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domingo, 3 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25233: In Memoriam (500): Eduardo Cesário Rodrigues, mais conhecido por "Salazar" (1941-2024), ex-alf mil, CCAÇ 1420 (Fulacunda) e CCAÇ 6 (Bedanda) (1967 / 69) (Joaquim Pinto Cavalho)



Eduardo Cesário Rodrigues, "Salazar" (1941-2024), ex-alf mil CCAÇ 1420 / BBCAÇ 1857 (Fulacunda) (jan-abr 67), e CCAÇ 6 (Bedanda) (mai67 - jun68)


Guiné > s/l > s/ d> O "Salazar" à esquerda



Guiné > Região de Tombali > Bedadanda > CCAÇ 6 > c. 1967/68> O "Salazar", do lado esquerdo, sentado, com boina,  a “tocar” no instrumento de que não sei o nome.



Portugal > Mealhada > 29 de junho de 2013 > 3.º Encontro dos Bedandenses, organizado pelo António Teixeira, "Tony" (1948-2018), ex-alf mil CCAÇ 3459/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, e CCAÇ 6, Bedanda (1971/73). 

Fotos (e legendas) : © Joaquim Pinto Carvalho (2024). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaraada da Guiné.]


1. Mais uma notícia triste que nos chega por telemóvel e depois por email de 26 do passado mês de fevereiro, por parte do Joaquim Pinto Carvalho 

tem 64 referências no nosso blogue; é membro nº 633 da Tabanca Grande; foi alf mil da CCAÇ 3398 (Buba) e CCAÇ 6 (Bedanda) (1971/73); natural do Cadaval, é advogado, poeta e régulo da Tabanca do Atira-te ao Mar, Porto das Barcas, Atalaia, Lourinhã; é autor de uma brochura com a história da unidade, a CCAÇ 3398, distribuída no respetivo XXV Convívio, realizado no Cadaval, em 18/9/2021; vai voltar no dia 9 à Guiné, passando por Bossau, Buba e Bedanda, com um grupo de graduados da ua CCAÇ 3398)]


Data - 2 de março de 2023, 20h21:

Olá, Luís!

Seguem breves elementos informativos sobre o "Salazar", que morreu no  passado dia 26 (*),   e algumas fotos em anexo ...

Nome: Eduardo Cesário Rodrigues, conhecido por  "Salazar". (O "nickname" Salazar nasceu no seio da família e era assim conhecido entre os amigos e até na tropa)

Data nascimento: 18/07/1941

Data do óbito: 26/02/2024

Incorporação: 03/05/1965

Disponibilidade; 28/02/1969

Embarque em Lisboa a 11/01/1967 a bordo N/M "Rita Maria" | Desembarque na Guiné no dia 19/01/1967

Patente: Alferes miliciano

Subunidades e locais: 

CCAÇ 1420 (BCAÇ 1857) – Fulacunda

CCAÇ 6 – Bedanda, 4º Pelotão,  de 01/05/1967 a 01/06/1968.

27/08/1968 – evacuado para o Hospital Militar Principal  (HMP), em Lisboa por doença em serviço.

Foi ferido na operação “Salto",  na zona de Caboxanque (Cantanhez), em data que não
 conseguimos precisar.

É o que tenho por agora. Pode ser que venha a obter mais dados. A foto ao pé do estandarte foi tirada num almoço convívio na Mealhada, organizado pelo Toni...

Ao dispor

Um abraço

Pinto Carvalho 
 

Guião da CCAÇ 6 (Bedana, 1967/74) , "Onças Negras", cuja lema era, de acordo com o guião acima reproduzido,  "Aut vincere aut morire" [Vencer ou morrer]. A antiga 4ª CCAÇ foi extinta a partir de 1abr67, passandP a designar-se por CCaç 6,

Foto: © Amaral Bernardo (2011). Todos os direitos reservados.[ Edição e legendagem: Blogue luís HGraça & Camaradas da Guiné]



Peniche >  28 de setembro de 2013 > Convívio dos bedandenses da CCAÇ 6 e outras subunidades > Tasca secreta do Belmiro >  A chegada do Eduardo Cesário Rodrigues (de alcunha, Salazar), vendo-se o seu filho, de costas.


Peniche >  28 de setembro de 2013 > Convívio dos bedandenses da CCAÇ 6 e outras subunidades > Tasca secreta do Belmiro > Foto nº 8 > O "Salazar", o filho e a afilhada


Peniche >  28 de setembro de 2013 > Convívio dos bedandenses da CCAÇ 6 e outras subunidades > Tasca secreta do Belmiro > O Hugo Moutra Ferreira,  o "Salazar", o João Carapau, o Gualdino (sempre convenientemente acompanhado) e o Lassana

Fotos (e legendas) : © Hugo Moura Ferreira (2013). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaraada da Guiné.]


Neste convívio de Peniche, organizado pelo Bemiro da Silva Pereira (1946-2022), houve 34 presenças... A recordar:

Aníbal Magalhães Marques (1972/74 ?), mais 3 familiares (n=4)

Belarmino Sardinha ((ex-1.º Cabo Radiotelegrafista STM, Mansoa, Bolama, Aldeia Formosa e Bissau, 1972/74), Cadaval) +  esposa (n=2)

Belmiro Silva Pereira (alf mil, 1968/69, Peniche,), mais  a esposa e filho (n=3)

Eduardo Cesário Rodrigues (Salazar) (alf mil, 1967/68), mais o filho e a afilhada (n=3)

Fernando de Jesus Sousa (fur mil, 1971/73) +  esposa (n=2)

Gualdino José da Silva (fur mil 1967/69, Algarve) mais 1 casal amigo (n=3)

Hugo Moura Ferreira (alf mil, 1967/68, Lisboa) + esposa, Lorena (n=2)

Joaquim Pinto Carvalho (alf mil, 1972/73, Cadaval) +  espoa, Maria do Céu (n=2)

João António Carapau (alf mil médeico, 1967/68, Portela, Loures) (n=1)

João José L. Alves Martins (alf mil art, BAC 1, 1968/69, Lisboa) n=1)

José P. B. Guerra (1º Cabo, 1971/73) (n=1)

Lassana Djaló (, o mais bedandense de todos os bendandenses, Lisboa) (n=1)

Luís Graça (fur mil, CCAÇ 12, 1969/71, Alfragide/Amadora) mais Alice (n=2)

Luís Nicolau (o homem do SPM, 1972/73, Benedita, Alcobaça) (n=1)

Renato Vieira de Sousa (cap inf, 1967/68, hoje cor ref, Lisboa) (n=1)

Rui [Gonçalves dos}  Santos (o mais vellhinho dos bedandenses, 1962/64, Lisboa) (n=1

Victor Luz (fur mil, 1967/68), mais esposa e 1 casal amigo (n=4)

Não compareceram mas estavam pré-inscritos (n=6)

Amadeu M. Rodrigues Pinho (alf mil, 1967/68)

António Rodrigues (O Capitão do Estandarte: o último Alferes / Capitão, fiel depositário do estandarte e da Cruz de Guerra)

Carlos Nuno Carronda Rodrigues (alf mil , hoje cor ref)

José Caetano

José Vermelho [ex-fur mil, CCAÇ 3520, Cacine; CCAÇ 6, Bedanda; e CIM, Bolama, 1972/74,]

Toni [António,] Teixeira [, ex-alf mil,  CCAÇ 3459/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto; e  CCAÇ 6,  Bedanda,  1971/73;  Espinho)
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2. Comentário do editor LG:

Joaquim, apanhaste-me de "baixa"...Lamento muito a morte de mais um dos nossos camaradas que passaram pelas "africanas"... O "Salazar", como era carinhosamente  tratado pelos "bedandenses", não é do meu tempo nem do teu, mas convivvemos com ele, tu muito mais do que eu. (Eu esporadicamente, em 2013, nos convívios da Amadora e em Peniche).

