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terça-feira, 6 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24372: História da CCAÇ 2402 (Có, Mansabá e Olossato, 1968/70) (Coordenação: Raul Albino, 1945-2020) - Textos avulsos - Parte II: A imaginação que era preciso ter para se comer "atacadores da PM com estilhaços"!... Trocando carne do restaurante "Solar dos 10", em Bissau, por produtos locais de Có (camarão, ostras, tomate...) (Mário Vargas Cardoso, 1935-2023)

Pombal > 28 de Abril de 2007 > II Encontro Nacional da Tabancva Grande  > Dois representantes da CCAÇ 2402/ BCAÇ 2851 (1968/70), o Raul Albino (1945-2020)  (assinalado com um círculo a amarelo) e o Maurício Esparteiro (a verde)... (Na foto, há outros camaradas que já nos deixaram, além do Raul Albino: Jorge Cabral, Carlos Santos, Fernando Franco, Victor Barata... Mas outros, felizmente ainda estão vivos!)

Foto (e legenda): © Luís Graça (2007). Todos os direitos reservados. [Edição : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1.  O nosso saudoso camarada e amigo Raul Albino (1945-2020), ex-alf mil at inf, MA, CCAÇ 2402 (Có, Mansabá e Olossato, 1968/70), publicou ainda em vida dois volumes com a história da sua unidade. 

O Raul Albino com a ajuda do fotógrafo Maurício Esparteiro (vd. foto acima) concebeu e realizou uma ideia original: um livro da CCAÇ 2402 onde todos e cada e um são gente... Do capitão ao soldado básico, toda a gente teve lá a sua foto, o seu espaço (*)... 

Além disso, cada um dos camaradas da CCAÇ 2402 podia ter uma versão única e original do livro, com registos exclusivos sobre a sua pessoa... Com uma pontinha de orgulho, o Raul e o Maurício mostraram-me, no encontro em Pombal, em 2007,  um exemplar do seu livro: cada exemplar saíu da tipografia a 8 euros, sendo vendido a 10 euros, para cobrir as quebras e as borlas ...

No II Volume, que continuou a ter  a coordenação fotográfica do Maurício Esparteiro, o Raul contou ainda com a participação especial do ex-cmdt da companhia, Vargas Cardoso, e do ex-fur mil SAM, João Bonifácio.  

Hoje publicamos mais dois pequenos textos do Mário Vargas Cardoso (1935-2023), ex-cor inf ref, que há dias nos deixou, e que ilustram bem o sentido da divisa dos "Lynces de Có": "Se é impossível, há de fazer-se" (**)...

No nosso blogue, o Raul Albino também já havia publicado, no devido tempo, 18 postes com episódios da história da CCAÇ 2402 (***).

Mário Vargas Cardoso (1935-2023)


50 kg de tomate produzidos por dia na bolanha de Có...

Ao chegarmos a Có, os indígenas começaram a aparecer com tomates do tamanho de batatas novas, pois não sabiam plantar tal fruto.

Então a Companhia com as sementes que levávamos, começou por fazer os viveiros em caixotes e o Moreira e o Ferreira, salvo erro,  encarregavam-se de chamar as indígenas (as mulheres é que trabalhavam na lavoura) e ensiná-las a fazer o viveiro, até as plantas terem determinada altura.

Depois era preparar o chão e transpalntar essas plantas de forma ordenada e com espaços entre os pés dos tomateiros; regar quando preciso; encanar as plantas quando começavam a precisar de apoio; continuar a regar; e colher quando estivessem em condições de o fruto ser apanhado...

Como se devem recordar,  algumas semanas depois, naquela bolanha para o rio, em Cõ já se produziam mais de 50 kg de tomate por dia...


... que chegámos a trocar, com outros produtos locais (camarão e ostras), com o restaurante "Solar dos 10", de Bissau

Uma das dificuldades com que nos deparámos na Guiné, todos se lembram, era no respeitante à possibilidade de obter produtos frescos...

Todos se recordam que,  desde o início da comissão, exceto no período que estivemos em Mansabá, sempre tivemos uma horta cavada e tratada pelos nossos militares. 

Mas no respeitante a carne, a situação era muito difíciil. As populações não produziam gado para vender aos militares. Para eles  o gado era uma riqueza pessoal.

