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quinta-feira, 22 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26830: Álbum fotográfico do Fur Mil Cav Aníbal José da Silva - Pel Caç Nat 56 em São João

1. Mensagem do nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), com data de 18 de Maio de 2025:

Caro Carlos Vinhal
Hoje volto ao tema "Pelotão de Caçadores Nativos 56", que depois de terem estado afetos à minha Companhia (CCAV 2483), entre Março e Junho de 1969, no aquartelamento de Nova Sintra, foram continuar a sua missão no destacamento de S. João

O meu amigo José Manuel Rodrigues Cunha, ex-Fur Miliciano da rendição individual, esteve em Nova Sintra aquando da permanência da CART 2771, (Set70 a Set72, de os "Duros de Nova Sintra". No final da comissão dos DUROS, o Cunha foi destacado para S. João, para integrar o Pel Caç Nat 56, onde permaneceu até 1973. Creio ter sido contemporâneo do camarada José Câmara, colaborador deste Blogue.

O amigo Cunha, conhecedor da minha ligação àquele Pelotão, há uma década, teve a gentileza de me oferecer as fotografias que envio em anexo e que agora pretendo partilhar com o distinto Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.

Bom Domingo e um abraço
Aníbal Silva



S. João > 1973 > Fur Mil José Cunha


S. João > Pel Caç Nat 56


S. João > Pel Caç Nat 56


Pel Caç Nat 56 patrulhando a estrada S. João-Nova Sintra


Pel Caç Nat 56 patrulhando a estrada S. João-Nova Sintra


Pel Caç Nat 56 patrulhando a estrada S. João-Nova Sintra


Pel Caç Nat 56 na estrada S. João-Nova Sintra


Painel de aulejos no muro da Fonte de S. João, colocado em 1945


Ruina do Fontanário de S. João em 2014, sendo visível o painel de aulejos de 1945


Escola de S. João em 1972/73


(Fotos: © Fur Mil José Manuel Rodrigues Cunha)
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Nota do editor

Último post da série de 11 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26791: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte XXIV: Mais fotos de Mansabá, novembro de 1970

sexta-feira, 9 de maio de 2025

Guiné 71/74 - P26782: (De)Caras (231): O meu "mano" José Pedro Silva, sold, Pel Caç Nat 56 ... Ou a amizade não tem cor (Aníbal Silva, ex-fur mil SAM, vagomestre, CCAV 2483, Nova Sintra e Tite, 1969/70)



Guiné > Região de Quínara > Nova Sintra > CCAV 2483 e Pel Caç Nat 56 > c. 1º semestre de 1969 > Partida de futebol... (Os "manos Silva", Aníbal e Zé Pedro, são os dois militares da ponmta direita, na foto ao alto)



Sobrescrito da carta enviada ao José Aníbal Soares da Silva, fur mil, SPM 5698 (Nova Sintra)


Rementente da carta, José Pedro da Silva, soldado nº 27/0612, SPM 3978 (Bolama)



Carta do José Pedro Silva para o fur mil vagomestre Aníbal Silva:

Transcrição ("ipsis verbis):  

São João, 19 de janeiro de 1970

Inesquecível mano Aníbal:

Em primeiro de tudo desejo-lhe que esta minha
linhas lhe encontra com uma ótima saúde e 
felicidades.

Pois meu querido mano eu juntos
dos meus colegas e amigos do Pelotão, eu vou indo
menos graça a Deus o bom criador do Mundo.

Pois mano, por intermédio des-
tas minhas duas linhas, venho pedir grande fa-
vor de mandar-me oferecer 6 barries vazio, pa-
ra poder arranjar uma coisa, náo te esque-se por 
amor de Deus, por cabeça das suas famílias.

Pode entregar o nosso amigo Oliveira, ou Braz para
me guardar, até quando aparecer culuna para cá.

Mais nada por hoje obrigado,
Recebe abraço forte do seu irmão Zé Pedro.
Dê-me os meus cumprimentos para todos amigos de N. S.


