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segunda-feira, 11 de julho de 2022

Guiné 61/74 - P23422: Frase do dia (1): Faz hoje 55 anos que entrei para a tropa, em Santarém. Tinha 22 anos feitos, regressei com quase 26... (Valdemar Queiroz, ex-fur mil at art, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)




Espinho > Silvade > Fevereiro de 1969 > Jantar de despedida antes da partida, a 18, para o TO da Guiné... Um grupo de sargentos e furriéis milicianos da CART 2479, futura CART 11, "Os Lacraus" (1969/70).

À esquerda, sentados: Canatário (armas pesadas), e Cândido Cunha; em pé Silva (transm.), Abílio Duarte e Pinto, atrás Macias e Pechincha (operações especiais); ao alto,  Sousa, ao centro 1º. Sarg Ferreira Jr. (já falecido), Renato Monteiro (1946-2021), Ferreira (vagomestre), Edmond (enfermeiro), Pais de Sousa (mecânico) e eu, sentado, à direita, Valdemar Queiroz (armado em finório) (nasceu em 30/3/1945; está assinalado com cercadura a amarelo). (*)

Para completar a classe de sargentos da CART 2479 (futura CART 11),  falta o 2º. sarg Almeida (o velho Lacrau) (já falecido), o fur mil Vera Cruz e o fur mil Aurélio Duarte  (também já falecido).

Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz 2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Fez ontem 55 anos que entrei para a tropa. Eu e o Cândido Cunha entrámos da parte da tarde no Destacamento da EPC em Santarém.

Tinha 22 anos feitos e regressei da tropa com quase 26 anos. Por acaso já tinha emprego certo, as empresas eram obrigadas a manter no Quadro de Pessoal os trabalhadores a prestar serviço militar.

Mas, quantos milhares de jovens ficaram a "patinar" no início da sua vida profissional por terem de ir para a tropa e depois para a guerra?

País do caraças, que obrigava os jovens a ir para a tropa e para a guerra em vez de os utilizar no desenvolvimento do País.




Valdemar Queiroz [ex-fur mil at art, CART 2479 /CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)


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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 19 de dezembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22821: Fotos à procura de... uma legenda (158): Tão meninos que nós éramos!... (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)

domingo, 31 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22675: Reavivando memórias do BENG 447 (João Rodrigues Lobo, ex-Alf Mil, cmdt do Pelotão de Transportes Especiais, Brá, 1968/71) - Parte VIII: O meu percurso militar (II): Depois da RMA, o CTIG: ao todo, 3 anos e 4 meses ao serviço da tropa


Doc 7 > Região Militar de Angola > Batalhão de Intendência de Angola >Quartel em Grafanil > Batalhão de Intendência > Companhia de Intendência > 11 de fevereiro de 1971 > #O documento mais valioso": a declaração da passagem à disponibilidade (ou à "peluda")



Doc 6 > Região Militar de Angola > Quartel General > Companhia de Comando e Serviços > Quartel em Luanda > 12 de agosto de 1968 > Recibo da Arrecadação do Material de Guerra, comprovativo da entrega pelo alf mil João Rodrigues Lobos de uma  G3, cimco carregadores, duas cartucheiras, um cinturão e... 100 cartuchos  7,62 mm m/962... 


Doc 8> Ministério do Exército > Direcção do Serviçpo de Pessoal > Repartição dos Oficiais > 2ª Secção > Lisboa, 28 de janeiro de 1978 > Declaração para efeitos de contagem do tempo de serviço.


Fotos (e legendas): © João Rodrigues Lobo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Segunda (e última) parte da mensagem de João Rodrigues Lobo [ex-alf mil, cmdt Pelotão de Transportes Especiais / BENG 447 (Bissau, Brá, dez1967/fev1971): fez o 1º COM, em Angola, na EAMA, Nova Lisboa; vive em Torres Vedras onde trabalhou durante mais de 3 décadas como chefe dos serviços de aprovisionamento do respetivo hospital distrital; membro nº 841 da Tabanca Grande.]


Data - sexta, 29/10, 10:11 (há 1 dia)



Assunto - O meu percurso militar


(Continuação)

Quando me mobilizaram para a Guiné fui para o Depósito  de Adidos, em Luanda, onde esperei por um transporte para a Guiné, que nunca mais me arranjavam, ( dizendo até que provavelments tinha de ir primeiro para a Metrópole e dali para a Guiné) sendo que o tempo passava e a Comissão não começava. 

Consegui pessoalmente junto da Força Aérea que me arranjassem transporte num avião militar que vinha para Lisboa com escala em Cabo Verde. Chegado a Cabo Verde esperei por outro avião militar, de carga, que me levou até Bissalanca. Ali chegado, sem nunca antes ter sabido qual a Unidade em que estaria colocado, apanhei boleia num jipe que por acaso tinha ido levar alguém a Bissalanca e que por camaradagem, (não estando autorizado e não constar do boletim da viatura) me levou ao Quartel General em Bissau. Ali chegado, e com as malas á porta, lá entrei e só aí soube que estava colocado no BENG 447. Por gentileza lá me mandaram levar a Brá.

Conhecendo eu bem Angola, e, só havendo 5 Aspirantes Milicianos da Especialidade formados no 1º COM em Angola, sendo este número manifestamente insuficiente para as colunas de MVL, e estando eu no Quartel General a prestar o que julgo bom serviço, porque cargas de água fui mobilizado para a Guiné? 

A explicação dada na época foi “intercâmbio entre Provincias” sem direito a mais perguntas!  Seria só isso ? Por vezes especulo sobre várias hipóteses, mas sem conclusões. Talvez fale delas noutra altura pois são só especulações.

E, quando acabei a comissão na Guiné, para voltar para Luanda, onde fui mobilizado, queriam que viesse de navio fretado para Lisboa (quando houvesse) e de Lisboa para Luanda (quando houvesse). 

Lá se foi o resto do que tinha poupado e paguei as 2 viagens aéreas de Bissalanca para Lisboa e de Lisboa para Luanda, na TAP totalmente do meu bolso! Em 1968 e 1969 também tinha pago as 8 viagens aérias na TAP nos dois meses de férias que tive, para as passar em Luanda onde residia a minha namorada.

Quando em 1977 fiz concurso público para Chefe dos Serviços de Aprovisionamento do Hospital Distrital de Torres Vedras, precisava de documento onde constasse o Serviço Militar cumprido. 

Não sabendo onde o podia obter, fui ao Ministério do Exército, no Terreiro do Paço, em Lisboa, onde estava “estacionado” o meu processo, por não ter a data da passagem á disponibilidade!!! 

Por sorte, (mais uma vez) tinha guardado o papelinho da “peluda”, que apresentei, e lá me passaram uma declaração simples (, com um erro na data do inicio da Comissão no qual só mais tarde reparámos, ) mas que serviu o objectivo. 

Em 1978 recebi um oficio onde, na disponibilidade, tinha sido colocado no Regimento de Engenharia nº 1 em Lisboa. E em 1983 recebi outro oficio,  dizendo que o meu processo estava no DRM  de Santarém. 

Em 2007 aquando da passagem á reforma, para obter a contagem do tempo, fui a Santarém e já não estava lá nada. Fui então ao Arquivo Geral do Exército, em Lisboa onde estava o meu processo, obtive a contagem do tempo e lá me deram 5 anos e 337 dias para a reforma ( tiraram alguns mesitos, talvez a recruta ou as férias). 

Esta “história” terá interesse?  Para mim tem,  dadas as bolandas em que andei, e, o tempo que perdi (ou ganhei) no Exécito Português.

Por onde passei tive e assisti a vários “episódios” alguns idênticos aos que outros camaradas descrevem , outros talvez um pouco diferentes. Tenho algumas situações,vividas pelos locais por onde estive, na memória, e tento recordar-me de outras para talvez as passar ao papel e vos enviar para o blog.

Resumindo, acabei por ter tanta sorte que passei quase ao lado da Guerra, estando bem perto da dureza e sofrimento que tantos camaradas, nas mesmas datas, passaram.