A Manutenção Militar tinha dificuldade em enviar carne fresca, para as unidades instaladas no mato, e estas tinham de se "desenrascar". 

Mas os "Lynces de Có", que às vezes se viam obrigadas a "requisitar" alguma vaca aos africanos, pagando ao preço estipulado pelo Governo da Pronvíncia, também utilizaram outros processos legais.

Lembro-me que, por duas vezes, se a memória não me falha, conseguimos carne vinda de Bissau, de forma expedita mas arcaica. 

Então o processo foi este: através do Bonifácio [ o fur vagomestre, nosso tabanqueiro, a viver hoje no Canadá encomendámos às indígenas que nos trouxessem ostras, camarão e tomate. Entretanto,, via rádio, para o delegado do nosso batalhão em  Bissau, de acordo com código que estabeleci com ele, pedia-lhe para obter junto do sr. proprietário do restaurante "Solar dos 10", peças de carne e levá-las em dia combinado, até João Landim, local onde se fazia a cambança do rio Mansoa, na jangada ali existente,

Por sua vez, a Companhia organizava uma coluna que, saindo de Có, levava tudo o que se fosse necessário mandar para Bissau, mais os produtos que os indígenas nos vendiam: 20 kg de camarão; 1 pipo de vinho cheio de ostras, e 80 kg de tomate.

Para a troca trazíamos para  Có cvrne que o deleghado pedira ao "Solar dos 10", que por sua vez nos ficava com os produtos que referi. E assim sempre se podia comer "os atacadores da PM [leia-se: esparguete...]  com estilhaços"...

Vargas Cardoso, ex-cmdt, CCAÇ 2402 (Cõ,. Mansabá er Olossato, 1968/70)


[Seleção / Revisão e fixação de texto / Subtítulo / Negritos ( Parèntses retos: LG]
___________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

23 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1105: Como escrever um livro de memórias de guerra 'à la carte' (Raul Albino, CCAÇ 2402)

4 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1246: O meu livro Memórias de Campanha da CCAÇ 2402 (Raul Albino)

(**) Último poste da série >  5 de junho de 2023 > Guiné 61/74 - P24368: História da CCAÇ 2402 (Có, Mansabá e Olossato, 1968/70) (Coordenação: Raul Albino, 1945-2020) - Textos avulsos - Parte I: Tempo(s) de Homofobia(s) (Mário Vargas Cardoso, 1935-2023)

(***) Vd. último poste da série > 19 de setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7010: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (18): Terceiro ataque ao Olossato

sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Guiné 61/74 - P23559: Notas de leitura (1480): "Panteras à solta", de Manuel Andrezo (pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade): o diário de bordo do último comandante da 4ª CCAÇ e primeiro comandante da CCAÇ 6 (Bedanda, 1965/67): aventuras e desventuras do cap Cristo (Luís Graça) - Parte II: "Homem gosta de ter mulher na cama, quando vem da guerra", lembra a "Tia", a mulher grande...

Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 ("Onças Negras") > Agosto de 1972 > O obus 14

Foto (e legenda): © Vasco Santos (2011). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem comlementar:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Tombali > Bedanda > 1969 > Álbum fotográfico do João Martins > Foto nº 125/199 > Casa do chefe de posto... Em 1965, o chefe de posto era o Fernandes, cabo-verdiano. A localidade tem possuía um posto de rádio, permitindo fazer ligações telefónicas com Bissau e Lisboa.


Foto (e legenda): © João José Alves Martins (2012)  Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Imagem à direita: capa do livro "Panteras à solta: No sul da Guiné uma companhia de tropas nativas defende a soberania de Portugal", de Manuel Andrezo, edição de autor, s/l, s/d [c. 2020] , 445 pp. , il. [ Manuel Andrezo é o pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade, ex-cap inf, 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, Bedanda, 1965/67. ]



1. Sobre Bedanda, no sul da Guiné, região de Tombali, temos cerca de 160 referências. Mas apenas uma vintena sobre a 4ª CCAÇ, também conhecida por 4ª CCAÇ I (4ª Companhia de Caçadores Nativos ou Indígenas).  