Não chegou a perfazer os 83 anos, este nosso veterano. Aqui fica a tua homenagem, e a de todos nós. Ele  não será inumado na "vala comun do esquecimento", mesmo que a interação com o nosso blogue tenha sido muito diminuta. Fica aqui, neste cantinho do ciberespaço, o registo de quem se lembrou na vida e na morte.

Transmite às "Onças Negras" e demais "bedandenses"  as nossas  condolências, bem como à sua família natural, esposa, filho, afilhada. 

Juntei  mais umas fotos dos nossos convívios.  Se, nesta viagem de saudade, que vais empreender à Guiné-Bissau, com início no dia 9, conseguires chegar a Bedanda, tira algumas fotos das vossas comuns geografias emocionais. E partilha depois com todos nós. Boa viagem, melhor regresso. 

Amadora > Venda Nova > Restaurante "O Gomes", às portas de Benfica > 19 de dezembro de 2013 > "O Eduardo Cesário Rodrigues, mais conhecido por "Salazar". Este nome que lhe é dado desde os anos 50, faz quase parte do nome dele. Eu costumo colocar no final do nome dele Salazar entre aspas. Como se fosse um título!". (**)

Foto (e legenda): © Hugo Moura Ferreira (2013). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaraada da Guiné.]

Amadora > Venda Nova > Restaurante "O Gomes", às portas de Benfica > 19 de dezembro de 2013 > Da esquerda para a direita, Gualdino da Silva, o lugar (vazio) deixado em memória do Tony, e o Joaquim Pinto Carvalho 

Foto: © Manuel Lema Santos (2013). Todos os direitos reservados. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaraada da Guiné.]

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Notas do editor:



quinta-feira, 14 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24951: Excertos dos melhores escritos de António Eduardo Ferreira (1950-2023), ex-1º cabo cond auto, CART 3493 / BART 3873 (Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) - Parte IX: A sorte naquele dia esteve do nosso lado

 

Guiné > Região de Tombali > Bedanda > 4ª CCAÇ (1965/67) > c. 1966 > Mulheres do mato, oirundas dos arredores de Bedanda, muito provavelmente Cobumba, na altura sob controlo do PAIGX. Ao centro está o alferes Oliveira, da 4ª CCAÇ. 

Fonte: livro "Panteras à solta: No sul da Guiné uma companhia de tropas nativas defende a soberania de Portugal", de Manuel Andrezo, edição de autor, s/l, s/d [c. 2010], 399 pp. il, disponível em formato pdf, na Bibilioteca Digital do Exército). [ Manuel Andrezo é o pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade, ex-cap inf, 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, Bedanda, jul 1965/jul 67]

 
1. Série com pequenos excertos dos melhores postes do António Eduardo Jerónimo Ferreira (1950-2023) (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493 / BART 3873, Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) (*).

O nosso camarada era natural de Moleanos, Alcobaça. Na tropa e na guerra era mais conhecido por Jerónimo. Lutou quase 20 anos, desde 2004, contra um cancro. Criou o blogue Molianos, viajando no tempo, por volta de 2013 ou 2014.




Parte IX -   A sorte esteve do nosso lado naquele dia


(...) Certo dia um grupo de elementos da nossa companhia foi a Cufar, como acontecia algumas vezes, tendo usado o nosso sintex.

 Nesse dia eu estava de serviço de condutor, ao fim da tarde fui com a viatura e mais três ou quatro camaradas para o cais, junto ao rio Cumbijã, onde estivemos durante algum tempo à espera que eles chegassem para os trazer de volta ao destacamento.

Enquanto esperávamos, os Fiat iam bombardeando não muito longe de nós. Naquele tempo, ao contrário do que acontecia antes dos Strela por lá terem chegado, altura a que eles faziam os bombardeamentos era bastante mais afastada do solo o que nos permitia vê-los. 

Durante o tempo que lá estivemos à espera, a conversa não parou, durante a qual alguém afirmou que a "Maria Turra" tinha dito que breve nos iam atacar. Era coisa tão normal ela dizer isso,  que nós não demos importância, dizia muitas coisas que não eram verdade. 

Quando em Mansambo fomos atacados, a primeira e única vez enquanto lá estivemos, no outro dia ela apareceu na rádio a dizer que nos tinham feito grandes estragos, entre os quais a destruição de um abrigo, o que era mentira, dentro do destacamento, nesse dia, apenas caíram duas granadas.

Guiné > Região de Tombali > Carta de Bedanda (1956) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Bedanda, Cobumba, Cufar e rio Cumbijã.


Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2023)



Entretanto os Fiat terminaram o seu trabalho e foram embora. Passados poucos minutos de terem partido começamos a ouvir alguns rebentamentos, e a nossa primeira reação foi pensar que eles tivessem voltado, pensamento que durou apenas breves instantes, rapidamente nos apercebemos que afinal éramos nós que estávamos a ser atacados. Ataque continuado e diversificado no armamento por eles utilizado, tendo sido o que demorou mais tempo dos vários com que fomos flagelados enquanto por lá permanecemos. 

A sorte naquele dia esteve do nosso lado, mas o susto motivado pela impotência com que nós fomos confrontados junto ao rio, foi terrível, nada podíamos fazer. 

Com uma das armas utilizada, o morteiro 82, eles conseguiram colocar uma granada de cada lado da picada com uma distância de cerca de quarenta ou cinquenta metros, uma da outra, desde o início das primeiras tabancas até a poucas dezenas de metros do local onde nós nos encontrávamos, que era a uma distância de cerca de quinhentos metros. 

Restava-nos ir para dentro do rio, naquela altura com a maré muito baixa. Foi o que fizemos, recordo-me de com as mãos tirar o lodo para os lados e me ter deitado nesse espaço, um disparate mas naquele momento tudo nos ocorria ao pensamento.

O armamento por eles utilizado estava distribuído por quatro locais: 

  • os RPG 7, um do lado de Pericuto, outro do lado oposto, início da mata de Cabolol; 
  • o canhão s/r deles, era daqueles que quando se ouvia a saída, a granada já estava a cair; 
  • o morteiro 82, dada a precisão com que eles colocaram as granadas junto à picada, só podia estar na direção da mesma, penso eu.

 Porque a sorte esteve do nosso lado, apenas tivemos um ferido leve, o apontador de um dos nossos canhões sem recúo, o que fez com que ele tivesse feito apenas um disparo.



Crachá do BART 3873 (Bambadinca, 197274). Divisa: "Na Guerra Construindo a Paz.



Passados largos minutos passamos a contar com a ajuda dos obuses de Catió

Se os camaradas que tinham ido a Cufar, têm chegado alguns minutos antes, tudo nos podia ter acontecido, dado o trajeto que nós tínhamos de fazer para regressar ao destacamento, atendendo à precisão com que eles colocaram as granadas junto à picada.