Fotos (e legendas) Fotos (e legenda): © Aníbal Silva  (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Mensagem de Aníbal Silva, ex-fur mil SAM, vagomestre, CCAV 2483 (Nova Sintyra e Tite, 1969/70); técnico de seguros, reformad0, vive em Arcozelo, Vila Nova de Gaia:

Data - 08/05/2025, 22:34

Assunto -. A Amizade Não Tem Cor


Caro Luís Graça

No poste  P26664 do dia 8 de Abril (*), fiz referência à enorme empatia que havia entre os militares da minha Companhia (Ccav 2483) e o pessoal do Pelotão de Caçadores Nativos 56.

Foram só três meses de convívio diário, mas suficiente para criar grandes amizades. Em Junho de 1969 o Pel Caç Nat 56 deixou-nos, tendo sido destacados para S. João, distante de Nova Sintra, mais ou menos 18 km e frontal a Bolama. 

Uma das amizades que restou, foi comigo e com o soldado nativo, de seu nome José Pedro da Silva. Como eu era tratado por Silva, o Zé Pedro associou o seu nome ao meu e dizia que eu era seu mano, irmão e também primo. 

Ver em anexo a sua carta de 19 de janeiro de 1970, em que começa com um "Inesquecível Mano" e na qual me pede 6 barris de vinho, obviamente vazios, para fazer cadeiras de baloiço. 

Não me recordo, mas muito provavelmente satisfiz o seu pedido, até porque os amigos são para todas as ocasiões.

Em dezembro de 1970 estava eu em Bissau na Comissão Liquidatária e numa deslocação ao Serviço de Saúde, instalado no Hospital Militar, onde fui resolver um auto relacionado com a enfermagem, ao passar por uma das enfermarias, ouvi chamar aos berros e repetidamente " Ó primo Silva".

Pareceu-me ser a voz do Zé Pedro, aproximei-me e era de facto. Estava internado para ser operado, extração de vários estilhaços que tinha nas costas. Seguiu-se um abraço emocionado. 

Na foto o Zé Pedro é o nativo à direita, junto a mim.

Um abraço de amizade

Aníbal Silva

(Revisão / fixação de texto: LG)

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Notas do editor LG:


(*) Vd. poste de 8 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26664: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (6): Pelotão de Caçadores Nativos 56 - Primeira vez debaixo de fogo e Emboscada virtual

(**) Último poste da série > 8 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26663: (De) caras (230): Dois manos ribatejanos que passaram por Mansabá, o Ernestino e o Nelson Caniço, um alferes e outro furriel, ambos de cavalaria, e hoje médicos

terça-feira, 8 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26664: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (6): Pelotão de Caçadores Nativos 56 - Primeira vez debaixo de fogo e Emboscada virtual

CCAV 2483 / BCAV 2867 - CAVALEIROS DE NOVA SINTRA
GUINÉ, 1969/70


VIVÊNCIAS EM NOVA SINTRA

POR ANÍBAL JOSÉ DA SILVA


14 - PELOTÃO CAÇADORES NATIVOS 56

Quando chegamos a Nova Sintra não houve sobreposição com a companhia que lá estava, a CART 1743. Nós chegamos e eles partiram. Ficou o Pelotão de Caçadores Nativos n.º 56, constituído por quinze a vinte elementos. Foram eles que nos ensinaram a andar no mato, a conhecer trilhos e picadas e a indicar locais perigosos. Era malta fixe, de etnias diversas, com muitos anos de guerra.
Em reconhecimento da lealdade, o capitão Bernardo um dia chamou-me e lançou o repto de passarmos a dar-lhes alimentação gratuita. Disse-lhe que só fazendo uma experiência durante uma semana. Até essa altura adquiriam os géneros de que precisavam pagando-os.
Feita a experiência e as contas, verificamos que era possível e assim foi feito. A empatia entre nós subiu. O porta-voz deles era o Ansumame que tinha alguma formação escolar, veio ter comigo pedindo que eu fosse o fiel depositário do dinheiro de todos eles. Na secretaria havia um cofre pequeno que não estava a ser utilizado. Com a devida autorização superior passei a usá-lo. Criei envelopes individuais onde colocava o dinheiro e uma folha de conta corrente onde registava as entradas e saídas. Passei a ser banqueiro.
Aproximava-se a data prevista para nos deixarem e ir para outras paragens. Na véspera da partida, à noite, o Ansumame veio convidar-me para ir ao abrigo deles para a despedida. Quando lá cheguei, aqueles que não bebiam álcool, os muçulmanos, estavam sóbrios mas as outros nem por isso. Tive de os acompanhar ao beber um wisky e um copo de Drambuie.
No dia seguinte lá foram eles.