Segundo informação do Jorge Araújo, foi criada e instalada primeiramente em Bolama em finais de 1959, tendo-se mudado em julho de 1964 para Bedanda, por necessidades operacionais.  Três anos após a instalação dos seus primeiros efectivos em Bedanda, esta unidade é renomeada, em 1 de abril de 1967, passando a designar-se por Companhia de Caçadores n.º 6 [CCAÇ 6, "Onças Negras"] (vd. postes  P18387 e P18391) (*).

Segundo a CECA (2002) (**), era uma subunidade da guarnição normal, com existência anterior a 1jan61, sendo constituída por quadros metropolitanos e praças indígenas do recrutamento local, e estando enquadrada nas forças do CTIG então existentes. Em 1jan61, estava instalada em Bolama, com um pelotão destacado em Bedanda.

Em 8abr61, iniciou o deslocamento para Buba, onde foi colocada temporariamente, a partir de 6mai61. Em 3jul61, foi transferida para Bedanda, mantendo um pelotão em Buba, até à chegada da CCaç 152, em 28jul61.


Entretanto, iniciou a instalação de forças em várias localidades da zona Sul, nomeadamente em Bolama, Bedanda, Cacine, Aldeia Formosa, Gadamael e Tite, as quais foram recolhendo à sede após substituição por outras forças, ou sendo deslocadas, para outras localidades, como Catió, Chugué e Caboxanque.

A partir de 25jul61, foi integrada no dispositivo e manobra do BCaç 237 e depois sucessivamente no dispositivo dos batalhões e comandos instalados no sector. Tomou ainda parte em diversas operações realizadas nas regiões de Caboxanque, Chugué, Bochenan, entre outras. 

Lamentavelmente, não tem história da unidade. Teve pelo menos 10 comandantes, até 1abr67 (quando passou se designar-se por CCAÇ 6):


2. Estamos agora a ler as memórias (em parte ficcionadas) do capitão Cristo, "alter ego" do cap inf Aurélio Manuel Trindade (hoje ten gen ref), de acordo com o livro cuja capa publicamos acima, da autoria de Manuel Andrezo (pseudónimo literário),  "Panteras à solta",  edição de autor, s/l, s/d [c. 2020] , 445 pp. (**).

Segundo informação do seu amigo e camarada cor inf ref Arada Pinheiro (que me emprestou o seu exemplar autografado), o livro não está à venda em Portugal, foi impresso na Alemanha. Pelo menos um exemplar foi doado à biblioteca da Academia Militar. 

Mas falando das "aventuras e desventuras" do cap Cristo, que vivia em Bedanda, nas barbas do "reino do Nino"... (Já no final da comissão irá conquistar e  destruir Calobol Balanta, até então um dos baluartes da tropa do Nino: vd.  "Reino do Nino", pp. 396-409).

O cap Cristo chegara a Bedanda, em rendição individual, em 6 de julho de 1965, e a sua primeira preocupação foi ganhar a confiança e o respeito dos seus subordinados bem como da população da localidade, que era sede de circunscrição administrativa (ou apenas posto administrativo ?), mas estava então  rodeada de "guerrilheiros" por todos os lados (curiosamente nunca usa o termo, pejorativo, "turras", mesmo sendo inplacável para eles).

 Parte da população sobre o controlo do PAIGC (nomeadamente as "mulheres do mato", que viviamm em Cobumba) vinham, em meados de 1965,  a Bebanda fazer compras (cana e tabaco),  e vender também os seus produtos (arroz, etc.). 

Cabolol, Cobumba e Chugué, na margem norte do rio Cumbijã, eram alguns dos pontos fortes controlados pela guerrilha. Na margem sul, destacava-se  Caboxanque (em pleno Cantanhez), Incala,  Nhai e Salancaur... O aquartelamento das NT, mais próximo, era Cufar. Bedanda tinha um problema demográfico: havia mais homens do que mulheres. E, alegadamente por razões de segurança, ninguém cultivava a rica e extensa bolanha. 

Uma das medidas que o capitão vai tomar,  é.. a "reforma agrária" (pp. 85-92). As ricas bolanhas de Bedanda eram outrora cultivadas pelos balantas. Em 1965, a população era predominantemente fula, e não produzia nada para comer.  Os homens viviam da guerra: eram guias, picadores, milícias... 