Quando os camaradas chegaram no Sintex, junto de nós, o ataque já tinha terminado, ainda bem que eles demoraram, assim safamo-nos de ter vivido aquela situação na picada no regresso… onde não havia sítios para nos abrigar, se tal fosse necessário.

Entre a população houve uma vítima mortal, uma senhora. No outro dia efetuaram o seu funeral, tendo sido enterrada junto à tabanca onde morava. Nesse dia apareceram por ali algumas pessoas vindas de outros locais. 

Ao fim do dia havia alguns com pedaços daquilo que nos parecia ser carne de porco, não chamuscado, gostava de saber se seria alguma tradição. Haverá alguém que saiba? (...)  (**)

(Seleção / revisão e fixação de texto / negritos: LG)

2. Comentário do editor:

Embora tardiamente, aqui vai a resposta à pergunta que o nosso camarada Ferreira nos colocou (em comentarioa um poste que ora não identifico)... 

Mesmo em contexto de guerra, o enterro da senhora que morreu em Cobumba, seguramente de etnia balanta, nesse ataque do PAIGC (portanto, vítima do "fogo amigo") (***), tem de ser entendido no quadro da cultura da sua etnia, e do indispensável "choro" (o mesmo é dizer o velório e o enterro) .. 

Aqui vai um excerto do artigo "Toca Tchur, uma celebração da vida", de Jamila Pereira (Bantumen, 17 de abrilde 2023) (com a devida vénia...)

(...) Tomemos, por exemplo, as etnias Balanta e Pepel na Guiné-Bissau, duas tribos com actos fúnebres similares mas, no entanto, distintos. (...)

Para ambas as tribos, sendo animistas, a compreensão de que o curso da vida é cíclico e não linear, como uma experiência contínua, permite que a morte seja percebida como um deslocamento para outro espaço habitacional. Consequentemente, existe a noção de que o “enterro perfeito” garante que o espírito do antepassado não fique entre os vivos para assombrá-los ou controlá-los, mas sim para protegê-los enquanto descansa pacificamente. Destacando então a narrativa de que aqueles que estão no reino dos mortos possuem poderes sobrenaturais, podendo amaldiçoar, curar ou abençoar e tirar ou dar vida. Entretanto, a pessoa também pode reencarnar em várias pessoas, como renascidos, ou habitar o mundo espiritual através da sua forma terrena como antepassados, posição muito valorizada nas crenças Africanas. Tornar-se um antepassado é, portanto, uma meta valiosa para muitos. 

E não enterrar o corpo “adequadamente” implica a possibilidade de a pessoa tornar-se num espírito vagante, incapaz de prosseguir convenientemente após a morte, constituindo um prejuízo para os que ainda estão vivos. Aliás, após uma morte, geralmente são procuradas respostas divinas para atribuir uma causa ao ocorrido: inveja, bruxaria, ofensa aos antepassados ou aos deuses. Então, aqueles que podem ter sido rotulados de indignos ou feiticeiros, indivíduos que morreram “muito cedo” ou não levaram uma vida “significativa” e “honrada”, talvez lhes seja recusado um “enterro perfeito” também, negando-lhes assim que se tornem antepassados.

Após um falecimento, família e amigos reúnem-se para celebrar a vida do indivíduo, denominado Toca Tchur, nome comum entre todas as etnias. Na etnia Balanta, caso seja um homem que tenha cumprido o fanado (conhecido por circuncisão), é lavado pelos anciãos e enrolado num fundinho, um tecido tradicional. Os vizinhos são então informados da morte através dum bombolom (tambor grande). No entanto, se o falecido for alguém mais jovem, por exemplo, como mencionado previamente, a celebração não ocorreria, pois a sua morte seria considerada ultrajante ou talvez uma maldição.

Eventualmente, após a mensagem ser enviada, o falecido será coberto mais adiante por mais panos doados por entes queridos como vizinhos, família e amigos. Ao longo da cerimónia os anciãos, em conjunto, retiram então os tecidos e entregam-nos à família para que os guardem carinhosamente depois de serem lavados, sendo assim uma lembrança permanente. Além disso, caso a família não possa cobrir o montante duma caixa (caixão) para o enterro, eles podem enterrá-lo numa esteira de palha. Assim têm a possibilidade de finalizar a primeira parte da cerimónia, depois de atravessarem por cima do porco sacrificado, abençoando o animal e a futura alimentação dos participantes.

Do álcool à fartura de comida, a celebração evidencia o orgulho que as pessoas carregam por estarem presentes e como vêem como uma bênção o poder duma vida plena e encerrada pela velhice. A celebração tem um impacto significativo no bem-estar dos entes queridos, mesmo que já tenham aceite o falecimento em questão. 

Ao longo do Toca Tchur, também são utilizados um bombolom e um tambor para que se estabeleça a comunicação com o espírito, conduzindo-o diretamente ao mundo dos mortos. Para finalizar a cerimónia, danças e rituais são feitos com os símbolos dos povos ganha pão, dependendo de cada profissão. E a maioria das cerimónias são realizadas entre abril e junho, pois representa a época de colheitas. (...)
____________

Notas do editor:


(**) Vd. poste de 10 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22361: Pedaços de um tempo (António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CART 3493) (15): A religião, a fé e o medo

Utilizámos  também pequenos  excertos do blogue do autor, Molianos, viajando no tempo.

(***) Vd, também poste de 23de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9642: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (12): Os infelizes que estão em Cobumba...

sexta-feira, 23 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24426: In Memoriam (480): Carlos Nuno Carronda Rodrigues (1948-2023), ex-alf mil, CCAÇ 6 (Bedanda, 1970/72), cor inf ref... Passa a integrar a título póstumo a Tabanca Grande, sob o n.º 876


Tabanca da Linha > Carcavelos > Hotel Riviera > 21 de janeiro de 2016 > Carlos Nuno Carronda Rodrigues, cor inf 'cmd'  (1948 - 2023).  

Foto (e legenda): © Manuel Resende (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Região de Tombali > Bedanda  CCAÇ 6 (ex-4ª CCAÇ) (1964/74) > Guião das "Onças"  cuja lema era  "Aut vincere aut morire" [Vencer ou morrer].

Foto: © Amaral Bernardo (2011). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 Carlos Nuno Ca

Mealhada > Pedrulha > Restaurante "A Portagem" > 9 de junho de 2012 > 2 .º Encontro Nacional "Onças Negras de Bedanda",  CCAÇ 6 > Uma foto histórica: da esquerda para a direita, o ex-cap inf  Aurélio Manuel Trindade (hoje ten gen ref), o último cmdt da 4.ª CCAÇ e o primeiro da CCAÇ 6 (1965/67), o Lassano, o Rui Santos, Amará e ex-alf mil Carronda Rodrigues (cor cmd ref).

Foto (e legenda: © António Teixeira, "Tony" (2012). Todos os direitos reservados. [ Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Amadora >  Venda Nova > Restaurante O Gomes, às portas de Benfica > 19 de dezembro de 2013 >  Almoço de Natal dos bedandenses do sul, com homenagem ao  Tony Teixeira  (António Henriques Campos Teixeira, 1948-2013) > Em primeiro plano, o cor Carronda Rodrigues. (que andou a pisar a bolanhas de Bedanda como alferes miliciano) e a esposa a Manuela Carronda Rodrigues.