15 - PRIMEIRA VEZ DEBAIXO DE FOGO

O nosso batismo de fogo foi na noite de 22 de Março de 1969. Pela primeira vez ouvimos o matraquear da famosa costureirinha, espingarda automática com carregador redondo, bem como as granadas de morteiro e canhão sem recuo, que assobiavam ao sobrevoar o quartel e a rebentar para os lados da bolanha. Eles deviam estar, talvez a 1,5 klm de distância, mas na nossa ideia estariam a entrar pelo arame farpado. Dentro dos abrigos, através das friestas disparávamos a torto e a direito, o cheiro a pólvora e o fumo eram enormes. Passados alguns minutos começamos a ouvir o nosso capitão, percorrendo os vários abrigos, a berrar ordenando o cessar fogo. Provavelmente nessa noite ninguém dormiu receando nova investida.
Recordo que nesta data, dois conterrâneos faziam anos, a D. Maria Lucas e o Tonecas, tendo horas antes escrito ao amigo desejando um bom aniversário.
Nos vinte meses de permanência em Nova Sintra, fomos flagelados por dezoito vezes.
Abrigo do morteiro 81
A metralhadora Breda do 2.º pelotão
Cunhetes de munições do PAIGC


16 - EMBOSCADA VIRTUAL

No regresso de uma coluna a S. João a dado momento ouviu-se uma rajada. De imediato o pessoal saltou das viaturas e deitados na berma da picada, tomamos posição para ripostar.
Mais um fogachal dos diabos. Eu estava deitado ao lado do Bicho e os invólucros que saíam da sua G3 batiam na minha cara e sentia o quente do metal. Passados poucos minutos o alferes que comandava a coluna, apercebendo-se que o fogo era só nosso, mandou cessar fogo. Afinal o que se tinha passado? Só no quartel viemos a saber. O Xabregas afirmou que a tal rajada partiu da sua arma. Em cima da viatura com a arma destravada e com o dedo no gatilho, levou com um ramo de uma árvore na cara, provocando-lhe desequilibrio e o apertar do gatilho. Felizmente que a rajada foi na direção da mata, se fosse para o interior da viatura poderia ter atingido alguém.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 1 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26636: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (5): Jogos de futebol e voleibol - Natal e Fim de Ano de 1969 e Hotel Miramar e Pensão Xantra

quarta-feira, 29 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25575: (De) Caras (208): António Baldé, ex-1º cabo , CIM Bolama (1966/69), Pel Caç Nat 56 (São João, 1969/70), e CART 11 (Paunca, 1970/71): "Eu tinha um sonho: ser apicultor no Cantanhez"...





















Guiné- Bissau > s/l > 2024 > O senhor apicultor e formador em apicultura, António Ussumane Baldé, membro da Tabanca Grande, desde 2013...


Fotos: © António Baldé (2024). Todos Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. De há muito que o António Baldé, nosso grão-tabanqueiro, tinha um sonho, ser apicultor.... Acaba de o realizar. (Ao fim de, pelo menos, vinte e tal anos, ou trinta. ) Fiquei muito feliz em sabê-lo. E prometi-lhe que publicava a notícia no blogue. Ele de vez em quando telefona-nos de Bissau, à Alice e a mim. Mandou-me mais de 70 fotos, pelo Whatsapp. Sem legendas.  Selecionei umas tantas. 