Até tive a sorte de , quase imberbe, deixar crescer o bigode, desde que aterrei na Guiné, bigode esse que foi crescendo sem nunca mo mandarem rapar, apesar de algumas bocas “superiores” e de alguns PM . O bigode, que aí começou, só o raparei quando a sorte que me acompanhou em Angola e na Guiné,  me fizer ganhar o Euromilhões!

Anexo vários “papéis” que guardei como recordação, em complemento do que já foi publicado no poste anterior (*)

Doc 6 – Documento de MVL – 1968

Doc 7 – O Documento mais valioso: a passagem à disponibilidade, em  1971

Doc 8 – A descoberta do meu processo – 1977 (1978)

Até breve.

João Rodrigues Lobo
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 30 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22671: Reavivando memórias do BENG 447 (João Rodrigues Lobo, ex-Alf Mil, cmdt do Pelotão de Transportes Especiais, Brá, 1968/71) - Parte VII: O meu percurso militar (I): Região Militar de Angola: EAMA, CICA, Companhia de Transportes nº 2560, QG-4ª Rep, Depósito de Adidos (1967/68)

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Guiné 61/74 - P17592: Efemérides (260): O dia em que entrei para a tropa... Foi há 50 anos, em 10/7/1967, na EPC, Santarém (Valdemar Queiroz, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]



Samtarérm > Escola Prática de Cavalaria > Abril 1971. Junto à entrada da EPC,  o Augusto Silva Santos, ladeado pelos camaradas Lúcio e Miguel Ângelo.

Foto (e legenda): © Augusto Silva Santos (2014). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




O DIA EM QUE ENTREI PRÁ TROPA


[, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]



Quem, de nós, não se lembra do dia em que entrou prá tropa?

Eu lembro-me. Faz agora 50 anos.

Foi no dia 10 de Julho de 1967, na Escola Prática de Cavalaria, em Santarém, para o CSM [, Curso de Sargentos Milicanos]. Já tinha 22 anos e, até hoje, não sei a razão por ter sido chamado tão tarde.

Tinha estado, uns dias antes, na Portugália, em Lisboa, a jantar ou, melhor, a comer o bife ‘à Portugália’ com um amigo que ia para Santarém horas depois ou, talvez fosse a um sábado, não me lembro bem. Contou-me que estava na EPC. no Curso de Sargentos Milicianos.
− Eu, também, vou pra lá no dia 10 −  digo-lhe eu. 
− Estás lixado, tens que ser engraxador, polidor de metais e soldadinho de chumbo como o ‘Mouzinho’ e explicou-me o que devia levar e o que lá devia fazer, senão, depois, não ‘vens a fim de semana’, disse ele.

Cheguei a Santarém.  Fui o primeiro a entrar ao Quartel ‘Destacamento’ da EPC., cá em baixo na cidade, na parte da tarde. Levava escovas e latas de graxa prás botas e solarine prós amarelos, na bagagem. 

O Cândido Cunha, que eu não conhecia e que havia de me acompanhar na recruta, na especialidade e até ao fim da tropa, incluindo na mesma CArt. na Guiné [, a CART 2479 / CART 11], também fazia parte deste grupo de recrutas. Fomos encaminhados prós testes psicotécnicos dos dominós e outros pra saberem as nossas capacidades. 

Depois fomos receber o fardamento. Deram-nos o fardamento adequado com a particularidade de nos ser fornecido umas fitas vermelhas/verdes largas e compridas para serem cosidas na boina, assim como um cartão para ser colocado na parte interior/superior da boina para suporte das Espadas de Cavalaria e, também, uns elásticos para segurar/enrolar o final das calças entre as fivelas das botas pra ficarem a ‘golf à Mouzinho’. 

Depois, no final da tarde, já com tudo organizado e equipado viemos prá parada e eis que surge a primeira tropa a sério: 
− Quem dos presentes percebe de laranjas? − foi perguntado. 
− Nós!− , responderam alguns,  e lá foram estes descascar batatas no refeitório pró jantar. 

Espectacular!!!... Até dá gosto ter estado na tropa. Com as botas bem engraxadas e com os ilhós dos atacadores e das duplas fivelas dos plainitos brilhantes/reluzentes como as Espadas da Cavalaria da boina começamos a sair prá cidade e a visitar a família aos fim de semana.

Quem me dera ter agora vinte e dois anos.

Valdemar Queiroz

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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17498: Efemérides (259): Dia do Combatente Limiano - 6.ª Homenagem do Concelho de Ponte de Lima aos seus 79 Heróis Militares caídos em combate pela Pátria, 27 na I Grande Guerra e 52 durante a Guerra do Ultramar (António Mário Leitão, ex-Fur Mil na Farmácia Militar de Luanda)

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16565: Inquérito 'on line' (72): Todos iguais mas uns mais iguais do que outros?... Resultado final (n=94 respostas): os ricos, os poderosos e... os famosos andaram comigo na escola (38%), na tropa (26%) e na guerra (17%)



Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (1969/71) > "Tugas" e "nharros", filhos de um deus menor... A CCAÇ 2590/CCAÇ 12 era constituida por cerca de 60 graduados e especialistas metropolitanos e 100 praças do recrutamento local.... Foi uma das companhia da "nova força africana" criada por Spínola. Nenhum de nós era filho de gente rica, poderosa ou famosa...

A foto fixou a progressão de forças da CCAÇ 12,  em   bolanha abandonada ou lala, no decurso de uma operação, na época das chuvas, no subsector do Xime, de Mansambo ou do Xitole (já não posso precisar)... O sector L1 equivalia em grande parte ao setor 2 do PAIGC, comandado na época por Mamadu Indjai (gravemente ferido em 18/8/1969 e depois substituído por Bobo Keita). Não demos tréguas uns aos outros nesta época... Todo o chão fula estava militarizado...

Foto: em primeiro plano, à esquerda, vê-se o fur mil at nf Arlindo T. Roda, o alf mil at inf op esp Francisco Magalhães Moreira (comandante do 1º Gr Comb e segundo comandante da companhia) e a seu lado, provavelmente sold 82105369 Mamadu Silá (Ap LGFog 3,7), fula, da 2ª secção (habitualmente comandada pelo fur mil at inf Joaquim João dos Santos Pina, natural de Silves)...Em quinto lugar, parece-me ser o comandante do 3º Gr Comb ( alf mil Abel Maria Rodrigues, transmontano, de Miranda do Douro) ou se o saudoso ex- 1º cabo José Marques Alves, de alcunha "Alfredo" (1947-2013), e que pertencia ao 2º Gr Comb. (Natural de Campanhã, Porto, vivia em Fânzeres, Gondomar,  à data da sua morte.)
Foto: © Arlindo Teixeira Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: L.G.]


1. INQUÉRITO DE OPINIÃO:

"OS FILHOS DOS RICOS E PODEROSOS DE ENTÃO ANDARAM COMIGO"...

Resultados definitivos, com base em  94 respostas (resposta múltipla):


1. Não, não andaram comigo na escola >  36 (38%)

2. Não, não andaram comigo na tropa >  44 (46%)

3. Não, não andaram comigo na guerra >  50 (53%)

4. Sim, andaram comigo na escola >  36 (38%)

5. Sim, andaram comigo na tropa >  25 (26%)

6. Sim, andaram comigo na guerra >  16 (17%)

7. Não sei / não me lembro > 9 (9%)

2. O inquérito 'on line' decorreu entre 28 de setembro e 5 de outubro e não chegou às 100 respostas.  Aqui vão alguns dos primeiros comentários que esta questão suscitou, entre os nossos leitores, camaradas, tanto no blogue como na nossa página do Facebook:


Domingos Robalo: 

(...) O sobrinho do ministro Sá Viana Rebelo e o filho do deputado à Assembleia Nacional falecido no acidente de helicóptero em Mansoa foram meus camaradas na Artilharia (BAC1 / GAC7). O primeiro comandava um pelotão de artilharia, creio que em Canquelifá e o segundo estava em Catió.  Outros "ricaços" e filhos de industriais por lá andavam em pelotões no TO. Obviamente que a maioria eram de origem mais modesta mas nem por isso menos considerados ou desrespeitados. Era assim na Artilharia. 