Foto: © Manuel Lema Santos (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, com a ajuda  do Hugo Moura Ferreira]

Oeiras > Algés > 21 de julho de 2016 > Restaurante Caravela de Ouro> 26.º convívio da Magnífica Tabanca da Linha > Caras conhecidas: Carlos Carronda Rodrigues, cor ref  e esposa Manuela (Alguerião)

Foto: © Manuel Resende (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] 

Tabanca da Linha > 34.º Almoço-convívio > Algés > Restaurante "Caravela de Ouro" > 16 de novembro de 2017 > 73 camaradas e amigos/as compareceram à chamada e desta vez bateu-se o recorde de inscrições e presenças... A localização do restaurante (Algés) e a ementa (cabrito no forno...) também ajudaram. Na foto, o Carlos Carronda Rodrigues, cor cmd ref, e a esposa., Manuela. O casal vive em Algueirão.

Fotos (e legendas): © Manuel Resende (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Morreu no passado dia 21, o nosso camarada Carlos Nuno Carronda Rodrigues, ex-alf mil, da CCAÇ 6, "Onças   Negras", Bedanda, 1970/72, cor cmd ref (*). Tinha 75 anos.

Sobre ele escreveu, ontem, na página do Facebook da Magnífica Tabanca da Linha, o Manuel Resende,  respetivo régulo e administrador:

(...) O Sr. Coronel Carronda Rodrigues foi quem colocou a medalha de ex-Combatente ao Diniz Souza e Faro, numa cerimónia em Comandos de Carregueira.

Já nos conhecíamos dos convívios, e fiquei muito satisfeito quando ele, sabendo que eu estava a filmar, me veio dar um grande abraço. São coisas que não podemos esquecer.

O Sr. Coronel Carronda Rodrigues veio a 11 convívios da Magnífica Tabanca da Linha, e sua esposa D. Manuela participou em 6 com o marido.

O 1.º Convívio em que o Sr. Coronel participou foi o n.º 22 em Oitavos, em 19-11-2015. O 1.º em que a D. Manuela o acompanhou foi o n.º 24 em 17-03-2016 em Oitavos. O último em que a esposa o acompanhou foi o n.º 34 em Caravela de Ouro em 16-11-2016.

O último convívio do Sr. Coronel foi o n.º 44 em 25-07-2019 em Caravela de Ouro – Algés. (...)

(Negritos nossos: editor LG)

2. Mais elementos, segundo nota biográfica disponibilizada pelos nossos camaradas do portal UTW - Dos Veteranos da Guerra do Ultramar

(i) nasceu em 2 de maio de  1948,  em Castelo Branco;

(ii) Foi mobilizado para o CTIG, de 15 de janeiro de 1970, como alf mil,  em rendição individual, para a  CCAÇ 6 (Bedanda, 1970/72);
 
(iii) em 1 de setembro de 1973, foi  colocado na Escola Prática de Infantaria (EPI, Mafra)  como tenente QEO (Quadro Especial de Oficiais);

(iv) em 26 de setembro de 1974 foi transferido para o BCmds 11, Amadora;

(v) em 12 de Maio de 1975 foi promovido a capitão ‘comando’ do Regimento de Comandos, Amadora;

(vi) no período 1993-1995, foi promovido sucessivamente a major e tenente-coronel no Regimento de Infantaria de Angra do Heroísmo.

(vii) em 2005, alcançou o posto de coronel de infantaria, do Quadro Especial de Oficiais (QEO) Infantaria ‘Comando’, sendo cmdt da Unidade de Apoio da Área Militar Amadora-Sintra;

(viii) em 3 de maio de 2009, na situação de reserva, cessa funções na Comissão para o Estudo das Campanhas de África (CECA) da Direcção de História e Cultura Militar (DHCM) do Estado-Maior do Exército (EME).


3. Como nos lembra o Virgínio Briote  (poste P4014, de 11 de março de 2009),  o cor cmd Carronda Rodrigues foi o coautor (juntamenmte com o cor cmd José Castelo Glória Alves e o cor cmd Horácio Silva Ferreira) do 14.º Volume (Comandos), Tomo I (Grupos iniciais), da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), Edição do Estado-Maior do Exército / Comissão para o Estudo das Campanhas de África, Lisboa, 20009.

Em resumo: Carronda Rodrigues não só foi combatente na Guiné, um "onça negra", como participou nas nossas tertúlias e convívios, e deu, ainda, um valioso contributo para a preservação e divulgação das nossas memórias... 

Por todas estas razões, e sob minha proposta, o camarada Carronda Rodrigues passa integrar, a título póstumo, a Tabanca Grande, sob o n.º 876 (**), seguindo-se à Inês Allen. Infelizmente não temos ainda nenhuma foto dele no CTIG. À viúva, a nossa amiga Manuela, com quem convivemos na Tabanca da Linha, e demais família, apresentamos as condolências da Tabanca Grande.
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Notas do editor:

(*) Último poste da série >  11 de junho de 2023 > Guiné 61/74 - P24389: In Memoriam (479): António Branquinho (1947-2023), ex-fur mil, Pel Caç Nat 63 (Fá e Missirá, set/69 - out/71)... Nosso tabanqueiro desde 24/9/2010, era irmão do advogado e escritor Alberto Branquinho, também ele membro da nossa Tabanca Grande

(**) Último poste da série > 1 de maio de 2023 > Guiné 61/74 - P24275: Tabanca Grande (549): As "fotos da praxe" do cor inf ref Mário Arada Pinheiro, que completou 90 anos em 12/12/2022... Foi 2.º cmdt do BCAÇ 2930 (Catió, 1971/73) e Cmdt do Comando Geral de Milícias (1973)

Vd. também poste de 27 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24259: Tabanca Grande (548): Inês Allen, senta-se à sombra do nosso poilão, no lugar n.º 875... Voltou a Empada, 17 anos depois, para cumprir a última vontade do pai, Xico Allen, entregar ao clube de futebol local, "Os Metralhas", o emblema da divisa da CCAÇ 3566 (Empada e Catió, 1972/74)

domingo, 4 de setembro de 2022

Guiné 61/74 - P23587: (Ex)citações (414): Um "presente envenenado": a minha transferência da CCAÇ 1621 para a CCAÇ 6, em 1/7/1967, em substituição do alferes miliciano acusado de roubar o arroz às "mulheres do mato" (Hugo Moura Ferreira)



Nota de 11 de julho de 1967, da 1ª Rep/QG/CTIG, com a ordem de transferência do alf mil Hugo Fernando Moura Ferreira, da CCAÇ 1621 para a CCAÇ 6.

Foto ( e legenda): © Hugo Moura Ferreira (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem, de hoje, às 9h36,  do nosso amigo e camarada, um histórico da Tabanca Grande (de que é membro desde 22/12/2005), Hugo Moura Ferreira, ex-alf mil CCAÇ 1621, Cufar, CCAÇ 6, Bedanda, e 1º Rep/QG/CTIG, Bissau, 1966/68:

Assunto  - "Panteras à Solta" e outras coisas

Olá, Luís Graça.

Desejo que as melhoras estejam a ser constantes e sentidas!

Já comecei a ler o livro "Panteras à Solta", de Manuel nrdezo, pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel TRindade, ed. autor, 201o, 399 pp.) que me está a entusiasmar. 

