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segunda-feira, 21 de março de 2022

Guiné 61/74 - P23096: Memória dos lugares (438): Rancho da Ponderosa, destacamento de Ualada, subsector de Empada (Francisco Monteiro Galveia, ex-1º cabo op cripto, CCAÇ 616, Empada, 1964/66; vive em Fronteira)


Guiné > Região de Quínara > Empada > CCAÇ 616 (1964/66) > Destacamento de Ualada, o "Rancho da Ponderosa".

Foto (e legenda): © Francisco Monteiro Galveua (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem, com data de ontem, às 18h22;Francisco Monteiro Galveia (ex-1º cabo op cripto,  CCAÇ 616  (Empada, 1964/66) , que vive em Fronteira:


Junto foto minha no capô da viatura em 1965, à entrada do "Rancho da Ponderosa" (*). 

Da operação que eu pedi ao Jorge para comentar, é que ele tem mais apontamentos que eu, quanto aos nomes, foi-me passado na altura: que José Pedro Pinto Leite que era deputado na ala liberal da Assembleia Nacional, seria natural daquela povoação e que as nossas tropas tinham que ir ao local para mostrar que o inimigo não tinha o local em seu poder. (**)

Quanto aos nomes e residência eu desconheço. Do que eu me lembro é que um pelotão reforçado com o pelotão de milicias saiu de Empada após o pôr do sol a pé, pela madrugada passaram por toda a gente sem darem um tiro nem dizerem nada e embarcaram nas lanchas LDM com destino a Empada. 

Havia um posto de sentinela avançado numa árvore de grande porte, que se estava lá alguém estava a dormir. É possivel que essa terra se chame Darssalame. O Jorge deve ter mais elementos por isso o meu pedido anterior. 

Um abraço Xiko.

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sexta-feira, 4 de março de 2022

Guiné 61/74 - P23047: Pequeno resumo dos dois anos em que estive na guerra (Joaquim Jorge, ex-alf mil, CCAÇ 616 / BCAÇ 619, Empada, 1964/66) - III (e última) Parte: 1965: A reconquista da bolanha de Ualada e a construção do "Rancho da Ponderosa"


Guiné > Região de Quínara > Empada > CCAÇ 1587 (Cachil, Empada, Bolama e Bissau, 1966/68) > Ualada > Destacamento do "Rancho da Ponderosa> O soldado Jorge Patrício, à porta do destacamento.  Em 2009,  vivia em Viseu, aposentado da função pública. 

É a única foto que conhecemos do "Rancho da Ponderosa" (*)... Foi a CCAÇ 616, sob o comando do alf mil Joaquim Jorge, quem fundou  o "Rancho da Ponderosa", começando a construi-lo a partir de  17 de março de 1965, como ele nos explica neste poste. (**)

A CCAÇ 616 foi depois substituída, no subsector de Empada, pela CCAÇ 1423   entre janeiro de 1966 e novembro, com um pelotão  destacado em Ualada. Seguiu-se-lhe a CCAÇ 1587 e depois a CCaç 1787, a partir de janeiro de 1968 (***). Teve um pelotão em Ualada até março de 1968, 

A partir daquela data deixa de haver referências a Ualada nos livros da CECA. È possível que a tabanca terá sido abandonada pela população e o destacamento desativado no segundo semestre de 1968  na sequência da retração e racionalização do dispositivo no CTIG, no início do "consulado" de Spínola, altura (2º semestre de 1968/ 1º semestre de 1969) em que foram abandonadas outras posições como Ponta do Inglês, Gandembel, Ganturé, Cacoca, Sangonhá, Beli, Madina do Boé, Cheche... 
 
Foto : Cortesia do CM - Correio da Manhã, edição de 4/10/2009. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 


Brasão da CCAÇ 616 (Empada, 1964/66).
A divisa, em latim, "Super Omnia", quer dizer "acima de tudo".
Foto do álbum do Francisco Monteiro Galveia
(ex-1º cabo op cripto, vive em Fronteira)




CCAÇ 616 > Empada, 1964/66 > Pequeno resumo dos dois anos
em que estive na guerra (*)



por Joaquim Jorge


III (e última ) Parte - 1965: A reconquista da bolanha de Ualada 
e a construção do "Rancho da Ponderosa"


O ano de sessenta e cinco, ao contrário daquilo que esperávamos, não nos foi muito favorável; não no aspecto de ataques ao aquartelamento, mas na questão do trabalho e entradas em operações, coisa que tinha andado esquecida pelos “maiores” desde que entráramos em quadrícula. 