Rui Castanha: 

(...) Não faço a minima ideia de quem eram, no inicio, os meus camaradas de guerra ou melhor de tropa. Fomos todos iguais e cada um ocupou o seu lugar com as suas responsabilidades. A questão que se deveria ter colocado é se cumpriram ou não o seu papel. (..:)


Mário Vasconcelos:

(...) Durante o serviço militar nunca me preocupou saber a origem daqueles que correspondiam ao esforço praticado. Os laços que nos irmanavam eram de tal modo fortes, que esse aspecto, para mim, era irrelevante. Suponho ser mais admissível dizer que, durante o ensino superior, alguns fossem dessa proveniência. E, portanto, muitos deles devem ter representado a nação em esforço de guerra. Verdadeiramente, não sei quantificar. (...)


António Rosinha:

(...) Nas grandes aldeias portuguesas, de onde saiam a maioria dos tropas para a guerra, os mais ricos eram o merceeiro, o alfaiate, o cabo da GNR, o mestre escola, e o presidente da junta, porque tinha mais alqueires de terra do que os pobres. Se por acaso algum dos filhos destes ricos quisesse fugir à tropa, estudava, estudava até se formar, e se chumbasse, ia para a Suiça continuar os estudos, e até podia levar uma viola e vir a ser cantautor. No caso dos pobres, quem quisesse fugir à tropa, ia de pedreiro para a França, sem viola... Mas não se diz que o país era de "meia dúzia deles"?  (...) Os filhos de donos de pontas da Guiné, e roças em Angola e machambas de Moçambique, alguns também (não muitos, penso eu) foram estudar ou para a Suíça, ou Inglaterra ou França. No fim apareceram com uma cara "afivelada" de anti-colonialistas, anti-portugueses, mas disfarçavam mal. (...)


Carlos Vinhal:

(...) Na minha Companhia, apareceu em determinada altura um alferes miliciano para substituir o Alferes Couto, vítima mortal de uma mina. Mal chegado, afirmou para quem o quis ouvir, que o seu tempo em Mansabá seria muito curto pois estava à espera que alguém, muito próximo, chegasse a Bissau para manobrar os cordelinhos e o tirar dali. Assim se cumpriu, e assim chegou a Mansabá o Francisco Baptista em sua substituição. (...)


Francisco Baptista:

(...) Pois meu amigo Carlos Vinhal o Francisco Baptista foi das maiores vítimas do compadrio na Guiné. Quando fui substituir esse tal mariola, de boas famílias, sei que tinha um apelido Meneres eu já tinha 17 meses de mato, em Buba. Não protestei pelo destino que me reservaram porque achei que o meu estado psíquico não me iria permitir uma boa adaptação à guerra dos papeis e dos soldadinhos de chumbo dos nossos coroneis e dos seus protegidos. (...)


José Martins:

(...) Sim, andaram por perto, mas em determinada altura afastaram-se. No Jardim Escola, andaram bastantes, que depois foram-se dividindo pelas duas escolas da cidade e das localidades vizinhas.
Na altura do secundário houve nova cisão: os ditos ricos, abastados e agricultoras para o liceu; os remediados para a escola técnica. Na tropa estiveram dois comigo, quer na recruta quer na especialidade de teleimpressor. Eu segui para o CSM. Deles em foi para o QG do Porto, enquanto o outro ficou no regimento, impedido às pocilgas. Quanto pagou ao sargento da pecuária? Não sei, mas deve ter sido bastante. (...)


Hélder Sousa:

(...) Tenho ideia de se falar nisso lá na terra, em que alguns integrantes dos terratenentes se chegaram à frente para defender a integridade da Pátria mas alguns outros houve que foram escapando à mobilização e muito sinceramente já não sei 'fulanizar' esses casos (...)


C. Martins:

Filho de ministro na recruta... não era nada pretensioso... bom camarada e com grande espírito de humor... Num sábado foi o único da sua companhia que não foi de fim de semana, julgo que devido a castigo. Ao apresentar a companhia que era só constituída por ele...meu capitão (oficial dia) companhia pronta...o capitão olha-o de soslaio e diz.. .mande dispersar essa merda... este obedece prontamente...faz meia volta volver.. e dirigindo-se para a parada vazia...berra a plenos pulmões...AAATEEENÇÃO MEERRRDA DISPERSAR...o capitão fez um sorriso amarelo por baixo do seu bigode.

Meu capitão,  tenho uma lagarta na sopa.. resposta do capitão...coma que isso é tudo proteína...pode ser mas.. é "uma merda de proteína"..e afastou delicadamente o prato de zinco. (...)


Luís Graça:

(..) Um grande admirador de Salazar e influente deputado, Cazal Ribeiro, considerado um ultranacionalista, teve um filho, que foi piloto de heli AL III, e que morreu em Angola... Não sei se em combate, se por acidente,,, O caso na época foi muito falado... e provocou comoção nas fileiras do regime, O nosso Dom Duarte Nuno também a fez a tropa e fez uma comissão em Angola... São dois casos, públicos, que me ocorrem à memória. (..)


Valdemar Queiroz:

(...) E, então, os que pagavam para não ir pra guerra ? Sim, houve situações que eu conheci, de Cabos Milicianos com boa classificação na especialidade, ou em pequena rotação, o exemplo das variantes de Artilharia, não mobilizados, que se ofereciam em substituição por troca de dinheiro a outros com classificações mais baixas e mobilizáveis? Os chamados 'mata serviços'. Havia-os cá a 'matar serviços' nos fins de semana, que depois se estendeu à guerra na Guiné, que dava bom dinheiro. Lembro-me do caso no RAP3, Figueira da Foz, de dois de especialidade Munições de Artilharia,  meus conhecidos, um que foi um jogador conhecido de futebol, outro meu ex-colega na Veiga Beirão. O meu ex-colega na Veiga, grande crânio, com excelente classificação, trocou por dinheiro com o futebolista, dum clube conhecido, com baixa nota, para ir pra Guiné. (...)
_____________

Nota do editor:

Último poste da série > 5 de outubro de  2016 > Guiné 63/74 - P16564: Inquérito 'on line' (71): Os Filhos dos Ricos e Poderosos, incluindo os jogadores de futebol... (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, Minas e Armadilhas, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)

Vd- também postes anteriores:

29 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16538: Inquérito 'on line' (68): Quando os filhos dos ricos e dos poderosos de então andavam connosco na escola, na tropa e na guerra... Resposta até ao dia 5/10/2016, às 19h44...

30 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16543: Inquérito 'on line' (69): Perguntar não ofende, mas às vezes pode incomodar... Os filhos dos ricos e dos poderosos de então andaram comigo na escola (25%), mas não na tropa (52%) e menos ainda na guerra (56%)... Resultados preliminares (n=44)... Prazo de resposta até 5 de outubro, 4ª feira, às 19h44

4 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16559: Inquérito 'on line' (70): Ricos e pobres, a tropa e a guerra... O caso de um camarada meu do 4º turno de 1971, no CISMI, Tavira , que era alegadamente filho de um grande acionista da Tabaqueira (Henrique Cerqueira , ex-fur mil, 3.ª CCAÇ / BCAÇ 4610/72, e CCAÇ 13, Biambe e Bissorã,

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16551: Inquérito 'on line' (69): ... Os filhos dos ricos e dos poderosos de então andaram comigo na escola (39%), mas não na tropa (45%) e menos ainda na guerra (52%)... Resultados preliminares (n=73)... Prazo de resposta até 5 de outubro, 4ª feira, às 19h44

1. INQUÉRITO DE OPINIÃO:~




 "OS FILHOS DOS RICOS E PODEROSOS DE ENTÃO ANDARAM COMIGO"...