Há coisas que desconhecia e outras de que apenas ouvi falar nelas de forma superficial, mas algumas conheço-as bem. Nomeadamente aquela em que tu mencionas no P23565 (*):

"... quando um dos seus alferes milicianos, feito com um comerciante local, roubou arroz às mulheres do mato. Foi exemplarmente punido com 3 dias de prisão simples, expulso da companhia e transferido para Catió" (...).

Ora, eu acabei pro ser um interveniente directo, nessa hist´roia, como te comprovo com o documento anexo. O facto é que,  devido à ocorrência, fui eu que acabei por ser colocado na CCaç 6, quando a minha CCaç 1621 foi transferida de Cufar para o Cachil.

No fundo, analizando bem a situação, o prevaricador que era o Alf  Mil______________ [omite-se o nome, por razões óbvias, LG] acabou por sair beneficiado, pois deixou de integrar uma unidade altamente operacional, para integrar uma de quadrícula "vulgar de Lineu" que por essa razão viu a sua comissão reduzida em 4 meses. 

Como deves saber, as Companhias formadas na Metrópole tinham uma comissão de 18 a 20 meses e os militares das Companhias da Guarnição Territorial, que ali eram colocados em rendição individual, "abichavam" 24 meses.

Foi isso que me aconteceu a mim, que não tinha sido castigado e acabei por sê-lo. porque a minha CCaç 1621, regressou em Agosto/1968 e eu acabei por embarcar em Novembro.

E a recordação leva-me à altura em que recebi a carta que te envio em anexo. Toda a malta, me veio dar os parabéns, por ter sido escolhido entre tantos alferes pertencentes ao Batalhão de Catió, que eu, sabendo a fama operacional que a CCaç 6 tinha, sempre fui respondendo com um "Xiça".

E lá fui... E não me arrependo, pois fiquei "agarrado" àquela terra e àquela gente precisamente por esse facto. Tal nunca teria sucedido se eu me tivesse mantido na minha Companhia de origem.

Mas quando fui, tomei uma posição que me levou a apresentar-me ao Major Monteny, Chefe da Rep. do Pessoal, do QG, colocando-lhe a questão da injustiça da situação. Felizmente ele compreendeu e aceitou o meu pedido(!) de que, quando a CCaç 1621 fosse para Bissau a aguardar embarque, eu também seria transferido para a capital, deixando Bedanda.

Isso veio a verificar-se. Eles no QG cumpriram o prometido.

Mas (há sempre um mas!) quando me apresentei no Quartel General, foi em má altura. Como o AlferesTesoureiro, da Chefia da Contabilidade, tinha ficado "cacimbado" e evacuado para Lisboa, a vaga estava ali mesmo à minha espera. Agora, imagina um atirador, sem formação contabilística, económica ou financeira, a ocupar o lugar do Tesoureiro do QG, para toda a Guiné.

Aqui tenho que fazer justiça a dois camaradas que muito me apoiaram. Foram o Alf Verde e o Alf Oliveira (filho dos donos das máquinas de costura Oliva, de São João da Madeira). Ao ponto de passarem a última noite, antes do meu embarque, na pesquisa de um erro de contas de 20 centavos, para eu poder passar o serviço e as contas em condições e ser autorizado a regressar. Não os esquecerei!

Mas foram 4 meses interessantes. A minha Mulher, com quem tinha casado 2 meses antes de embarcar para a Guiné, depois de 8 anos de namoro, com quem não tinha podido gozar a Lua de Mel, dado que estava no IAO, quando formei companhia, em Abrantes, no RI2, acabou por ir viver comigo esses 4 meses. E acompanhou-a o meu filho mais velho, que nasceu precisamente em Julho/67, coincidindo com a minha mudança da CCaç 1621, para a CCaç 6. 


Guiné > Região de > Cufar > CCAÇ 1621 (1966/68) > s/d > Coluna de Sangonhá para Cacine> Foto disponibilizada por pessoal da CCAÇ 1621, por ocasião do  convívio de Junho de 2006).

Foto  (e legenda): © Hugo Moura Ferreira (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

(...) Tenho outras questões que aqui vou focar, embora de forma sucinta.

1ª - Curiosidade;

Quando os alunos da Academia Militar terminavam os cursos, vulgarmente eram destacados, por 1 ano, para as Companhias, a fim de fazerem o Tirocínio. Foi o que aconteceu ao Cap Gastão Silva, que criou o "Sete do Cantanhez". Esteve comigo, uns anos antes, como Alf do quadro, na Ccaç 6. Tal como ele passou um outro Alf que já está na reserva como Cor., era o Alf Paninho Souto.

2ª - Curiosidade;

No meu tempo, apenas um ou dois meses, após a saída do Cap Aurélio Trindade, que eu não conheci, já não havia destacamento na povoação comercial.

À entrada da povoação existia, sim,  uma casa junto à Ultramarina, do Saldanha, onde dormiam 2 ou 3 Alferes. Já não me lembro. Eu sei que dormia ali!

3ª - Curiosidade:

Quanto à questão das Panteras 'versus' Onças, não sei exatamente o que se passou e levou o Cap Renato Vieira de Sousa (que sucedeu ao Aurélio Manuel Trindade) a proceder a essa alteração, mas irei tentar saber junto dele e depois informarei.

Por hoje aqui me fico, enviando um Abraço amigo! (**)

Hugo Moura Ferreira.
______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 29 de agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P23565: Notas de leitura (1481): "Panteras à solta", de Manuel Andrezo (pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade): o diário de bordo do último comandante da 4ª CCAÇ e primeiro comandante da CCAÇ 6 (Bedanda, 1965/67): aventuras e desventuras do cap Cristo (Luís Graça) - Parte III: O Tala Djaló, cmdt do Pel Mil 143 e depois fur grad 'comando' da 1ª CCmds Africana, que virá a ser fuziladdo em Conacri, na sequência da Op Mar Verde

Guiné 61/74 - P23586 Os nossos camaradas guineenses (47): Tala Biu Djaló, ex-alf 2ª linha, cmdt Pelotão de Milícias (Bedanda, 1965/69), e ex-fur graduado 'comando, 1ª CCmds Africanos (Fá Mandinga, 1969/70), desaparecido em Conacri, em 22/11/1970, no decurso da Op Mar Verde (Hugo Moura Ferreira, ex-alf mil, CCAÇ 1621, Cufar, e CCAÇ 6, Bednda, 1966/68)




Tala Biu Djaló, ex-fur graduado 'comando', 1ª Companhia de Comandos Africanos. Pertencia ao Gr Com do alf graduado 'comando' João Benjamim Lopes, que ficou retido em Conacri, em 22 de novembro de 1970, no decurso da Op Mar Verde. Terá sido depois fuzilado, juntamente com todo o grupo.

Originalmente, o Tala Dajló era alf de 2ª linha, comandante do Pelotão de Milícias, de Bedanda, ao tempo do último comandante da 4ª CCAÇ e primeiro da CCAÇ 6,  cap inf Aurélio  TRindade (Bedanda, 1965/67).

Fotos ( e legendas): © Hugo Moura Ferreira (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Hugo Moura Ferreira
1. Mensagem de 30/8/2022, 0h56, do veterano da Tabanca Grande, Hugo Moura Ferreira, ex-alf mil inf, CCAÇ 1621, Cufar, e CCAÇ 6, Bedanda, 1966/1968)
 
Verifiquei que, no poste colocado em 29Ag22 (Guiné 61/74 - P23565) (*), dás como em falta uma imagem do meu saudoso amigo Tala Biu Djaló. Sendo assim, aqui te envio uma imagem dele.