Diga-se, em abono da verdade, que uma Companhia quase independente como era a minha, não podia dispor senão de dois pelotões para operações, pois não íamos deixar o aquartelamento quase abandonado quando nos tinha custado suor, lágrimas e sangue para conquistarmos uma posição mais ou menos sossegada. Mas quem manda pode e vimo-nos obrigados a entrar em operações somente com os componentes da milícia e às vezes protegidos e ajudados pela força aérea. 

Era ideia fixa a conquista da bolanha de Ualada, há vários anos inculta e mais ou menos em poder do inimigo. Não haja a menor sombra de dúvida de que a única maneira de se acabar com a guerrilha é roubar ou reconquistar os fulcros da alimentação do inimigo. Bolanha é um campo ou vários campos de cultivo de arroz banhados pelo mesmo rio por meio de ouriques. 

A bolanha de Ualada, também chamada bolanha de São Miguel, que a nossa companhia cognominou de “Ponderosa”, em lembrança da série “Bonanza” da TV. cultivada na sua totalidade, dava para cima de vinte toneladas de arroz, arroz esse que viria acabar com o problema da fome em Empada.  [ A série  do faroeste "Bonanza", com a saga da família Cartwright,  proprietária do rancho da "Ponderosa", no Nevada, estreou-se, na televisão americana, em 1959; foi um extraordinário de caso de popularidade e longecidade; começou a ser exibida na RTP em 1961. (LG)]

Depois de várias divergências entre o coronel, comandante de sector,  e eu,  comandante da companhia,  apoiado pela população,  ficou decidido que iríamos ocupar Ualada para construirmos uma posição de autodefesa à bolanha…(mais à frente relataremos em pormenor esta divergência.)

Foi com muita ansiedade e espectativa que chegou o dia dezassete de Março, pois foi neste dia que chegámos a Ualada (“Ponderosa”), distante quatro quilómetros de Empada, com armas, pás, picaretas, arame farpado, chapas de bidão e algumas rações de combate,  prontos para a sua reconquista e instalação de um novo “quartel”. 

Coube ao 2º pelotão, comandado pelo alferes Pedro Oliveira e a um pelotão de milícias a permanência dos primeiros dez dias e nesses dez dias dormiram em buracos cavados no chão abertos no primeiro dia com chapas de bidão por cima para se protegerem de possíveis ataques. 

Rapidamente e com muito esforço,  a “Ponderosa” ganhou forma e a bolanha começou a ser preparada. Além dos buracos e abrigos construímos algumas casas para aquartelamento em adobes artesanais feitos com as mãos e os pés, pois não tínhamos utensílios necessários para a sua fabricação de outra forma. Mas foi uma obra feita com gosto e entusiasmo. 

Os pelotões eram rendidos de dez em dez dias e todos queriam fazer melhor que os anteriores. Tentámos construir o aquartelamento imitando o oeste americano que conhecíamos através da série televisiva “Bonanza”, por isso batizámos o aquartelamento por “Rancho da Ponderosa”. A bolanha começou a produzir e assim a render o benefício do esforço dispendido por nós, militares, pela milícia e pela população e a "Ponderosa" começou a crescer também como “Tabanca” e a fome desapareceu da população de Empada. 

Foi um grande orgulho para a Companhia 616 esta obra que mereceu a visita e a admiração do Governador General Arnaldo Schulz, de outras altas entidades militares, assim como da Embaixada Militar Americana em Portugal e ainda de uma equipa de jornalistas de “O Século” em cujo jornal foi publicada uma grande reportagem.