O Baldé, como lhe chama a Alice, foi 1º cabo art, CIM Bolama (1966/69), Pel Caç Nat 56 (São João, 1969/70) e  CART 11 (Paunca, 1970/71). 

Recapitulemos a sua história de vida, tal como eu a contei quando foi apresentado à Tabanca Grande em 25 de março de 2013 (*):

(i) António Ussumane Baldé nasceu em  Contuboel, em 1944;

(ii) foi educado, até aos 12 anos, pelo chefe de posto adinistrativo local, o português José Pereira da Silva, ainda vivo em 2013 (morava em Oeiras);

(iii) fez a 4ª classe e isso abriu-lhe outras portas que outros miúdos da sua tabanca não puderam franquear;

(iv) lembrava-se bem da serração do Albano, que ainda existia no meu tempo (junho/julho de 1969, quando Contuboel foi Centro de Instrução Militar, donde saíram, de entre outras, as futuras CART 11 e a CCAÇ 12);

(v) em 1966, foi chamado para a tropa: fez a recruta e a especialidade no CIM de Bolama ficou lá dois anos; promovido a 1º cabo, de artilharia, foi instrutor; lá se formaram diversos Pel Caç Nat;

(vi) em 1969 é transferido para o Pel Caç Nat 56, sediado em S. João, frente a Bolama;

(vii) em 1969 casou-se: será o primeiro de quatro casamentos; teve ou tem 15 filhos, o último dos quais a Alicinha do Cantanhez, filha da nalu Cadi Indjai (1985-2013) (por sua vez, filha de um antigo "combatente da liberdade da Pátria", que perdeu uma perna, na zona do Xitole, ao pisar uma mina dos "tugas", tendo estado na Alemanha de Leste, em reabilitação);

(viii) desse tempo, e do tempo do Pel Caç Nat 56, lembra-se com saudade dos furriéis Gil e Nuno, que gostaria de voltar a encontrar; não faz ideia do seu paradeiro; em São João esteve em 1969/70; 

(ix) será depois transferido para a CART 11, que estava em Paunca: esteve por lá em 1970/71: o comandante do seu pelotão era o alf mil Matos, que é de Ovar, e com quem ainda hoje convive e fala ao telefone: já foi a um (ou mais) dos convívios da companhia: esteve no destacamento de Sinchã Queuto [que eu só localizo a norte de Bafatá, e a sul de Contuboel, no mapa de Bafatá];

(x) saiu da tropa em finais de 1970 ou princípios de 1971; a mulher tinha ficado em Bolama;

(xi)  assistiu depois à independência; não tem boas memórias de Bambadinca desse tempo (teve de assistir a julgamentos populares selvagens e a execuções sumárias, bárbaras, pelo menos de um polícia administrativo e de um régulo, considerados "inimigos públicos nº 1 do PAIGC"); mas não teve, felizmente para ele,  quaisquer problemas com os novos senhores da Guiné-Bissau...

Ainda antes da independência tinha começado a trabalhar nos serviços agrícolas da província. Fez formação em floricultura, se não me engano. Foi ele e outros estagiários quem fez o jardim do Bairro da Ajuda, em Bissau, no tempo do administrador Guerra Ribeiro. 

Depois da independência começou a trabalhar com o engº agr Carlos Scwharz, no DEPA, na região de Tombali. Tem uma grande admiração pelo Pepito e pelo trabalho dele em prol do desenvolvimento da sua terra. (É cofundador, se não erro, e cooperante da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede no bairro do Quelelé, de que o Pepito  foi diretor executivo atà data da sua morte, em 2014).

No princípio deste século, veio a Portugal fazer um curso de apicultura, que era então (e continua a ser hoje)  a sua grande paixão. Acabou por ficar. Para sobreviver, trabalhou como segurança numa empresa de construção, no concelho de Cascais. Entretanto, obteve a nacionalidade portuguesa. Tinha, em 2013, um filho, de 13 anos, o Umaro Baldé, que vivia com ele e que estava a frequentar o 7º ano de escolaridade obrigatória, em Alfragide, e queria ser  informático (está neste momento em Inglaterra).

