Não conhecia esta história e confesso que fiquei sensibilizado com a sua narrativa. A minha primeira reação foi de incredibilidade. Como teria sido possível? Duas companhias sofrerem uma emboscada de armas ligeiras, a que pelos vistos não reagem, e sem baixas, nem mortos nem feridos, fogem para o quartel em debandada.
Não consigo descortinar uma razão para este procedimento. Qual terá sido a causa? A zona era assim tão perigosa, com o IN a dominar toda aquela região, com uma área de 15 por 15 Km, confinada pela foz de 2 rios navegáveis?
Depois fico angustiado: Como me sentiria eu, se tivesse sido um dos que regressaram a Fulacunda, sabendo que não regressaram ao quartel seis camaradas? Quais os sentimentos dos Comandos dessas unidades que, não os procurando de imediato, organizam uma busca no dia seguinte, e que, não os conseguindo encontrar nessa operação, desistem de os procurar? Que sentido faz, organizarem uma busca 10 dias depois?
E tudo isto se passou relativamente próximo de Bissau, do QG.
Se as tropas sitiadas em Fulacunda, não estavam capacitadas (?) para conhecerem e controlarem a região onde se inseriam, não havia outras forças à disposição do Com-Chefe, para atuarem de imediato, por terra, pelos rios e pelo ar, para detetarem os seis militares perdidos e acossados pelos guerrilheiros ?
Eu nada conheço do que se passava naquela região a esse tempo! Era uma região sob o domínio da guerrilha? Mas seria assim tão difícil libertar essa região do seu domínio?
O que mais me choca, é reconhecer como os soldados e os milicianos que alinhavam no mato, eram tratados, como carne para canhão,(salvo raras exceções) pelos seus superiores, oficiais, militares profissionais, oriundos da Academia Militar, que raramente saiam da sua área de conforto, o reduto do quartel, bem protegido com abrigos e cercas de arame farpado e torre de vigia com sentinelas.
Este episódio narrado, destes seis camaradas abandonados nas matas, perseguidos pela guerrilha e à mercê da sorte, para mim é chocante. Evidencia a desumanidade de alguns Comandantes, indignos da farda que envergavam e dos galões que ostentavam, para quem a vida dos seus subordinados pouco ou nenhum valor tinha. Era esta a perceção que tinha de alguns militares profissionais que conheci, que ainda me tornavam mais anti-militarista.
Resta-me acrescentar que esta minha sensibilidade exacerbada, perante este caso narrado, se deve a sentir que algumas das "operações" que me foram ordenadas, eu e aqueles que me acompanhavam, fomos usados como carne para canhão, na cruel perspetiva de nos provocar baixas, com que o sinistro oficial de operações, em final de comissão, agregaria ao seu miserável palmarés. (**)
Atentamente
JLFernandes
Eu nada conheço do que se passava naquela região a esse tempo! Era uma região sob o domínio da guerrilha? Mas seria assim tão difícil libertar essa região do seu domínio?
O que mais me choca, é reconhecer como os soldados e os milicianos que alinhavam no mato, eram tratados, como carne para canhão,(salvo raras exceções) pelos seus superiores, oficiais, militares profissionais, oriundos da Academia Militar, que raramente saiam da sua área de conforto, o reduto do quartel, bem protegido com abrigos e cercas de arame farpado e torre de vigia com sentinelas.
Este episódio narrado, destes seis camaradas abandonados nas matas, perseguidos pela guerrilha e à mercê da sorte, para mim é chocante. Evidencia a desumanidade de alguns Comandantes, indignos da farda que envergavam e dos galões que ostentavam, para quem a vida dos seus subordinados pouco ou nenhum valor tinha. Era esta a perceção que tinha de alguns militares profissionais que conheci, que ainda me tornavam mais anti-militarista.