As mulheres, por seu turno, eram lavadeiras, "lavadeiras para todo o serviço" (sic)  (pág. 85): "Lavavam a roupa dos militares e iam para a cama com eles", coisa que o capitão até nem via com maus olhos: "Nada tinha contra o facto dos soldados terem a sua lavadeira para todo o serviço". 

(...) "Os militares eram quase todos nativos, mas havia alguns brancos, cabos especialistas, e quase todos os sargentos. Brancos eram todos os oficiais. Todos tinham a sua lavadeira, Por vezes havia problemas com os militares e a população que o capitão tinha que resolver em ligação com o régulo Samba" (...).

Veremos oportunamente como o capitão, beirão e de origem camponesa, vai resolver o difícil problema de ter uma população sob o seu controlo que vivia pior (passava fome) do que a população do "mato"...

(...) "Do lado deles [da gente do mato]  não havia falta de arroz, mancarra, mandioca e óleo.  Do lado da tropa tinham apenas cana, tabaco e panos que os comerciantes traziam de Bissau. e o arroz que compravam às mulheres  dos guerrilheiros" (pág. 87).

A solução encontrada  pelo cap Cristo (de tipo "topdown", de cima para baixo, mas contando com a cumplicidade da Tia, das mulheres  e do régulo, este último a princípio renitente) foi acabar com a "malandragem" que, em Bedanda,  só vivia da guerra...e pôr toda a gente a lavrar arroz, mancarra, mandioca...

Os abastecimentos eram  feitos por via fluvial, por barcos civis com apoio da marinha e da força aérea.  Bedanda tinha dois portos fluviais, o "interior" (rio  Ungarinol, afluente do rio Cumbijã, a 200 metros da povoaçao) e o "exterior" (rio Cumbijã), a cerca de 4 km. O abastecimento mensal, feito através do porto exterior, equivalia a uma verdadeira operação a nível de companhia. O porto interior deixara, há muito, de ser utilizado por razões de segurança, e oposição da Marinha.  O cap Cristo vai quebrar, por fim, o mito de que não era navegável o rio Ungarrional ("A Marinha reabastece Bedanda", pp. 93-103). 

O livro tem apontamentos saborosíssimos (e de interesse documental)  sobre a situação étnica, social, económica e militar de Bedanda, bem como sobre as tropas (uma companhia e um pelotão de milícia, para além de um pelotão de artilharia) que defendem a povoação, outrora parte do chão balanta, Em 1965, a maioria da população era fula, oriunda de várias partes da Guiné, e "principalmente da mata do Cantanhez onde o domínio dos guerrilheiros tem sido evidente" (sic) (pág. 17).

Samba Baldé, o régulo, ele próprio fugiu do Cantanhez, "deixando terras, gado e casa, para não ser obrigado a colaborar com os guerrilheiros".  Bedanda tinha, nessa altura, 4 casas comerciais, sendo as duas mais importantes a Ultramarina e a Gouveia, A Ultramarina tinha à sua frente o Zé Saldanha, "um mulato muito inteligente", e que se dava bem com a tropa. A mulher, Inácia, balanta, era uma excelente cozinheira, a cujos serviços o cap Cristo irá recorrer várias vezes (nos seus dois anos passados em Bedanda). 

O encarregado da Casa Gouveia, por sua vez, era  "um cabo-verdiano mal encarado", de seu nome Fernandes. com fama de jogar com pau de dois bicos (de resto, como quase todos os comerciantes da Guiné)... A sua secretária também era a telefonista: havia um posto de rádio permitindo fazer ligações a Bissau e a Lisboa. 

O cap Cristo teve a preocupação de, logo no início, e ainda na presença do anterior comandante que ele veio substituir, o cap Xáxa, de ir "partir mantenhas" (apresentar cumprimentos) com todas as forças vivas de Bedanda, incluindo a "mulher grande", conhecida por a "Tia" (pág. 19). 

