Guné > Região de Gabu > Nova Lamego > Pel Mort 4574 (1972/74) > Eram tapetes, de estilo oriental, com motivos exóticos (como a fauna e a flora africanas), que os militares compravam aos comerciantes libaneses. Eles também aproveitaram a "economia de guerra"... Foto do álbum de Joaquim Cardoso [, ex-sold trms, Pel Mort 4574, Nova Lamego, 1972/74].

Guiné > 1956 > Amostra de anúncios de casas comerciais, pertencentes a sírio-libaneses ou seus descendentes. Foram publicados em Turismo - Revista de Arte, Paisagem e Costumes Portugueses, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2.
1. Os colonos na África Portuguesa não eram só cidadãos portugueses da metrópole (*), mas também das ilhas atlânticas (Madeiras, Açores e Cabo Verde) e igualmente estrangeiros como os libaneses, ou sírio-libaneses, sem esquecer os luso-indianos de Goa, Damão e Diu, e até os macaenses. Pode-se falar de um mosaico de povos para classificar a diversidade humana da colonização da África Portuguesa, de Cabo Verde a Timor.
É uma afirmação historicamente correta e de grande pertinência: a população de "colonos" na África sob domínio português não era composta exclusivamente por cidadãos da metrópole. Pelo contrário, estes territórios acolheram uma diversidade de gentes oriundas de várias partes do Império Português e de outras regiões, formando uma sociedade colonial complexa e multifacetada.
A Presença Libanesa na Guiné: Um Século de Comércio
A presença de comerciantes libaneses, e mais amplamente sírio-libaneses, na Guiné é um facto histórico bem documentado, que remonta à transição do século XIX para o século XX. Estes imigrantes desempenharam um papel fundamental e duradouro na estrutura comercial do território, hoje Guiné-Bissau.
A chegada destes levantinos enquadra-se num movimento migratório mais vasto, que os levou a estabelecerem-se na Amércia do Suil (com destaque para o Brasil) e em vários pontos da África Ocidental (com destauqe para a Costa do Marfim: maior comunidade libanesa na África Ocidental; muito presentes em Abidjan e no setor comercial).
O termo “sírio-libaneses” refere-se sobretudo à emigração anterior a 1920, quando a Síria e e o Líbano ainda eram parte do Império Otomano e depois do Mandato francês-
O Papel dos Comerciantes Sírio-Libaneses:
- Comércio de Proximidade: ao contrário das grandes companhias portuguesas (como a Casa Giouveia ou a Ultramarin), que se focavam na exportação de produtos como a mancarra (amendoim) e o coconote, os sírio-libaneses especializaram-se no comércio a retalho; montaram lojas e estabelecimentos nos principais centros urbanos e vilas do interior, como Bissau, Bolama, Bafatá, Teixeira Pinto, Bissorã, Farim, Geba, Bambadinca, Xitole, Jabadá, Catió, Cacine, Gadamael, etc.
- Rede de Distribuição: forneciam às populações locais bens de consumo importados da Europa, como tecidos, utensílios domésticos, e outros produtos manufaturados, a sua mobilidade e capacidade de se fixarem no interior permitiu-lhes criar uma rede capilar que penetrava profundamente no território;
- Impacto Económico: o seu sucesso foi notável; de acordo com registos da época, em meados do século XX, as firmas pertencentes a sírio-libaneses representavam uma fatia muito significativa, por vezes perto de metade, dos estabelecimentos comerciais em importantes centros de trocas do interior da colónia.
Esta comunidade, embora não numerosa em termos absolutos (umas escassas centenas., concentrados hoje em Bissau), teve um impacto desproporcional na vida económica e social da Guiné.
Os sírio-libaneses, que se começaram a radicar no território a partir de 1910, alguns acabaram por ligar-se, pelo casamento, a famílias portuguesas... Inicialmente não eram, porém, bem vistos pela concorrência nem até pelas autoridades locais.
Fontes...
Segue uma lista de fontes académicas e publicações que corroboram e aprofundam a informação sobre a presença de comerciantes sírio-libaneses na Guiné desde o início do século XX. Estas fontes são essenciais para quem deseja estudar o tema com rigor académico.
Fontes Académicas Específicas:
Janequine, Olívia Gonçalves. Os sírio-libaneses na Guiné Portuguesa, 1910-1926. Dissertação de Mestrado em História, Universidade de Évora, 2011.(*)
Resumo: Este é talvez o trabalho académico em língua portuguesa mais focado e detalhado sobre o início da presença sírio-libanesa na Guiné. A autora analisa a sua chegada, o estabelecimento das suas redes comerciais e a sua relação com a administração colonial e com as populações locais no período crucial de 1910 a 1926. É uma fonte primária.
Forrest, Joshua B. Lineages of State Fragility: Rural Civil Society in Guinea-Bissau. Ohio University Press, 2003.