Abraço e dispõe para aquilo que aches que eu possa ser útil. Hugo Moura Ferreira (**)
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de:


sábado, 3 de setembro de 2022

Guiné 61/74 - P23583: O Cancioneiro da Nossa Guerra (14): Os Hinos da 4ª CCAÇ (Bolama e Bedanda, 1961/67) e da CCAÇ 6 (Bedanda, 1967/74)



Hino da  4ª Companhia de Caçadores  

(Bolama e Bedanda, 1959/67)


A terrível companhia 4ª CC
Que luta de noite e dia
Não têm medo
Na luta não tem rival
E gritam sempre
Vamos lá malta para a frente
Aqui manda Portugal

Refrão

No tarrafo são panteras
E na mata são leões
Mais do que com as armas
Eles lutam como feras
Lutam com os corações

Lutam sem medo
Nas bolanhas da Guiné
Caçadores nativos
Aos turras batem o pé
Sabem actuar
Em qualquer situação
Avançando sem parar
Gritando sem cessar
Defendemos nosso chão

Refrão

No tarrafo são panteras
E na mata são leões
Mais do que com as armas
Eles lutam como feras
Lutam co
m os corações

Fonte: In "Panteras à solta: No sul da Guiné uma companhia de tropas nativas defende a soberania de Portugal", de Manuel Andrezo, edição de autor, s/l, 2010, pág. 5. [ Disponível em formato pdf, na Biblioteca Digital do Exército (Panteras_a_Solta (PDF, 6 MB, link para descarregar o ficheiro em pdf, cortesia do autor e da Biblioteca Digital do Exército. Manuel Andrezo é o pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade, ex-cap inf, 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, Bedanda, jul 1965/jul 67].

Não sabemos a data nem o autor da letra. Mas já devia existir esta letra em 1965/67.  Diz o refrão: " No tarrafo são panteras / E na mata são leões / Mais do que com as armas / Eles lutam como feras / Lutam com os corações"...

Quem escreveu este refrão, não conhecia bem a fauna da Guiné, onde, em 1965, ainda existiam leões (pouquíssimos) mas não não propriamente panteras. "Onça" (termo crioulo para leopardo), sim (nome científico: Panthera pardus) ... O termo "pantera" tende a ser usado para designar três tipos de felinos: 

(i) a pantera africana ou leopardo; 

(ii) a pantera americana ou onça p.d.; 

e (iii) e a pantera negra, que, na verdade, é uma variante melânica do leopardo (Panthera pardus).





Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, adapt de "Guia de Identificação dos Animais da Guiné-Bissau". República da Guiné-Bissau, Direcção Geral dos Serviços Florestais e Caça, Departamento da Fauna e Protecção da Natureza, s/l, s/d, pág. 11 (Disponível em formato pdf, aqui, no sítio do IBAP ,
https://ibapgbissau.org/Documentos/Estudos/Animais%20da%20Guine-Bissau.pdf)


A onça-preta, ou onça-preta, também conhecida por jaguar-preto, é uma variação melânica da onça-pintada (ou jaguar), e só existe no continente americano...A pantera-negra é rara na natureza, sendo muito pouco comum na África e grande parte da Ásia.... A variante é mais comum, nas selvas do sudeste asiático, e até abundante na Malásia. 

È muito pouco provável, pois, que algum guineense alguma vez tivesse visto em Bedanda, u noutra parte da Guiné, uma pantera-negra...e muito menos ainda uma onça-negra...

Também não sabemos como seria cantada este hino (em geral, adaptava-se a letra a uma música conhecida).

A 4ª CCAÇ foi extinta, passando a designar-se, em 1abr67, por CCaç 6 (por sua vez extinta em 20ago74) (*).


Hino da 6ª CCAÇ 
(Bedanda, 1967/74)






O Hino dos Onças Negras da CCAÇ 6 (Bedanda, 196774)


Fonte: "O Seis do Cantanhês", nº 1, 1973 (?)... Jornal mensal (mas só saíram dois números),  "jornal de caserna",  foi criado e dirigido pelo Cap Gastão e Silva, da CCAÇ 6, tinha como redator-coordenador o alf mil Joaquim Pinto Carvalho e, entre outros membros da redação, o alf mil António Teixeira, o nosso saudos Tony (1948-2013)... Foi ele que nos facultou esta página. Não sabemos quem é o autor da letra do hino. nem o ano,  mas, pela  referência à "Guiné Melhor", deve ser do tempo do Spínola (1968/73).(**). 


Enfim, são mais duas peças para o Cancioneiro da Nossa Guerra (***). Esperemos que outras letras  (e músicas) não se percam.

Imagem: © António Teixeira (2011). Todos os direitos reservados.
[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].

______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P23553: Notas de leitura (1478): "Panteras à solta", de Manuel Andrezo (pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade): o diário de bordo do último comandante da 4ª CCAÇ e primeiro comandante da CCAÇ 6 (Bedanda, 1965/67): as aventuras e desventuras do cap Cristo (Luís Graça) - Parte I: "Os alferes não gostaram do novo capitão. Acharam-no com cara de poucos amigos."

(**) Vd. poste de 30 de Setembro de 2011 > Guine 63/74 - P8842: Cancioneiro de Bedanda (1): O hino da CCAÇ 6, Onças Negras (António Teixeira / Hugo Moura Ferreira)

(***) Útimo poste da série > 28 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23209: O Cancioneiro da Nossa Guerra (13): a "Spinolândia", com letra (parodiada) e música de "Os Bravos", de Zeca Afonso: uma preciosidade encontrada no sítio de "Os Leões de Madina Mandinga", a 1ª CART/BART 6523/73 (1973/74)

quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Guiné 61/74 - P23577: Notas de leitura (1486): "Panteras à solta", de Manuel Andrezo (pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade): o diário de bordo do último comandante da 4ª CCAÇ e primeiro comandante da CCAÇ 6 (Bedanda, 1965/67): aventuras e desventuras do cap Cristo (Luís Graça) - Parte VI: "Cercados de guerrilheiros por todos os lados", diz o alf mil Ribeiro, no "briefing" da praxe...

 

Croquis, basedo na carta de Bedanda (escala 1/50 mil), abrangendo os subsectores de Bedanda e Cufar... O rio principal era o Cumbijã, de que o rio Ungarinol era afluente (aqui se situava  o porto interior de Bedanda). Em 1965/67, as "barracas" do PAIGC e outros pontos logísticos (com população) vão assinaldos a vermelho... A 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, com sede em Bedanda, ao tempo do cap inf Aurélio Manuel Trindade, "partiu mantenhas" com a gente do mato que vivia por aqui... Em Cufar, estava  a CCAÇ 763 (1965/66), do nosso amigo e camarada Mário Fitas, ex-fur mil oo esp. E mais abaixo, a sede de batalhão, em Catió, sector S3: primeiro o BCAÇ 619 (jan 1964 / jan 1966),e  depois o BCAÇ 1858 (jan 1966 / mai 1967).