Em 2013, quando entrou para a Tabanca Grande estava desempregado. O seu sonho era voltar a Caboxanque onde tem casa, junto ao rio Cumbijã,  e desenvolver o seu projeto de apicultura no Cantanhez. Mas tinha dois filhos pequenos para criar (o Umaru e a Alicinha do Catanhez, que ele e a Alice quiseram trazer para Portugal). 

Muçulmano, ia todas as sextas feiras à mesquita central de Lisboa. Era um bom crente. Era uma homem afável, conhecia meio mundo, e pediu-me para ingressar na Tabanca Grande. Estava interessado sobretudo em partilhar os seus conhecimentos e a sua paixão como apicultor.

Conhecia-o nessa altura, em 2013.  Era o pai, biológico, da Alicinha do Cantanhez, filha da Cadi, a sua quarta mulher.  Ele vivia na zona de Cascais, onde era segurança. A empresa fechou, o Baldé ficou no desemprego. Um advogado, seu amigo, arranjou-lhe casa em Alfragide. Éramos,  pois, vizinhos de 'tabanca'.  Só conhecia a filha de fotografias e vídeos (que o Pepito mandava para a Alice) . Mas era um pai babado. Vivia em Portugal há já cerca de 10 anos. Éramos nós que lhe  dávamos notícias da mãe e da filha. Tinha casa em Caboxanque na margem esquerda do Rio Cumbijã.  Queria que lá fossemos um dia passar férias. Queria votar à sua terra com o diploma de apicultor (**).

A Alicinha e a mãe, nalu,
Cadi Indjai (1985-2013)

Infelizmente, tudo lhe correu mal. Estava a tentar aguentar-se cá 15 anos, fazendo descontos para a Segurança Social e contando com o tempo da tropa.  Nem o tempo de tropa lhe foi descontado nem a Segurança Social lhe garantiu uma pensão de reforma. Por outro lado, a Cadi morreu (em 2013)  e a filhota, a Alicinha do Cantanhez, não conseguiu chegar a Portugal nem perfazer os 5 anos (morreu em 2014). Vi-o chorar convulsivamente quando soubemos e lhe transmitimos a notícia, devastadora para todos. Adorávamos a Cadi e a Alicinha. E o Baldé passou também a fazer parte da família...  

Voltou para Bissau, com os sonhos desfeitos e sem o diploma de apicultor. Sem um tostão, sem a pequena reforma que seria fundamental para a concretização dos seus sonhos e poder alimentar uma família numerosa. 

Os primeiros anos forma difíceis. Em meados de 2019, passava-se fome em Bissau. Telefonou-nos um dia a dizer que estava em Caboxanque a passar mal.  São situações que nos destroçam o coração...  E depois veio a maldita pandemia de Covid-19. De tempos a tempos ia dando notícias. Tem cá uma filha e netos, em Massamá ou no Cacém.

 Finalmente há dias soubemos, por ele,  que as coisas estavam a correr melhor, em Bissau e em Caboxanque, e que para o ano ele ia a fazer a sua primeira grande colheita de mel. Tanto quando dá para perceber pelas fotos que nos enviou, sem legendas, tem o seu negócio, independente... Aos 80 anos (!), continua a perseguir o seu sonho de há muito!..."Com a ajuda do Criador", diz ele, humildemente, ao telefone. Faz formação (e ele próprio elabora os seus materiais pedagógicos) e monta colmeias. Tem já bastantes no Cantanhez.  Não sei se tem algum apoio de alguma OND. Enfim, uma história feliz, desta vez, mesmo que ainda não se possa dizer que terá um final feliz. Mas Oxalá, Enxalé, Insha'Allah!.... Parabéns, Baldé, tu mereces tudo de bom.  (***)

(**) Vd. poste de 7 de janeiro de  2014 > Guiné 63/74 - P12554: Ser solidário (157): O nosso camarada, luso-guineense, natural de Contuboel, desempregado, a residir em Alfragide, António U. Baldé, pai da Alicinha do Cantanhez, tem um sonho: ser apicultor em Caboxanque...
 