Merece uma página de antologia a sua apresentação e as primeiras "trocas de galhardetes" entre os dois... Veja-se só este diálogo, delicioso e pícaro, em português acrioulado, entre a Tia e o cap maçarico (ainda não se usava o termo periquito) (pág. 19):

− Então, nosso capitão é maçarico. Eu já gosto do nosso capitão maçarico. Se precisar de alguma coisa pede à Tia. Tia arranja tudo para nosso capitão. Se nosso capitão gostar de alguma mulher da tabanca não fale com ela pois o marido e o pai pdoem desconfiar. Fale comigo e eu depois trago mulher a minha casa para nosso capitão.

− Está bem, Tia, mas desconfio que não vai ser preciso  responde  o capitão Cristo.

 Vai, vai, nosso capitão não tem mulher e não pode viver aqui sem sem mulher. Homem gosta de ter mulher na cama quando vem da guerra. Nosso capitão vem até minha casa. Se quiser mulher eu arranjo, se não quiser fica aqui a descansar" (...)

(Continua)
_____________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:


8 de março de  2018 > Guiné 61/74 - P18391: (D)o outro lado do combate (21): "Plano de operações na Frente Sul" (Out - dez 1969) > Ataque a Bedanda em 25 de outubro de 1969 (ao tempo da CCAÇ 6, 1967-1974) - II (e última) Parte (Jorge Araújo)


sábado, 16 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23173: Humor de caserna (49): Mensagem, de 13/3/1971, enviado pelo Cap Art Gaspar, cmdt da CART 3330, à Manutenção Militar, c/c ACAP, Com-Chefe, CAOP1 e BCAÇ 2928: "Maior respeito boa vontade Vexa. Verifico todo peixe estragado, ovos com pintos, etc. Ir buscar estes implica risco vida. Ou monto aviário ou entre acordo. Pronto colaborar todo sacrifício. Estou com o pessoal destruído moralmente. Julgo compreendeu." (Ernestino Caniço)

 


88/C/71

Maior respeito boa vontade Vexa. Verifico todo peixe estragado,  ovos com pintos, etc. Ir buscar estes implica risco vida. Ou monto aviário ou entre acordo. Pronto colaborar todo sacrifício. Estou com o pessoal destruído moralmente. Julgo compreendeu. Cap Gaspar


Foto (e legenda): © Ernestino Caniço (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. M
ensagem do nosso camarada Ernestino Caniço:

 (i) ex-Alf Mil Cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2208, Mansabá e Mansoa; Rep ACAP - Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológica, Bissau, fev 1970/dez 1971;

(ii) hoje médico, aos  77 anos teima em continuar ao serviço dos outros,  de acordo com o seu juramento hipocrático; 

(iii) vive em Tomar, estando reformado do SNS ]


Data: 15 abril 2022 17:25  

Assunto - Major Gaspar

Caros amigos:

Votos de ótima Páscoa.

Face ao citado humor do Major Gaspar (*), ocorreu-me enviar-vos um excerto de uma mensagem dirigida pelo então  Cap Gaspar à Manutenção Militar, em 13mar1971, enquanto Cmdt da CART 3330.

A referida mensagem foi enviada com conhecimento à ACAP (Assuntos Civis e Acção Psicológica), COMCHEFE, CAOP1 e BCAÇ 2928.

Sendo um fragmento de um documento original, aquilatareis vós do seu interesse.

Um abraço,

Ernestino Caniço

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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Guiné 61/74 - P22975: Notas de leitura (1417): “A crise alimentar e o estado socialista na África Lusófona”, por Rosemary E. Galli, artigo publicado na Revista Internacional de Estudos Africanos, n.º 6 e 7, Janeiro/Dezembro de 1987 (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Fevereiro 2019:

Queridos amigos,
Muitos dos sonhos e promessas dos líderes do PAIGC revelaram-se impraticáveis, Rosemary Galli estudou aprofundadamente o modelo de desenvolvimento rural seguido na colónia portuguesa e depois, nos regimes de Luís Cabral e Nino Vieira, disseca as lógicas de funcionamento, o que os líderes do PAIGC pretendiam e o que rotundamente falhou no modelo produtivo e exportador, como recaiu sobre os camponeses o ónus da reconstrução e como estes viraram as costas ao sistema estatal. É preciso ter investigado muito para sintetizar e tirar as conclusões de estratégias que falharam e que, pior do que tudo, comprometeram o desenvolvimento rural da Guiné-Bissau no médio a longo-prazo.