No período em que andámos ocupados com as obras da Ponderosa, os “grandes da guerra” deixaram de pensar na nossa companhia para outras operações. Pensámos então nós que a "Ponderosa" tinha sido a nossa tábua de salvação, mas assim não sucedeu. Quando a "Ponderosa" já não oferecia qualquer possibilidade ao inimigo,  voltámos às operações embora já com a companhia em precárias condições gerais de saúde.  
Operações como as que efectuámos em Aidará, Satecuta, Gã-Eugénia, Batambali, Darsalame e tantas outras, para não mencionar todas, não mais se apagarão das nossas memórias, tão gravadas ficaram pelo esforço, suor, sangue e lágrimas em todos os militares da Companhia de Caçadores 616.

Não há dúvida nenhuma de que a CCAÇ 616 fez um grande trabalho a nível militar e social durante os seus dois anos de comissão em Empada Não quero com isto dizer que a nossa companhia tenha acabado com a guerra nesta região. Esse não é trabalho para uma só companhia, mas sim para um efectivo militar muito maior e bem organizado. Todavia de todos os locais que pertenciam ao nosso subsector, só nos faltou “visitar” os acampamentos inimigos de Pobreza e Cachobar. 

Lembramos que a nossa área de acção foi o maior subsector do sul da Guiné, indo, no sentido este/oeste, de Antuane e Batambali até Darsalame e Madina de Baixo, não esquecendo de Pobreza para sul. Tudo isto dava uma extensão de cerca de quarenta quilómetros no seu maior comprimento. 

O convívio constante e fraternal e o nosso trabalho de apoio incondicional criaram a amizade e a confiança de todos os nativos. Estou a recordar-me agora de um acontecimento que mostrou bem a amizade e a confiança que toda a população de Empada votava em nós: No regresso da operação a Darsalame, considerado por todos uma aventura e um mito perigosíssimo, pois há três anos que lá não iam tropas, ao regressarmos e apesar da hora tardia, vinte horas, toda a população veio para as bermas da rua que dava para o aquartelamento agradecer, incitar e gritar por Empada e pela 616.

Depois de um esforço tão grande da nossa parte e do êxito alcançado, nada melhor para retemperar as forças do que ter ouvido os incitamentos e manifestações de alegria por parte daquela magnífica e saudosa população de Empada que sabia viver e reconhecer os momentos difíceis pelos quais atravessávamos. Na luta, no trabalho, na compreensão e na amizade,  o branco era de cor e o de cor era branco.

Apesar de tudo quanto sofri, sempre sentirei saudades da “querida” Empada.

Ferrel, 8 de Janeiro de 2022 – Dia do 58º aniversário da minha partida para a Guiné.



Guiné > Região de Quínara > Carta de Empada (1961) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Empada e, a sudeste, Ualada, onde a CCAÇ 616 passou a ter um pelotão destacado a partir de março de 1965. O destacamento foi batizado como "Rancho da Ponderosa". A bolanha de Ualala era também conhecida como bolanha de São Miguel.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2022)

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Notas do editor:


(**) Vd. postes anteriores da série > 


28 de fevereiro de 2022 > Guiné 61/74 - P23040: Pequeno resumo dos dois anos em que estive na guerra (Joaquim Jorge, ex-alf mil, CCAÇ 616 / BCAÇ 619, Empada, 1964/66) - Parte I: 1964: 30 de maio, um ataque de seis horas!

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Guiné 61/74 - P23040: Pequeno resumo dos dois anos em que estive na guerra (Joaquim Jorge, ex-alf mil, CCAÇ 616 / BCAÇ 619, Empada, 1964/66) - Parte I: 1964: 30 de maio, um ataque de seis horas!


Foto n.º 1 > Alguns dos ainda aspirantes a oficiais milicianos, do BCAÇ 619 , poucos dias antes do embarque para a Guiné: o 1.º da esquerda, sou eu, da CCaç 617; o 6.º é o médico da CCaç 617, Folhadela de Oliveira, o 7.º é o Montes, da CCaç 618 , o 8.º (e último), é o Joaquim da Silva Jorge, da CCaç 616.



Foto n.º 2 > Guiné > Bissau > Janeiro de 1964 > Alguns oficiais milicianos do BCAÇ 619: o 2.º sou eu e o 3.º é o Joaquim Jorge, assinalado com cercadura a amarelo.