(***) Último poste da série > 4 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25478: (De) Caras (207): Homenagem póstuma da sua terra natal, Mealhada, ao ex-1.º Cabo At Inf do Pel Caç Nat 58, José da Cruz Mamede (1949-1970), morto na emboscada de Infandre, em 12/10/1970

terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24085: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (37): Sentimentos que a farda militar encobre


1. Em mensagem de 18 de Fevereiro de 2023, o nosso camarada José Câmara, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56 (Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73), enviou-nos mais uma das suas Histórias e Memórias, desta vez relacionada com as trágicas e traiçoeiras minas.


MEMÓRIAS E HISTÓRIAS MINHAS

37 - Sentimentos que a farda militar encobre

Nos últimos tempos, por razões que para aqui não interessam, tenho estado afastado da escrita, mas continuo atento. O tema “minas” tem-me chamado a atenção não só pelo desaparecimento prematuro de vidas e, como não podia deixar de ser, pela destruição da qualidade de outras, que se prolongaram nos tempos.

A CCaç 3327/BII17, companhia que integrei até ser transferido para o Pel Caç Nat 56, também teve o seu malfadado encontro com aqueles engenhos na zona de Bissássema. Vou deixar que a História da Unidade fale por si na descrição dos acontecimentos e, mais importante que tudo, integrar os sentimentos que então assolaram o Fur Mil Luís José Vargem Pinto, comandante da 3.ª Seccão, do 4.° GComb, do qual eu também fiz parte. Acrescento aqui que na altura deste acontecimento eu já tinha sido transferido para o Pel Caç Nat 56.

Na História da Unidade (CCaç 3327/BII17) – CAP II, FASC XI – PAG 25 é possível ler-se uma descrição bem elucidativa do que aconteceu naquele dia 16FEV72. Os elementos feridos não faziam parte da CCaç 3327. A sua presença no local deveu-se à proteção que fizeram ao comandante do Batalhão de Tite que entendeu deslocar-se ao local do rebentamento e, segundo testemunhos de militares da 3327, por pouco não pisou uma das minas.

Este foi o estado em que ficou o pontão destruído pelo PAIGC. Sem dúvida que foi uma grande carga explosiva. Foi à volta destes escombros que foram implantadas as minas que o Furriel Pinto levantou.

Em 2011, aquando do convívio da CCaç 3327, realizado no BII17, na ilha Terceira, o Fur Mil Pinto presenteou-me com uma pequena descrição daquilo que tinha sido a sua acção no levantamento das minas e os sentimentos que então o assolaram para tomar tal decisão. Importa realçar que toda a sua acção envolve à volta dos mais altos princípios humanos e desprezo total por aquilo que lhe pudesse acontecer.

Pela pena do FurrielMil Pinto:
“...Quando levantei as minas não foi pensando no dinheiro, nem sequer sabia que pagavam 1000 escudos cada mina levantada. Em primeiro lugar pensei que não podia deixá-las no terreno, porque alguma noite podia ser necessário passar por lá e pisar alguma, aí, adeus ó perna.
Em segundo lugar pensei na população, se ficassem no trilho quando alguém por lá passasse iam acioná-las e aí seria o rebentamento com perdas irreparáveis.
Rebentá-las no sítio não era possível, o inimigo sabia à distância a nossa posição.
Portanto decidi levantá-las e levá-las para o quartel.
Quero agradecer ao nosso comandante a confiança que depositou em mim como graduado e aos homens por mim comandados para uma missão tão difícil.”

Convívio no BII17, Angra do Heroísmo, Terceira, Açores, ano de 2011. Eu (à esquerda) com o Fur Mil Pinto.

Um abraço transatlântico
José Câmara

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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22056: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (36): Um levantamento de rancho servido com uma bofetada