Um abraço do
Mário



A economia guineense: Do desenvolvimento colonial a Nino Vieira (2)

Beja Santos

Devemos à investigadora norte-americana Rosemary Galli uma poderosa análise do desenvolvimento rural da Guiné-Bissau, as suas pesquisas e reflexões são altamente fundamentadas e profundamente incómodas para as decisões políticas tomadas por sucessivos governos guineenses depois da independência. Vimos no texto anterior um resumo do quadro histórico da agricultura na Guiné-Bissau a partir da colonização portuguesa e da lógica que imperou no Estado Novo.

A guerra de libertação nacional, como é óbvio, condicionou o modelo produtivo e, consequentemente, o modelo exportador. Durante a guerra houve migração em grande escala: ainda hoje não se sabe ao certo o número daqueles que fugiram para o Senegal e para a Guiné-Conacri; dezenas de milhares foram para Bissau; constituíram-se reordenamentos que, de algum modo, alteraram o figurino das produções agrícolas; e uma grande quantidade de jovens abandonou as suas casas para se juntar aos combatentes pela libertação; houve bombardeamentos dos diques e invasão dos arrozais pela água salgada.

A maior parte do peso da reconstrução do pós-guerra recaiu sobre os camponeses: a reparação de diques exigiu capital e mão-de-obra em grandes quantidades; foi preciso passarem alguns anos até a água das chuvas dessalinizar os campos de arroz; os camponeses não tinham economias e contaram com pouca ou nenhuma ajuda do Governo. O investimento do Governo em infraestruturas económicas foi mínimo. Entre 1975 e 1980, quase não houve qualquer extensão do sistema rodoviário. O olhar de Rosemary Galli vai em todas as direções, o seu balanço sopesa o sistema de transportes, as infraestruturas, o abastecimento e os preços. Lembra que o melhoramento do sistema fluvial teria representado uma grande ajuda para o setor camponês das zonas orizícolas do sul. Antes do século XX a maior parte do comércio fazia-se através das rias, depois da independência quase nada foi feito para revitalizar este sistema de comunicação. A frota era velha e encontrava-se principalmente nas mãos do Estado, os autocarros e camiões propriedade do Estado cedo ficaram inoperacionais e com falta de manutenção apodreceram. 

O PAIGC procurou substituir com a sua própria rede de lojas a Casa Gouveia e as casas comerciais autorizadas pelo Governo em cada área que libertava. Depois da guerra os chamados Armazéns do Povo tomaram conta da Casa Gouveia e de uma sociedade comercial de capital estatal e privado, a SOCOMIN, para complementar as atividades dos Armazéns do Povo. O sistema revelou-se extremamente inconveniente, supercentralizado, ineficiente e corrupto. E, pior do que tudo, não chegava de facto aos produtores rurais. Atribui-se as causas da ineficácia a uma política de importações inadequada, à inexperiência dos gestores do sistema e a uma má distribuição dos produtos entre os diferentes setores. E a política de preços foi determinante para o insucesso. Embora o PAIGC tivesse elevado os preços ao produtor após a independência, estes não acompanharam a subida dos preços dos poucos produtos importados que chegavam ao campo. O poder de compra dos camponeses em 1983 era menor do que na altura da independência. Uma barra de sabão importado custava cerca de um dólar no mercado oficial. Isto significava que o seu preço para os camponeses era 3,5 kg de arroz ou 5 kg de amendoim. Para um camponês, três quilos de arroz equivaliam à alimentação de uma semana. Uma lata de leite em pó de 2,5 kg custava cerca de 10 dólares ou quase 37 kg de arroz e/ou 49 kg de amendoim.

Para a investigadora, a política agrícola seguida na Guiné-Bissau a seguir à independência revelou a continuação de muitas das políticas do Estado Novo e fundamentalmente pelas mesmas razões: aumentar as receitas para pagar à administração estatal e para investir na indústria. O malogro foi de tal ordem que foram destruídas as oportunidades a longo-prazo para o desenvolvimento agrícola, os produtores exportavam à candonga, levaram os seus produtos para fora do país. O golpe militar de novembro de 1980 prometia alterar todo este estado de coisas, o Conselho da Revolução que tomou o poder pediu ao Governo uma retificação da sua política. A reestruturação que se pretendeu imprimir em 1982 assentava em que as importações ficariam sob o controlo do Estado através da Companhia de Comércio Externo, seguir-se-ia uma política de importações em que 80% das divisas iriam para itens de subsistência básica e seriam geridas pelo monopólio estatal; os Armazéns do Povo e o SOCOMIN conheceriam restruturação, um para tomar conta do comércio externo e a outra o comércio interno, ficando o comércio a retalho completamente nas mãos de comerciantes privados.