Resta-me acrescentar que esta minha sensibilidade exacerbada, perante este caso narrado, se deve a sentir que algumas das "operações" que me foram ordenadas, eu e aqueles que me acompanhavam, fomos usados como carne para canhão, na cruel perspetiva de nos provocar baixas, com que o sinistro oficial de operações, em final de comissão, agregaria ao seu miserável palmarés. (**)
Atentamente
JLFernandes
2. Breve CV do nosso camarada, que integra a Tabanca Grande, membro nº 621, desde 29/12/2013:
(i) Joaquim Luís Fernandes, natural e residente em Maceira, concelho de Leiria;
(ii) Assentou praça (recruta) em janeiro de 1972 no RI 5 nas Caldas da Rainha com o número 06067572;
(iii) No 2º trimestre esteve em Mafra na EPI e fez o COM como cadete de infantaria;
(iv) No 3º trimestre voltou ao RI 5 como aspirante a oficial miliciano e foi instrutor, dando aí uma recruta;
(v) Foi mobilizado em setembro ou outubro de 1972, mas só em 20 janeiro de 1973 teve voo para a Guiné, depois de longo adiamento que o deixou solto e sem quartel durante 3 meses;
(vi) Apresentou-se no QG em Bissau como alf mil inf em 20 janeiro de 1973 (data da morte de Amílcar Cabral) ficando (no famoso Biafra) a aguardar coluna de transporte para Teixeira Pinto onde iria ser integrado na CCaç 3461/ BCaç 3863 comandada pelo cap Mil Gouveia;
(ii) Assentou praça (recruta) em janeiro de 1972 no RI 5 nas Caldas da Rainha com o número 06067572;
(iii) No 2º trimestre esteve em Mafra na EPI e fez o COM como cadete de infantaria;
(iv) No 3º trimestre voltou ao RI 5 como aspirante a oficial miliciano e foi instrutor, dando aí uma recruta;
(v) Foi mobilizado em setembro ou outubro de 1972, mas só em 20 janeiro de 1973 teve voo para a Guiné, depois de longo adiamento que o deixou solto e sem quartel durante 3 meses;
(vi) Apresentou-se no QG em Bissau como alf mil inf em 20 janeiro de 1973 (data da morte de Amílcar Cabral) ficando (no famoso Biafra) a aguardar coluna de transporte para Teixeira Pinto onde iria ser integrado na CCaç 3461/ BCaç 3863 comandada pelo cap Mil Gouveia;
(vii) Em Teixeira Pinto substituiu, em rendição individual, o alf mil Marques, que tinha sido evacuado para a Metrópole; comandou um pelotão (grupo de combate "Os Americanos");
(viii) Teve como principais missões, a escolta de colunas e o patrulhamento de segurança e de reconhecimento ofensivo;
(ix) No fatídico dia 1 de fevereiro de 1973, domingo, fez o seu primeiro serviço de oficial dia e o seu grupo estava de piquete: um trágico "batismo" para um "pira". (***);
(viii) Teve como principais missões, a escolta de colunas e o patrulhamento de segurança e de reconhecimento ofensivo;
(ix) No fatídico dia 1 de fevereiro de 1973, domingo, fez o seu primeiro serviço de oficial dia e o seu grupo estava de piquete: um trágico "batismo" para um "pira". (***);
(x) Está reformado, tendo trabalhado na indústria de moldes;
(xi) Tem página no Facebook.
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 4 de março de 2024 > Guiné 61/74 - P25234: 20.º aniversário do nosso blogue: Alguns dos nossos melhores postes de sempre (1): Um dos episódios mais trágicos da nossa guerra, no decurso da Op Lenda, em 7/10/1965, Gamol, Fulacunda
(**) Último poste da série > 18 de fevereiro de 2024> Guiné 61/74 - P25183: S(C)em Comentários (28): Graduados e desgraduados, o drama dos antigos comandos africanos: o caso do Amadu Djaló (Cherno Baldé,Bissau)
(***) Vd. Excerto do "Diário da Guiné, Lama, Sangue e Água Pura", do nosso camarada António Graça de Abreu, pág. 73/74: (...) Canchungo, 1 de Fevereiro de 1973 (...)