Resultados provisórios, com base em 73 respostas:


4. Sim, andaram comigo 
na escola  > 29 (39%)

2. Não, não andaram comigo 
na tropa  > 33 (45%)


3. Não, não andaram comigo 

na guerra  > 38 (52%)


1. Não, não andaram comigo na escola  > 26 (35%)

5. Sim, andaram comigo na tropa  > 21 (28%)

6. Sim, andaram comigo na guerra  > 12 (16%)

7. Não sei / não me lembro  > 8 (10%)

Resposta múltipla. Votos apurados: 73

Dias que restam para votar: 2 (Termina em 5/10/2016, 4ª feira, às 19h44)

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sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Guiné 63/74 - P16543: Inquérito 'on line' (69): Perguntar não ofende, mas às vezes pode incomodar... Os filhos dos ricos e dos poderosos de então andaram comigo na escola (25%), mas não na tropa (52%) e menos ainda na guerra (56%)... Resultados preliminares (n=44)... Prazo de resposta até 5 de outubro, 4ª feira, às 19h44

Bissau: Monumento ao Esforço da Raça
(c. 1950)
1. INQUÉRITO DE OPINIÃO: "OS FILHOS DOS RICOS E PODEROSOS DE ENTÃO ANDARAM COMIGO"...


1. Não, não andaram comigo na escola  > 17 (38%)


2. Não, não andaram comigo na tropa  > 23 (52%)

3. Não, não andaram comigo na guerra  > 25 (56%)

4. Sim, andaram comigo na escola  > 18 (40%)


5. Sim, andaram comigo na tropa  > 11 (25%)


6. Sim, andaram comigo na guerra  > 7 (15%)

7. Não sei / não me lembro > 4 (9%) 


2. Mais um inquérito (ou "sondagem"...) para responder no nosso blogue, até ao dia 5 de outubro, até às 7:44 PM (19h44)... Não se trata de nenhum trabalho de pesquisa científica, é apenas um passatempo, inocente... Não sabemos quem responde nem quem não responde... Se chegarmos aos 100, ótimo, é uma boa amostra de conveniência.

Até hoje de manhã, tínhamos 44 respostas, cujos resultados preliminares apresentamos acima.

Por favor, camarada,  coloca a(s) cruzinha(s) aqui. diretamente, ao canto superior esquerdo do blogue... A pergunta tem resposta múltipla... E, já sabes, perguntar não ofende... E também não queremos naturalmente incomodar ninguém... Só queremos conhecer a tua experiência ou a tua perceção... 

Na época,  em 1961/74, havia o serviço militar obrigatório e o país estava a braços com uma guerra em 3 frentes, bem longe de casa... Dizem que mobilizou perto de 1 milhão de homens...200 mil terão sido os refratários; desertores foram poucos... Alguns de nós acham que, na época, éramos todos portugueses e todos iguais... Mas outros acrescentam que havia alguns de nós que eram mais iguais do que outros... Em que é que ficamos ?


3. Alguns comentários na página do Facebook da Tabanca Grande, com de ontem e hoje:

(i) Domingos Robalo:

Já fiz a minha votação e gostaria de comunicar o seguinte: Fiz 24 meses de Guiné de maio 69 a 71.

O sobrinho do ministro Sá Viana Rebelo e o filho do deputado à Assembleia Nacional falecido no acidente de helicóptero em Mansoa foram meus camaradas na Artilharia (BAC1 / GAC7). O primeiro comandava um pelotão de artilharia, creio que em Canquelifá e o segundo estava em Catió.

Outros "ricaços" e filhos de industriais por lá andavam em pelotões no TO. Obviamente que a maioria eram de origem mais modesta mas nem por isso menos considerados ou desrespeitados. Era assim na Artilharia.

Não esquecer que a maioria dos nossos soldados eram de origem Guineense, [tendo sido] vitimas dos assassinatos a seguir à independência daquele País de gentes amigas e ainda saudosas de Portugal.

PS - Correcção: o primeiro [, o sobrinho do ministro Sá Viana Rebelo] estava em Saré Bacar, e estivemos juntos na "Operação Mabecos", em Piche, na semana de carnaval de 1971, operação de triste memória.

(ii) Augusto Carolino Carvalho:

Alguns andaram na Escola Primária, depois ninguém mais os viu, só de vez em quando é que vinham à Terra.

 (iii) Mario Vasconcelos:

Durante o serviço militar nunca me preocupou saber a origem daqueles que correspondiam ao esforço praticado. Os laços que nos irmanavam eram de tal modo fortes, que esse aspecto, para mim, era irrelevante. Suponho ser mais admissível dizer que, durante o ensino superior, alguns fossem dessa proveniência. E, portanto, muitos deles devem ter representado a nação em esforço de guerra. Verdadeiramente, não sei quantificar.

 (iv) Raul Castanha:

Não faço a minima ideia de quem eram, no inicio, os meus camaradas de guerra ou melhor de tropa. Fomos todos iguais e cada um ocupou o seu lugar com as suas responsabilidades. A questão que se deveria ter colocado é se cumpriram ou não o seu papel.~

(v) Manuel Amaro:

 Havia de tudo... uns inventavam doenças como o filho do Director do Hospital Militar... outros, como o filho de um General, meu vizinho, faleceu em Angola.

(vi) Manuel Belinha:

Na escola aonde eu andei, andavam todos, ricos e pobres, brincávamos juntos . Nos anos 50 não havia colégios privados. Isso são coisas das mentes deturpadas modernas e de quem perde tempo a fazer estes inquéritos. Esta página [Facebook da Tabanca Grande] é de grande utilidade para todos nós que estivemos na Guiné . Ficarei muito triste se ela for usada para fins políticos.  Na Guiné éramos todos camaradas unidos, porque ninguém sabia e não se discutia política.

A vida é assim mesmo. Uns imigraram, para o estrangeiro ou grandes cidades. A vida de criança, mal era se não mudasse na idade adulta. Conheço gente que era rica,  hoje está pobre, também conheço gente que era pobre,  hoje está rica.  É a sorte e o destino de cada um.

(vii) José Augusto de Araújo:

Eu também estive na Guiné de 69 a 71, e já há muito que sou adepto da Tabanca Grande!...  Ricos ou pobres, todos os que lá fomos sofremos na pele o inferno da guerra!...
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quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Guiné 63/74 - P16538: Inquérito 'on line' (68): Quando os filhos dos ricos e dos poderosos de então andavam connosco na escola, na tropa e na guerra... Resposta até ao dia 5/10/2016, às 19h44...


Guiné > Bissau > s/d > "Monumento ao Esforço da Raça (Bissau)". Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 131". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal. Imprimarte, SARL).

Coleção de postais  ilustrados do Agostinho Gaspar / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010) (*)


1. INQUÉRITO DE OPINIÃO: "OS FILHOS DOS RICOS E PODEROSOS DE ENTÃO ANDARAM COMIGO"...

1. Não, não andaram comigo na escola

2. Não, não andaram comigo na tropa

3. Não, não andaram comigo na guerra

4. Sim, andaram comigo na escola

5. Sim, andaram comigo na tropa

6. Sim, andaram comigo na guerra

7. Não sei / não me lembro


2. É um inquérito (ou "sondagem") para responder no nosso blogue, até ao dia 5 de outubro, até às 7:44 PM (19h44)... Colocar a cruzinha aqui. diretamente, ao canto superior esquerdo do blogue... Passadas as férias de verão, contamos com uma boa adesão dos nossos leitores, o mesmo é dizer, 100 ou mais respostas (**)...

Os ricos e poderosos do nosso tempo, do tempo da guerra colonial (1961/74), eram uma elite restrita: grandes agrários, grandes empresários industriais, grandes comerciantes, alto clero, banqueiros, generais, almirantes, magistrados,  deputados à Assembleia Nacional e procuradores à Câmara Corporativa, dirigentes do partido único (União Nacional / Ação Nacional Popular), ministros, governantes do Estado Novo, governadores civis, autarcas,,,.

Nas terras de província contavam-se pelos dedos. Tinham nomes de família sonantes. Eram respeitados. temidos, amados, odiados... Tinham criados, rendeiros, afilhados,,,, Eram influentes, eram poderosos, mesmo que nem todos fossem ricos, ou muito ricos... Portugal era (e ainda o é) uma "sociedade clientelar"...