Fotos (e legendas): © João Sacôto (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Joaquim Jorge, Ferrel, Peniche. 
Foto: LG (2015)


1. Mensagem de Joaquim [da Silva] Jorge, régulo da Tabanca de Ferrel / Peniche, ex-alf mil, CCAÇ 616, Empada, 1964/66, BCAÇ 619, Catió, 1964/66), bancário reformado, ex-autarca e ativista comunitário; tem 17 referências no blogue; entrou para a Tabanca Grande em 2015:




Brasão da CCAÇ 616 (Empada, 1964/65).
A divisa, em latim, "Super Omnia", quer dizer "acima de tudo". 
Foto do álbum do  Francisco Monteiro Galveia 
(ex-1º cabo op cripto, vive em Fronteira)  (*)


CCAÇ 616 > Empada, 1964/66 > Pequeno resumo dos dois anos 
em que estive na guerra 

por Joaquim Jorge

Parte I - 1964: 30 de maio, um ataque de seis horas!


Quando chegámos ao “mato”, a Empada, para rendermos a companhia de caçadores 417 (**), encontrámos, primeiro por conversas com os camaradas que iam embora e depois pelos acontecimentos que se seguiram, encontrámos, dizia eu, uma situação deveras alarmante não só na questão operacional como também no tocante à precária condição de existência dos três mil nativos que compunham a população local. 

Não quero dizer com isto que tenha havido negligência por parte dos nossos antecessores. Eles fizeram a sua obrigação; portaram-se como todos os outros e como nós, pois não éramos diferentes, mas a guerra tinha começado ainda não havia um ano e o número de inimigos crescia. 

Foi com séria apreensão que encetámos a nossa campanha em Empada, uma pequena “vila” no sul da Guiné. Sabíamos que mais dia, menos dia teríamos de nos encontrar com os nossos inimigos ou teríamos a sua visita sempre aborrecida pelas consequências que daí advinham para o nosso reduto, o que equivale a dizer para a “tabanca” de Empada. 

E o certo é que nossa apreensão inicial não foi iludida… Estávamos lá há quinze dias quando o inimigo deu o primeiro sinal de que não queria deixar, de pé para a mão, de pensar em destroçar pessoal ou palhotas (moranças) de Empada. 

Talvez por não terem sido bem sucedidos nesta primeira incursão vissem que da maneira como tinham actuado não podiam ter o êxito desejado; então reorganizaram-se, pediram reforços a outros locais seus afectos e na noite de trinta de Maio tentaram aquilo que eles consideravam o fim de Empada. 

Nós nessa altura éramos um tanto inexperientes, “maçaricos” como se dizia na gíria militar; a maior parte dos militares da companhia ainda não tinha tido o chamado, na guerra, “baptismo de fogo” e nas primeiras horas (pois o ataque durou seis!!!),  andámos confundidos no meio de tiroteio infernal. 

Graças a Deus não houve muito perigo para nós, pois além de estarmos entrincheirados nos abrigos ao redor do quartel, o fogo inimigo passava muito alto e, além disso, tínhamos em redor das “tabancas” um grande número de voluntários nativos armados que aguentavam a pé firme os primeiros embates. 

Raiava o último dia do mês quando tudo sossegou… E até meados de Julho deixaram-nos viver com relativo sossego, sossego esse aproveitado por todos nós, (oficiais, sargentos e praças) para ajudarmos a população na reconstrução da sua vida normal, interrompida pela constante aflição e preocupação no tempo dos nossos antecessores, pois não lhes era permitido ausentarem-se da “tabanca” para procurarem os alimentos e daí pode calcular-se a miséria que grassava em Empada…

Cheguei a contar numa refeição duzentas e cinquenta crianças, todas nuas, de lata na mão, a irem ao encontro da “vianda” (comida), feita pela Companhia propositadamente para elas… Era a psico-social em funcionamento e a recuperação da confiança em todos os nativos. Escoltas para manter a segurança aos civis nativos que iam ao cajú e à manga, frutos preponderantes na sua alimentação, e autênticas rusgas a oito e nove quilómetros de Empada para colheita de cola, elemento essencial na riqueza da Guiné, foram levadas a cabo para tentarmos amenizar a fome. 