Resumo: Embora o foco seja a sociedade civil e a formação do Estado, este proeminente historiador da Guiné-Bissau dedica várias passagens à estrutura económica da colónia. Ele descreve o papel fundamental dos comerciantes sírio-libaneses como intermediários económicos, destacando como eles preencheram um vácuo deixado pelas grandes companhias portuguesas, especialmente no interior.
Galli, Rosemary E. & Jones, Jocelyn. Guinea-Bissau: Politics, Economics and Society. Frances Pinter Publishers, 1987.
Resumo: Um estudo clássico sobre a Guiné-Bissau que, ao analisar a economia colonial, faz referência explícita à importância das comunidades de comerciantes estrangeiros, nomeadamente os sírio-libaneses, na estrutura do comércio a retalho.
Fontes sobre a Diáspora e Contexto Regional:
Leite, Joana Pereira. "Comerciantes sírio-libaneses em Moçambique: perfis e percursos de uma minoria." Revista de História da Sociedade e da Cultura, vol. 18, 2018, pp. 245-266.
Resumo: Apesar de o foco ser Moçambique, este artigo é útil porque contextualiza o fenómeno da migração sírio-libanesa para as colónias portuguesas em geral. Explica os padrões de migração, as redes familiares e os modelos de negócio que eram comuns a estas comunidades em toda a África Lusófona, incluindo a Guiné.
Boumedouha, Said. "Change and continuity in the relationship between the Lebanese in Senegal and the Mouride brotherhood." In The Lebanese in the World: A Century of Emigration, editado por Albert Hourani e Nadim Shehadi, I.B. Tauris, 1992.
Resumo: Este livro é uma obra de referência sobre a diáspora libanesa a nível mundial. O capítulo sobre o Senegal é particularmente relevante porque a Guiné-Bissau partilha muitas dinâmicas históricas e comerciais com a sua vizinhança na África Ocidental. Descreve o modelo de negócio dos comerciantes libaneses na região, que é perfeitamente aplicável ao caso da Guiné.
Estas fontes demonstram que a presença e a importância dos comerciantes libaneses e sírio-libaneses na Guiné-Bissau não são apenas um facto conhecido, mas também um objeto de estudo académico consolidado. A dissertação de Olívia Janequine (**), em particular, é a referência mais direta e aprofundada sobre o tema.
O governo não estava nada satisfeito com este sistema por considerar que os libaneses ganhavam demasiado com estes negócios de verdadeira exploração dos produtores locais. Considerava também que as pequenas quantidades transportadas não eram economicamente viáveis na perspetica da exportação em grande escala.
Ambos os problemas foram resolvidos com um plano que previa a nacionalização do comércio por grosso e a retalho e o transporte das mercadorias a realizar por camiões modernos.
Claro está que foi a Suécia quem, a meu pedido, veio a fornecer umas dúzias de moderníssimos camiões Volvo, desembarcados em Bissau em poucos meses.
Estes camiões último modelo,com ar condicionado, rádio estereofónico e confortável cabine para o condutor dormir, eram naves espaciais aos olhos da populção, e depressa se tornaram num instrumento de "engate" das belezas locais nas ruas de Bissau.
Durante uns tempos era mais importante esta "mercadoria" do que os tradicionais produtos de plástico e tecidos a serem transportados para o interior.
Se o problema tivesse sido só esse, as coisas näo teriam sido tão graves. Mas...quando os camionistas mais consciencios finalmente se puseram a caminho do interior (o que não deveriam ter feito!), concluiu-se que as estradas existentes ["picadas",] não foram feitas para estes mastodontes ma sim para as carrinhas Peugeot.
Todos os tipos imagináveis de problemas surgiram, acabando por liquidar este tipo de transporte. Em menos de seis meses todos os camiões Volvo estavam parados.
Sendo as marcas de camiões Volvo e Scania as mais vendidas mundialmente, e utilizadas nas condições mais extremas, foi enviada a Bissau uma equipa de mecâncios para estudar o problema surgido.
Chegou-se à conclusão de que, para além dos problemas quanto ao peso que as estradas não suportavam, ambém tinham surgido pequenos problemas de manutenção das viaturas, do tipo: esqueceram-se de mudar o óleo, houve componentes dos motores que desaparecera, etc.
Com a falta de intermediários tradicionais, como os comerciantes libaneses, os camponeses não conseguiam escoar a sua produção, pelo que se voltaram a concentrar-se na produção para consumo local.
O arroz passou a não chegar para alimentar a população de Bissau. Aí a coisa tornou-se grave!
Telegrafei de imediato para os escritórios centrais da SIDA (que são as iniciais ou o acrónimo da Agência Estatal Sueca para a ajuda aos países em vias de desenvolvimento) e, em muito curto espaço de tempo, tínhamos em Bissau um barco fretado, chinês, que transportava 3 mil toneladas de arroz para que a população não morresse de fome.
Estou a simplicar mas as coisas passaram-se basicamente assim.