Será que os filhos desses senhores (e senhoras) andaram connosco ?... Na escola, na tropa e na guerra ?... Não pomos outras hipóteses, como creche/jardim de infância, que era coisa que no nosso tempo não existia... Quando muito, catequese, mocidade portuguesa... A escola inclui o liceu (para os poucos que tinham a sorte de chegar  ao liceu e depois, com mais sorte ainda,  à universidade)...

Confesso que o mote me foi dado pelo nosso camarada Adão Cruz, ex-alf mil médico (***).

A resposta é múltipla: os filhos dos ricos e poderosos da  nossa terra, nos anos 50, 60, 60, 70, do século passado,  podem ter andado connosco na escola ou no liceu (?) ou até na tropa (!) mas provavelmente não na guerra... E, se eram mobilizados para a "guerra do ultramar", arranjavam, com facilidade, maneira de ficar no "ar condicionado" de Bissau, Luanda ou Lourenço Marques... É verdade ?...

Histórias, precisam-se!... E,  se houver fotos, melhor!.. Mas,  antes,  não se esqueçam de "votar", ou seja, escolher as categorias de resposta que vos parecerem mais adequadas... (LG)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de junho de 2010 >  Guiné 63/74 - P6645: Memória dos lugares (87): Bissau, cidadezinha colonial (Parte V) (Agostinho Gaspar)

(...) Não sei de quem é o autor deste monumento nem o ano exacto da sua concepção e construção. A estética é claramente estado-novista típica dos anos 40/princípios de 50... O monumento, destruído depois da independência (segundo sei), tem várias leituras: para uns pode ser uma obra-prima, para outros um mamarracho... Eu, que sou contra o camartelo dos iconoclastas (de todos os iconoclastas), tenho pena que o monumento não tenha sido poupado, como de resto parte da estatuária do 'colonialismo'...

Para os camaradas que fizeram a guerra colonial, como eu, e que conheceram este monumento, devo dizer o seguinte: toda a arte traz a marca do seu tempo e fala do seu tempo... Seria fácil, há trinta e cinco atrás, do alto da nossa arrogância juvenil, apodar o monumento de 'colonial-fascista'... Mas já nos tempos que por lá passei, em Bissau, em 1969/71, o termo raça me fazia urticária... Qualquer que fosse a raça em causa... Hoje é sabido, de resto, que não existem raças humanas... Pertencemos todos à mesma espécie, Homo sapiens sapiens... É uma constatação científica, não é uma asserção do politicamente correcto... Dito isto, tenha pena que os guineenses tenham destruído o 'Monumento ao Esforço da Raça' [, Portuguesa, claro]... fazia parte do seu património histórico, da mesma maneira que os marcos milíários que pontuavam as vias romans ligando a Lusitânia ao resto do Império Romano, fazem parte do nosso património histórico (...) (LG)


(**) Último poste da série > 25 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16419: Inquérito 'on line' (67): Valha-nos, ao menos, isso: as NT nunca usaram soldados-meninos....

(***) Vd. poste de 27 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16528: Memórias de um médico em campanha (Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547) (8): O Tanque

(...) O Alferes Almeida foi meu companheiro de quarto em Bigene, no norte da Guiné, se é que podemos chamar quarto ao alpendre onde dormíamos. Cerca de oito anos mais novo do que eu, o Almeidinha fez-se meu amigo de verdade. Amigo desde o acampamento da Fonte da Telha, do quartel de Porto Brandão e da Amadora.

Embarcámos para a Guiné no velho Uíge, empurrados pelo magnífico patriotismo de Salazar, entalados entre o belo gesto das senhoras do Movimento Nacional Feminino e o malabarístico safanço dos filhos dos ricos e patriotas da situação. Embalados pelas ondas do mar da Mauritânia, e sossegados pelas ricas ementas flamejantes do cozinheiro de bordo, demos à costa da Guiné no dia 13 de Maio de 1966. (...)

domingo, 24 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15660: Inquérito 'on line' (33): Só pouco mais de um terço (35,7%) de um total de 123 respondentes, é que diz que "sim, a tropa fez de mim um homem"...



Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3



Foto nº 4


Guiné > Região de Cacheu > Jolmete > c. finais de 1968/ maio de 1969 > 

Fotos nº 1 e 2 > Senhora Supico Pinto também a falar ao pessoal no refeitório; 

foto nº 3 > Na messe; à  esquerda julgo que é o falecido sr maj Passos Ramos, depois, sentada, uma senhora do MNF que não sei identificar;  a seguir, de pé, o nosso cap Barbeitos a falar com a esposa [, elegantíssima,] do general Spínola e depois, sentada, está a Cilinha Supico Pinto, como era conhecida e tratada naqueles tempos. 

Foto nº 4 >  Spínola em Jolmete com as senhoras do MNF: destaque para Cecília Supinco Pinto, de amarelo.

Fotos do álbum de Manuel Carvalho (ex-fur mil armas pesadas inf, CCAÇ 2366/BCAÇ 2845, Jolmete, 1968/70). (*)


Fotos (e legendas): © Manuel Carvalho (2013). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


A. INQUÉRITO DE OPINIÃO: "SIM, A TROPA FEZ DE MIM UM HOMEM"


1. Totalmente verdadeiro > 10 
(8,1%)
2. Verdadeiro > 34 
(27,6%)
3. Nem verdadeiro nem falso > 53 
(43,1%)
4. Falso > 15 
(12,2%)
5. Totalmente falso > 8 
(6,5%)
6. Não sei responder > 3 
(2,4%)
Votos apurados > 123  
(100,0%)


Sondagem fechada: 21 jan 2016  10h06.

B. Comentário dos editores:

Não sei se poderia perguntar às mulheres, hoje,  se a tropa fez (ou faz) delas "mais mulheres"... SEm o querer, estamos a jogar com os estereótipos homem/mulher...

No nosso tempo não há a quem perguntar, com exceção das nossas camaradas enfermeiras paraquedistas (que tiveram o mérito, histórico, de abrir às mulheres as fileiras das Forças Armadas Portuguesas)... As poucas mulheres que "foram à guerra", no TO da Guiné, era "esposas", civis, que acompanharam os maridos, militares,  nas suas comissões de serviço, nalguns (poucos) sítios, relativamente seguros e confortáveis... E, claro, Cecília Supico Pinto, sempre "festiva",  e as suas colegas do Movimento Nacional Feminino (MNF).

Para os homens, a tropa está longe de ter sido uma experiência "realizadora"... É, pelo menos, o que se depreende das respostas (n=123) ao nosso inquérito de opinião, "fechado" no passado dia 21. (**)
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Notas do editor:

(*) Vd.. poste de 24 de janeiro  de 2013 >  Guiné 63/74 - P10999: Ainda as visitas da Cilinha pelas Unidades Militares estacionadas no mato (Manuel Carvalho)

(...) Ao ver o poste sobre a visita ao Olossato das Senhoras do MNF (...),  lembrei-me que devia ter fotos, e tenho 5, não sei se são todas da mesma visita, porque duas tem indicação de meados de Maio de 1969 e as outras não tem data.

Da comitiva fazem parte o Sr. General Spínola e o então cap. Almeida Bruno que na altura o acompanhava sempre e numa foto na messe julgo que está de camuflado o Maj. Passos Ramos, que cerca de um ano mais tarde viria a ser cruelmente assassinado pelo PAIGC naquela zona.
Está também a esposa do Sr. General Spínola e uma Senhora do MNF que não sei identificar.

Para além desta visita a Jolmete penso que houve uma outra em fins de 68 ou princípio de 69 mas não tenho a certeza. Como sempre foram distribuídos uns maços de cigarros uns isqueiros e umas palavrinhas para atenuar a crise. (...)