Como já atrás referi, o inimigo “deixou-nos” mais ou menos e com algum condicionalismo trabalhar nesta missão civilizadora até ao dia dezasseis de Julho, altura em que tentaram por todos os meios e em força invadir e destruir a “tabanca” e o quartel de Empada, matando a população e os militares. Eram estes os seus objectivos. 

O anterior ataque de trinta de Maio ensinou-nos muito; fizemos em conjunto uma análise a tudo o que se passou nessa noite e agora estávamos mais experientes e preparados e tínhamos tudo organizado para os “receber”. Não tiveram qualquer espécie de sorte pois viram desaparecer do rol dos vivos mais de quatro dezenas de homens, além da perda de armas e munições. Foi, diga-se, o remate psicológico nas pretensões do inimigo pois pode considerar-se que não mais tentaram penetrar em Empada. 

Não quero dizer com isto que eles deixaram de nos “visitar”. Nada disso. Simplesmente quando iam era só com intenção de flagelar, e de longe, para não sofrerem de novo os reveses sofridos na heroica (para nós) noite de dezasseis para dezassete de Julho. Até aí e sempre nunca descurámos os patrulhamentos pelas redondezas, estranhando que “eles” não se atravessassem no caminho com emboscadas ou implantações de minas traiçoeiras na terra mole dos caminhos. Também mantínhamos o cuidado constante de cortar o capim e o mato ao longo dos caminhos para dificultar ao inimigo a montagem de emboscadas. Tudo tínhamos planeado para garantir a segurança da população e a resolução do problema da sua subsistência. 

E trabalhámos arduamente para a resolução destes dois problemas. Não saía do nosso pensamento a ideia da criação e organização de uma companhia de milícias com os homens e jovens de Empada. Como comandante de Companhia expus esta ideia ao comandante de Batalhão e ao Governador e Comandante-Chefe da Guiné General Arnaldo Schultz que me apoiaram plenamente. 

Numa população de cerca de três mil pessoas conseguimos a adesão de cerca de duzentos voluntários que durante os meses de Novembro e Dezembro receberam instrução militar dada pelos oficiais e furriéis da Companhia e conseguimos organizar duas companhias: a 6.ª Companhia de Milícias comandada por Dauda Cassama e a 7.ª Companhia de Milícias comandada por Malan Sambu que seguiu para Jabadá para apoiar o Batalhão sediado em Tite. Connosco em Empada ficou a 6.ª Companhia. Os comandantes de companhia Dauda e Malan bem como os comandantes de pelotão foram promovidos a “Alferes de Segunda Linha”. 

Todos os elementos da companhia de Milícias ou “Voluntários”, como nós lhes chamávamos, passaram a receber seiscentos e setenta e cinco escudos por mês  e nos dias em que faziam patrulhamentos ou outros tipos de operações militares tinham direito a alimentação. [675$00, em dinheiro da metrópole, em 1964, equivaleria hoje a 277,92 €;  na Guiné, o escudo ou o peso, sofria ums desvalorização de 10%. LG ]

Sem dúvida que a constituição das companhias de milícias veio alterar, por completo, a vida das gentes de Empada, pois o ordenado fixo mensal veio dar possibilidades à resolução do problema há tanto tempo em causa: o problema da fome. Subiu o nível de vida do nativo, embora alguns não tenham sabido aproveitar completamente essa ascensão.

(Continua)


Guiné > Região de Quínara > Carta de Empada (1961) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Empada e, a sudeste, Ualada, onde a CCAÇ 616 tinha um pelotão destacado, (*)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2019)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 14 de fevereiro de  2019 > Guiné 61/74 - P19495: Consultório militar do José Martins (39): Ficha do Batalhão de Caçadores 619 (Catió, 1964/66)

(**) Vd. poste de 22 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15780: Consultório militar do José Martins (18): Forças Militares Portuguesas que passaram por Empada

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Guiné 61/74 - P20246: Episódios da minha guerra (Manuel Viegas, ex-fur mil, CCAÇ 1587, Empada, Catió e Ilha do Como, 1966/68) - Parte I: O ataque ao destacamento avançado, "Rancho da Ponderosa", na tabanca de Ualada, subsetor de Empada