Infografia: Aurélio Manuel Trindade / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2022)










Anúncios de casas comerciais que, em meados dos anos 50, operavam no sul da Guiné, na região de Tombali, na altura o celeiro da província... Fonte:Turismo - Revista de Arte, Paisagem e Costumes Portugueses, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2. (Recolha do nosso camarada Mário Vasconcelos, 1945-2017)



1. Continuação da leitura do livro "Panteras à solta: No sul da Guiné uma companhia de tropas nativas defende a soberania de Portugal", de Manuel Andrezo, edição de autor, s/l, s/d [c. 2020] , 445 pp. , il. [ Manuel Andrezo é o pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade, ex-cap inf, 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, Bedanda, jul 1965/jul 67, exemplar gentilmente facultado, a título de empréstimo, pelo cor inf ref Mário Arada Pinheiro, com dedicatória autografada do Aurélio Trindade, datada de 13/12/2020] (*).


Mas a patir de agora, tomamos como referência a edição de autor, de 2010 , de 399 pp., il.,, disponível em formato pdf,  na Biblioteca Digital do Exército (Panteras_a_Solta (PDF, 6 MBlink para descarregar o ficheiro em pdf, cortesia do autor e da Biblioteca Digital do Exército).

O cap Cristo ("alter ego do cmdt da 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, no período que vai de meados de 1965 a meados de 1967)  não nos explica  por que razão Bedanda  estava em decadência, e isolada do resto do território, com a população dependente do exterior para se alimentar, quando uma dezena de anos antes fazia parte, com Catió e Cacine, do grande celeiro da província (**)...

A Guiné que exportava arroz, teve que começar a importá-lo. A explicação era, naturalmente, a guerra, com a consequente destruição do tecido económico e social do território. Na aregião de Tombali, no sul, a população balanta caiu sob o controlo do PAIGC e os fulas refugiaram-se em Bedanda, A admitraçao civil era totamente inoperante. Como dizia o seu responsável, Fernandes, cabo-verdiano, ao capitão Cristo, no dia em este o foi cumprimentar: (...) "Sou o administrador mas quem manda é a tropa, porque eu estou limitado a ir do posto para casa e de casa para o posto. É uma dura rotina." (... )pág. 19),

Leia-se o, entretanto,  o que o autor escreveu no início do capítulo intitulado "Reforma Agrária" (pp. 76-82):

(...) Em tempos, um outro capitão tentou levar os nativos da povoação a cultivar as ricas bolanhas de Bedanda. Era uma pena ver estas terras que antes da guerra roduziam muito arroz quando trabalhadas por balantas, agora cheias de mato. A população de Bedanda é hoje predominantemente fula, quando a região foi sempre, ao longo dos anos, chão balanta. O fula é fundamentalmente negociante e não gosta muito de lavrar a terra. No entanto, todos nós militares víamos que a actual situação não se podia manter. A população não produzia nem para comer. Vivia, por um lado, do trabalho de guia e da milícia, isto os homens, e por outro, de relações com os militares, as mulheres.(...) 

Veja-se também este diálogo entre o capitão e o régulo Samba Baldé (pág. 77/78)  

(...) "─ As pessoas não têm o que comer, passam muita fome e eu não quero que vivam pior que a gente do mato. Samba, tu és o homem grande e eu preciso de saber o que devemos fazer.
─ Nosso capitão, não há trabalho em Bedanda, apenas na milícia. Mulher é lavadeira da tropa e mais nada. O dinheiro é pouco, não dá para comprar arroz, peixe e óleo. Nosso capitão tem razão. A gente passa fome.
─ Samba, eu não compreendo a tua passividade. É preciso arranjar maneira de toda a população ter comida. Está na altura de preparar a bolanha para semear o arroz. emos muito boa bolanha em Bedanda. Toda a gente vai cultivar arroz. Tu divides a bolanha por todos e verás que ainda sobra bolanha.
─ Nosso capitão não pode ser, fula não cultiva arroz. Fula é comerciante e no seu chão faz arroz de sequeiro, não de bolanha. Fula da população não sabe cultivar arroz.
─ Samba, ouve bem o que eu te digo. Eu sou filho de pessoas que cultivam a terra lá no puto. Eu cultivei a terra. Já aprendi com o senhor Aniceto a cultivar arroz e já andei pela bolanha a ver as terras. Há terras livres para toda a gente. E vamos cultivar rroz porque eu não quero que as pessoas passem fome. Quero que cultivem arroz para comer e para vender. A bem ou a mal vamos cultivar arroz. (...)

O sucesso da sua  "reforma agrária" deve ter sido motivo de orgulho para o cap inf Aurélio Manuel Trindade. Naturalmente, não temos  acesso a outras fontes para comprovar a eficácia e a eficiência das medidas então tomadas pelo capitão. Confiamos no seu testemunho (Ou nas suas memórias passadas ao papel meio século depois).

Para o novo comandante da 4ª CCAÇ, Bedanda é uma ilha, fisica e metaforicamente falando

(...) "─ Ilha,  não digo, ─ diz o Dino [antigo tropa, agora pequeno conerciante]   ─ pois Bedanda é mais uma península cercada de água por todos os lados menos por um que é Guilleje.
─ Sabe Dino, ─ esclarece Cristo ─ eu falava de ilha em sentido figurado, eu não queria dizer cercada de água mas de guerrilheiros, que estão por todo o lado, e Bedanda é de facto uma ilha nesse sentido". (...)  (pág, 22).

E a verdade é que o croquis que publicamos acima, não enganava... Tirando Bedanda e Cufar, a guerrilha parecia estar por todo o lado... Era o "reino do ino" (pp. 354-365): Comumba, Bobedê/Melinde, Cabolol,Incala, Salancaur (já no corredor de Guile), Chugué, Cabedú, Nhai,Buchenon, etc., são topónimos de guerra... E sobre todos eles há histórias que ficaram para sempre gravadas na memória dos bravos de Bedanda e, naturalmente, do capitão Cristo que as viveu e escreveu, com paixão, coragem, inteligência e desassombro...

(...) "Em zonas mais afastadas como Salancaur, Nhai, Caboxanque e Cabolol, só duas companhias dão garantia de sucesso da operação. " (...) (pág. 101). Por sua vez, "Bobedê era considerada uma área onde só se ia com três pelotões" (pág. 107). E estamos a falar de uma companhia que era não de intervemnção mas de quadrícula, da guarnição normal, incialmente constitu+ida por "matrapilhas" (com a velha farda do caqui amarelo, esfarrapada, equipada com a velha Mauser, bebendo o café por latas de salsichas, sem roupa de cama, nem mosquiteiros)...Mas que, quando vai para o mato com o cap Critso,  não vai me "traje de passeio:

(...) "O Antunes prepara fogos de artilharia, a executar à ordem, sobre Samenhite. Levamos rações de combate para um dia, 200 cartuchos por homem, 2 granadas ofensivas por militar, 4 granadas de morteiro 60 por cada morteiro e 3 de lança-granadas por pelotão. Não se esqueçam de verificar se os homens levam água. A água que vamos encontrar é salgada" (...= (pp- 107/108)-

2. Quantos militares estavam aquarelados então em Bedanda, incluindo um pelotão de milícias (40 homens), e eçotão de artilharia, com duas bocas de 8.8  ? 