(**) Último poste da série > 20 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15643: Inquérito 'on line' (32): "A tropa fez de mim um homem"?... A tropa acrescentou a decisão e a determinação na acção, atitudes muitas vezes necessárias para o vencimento de inércias, e o alcance de objectivos (José Manuel Matos Dinis, "homem grande" da Magnífica Tabanca da Linha)

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15643: Inquérito 'on line' (32): "A tropa fez de mim um homem"?... A tropa acrescentou a decisão e a determinação na acção, atitudes muitas vezes necessárias para o vencimento de inércias, e o alcance de objectivos (José Manuel Matos Dinis, "homem grande" da Magnífica Tabanca da Linha)

A Tropa Fez de Mim Um Homem ? (*)

 por José Manuel Matos Dinis


[ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71; um dos "homens grandes" da Magnífica Tabanca da Linha que tem amanhã mais um dos convívios regulares, desta vez em Carcavelos]


Mais um repto dos nossos editores. De facto, a tropa mexeu muito connosco, com as gerações da guerra de África. A guerra que a certa altura das nossas vidas já se revelava um obstáculo inevitável, e que cada um encarava de forma particular, com reserva, ou com a descontracção possível, já que a todos os ajuizados havia de causar alguma ponderação, quiçá preocupação.

Com excepção da morte da minha mãe aos 8 anos, situação que o meu pai compensou o melhor possível, fui um puto muito feliz, e tive a sorte de ter sido criado num local ocupado por muitas famílias da mesma geração, de portas abertas para os amigos dos filhos, pelo que os putos acompanhavam-se com grande alegria, imaginação, rebeldia e solidariedade. Era a malta do bairro, que alinhava em alcateia, que jogava futebol, ou guerreava os putos de outros azimutes de Cascais. 

Na praia da Duquesa tínhamos os nossos lugares cativos. E as nossas amizades alargavam-se com a entrada para o secundário, onde passámos a conviver com a juventude estudantil do concelho.
Claro que vivi em casa do meu pai até frequentar os estabelecimentos militares do Exército Português. 

A certa altura comecei a imaginar que em África teria grandes possibilidades de levar um tiro na córnea, e quando chegava a casa com negativas, desculpava-me com essa possibilidade, do que resultava a seguinte questão: estudar para quê, se estava destinado a uma medalha a título póstumo. E o bom coração do meu pai cedia. Passei por baixo durante alguns anos.

Quando acabei o 5.º ano, já contava 18 de idade. O meu pai colocou-me perante uma escolha. Segundo ele, eu não dava para tirar um curso superior, logo, não valia a pena continuar a arrastar o corpinho nos corredores do colégio, e propôs-me tirar um curso técnico que me habilitasse para a vida. Um familiar tinha outra proposta para mim, e assim inscrevi-me na escola de hotelaria de Lisboa, enquanto de tarde estava autorizado a estagiar num hotel. Maravilha! 

As aulas eram bacanas, com um grupo de raparigas e rapazes bastante animado. De tarde, quando sentia necessidade de dinheiro para a estroina, duas a três vezes semanais, ia "trabalhar" na recepção (outro lugar que rapidamente degenerou num ambiente de reguilice), e acompanhava aos quartos os clientes recém-chegados com ar de deixar uma nota na mão. As moedas ficavam para um "groom" que não perdia pitada quando me via a alinhar. 

Foi um tempo também magnífico, divertido, e com dinheiro no bolso, ao contrário da minha vida anterior, que até me envergonhava de pedir 5 c'roas ao meu pai. Deixei de recorrer ao argumento da tropa, porque deixei de apresentar negativas.

Em Outubro de 68 fui diagnosticado de pleuresia, e o saudoso Canas da Mota recomendou uma mesinha e, sobretudo, muito descanso e boa alimentação, que tinha doença para uns 2 ou 3 meses. Foi o que fiz. Passadas duas semanas pedi-lhe licença para sair. Confirmou que tinha acontecido um milagre, e deixou-me sair por muito pouco tempo diariamente. Não o contrariei. Saía à noite. Já estava com o destino traçado para as Caldas. 

Numa dessas noites no bar do Chico (um primeiro andar fronteiro ao Largo Camões, onde morou o Américo Tomás), com um prodigioso amigo fui co-inventor de um jogo de setas denominado "Angola é Nossa". Consistia no uso das setas lançadas sobre um alvo circular, com espaços alternados de branco e preto. O melhor resultado de uns quantos jogos valia uma cervejola, um Porto, um Drambuie, um Constantino, qualquer coisa. Sabíamos quem ganhava conforme os pontos de cada espetadela no alvo. Acertando numa faixa preta, conquistava-se um ponto; acertando numa branca, descontavam-se 2 pontos. Estão a ver como comecei a exercitar-me com denodo, e a dominar a geometria no espaço, numa precoce preparação para a maldita guerra.

Em Dezembro apresentei-me para trabalhar, pedi o salário de um conto, e um horário com cartão de ponto. Foi um mês porreiro, pois a minha actividade era muito agradável, e punha-me em contacto com muitos ilustres e interessantes personagens. Segundo um dos ascensoristas, a Mylène Demongeot dava-me bola, talvez porque me fartei de esperar por ela, que deva entrevista à Maria Leonor; Jorge Amado foi de uma grande simpatia numa breve conversa que mantivemos; o capitão Warton, um veterano americano da 2.ª GG, que fazia transportes para o Biafra, convidou-me para seu representante em África, que recusei liminarmente; enfim, muitas outras personagens da política e do empresariado nacional davam alguma réplica ao meu atrevimento. Mas a Beatriz Costa era a mais simpática e gaiata, sempre a irradiar alegria, foi a primeira pessoa a falar-me das "delicias" de Torre de Molinos.

No final de Dezembro o director veio ter comigo e perguntou-me se queria receber a Gigliola Cinquetti no dia 9 de Janeiro. Respondi-lhe que não, que nesse dia teria que me apresentar nas Caldas para iniciar o serviço militar. Foi assim que se soube da minha incorporação.

Estava de chuva, e a malta em fila para recebermos fardamentos e armas, com os sacos civis ao lado de cada um. Um furriel de Operações Especiais, acompanhado de 4 ou 5 mamantes, fazia revista e sacava dos sacos as melhores iguarias. Eu tinha o saco cheio delas, e apresentava-me com os meus 70 kgs e 1,78 mts. Ao meu lado, o Zé Tito com o corpo ginasticado e os ombros largos da formação no INEF aguardávamos em cavaqueira, achando graça a tudo quanto víamos. Quando o furriel se me dirigiu, respondi-lhe que levava bolos de bacalhau, pastéis de carne, presunto, paio, salame de chocolate, e uma garrafa de qualquer coisa, mas que era tudo para mim, que era de bom alimento. Surpresa geral: o furriel declarou ao séquito que já tinham o suficiente, e eu granjeei alguma admiração. 

Na primeira semana o tempo persistia chuvoso, e os pelotões recolhiam-se nas salas de aulas regimentais, uma espécie de regresso ao liceu. Da última cadeira de uma fila, levantei o braço. O tenente Clemente ordenou: 
- .Diga lá, ó nosso instruendo! 
- Meu tenente, nós estamos aqui para ganharmos preparação para a guerra nos climas inóspitos, e agora porque está a chover, refugiamo-nos como uma turma de meninas.

Não cheguei a dizer mais nada, pois aquele tenente exclamou surpreendido: hhhaaannn!? E logo acrescentou: 
- Está tudo a formar lá fora!

E acompanhou-nos numa sucessão de ordens que incluíram rastejar na lama. Quando o pelotão chegou à caserna, outros elementos de outros pelotões comentavam que o tenente era um... (nome feio)... Não, (nome feio) é o Dinis, respondiam os meus camaradas. Tal episódio constituiu uma espécie de pacto entre nós, o tenente, e os cabos milicianos, onde o Mourinho pontificava. 

Depois de várias estórias fui colocado em Tavira, e também o Zé Tito, meu amigo da juventude, com quem fiz a tropa do primeiro ao último dia. E foram muitas as aventuras também em Tavira, onde só fomos penalizados durante um fim-de-semana. Custou-me muito. Nesse dia de manhã, enquanto a malta iniciava as tarefas (ida ao mercado e padaria, compra e preparação do almoço), só me levantei para comer, se não erro, uma posta de pescada cosida com batatas e legumes. Depois, os sacanas lá de casa abalaram para o mundo livre e deixaram-me a loiça para lavar. Velhacos!