A conclusão da investigadora é implacável: o que veio a acontecer foi o afastamento dos administradores estatais, perderam o contato direto com os produtores; o novo Governo fez muitas mudanças de pessoal nos anos de 1980 para combater a corrupção, mas era evidente que a estrutura do poder não tinha mudado e o mesmo se pode igualmente verificar na política de câmbios, tudo falhou com as sucessivas desvalorizações da moeda. “Investigações realizadas pela autora sobre os dois principais projetos de desenvolvimento orizícola revelaram que parte do equipamento e parte do arroz dos projetos já tinham sido trocados pelos bens básicos que faltavam na área. A investigação sobre o principal projeto de desenvolvimento do amendoim mostrou que a introdução da tração animal não produziu o crescimento das culturas esperado. Pelo contrário, permitiu que os jovens partissem mais cedo do que o habitual para irem participar na colheita de amendoim no Senegal. A emigração, quer temporária quer permanente, e o contrabando, constituem os sinais de uma luta passiva contra as políticas de acumulação primitiva que prometiam tanto mas deram tão pouco”.

Enfim, conclusões bem tristes para um país a quem fora prometido uma libertação com melhores condições de vida.

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Nota do editor

Último poste da série de 4 DE FEVEREIRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P22967: Notas de leitura (1416): “A crise alimentar e o estado socialista na África Lusófona”, por Rosemary E. Galli, artigo publicado na Revista Internacional de Estudos Africanos, n.º 6 e 7, Janeiro/Dezembro de 1987 (1) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 28 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20913: Da Suécia com saudade (69): Eu destrui um país [em sueco, "Jag har förstört ett helt land"], por Patrik Engellau... (José Belo)


Guiné-Bissau > Bissau > 2020 > Afribaba > Anúncio de venda de "Camião Volvo, de 20 toneladas, báscula para dois lados, com motor,  arroçaria e caixa em muito bom estado". Preço: 9 100 000 CFA (cerca de 13 870 euros, ao câmbio de hoje, 1 euro = 655,96 CFA).  Anunciante: Afribaba.(Reproduzido com a devida vénia...)


1. Mensagem de  José Belo,  ex-alf mil inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, e manteve-se no ativo, no exército português, durante uma década; está reformado como capitão inf do exército português; jurista, vive entre (i) Estocolmo, Suécia, (ii) nas imediações de Abisco, Kiruna, Lapónia, no círculo polar ártico, já próximo da fronteira com a Finlândia, e (iii) Key-West, Florida, EUA; é o único régulo da tabanca de um homem só (, mas sempre bem acompanhado das suas renas, dos seus cães e dos seus ursos)

Data: sábado, 25/04, 20:16



Assunto: : "Eu destruí completamente um País" (*)


Luís: seguem as as declaracões de Patrik Engellau, um alto quadro do funcionalismo público sueco, sobre a Guiné-Bissau.. Junto foto dele, Patrik Engellau em artigo publicado no "Alla Skribenter", 27 dezembro de 2015. Faço uma tradução adaptada do artigo. Atenção aos muitos erros ortográficos na língua de Camões, por mim pouco usada há muitas décadas, a pedir benevolências extras quando escrita sobre o joelho nesta tradução do sueco original.



Ámen, J.Belo


2. Eu destrui um país [em sueco, "Jag har förstört ett helt land"]

"Alla Skribenter", 27 de dezembro de 2015.

por Patrik Engellau


Trabalhei durante cerca de 10 anos na ajuda económica ao Terceiro Mundo, primeiro nas Nações Unidas e depois  na agência sueca para o a cooperação internacional e o desenvolvimento (SIDA - Swedish International Development Cooperation Agency), em países como o Brasil, Índia, Etiópia, e por último como chefe na embaixada sueca em Bissau.