(...) A companhia tem cerca de duzentos e cinquenta homens na sua maioria negros. Quando na companhia houve uma tentativa de revolta, o Comando do Batalhão fez deslocar para Bedanda duas secções de brancos de outras duas companhias do batalhão. Essas secções ainda permanecem em Bedanda. Deve haver cerca de quarenta brancos, entre oficiais, sargentos e praças, para duzentos e dez negros. No sul da Guiné, em que a maior parte do território está controlado pelos guerrilheiros, existe uma companhia de nativos que soma êxitos sobre êxitos nas operações contra eles." (...)  (pág. 103). 


Embora extenso (pp. 26/27), vale a pena repoduzir a seguir o "briefing",  feito a sério e a brincar (também fazia parte da "praxe" aos "maçaricos", como então se dizia),  ao capitão Cristo, pelo  alf mil Ribeiro, o mais velho e o melhor operacional dos oficais milicianos da 4ª CCAÇ. (Vd. foto à esquerda, fonte: "Panetras à Solta", ed. autor, 2010, pág. 395; descobrimos que se trata de José Augusto Nogueira Ribeiro, natural de Fafe, 1940 - 2017, cor inf ref, condecorado com a "Torre e Espada" por feitos nos TO da Guiné Moçambique, vd. aqui no portal UTW . Ultramar Terra Web, Dos Veteranos da Guerra do Ultramar.)

(...) "─ Meu capitão, estamos na cantina, no ponto mais alto da Companhia. À nossa frente temos um rio navegável que separa, a norte, a área controlada pelos guerrilheiros, é o rio Ungauriuol. Este rio nasce a leste e corre para oeste, indo desaguar no rio Cumbijã que contorna a área da Companhia a oeste. A norte do Ungarinol, começando junto à sua foz, temos uma mata muito densa, mais ou menos paralela ao rio e que serve de esconderijo a vários acampamentos de guerrilheiros de efectivos variáveis mas com capacidade para se apoiarem uns aos outros quando atacados. 

Aoeste e a norte do rio Ungarinol, na mata referida, temos primeiro Incala, um dos pontos fortes dos guerrilheiros donde controlam a navegação não só do rio Cumbijã mas também do Ungarinol. A sudoeste de Incala o rio faz uma curva muito acentuada que é conhecida como a curva da morte. A última vez que a tropa tentou trazer um barco até ao porto interior de Bedanda, o barco foi fortemente atacado nesse local tendo morrido ou ficado feridos vários militares.  partir desse dia a Marinha recusou se a navegar no rio Ungarinol por falta de segurança. 

Desviando a nossa vista mais para leste encontramos primeiro Contumbum e depois Samenhite. Sabe-se que há um acampamento de guerrilha entre estas duas localidades que nunca conseguimos referenciar ou localizar em patrulhas pela zona. A seguir temos Bobedê, um dos pontos fortes dos guerrilheiros para evitar a passagem do rio Ungauriuol pelas nossas tropas. Já ali demos e levámos muita porrada.

 Mais para norte e na outra extremidade da mata fica Nhai e depois Salancaur, esta já no conhecido corredor de Guileje por onde passam os reabastecimentos dos guerrilheiros provenientes da Guiné-Conacri. Salancaur é mais um dos pontos fortes e mais ainda por ser um ponto de passagem, de concentração e descanso antes das colunas aí se dividirem em duas, uma seguindo para sul, para a mata do Cantanhez, onde está o Nino, o comandante guerrilheiro de todo o sul da Guiné, e a outra, atravessando o rio Cumbijã, vai com destino à base de Cansalá que fica para os lados do nosso Comando do Batalhão sediado em Catió

De novo para leste encontramos uma densa mata, já dentro dos limites do Cantanhez, que
é atravessada pela estrada que, vinda de Salancaur, segue depois até Cabedú, a sul dos
limites do Cantanhez, onde está estacionada uma companhia do nosso Batalhão. Não
há ligação entre a nossa Companhia e a de Cabedú. É uma zona completamente dominada pelos guerrilheiros. 

Partindo daqui para leste para alcançar Bedanda, encontramos outra estrada que se embrenha na mata. Esta estrada conduz até à fronteira da Guiné-Conacri, encontra-se cheia de abatizes5, de minas e de armadilhas,  e a primeira tropa que se encontra nessa direcção é um pelotão estacionado no Mejo, já pertencente à companhia de Guileje. Houve em tempos uma ligação terrestre entre Bedanda e Mejo, mas actualmente não conseguimos sequer chegar ao cruzamento para Salancaur. Sempre que tentámos chegar ao cruzamento fomos emboscados e retirámos com mortos e feridos. É uma zona dos diabos que os guerrilheiros querem controlar a todo o custo para garantirem o reabastecimento do Cantanhez. 

Voltando-nos agora para sul, vemos outra mata que, começando nas imediações de Bedanda, termina no rio Cafunebom, afluente do Cumbijã. O Cafunebom pode ser atravessado a vau. Antes de alcançarmos esse o rio, encontramos duas povoações, Cura e Braia. Estão na orla da mata, uma na margem do Cumbijã, a outra voltada para as tabancas de Flanque Injã e Caboxanque. São zonas onde se pode ir com um grupo de combate com muito cuidado pois é possível ter encontros com patrulhas dos guerrilheiros. Cura e Braia estão destruídas e desabitadas. 

Ainda mais a sul, já para lá do rio Bixanque, fica o coração do Cantanhez onde está o Nino, ocupando fortemente vários pontos da mata em que os mais conhecidos são Cadique e Cafal. A sul do Bixanque é já zona de acção da companhia de Cabedú. Para oeste, a nossa zona de acção termina no Cumbijã, via fluvial que é preciso manter a todo o custo pois é por ela que, uma vez por mês, nos chegam os reabastecimentos. É neste rio que fica o porto exterior de Bedanda. 

Este porto, onde já estivemos no outro dia quando da primeira saída do meu capitão, fica a
4 kms de Bedanda, em frente a Cobumba que já pertence à zona da acção da companhia de Cufar. Ponto muito forte dos guerrilheiros que dele precisam para garantirem a passagem e o reabastecimento dos seus acampamentos de Cabolol.

Cobumba é atravessada pela estrada que a cerca de 8 kms cruza com a que vem de Catió. Esta estrada segue depois para Cufar onde está mais uma companhia do nosso
batalhão. Seguindo para norte, até Empada, aí fica ainda mais outra companhia do batalhão. 

Na mata a sul de Cobumba ficam as tabancas de Cabolol e Cantumane, onde é muito difícil entrar. A norte de Cobumba fica Chugué, dominado pelos guerrilheiros, onde em tempos esteve destacado um pelotão da companhia. Uma noite, o pelotão foi atacado, arrasaram tudo e nunca mais lá conseguimos ir. Os sobreviventes do ataque retiraram para o quartel destroçados tanto física como moralmente. Aconteceu o mesmo em Salancaur onde no início existia uma secção destacada. Uma noite a secção foi atacada e só dois soldados conseguiram chegar à companhia. Dos outros elementos ainda nada se sabe, se terão sido mortos ou raptados. 

Resumindo, eu diria que estamos cercados de guerrilheiros por todos os lados e que sempre que saímos do quartel e nos afastamos mais de 4 kms, acabamos a tomar banho nas bolanhas ou nos rios e tiroteio também não nos deve faltar. Terminei a minha exposição. Espero ter sido explícito e desejo que tenha sido útil para o meu capitão poder ficar com uma ideia da área onde veio cair. Nenhuma das companhias mais próximas de Bedanda pode vir em nosso auxílio, em tempo útil se formos atacados. " (...)