Férias! E o curso de "mines and bloody tracks". Éramos 5 que constituíamos um grupo reguila. Na primeira noite, já bem avinhados, seriam umas duas da manhã, quando arribámos ao Casal do Pote. No gabinete do oficial de dia, um aspirante porreirinho desfez-se em gentilezas na recepção. Sacou de uma garrafa de whisky e encheu os cálices. Cada um tinha uma estória para desfiar, enquanto outro voltava a atestar. Quando a garrafa vazou, bazámos para dormir. Na caserna, a luz vermelha de presença inspirou uma sessão de streep, pois o pessoal não ia dormir com fardas. Alinhámos os caixotes em modo de desfile de modas, e o Ruas, um jeitoso de quase 2 metros oriundo da PM, começou a despir-se, enquanto a malta improvisava sons sobre a "pantera cor-de-rosa", uma música que se adaptou muitíssimo bem. Os que acordavam mal-dispostos levavam um aviso para não interromperem a "performance", e com isso ganhámos o nosso espaço e individualidade. Durante a primeira aula, o alferes-engenheiro ensinou-me o essencial: nunca se armem em parvos. 

Férias novamente, a que se seguiu uma viajem turística para o Funchal, a bordo do Funchal. Por altura da passagem da barra o Zé Tito fez-me uma declaração: estou quase teso; e eu respondi-lhe nos mesmos termos. O que fazer? Vamos p'rá batota. Por junto tínhamos cerca de um conto e trezentos. O Zé pediu para ficar com os 300 escudos e deu-me o conto de reis para o póquer. Rondámos as mesas para estudos dos potenciais adversários, e pedi licença na mesa onde jogavam uma família de três e um vendedor de artigos fotográficos, que me lembre. Estudei-os muito bem, até que o Zé Tito se aproximou e questionou; como vai nisso? Estou a ficar teso. Toma, respondeu, ganhámos nos jogos de tombadilho, deu-me agora o comissário. Era outro conto de reis, Em cerca de meia hora ganhei 6 contos. Era fim-de-semana, e de táxi fomos para o Hotel. Na 2.ª feira batemos a pala ao nosso Comandante, e pedimos um abono para nos instalarmos, porque já não tínhamos dinheiro

A estadia na Madeira pode merecer um episódio autónomo. Quero no entanto referir, que até esta altura nunca me escusei ao que fosse, de bom e de mau, embora considere que tenha vivido muito feliz, coisa que o serviço militar só ocasionalmente interrompeu. Nunca me fui abaixo com problemas, e adoptei a divisa de que o que não tem solução (para mim) solucionado está. 

Até essa idade também nunca deixei de encarar os problemas impossíveis de não enfrentar, e com maior ou menor sucesso consegui ultrapassá-los. Também concluí desde novo que a união faz a força, e sempre me preocupei em valorizar a solidariedade e o espírito de grupo. Sobre os princípios gerais de educação consignados nos deveres gerais de respeito, desde muito cedo que mos transmitiram, e de um modo geral estive atento a eles. Mas a tropa acrescentou a decisão e determinação na acção, atitudes muitas vezes necessárias para o vencimento de inercias, e o alcance de objectivos. Só a partir deste período é que fui confrontando com verdadeiras hipocrisias... e comecei a engolir alguns sapos. Muitas vezes por falta de solidariedade, causada pelo medo que impende sobre subordinados, conforme mecanismos psicológicos e sociais que limitam a liberdade de espírito e o sentido crítico, atitudes fundamentais para se atingir o bem comum.

José Manuel Matos Dinis
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terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15639: Inquérito 'on line' (31): "A tropa fez de mim um homem" ?... Lembrando o caso dos meus conterrâneos que, tendo emigrado antes, vieram do estrangeiro propositadamente para fazer a tropa (Francisco Baptista, Brunhoso, Mogadouro)

Vista geral de Brunhoso.
Cortesia da página Brunhoso, Mogadouro


1. Comentário de Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72):

Brunhoso, a minha aldeia distava cinco quilómetros de Mogadouro, sede do concelho, por esse motivo os mancebos da terra chamados à inspecção, deslocavam-se a pé, pois estavam habituados a calcorrear muitos quilómetros no dia a dia de trabalhadores agrícolas. Arranjar transportes também não seria fácil. Bicicletas ninguém tinha, muito menos motorizadas. Os burros ou mulas, já que cavalos praticamente não havia, ninguém se atrevia a pedir aos pais, que iam considerar pouco másculo, para um rapaz de 20 anos fazer uma distância tão pequena.

No meu ano, fomos quatro, porque outros quatro do mesmo ano, já tinham emigrado para longes terras, Brasil e Angola.

Nesse tempo, em que os praças do meu ano e outros de anos anteriores, se dispersavam já pelo mundo europeu, americano ou africano à procura de melhores condições de sobrevivência, a velha máxima " de que a tropa vai fazer de ti um homem" estava a perder actualidade, já que eles,  pelas andanças pelo mundo, iam adquirindo os mesmos conhecimentos e experiências que a tropa lhes poderia dar. Experiência da vida e do mundo, que de certeza terá dado, a alguns dos seus antepassados, que na vida inteira só por essa causa, saíram para lá dos limites onde os levavam as pernas deles ou as dos animais de carga.

Por outro lado a tropa não os iria fazer homens mais obedientes e disciplinados do que já eram, a eles filhos de uma sociedade rural antiga e afastada de tudo, onde não tinham entrado ideias libertárias da revolução liberal do século dezanove, nem da revolução republicana dos inícios do século vinte e continuavam debaixo do poder absoluto das várias autoridades, a começar na Igreja e a acabar nos pais, que Salazar abençoou quando tomou o poder. 

O livro "Das Trincheiras com Saudade" sobre a participação do Corpo Expedicionário Português,
numa passagem fala sobre a coragem e disciplina do batalhão dos transmontanos. As duras condições de trabalho que tinham de suportar e as imposições seculares que lhes condicionavam a personalidade terão provavelmente contribuído para isso. 

Não quero deixar de salientar a atitude, destes meus "praças" que na nossa velha escola primária tinham aprendido a História de Portugal, à custa de muitos gritos, reguadas e vergastadas da professora, que patriotas, como poucos, vieram de França, para "dar a tropa" na linguagem deles. Seria patriotismo ou medo da Pátria, essa avó rabujenta´, que nunca lhes tinha dado algum amor, mas que se podia vingar deles e condená-los ao ostracismo?

Há dias ouvi,  na apresentação de um livro sobre a guerra, que mais do que desertores houve muitos que vieram do estrangeiro propositadamente para fazer a tropa. Estes meus conterrâneos devem fazer parte dessa contabilidade desse nosso camarada.

O ilustre intelectual e camarada que fez essas afirmações parece-me que não conhecia muito bem as motivações e a realidade dos nossos jovens emigrantes, na sua maioria futuros soldados, que durante três anos, para começo de vida e estando já alguns casados, iriam receber um vencimento miserável. Os futuros oficiais e sargentos milicianos, apesar da interrupção das suas carreiras profissionais ou escolares, iriam receber um vencimento bastante compensatório, o que não era o caso dos enumeros batalhões formados sobretudo por soldados. Concluindo os três camaradas que vieram de França, para ir às sortes comigo, e dar a tropa, vieram por amor à sua sua terra, terra dos seus pais e antepassados, porque sabiam que se não viessem ficavam condenados, não sabiam até quando, a não poder regressar.

A mim pessoalmente a vida militar, depois da crise mais ontológica da adolescência , relacionada com as razões, causas e justificações das nossas origens e destinos, provocou-me uma crise de consciência política sobre as razões ou sem razões dessa guerra. Um combatente com dúvidas não pode ser um bom combatente, embora um dia tenha sentido subir muito por mim a adrenalina e o desejo de vingança por causa da morte de um camarada.

Francisco Baptista
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Nota do editor:

Vd. postes de 16 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15622: Inquérito 'on line' (28): "A tropa fez de mim um homem"?... Nem sim nem não, metade da malta (12 em 24) responde "nim", "nem verdadeiro nem falso"... Inquérito em curso até 5ª feira...