Guiné > Região de Quínara > Empada > CCAÇ 1587 (Cachil, Empada, Bolama e Bissau, 1966/68) > Ualada > Destacamento "Rancho da Ponderosa> O soldado Jorge Patrício, à porta do destacamento. A tabanca terá sido abandonada pela população e o destacamento desativado no segundo semestre de 1968 (, facto a confirmar), na sequência da retração e racionalização  do dispositivo no CTIG, no início do "consulado" de Spínola, altura (2º semestre de 1968/ 1º semestre de 1969) em que foram abandonadas outras posições como Ponta do Inglês, Gandembel,  Ganturé, Cacoca, Sangonhá, Beli, Madina do Boé, Cheche... (Em 2009, o José Patrício vivia em Viseu, já aposentado da função pública.)

O destacamento deve ter sido construído pela CCAÇ 1423 (RI 15, Tomar), que  ocupou o aquartelamento de Empada entre janeiro de 1966 e dezembro do mesmo ano, seguindo depois para o Cachil.  [Foi comandada pelo Capitão de Infantaria Artur Pita Alves, Capitão de Infantaria João Augusto dos Santos Dias de Carvalho, Capitão de Cavalaria Eurico António Sacavém da Fonseca, de novo Capitão de Infantaria João Augusto dos Santos Dias de Carvalho, e de novo Capitão de Infantaria Artur Pita Alves. Ostentou como Divisa “Firmes e Constantes”.]


(i)  a CCAÇ 616 (RI 1, Amadora), ocupou o aquartelamento entre abril de 1964 e janeiro de 1966, quando acabou a comissão. [Foi comandada pelo nosso grã-tabanqueiro , de Ferrel, Peniche,   alf mil Joaquim da Silva Jorge,  pelo cap mil inf  Francisco do Vale,  cap inf  José Pedro Mendes Franco do Carmo, de novo pelo alf mil inf Alferes Miliciano  Joaquim da Silva Jorge e cap cav Germano Miquelina Cardoso Simões; ostentou como Divisa “Super Omnia”]M

(ii) segui-se a Companhia de Milícias n.º 6, do recrutamento local, quem ocupou o aquartelamento entre Janeiro de 1965 e Dezembro de 1971, até à extinção da força.

Por informação posterior, do nosso amigo e camarada Joaquim Jorge, ficamos a saber que "quem "fundou e construiu a 'Ponderosa' foi a CCAÇ 616 da qual eu era comandante em 17 de Março de 1965."
Fonte: Cortesia do CM - Correio da Manhã, edição de 4/10/2009. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Bolama > Nova Sintra > 1972 > Entrada do quartel dos Duros de Nova Sintra, a CART 2711, 1970/72... É possível que este pórtico, "!Rancho dos Duros", tenha sido inspirado pelos vizinhos,  mais antigos, do "Rancho da Ponderosa", destacamento de Ualada, subsetor de Empada,  ao tempo da CCAÇ 1587 (1966/68).

Foto (e legenda): © Herlander Simões (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagen complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


[Foto à esquerda: Manuel Rosa Viegas, ex-Furriel da Companhia de Caçadores, nº 1587, Empada , Catió e ilha do Como, entre 1966 e 1968; vive em Faro; é o mais recente membro da Tabanca Grande, nº 798 (*)]


Episódios da minha guerra (Manuel Viegas, ex-fur mil, CCAÇ 1587, Empada, Catió e Ilha do Como, 1966/68) - Parte I:  O ataque ao destacamento avançado, "Rancho da Ponderosa", na tabanca de Ualada, subsetor de Empada.


É com profunda nostalgia e tristeza que irei narrar algumas das operações em que colaborei e ataques e flagelações que sofri.

O episódio que irei transcrever em 1º lugar, não é o que mais me marcou psicologicamente, mas sim fisicamente.

Estava colocado em Empada e calhou a primeira vez, juntamente com o meu pelotão , que estava no destacamento avançado,  a cerca de cinco quilómetros de Empada, de nome "Rancho da Ponderosa" (**).

Tinha como finalidade fazer a segurança a uma pequena tabanca [, Ualada, a sudoeste de Empada,]   e ao mesmo tempo servia para resguardar a retaguarda da companhia de Empada.

O Rancho tinha uma circunferência de duzentos metros aproximadamente , e era ladeado de abrigos . Ao aproximar-se o sol posto e após os soldados terem jantado , aproximei-me deles e disse-lhes para iram para os abrigos , mas alguns deles não gostaram muito e um deles ainda disse “ o furriel Viegas é sempre o mesmo” , e três ou quatro por represália foram para a capelinha que lá tínhamos.

Acabei por me dirigir a eles diplomaticamente e fazer-lhes ver que estava na hora do inimigo atacar, a muito custo abandonaram a capelinha , tendo ficado para trás o Manuel dos Santos , que por coincidência era dos que com quem eu me dava melhor . A capelinha ficava junto ao abrigo do morteiro 81, passados alguns minutos dos soldados se retirarem para os abrigos , quase simultaneamente, atacaram-nos de norte para sul com canhões sem recuo , talvez tenha sido a primeira vez que utilizaram os mesmos.

Entretanto eu saltei para o buraco do morteiro , e o Manuel dos Santos rastejou até ás granadas que estavam próximas do morteiro , mas tanto ele como eu não tínhamos experiência de mandar as morteiradas , foi a nossa sorte, a falta de experiência , estas caíram próximas dos nossos abrigos onde eles estavam a alvejar o aquartelamento. Além das granadas que lhes caíram em cima, os dos abrigos responderam com todo o material que tinham.

O ataque não demorou muito, cerca de vinte minutos,  eles foram bastante flagelado, deixando algum material abandonado na sua retirada .

Uma das granadas caiu no aquartelamento , em cima da mesa do refeitório onde tínhamos acabado de jantar, os pratos, os púcaros e os tachos ficaram todos furados.

Eles estavam preparados para dar um golpe de mão, e matar-nos a todos, só que as coisas correram mal para eles, para nosso bem. Só com um senão da nossa parte que fica para toda a vida,  o Manuel dos Santos ficou surdo oito dias e eu fiquei surdo de um ouvido, e tanto ele como eu ficámos com um zumbido para toda a vida.

PS. - Supomos que eles tinham tudo planeado para dizimar o Rancho do Ualada ("Ponderosa") , porque nessa mesma noite eles anunciaram na rádio que tinham feito uma limpeza total e só se safou um cão.

Aproveito para dizer que a minha companhia até ao dia do embarque trouxe três flâmulas de ouro, salvo erro quem trouxe mais do que nós foram os paraquedistas  [, do BCP 12,] com cinco.

Manuel Rosa Viegas,
ex-fur mil, CCAÇ 1587 (1966/68)



Guiné > Região de Quínara > Carta de Empada (1961) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Empada e, a sudeste, Ualala.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2019)
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Vd. postes de 


(...) Houve uma Companhia que em memória da célebre série da TV, "Bonanza",  fez um pórtico com o nome "Rancho da Ponderosa" e este vingou, ficando a ser conhecida por todo o branco como Ponderosa. 

(...) Em 1969 a Tabanca [, de Ualada, a sudoeste de Empada) ] estava deserta. Tinha sido abandonada e a população recolhida em Empada. Como tinha um bolanha muito produtiva, a população ia todos os dias para lá trabalhar nos campos de arroz e a minha Companhia fazia deslocar 2 Secções para o local, no sentido de proteger a população. Algumas das fotos que te envieiforam tiradas lá (, uma em cima de um bagabaga, pro exemplo). Vou ver se consigo um foto que já vi,  com o pórtico do Rancho da Ponderosa. (...)

9 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10643: Manuel Serôdio, ex-fur mil CCAÇ 1787 (Empada, Buba, Bissau, Quinhamel, 1967/68) (Parte V): O subsetor de Empada

(...) Ualada era uma tabanca junto à bolanha do mesmo nome, e junto à qual existiu um destacamento defendido por 2 grupos de combate. Tendo o destacamento sido abandonado e destru[ido pelas nossas tropas, a população de Ualada refugiou-se em Empada. (...)