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15635: Inquérito 'on line' (30): "Sim, a Tropa fez de mim um Homem"... (Mário Vitorino Gaspar)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de hoje, 18 de Janeiro de 2016, com a sua opinião sobre o tema "A Tropa vai fazer de ti um homem":

Caros Camaradas

A tropa, na minha modesta opinião, também polémica e contestável, foi um desastre na minha vida, isto era já o que pensava quando a PIDE através das Câmaras Municipais de Sintra (onde nasci) e Vila Franca de Xira, devido a habitar em Alhandra. Existe um pedido desta última Câmara à Junta de Freguesia de Alhandra.

Este pedido é formulado devido ir frequentar o Curso de Sargentos Milicianos (CSM).

Isto devia suceder com os Camaradas todos que viessem a frequentar os Cursos de Oficiais e Sargentos Milicianos. Obtive essa informação quando fui à Torre do Tombo consultar o meu Processo. Isto por termos muitos de nós esses Processos. Infelizmente que no meu Processo Civil e Militar, nada consta sobre a carnificina em Ganturé, morreram 10 civis e mais de 20 feridos. Era o primeiro visado.

Abriram um Processo Civil (a cargo da PIDE, isto já em Gadamael) e o Militar sobre a responsabilidade do Comandante da Companhia de Caçadores 1620, o Capitão Miliciano de Infantaria Fernando António de Magalhães Oliveira, Sangonhá e Cacoca. A CCAÇ 1620 foi para Sangonhá a 01AGO67 e foi rendida pela CCAÇ 1621 a 20MAR68.

À partida ir para a tropa prejudicava a minha vida e meus sonhos e ambições.


Velha Vila de Sintra. Ao virar à direita, fundo prédio amarelo estavam os Bombeiros 

© Foto do meu filho Alexandre Miguel Marques Gaspar


A Inspecção na Vila de Sintra a 27 de Julho de 1963 (nos Bombeiros Municipais da terra), onde veio a ser mais tarde o Museu do Brinquedo – parece não ser o local onde se situa este – mas não tenho a certeza e pouco importa.

A Inspecção unanimemente era para quase toda a rapaziada um dia de festa. “Não era homem não era nada se não fosse apurado para o Serviço Militar”.

O meu pai tentou que fosse trabalhar para as Oficinas Gerais do Material Aeronáutico (OGMA). Quem trabalhasse nestas Oficinas fazia  julgo que só a Recruta. Mas não quis por não ser diferente de todos os outros. Reconheço não ter o direito de julgar todos aqueles que ficaram livres de embarcarem para a Guerra quando eram trabalhadores das OGMA. Existiam outros abrangidos – trabalhadores por exemplo da Fábrica de Braço de Pátria (FBP – onde nasceu a nossa Pistola Metralhadora “FBP”) – que também, entre outros ficado livres – ao fim e ao cabo – de partirem para a Guerra. Fui à Inspecção e logo que o “nosso Sargento” gritou “Todos nus”, despi-me e coloquei-me na varanda nu, turistas que passavam riam.

Verifiquei terem ficado satisfeitos e radiantes ao tomarem conhecimento “terem ficado apurados para todo o serviço…”. Combinavam festas, almoços e adquiriram umas fitas que traziam escrito o apuramento para a tropa.

Trata-se de dar a minha opinião quando os meus filhos Carlos Pedro e Alexandre Miguel, também meus netos Raquel e Pedro, me perguntaram ou venham a fazê-lo: "Pai, avô, a tropa fez de ti um homem?".

Nem todos os camaradas possuem esta relíquia. Sempre pendurado no pescoço. 
Denomino Chapas dos Mortos

Pois contrariado e sempre, fui cumprindo. Quanto a “fazer de mim um homem”, não. A primeira resposta: “Não, a tropa não fez de mim um homem”, mas ajudou-me a evoluir noutros aspectos, andei num Curso Superior da Vida – Tropa/Serviço-Militar, antes uma “Pós-Graduação”, principalmente por ser de Especialista de Minas e Armadilhas. Aprendi e muito por vontade própria e defesa pessoal e defesa dos outros, a olhar para o meu interior, tendo adquirido o domínio, e alarguei os “meus sentidos”, conseguindo preencher as lacunas que permitiram tornar-me um perito no controlo de emoções, aumentando a minha biblioteca mental. Aprendi a controlar o tempo e dar uma resposta logo que solicitada.

Também assumo que a “tropa ajudou muito jovens a libertarem-se da enxada ao tomarem conhecimento que o mundo não era a sua aldeia, a sua terra e que existia um outro mundo por descobrir”. Fico imensamente radiante e orgulhoso quando fui professor de analfabetos e levei a passarem no Exame da 3.ª ou 4.ª Classes estes camaradas, mesmo aqueles que nem sequer fizeram esses Exames. Existiam aqueles que sabiam o suficiente para passarem no Exame e outros que não reuniam condições para passarem no Exame. Aqueles que reuniam as condições – segundo a minha opinião, e aqui era somente eu o responsável, só eu – foram a Exame, os outros foram por mim substituídos por camaradas já com a 4.ª Classe feita. Tudo feito unicamente com a minha responsabilidade. O Capitão só viu quando estavam todos sentados a fazerem as Provas, e eram 1.º Cabos os substitutos. Os Alferes Milicianos oriundos de Bissau acompanhavam os Exames. Depois de Aprovados, tiveram os substituídos de saberem assinar os seus nomes. Fiz mal? Se fiz, condenem-me. Fiquei feliz quando encontrei um camarada desses a conduzir um táxi. Tomei conhecimento ter feito depois a 4.ª Classe. Respeito todos aqueles que se libertaram, nesse aspecto a “tropa ajudou”, não a “serem homens” – homens já eram – ajudou a que dessem uma volta na vida. Alguns são proprietários de Empresas, a satisfação para mim.

Eu fui ajudado no dia 24 de Janeiro de 1969 na Entrevista com o Engenheiro Sucena, Administrador da DIAMANG e DIALAP que depois de confessar ser “um estudioso do ser humano e que nada tirara de mim, mas que se respondesse à questão que colocou «que razões tinha eu Mário Vitorino Gaspar para convencer o Engenheiro que veria ser um bom Lapidador de Diamantes, já que o diamante era matéria cara, podia ser muito valiosa e valer milhões”?
Respondi que tinha terminado o Serviço Militar e tinha feito uma Comissão e ter lidado com a morte, especialmente por ser de Minas e Armadilhas, e ter comandado homens. Terminando por dizer que lapidar diamantes seria tarefa mais fácil e com certeza viria a ser um bom Lapidador de Diamantes”. Respondeu o Engenheiro Sucena: “Venha trabalhar no dia 27 de Janeiro para a DIALAP – Sociedade Portuguesa de Lapidação de Diamantes, SA”. E acabei mesmo por ser um bom Lapidador de Diamantes.

Tivera a oportunidade de ver o Mancebo chegar ao RI 14, em Viseu – fui Monitor de Instrução desde 3 de Abril de 1966 a Agosto do mesmo ano e vi chegarem esses jovens (cada Pelotão da Recruta com 77 jovens) e tive na minha presença o Soldado Português com características que faziam com que o nosso papel de Instrutores e Monitores fosse facilitado. A crueldade da vida ao viverem em terras remotas, longe dos grandes centros urbanos e terem como utensílio a enxada e viverem longe e terem de caminhar muitos quilómetros e também viverem isolados. Reunidas estavam as condições para serem os meus Heróis. Ao ministrar a Especialidade, neste caso já à Companhia a que pertencia, a CART 1659 e chamada ZORBA e com o lema “Os Homens não Morrem”, fiquei consciente que teria de partir com eles. Afastei a ideia de desertar e assumi conscientemente esse compromisso, mesmo sendo sempre contrário à Guerra. Defensor acérrimo que o Amor é a solução. E a 100% parti para a Guiné. Nunca na Guerra – para mim foi uma Guerra Colonial – me baldei. Cumpri.

Aceito que a tropa, neste caso a Guerra foi uma oportunidade de mudar de vida. Foi um virar de página para uma grande maioria. Para mim foi um travão e só me libertei com quase 26 anos. Mudei realmente, mas era também essa a minha intenção – MUDAR DE VIDA…

Mário Vitorino Gaspar
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Nota do editor

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