Cheguei a Bissau em 1976, com 50 milhões de coroas suecas, no bolso, por ano,  para apoio económico (,hoje equivalente a cerca de 250 milhões). Isto foi mais ou menos na mesma altura em que o novo governo guineense tomava posse após a queda do império português.

A Guiné-Bissau era um dos países favoritos da Suécia. Tanto a União Soviética como a Suécia tinham feito grandes doações ao PAIGC, o movimento de libertação de orientação socialista, agora no poder. Mas a Suécia era, então, de longe, o maior doador.

As nossas contribuições totalizavam uma soma muito superior ao Orçamento do Estado guineense. Sentia-me, então, como um dos elementos com maior influência no país. Tanto o Presidente [, Luís Cabral,] como os Ministros procuravam-me quase diariamente para obter as mais variadas coisas.

Mas os que julgam que tudo então se perdeu por os políticos terem aberto contas particulares em bancos suíços, estão enganados. Pelo menos no início, a líderança política eram constituída por gente honesta, bem intencionada, verdadeiros socialistas idealistas.
Queriam reformar e fazer progredir o país.

Obviamente que, ao olhar-se hoje [2015] retrospeticamente, não teria sido pior se a nossa ajuda económica tivesse terminado nas tais contas bancárias particulares.

A principal produção da Guiné-Bissau, além da agricutura de autosubsistência, era o arroz e o amendoim, os dois produtos de exportação,O comércio entre os produtores e o porto de Bissau estava nas mãos dos libaneses. Estes usavam carrinhas de marca Peugeot, em estradas lamacentas e com pouca manutenção, para transportarem para o interior produtos importados (, artigos de plástico, tecidos e outros), consumidos pelas populações, e no regresso a Bissau voltavam carregados com arroz e amendoim.

O governo não estava nada satisfeito com este sistema por considerar que os libaneses ganhavam demasiado com estes negócios de verdadeira exploração dos produtores locais. Considerava também que as pequenas quantidades transportadas não eram economicamente viáveis na perspetica da exportação em grande escala.

Ambos os problemas foram resolvidos com um plano que previa a nacionalização do comércio por grosso e a retalho e o transporte das mercadorias a realizar por camiões modernos.

Claro está que foi a Suécia quem, a meu pedido, veio a fornecer umas dúzias de moderníssimos camiões Volvo, desembarcados em Bissau em poucos meses.

Estes camiões último modelo,com ar condicionado, rádio estereofónico e confortável cabine para o condutor dormir, eram naves espaciais aos olhos da populção, e depressa se tornaram num instrumento de "engate" das belezas locais nas ruas de Bissau.

Durante uns tempos era mais importante esta "mercadoria" do que os tradicionais produtos de plástico e tecidos a serem transportados para o interior.

Se o problema tivesse sido só esse, as coisas näo teriam sido tão graves. Mas...quando os camionistas mais consciencios finalmente se puseram a caminho do interior (o que não deveriam ter feito!), concluiu-se que as estradas existentes [, "picadas",] não foram feitas para estes mastodontes ma sim para as carrinhas Peugeot.

Todos os tipos imagináveis de problemas surgiram, acabando por liquidar este tipo de transporte. Em menos de seis meses todos os camiões Volvo estavam parados.

Sendo as marcas de camiões Volvo e Scania as mais vendidas mundialmente, e utilizadas nas condições mais extremas, foi enviada a Bissau uma equipa de mecâncios para estudar o problema surgido.

Chegou-se à conclusão de que, para além dos problemas quanto ao peso que as estradas não suportavam, ambém tinham surgido pequenos problemas de manutenção das viaturas, do tipo: esqueceram-se de mudar o óleo, houve componentes dos motores que desaparecera, etc.

Com a falta de intermediários tradicionais, como os comerciantes libaneses, os camponeses não conseguiam escoar a sua produção, pelo que se voltaram a concentrar-se na produção para consumo local.

O arroz passou a não chegar para alimentar a população de Bissau. Aí a coisa tornou-se grave! O Presidente [, Luís Cabral,] justificou perante mim, que as coisas tinham-se agravado por razões climatéricas que teriam acarretado doenças para as plantas. Devido a isto, perguntou-me de imediato se seria possível um aumento da ajuda económica estipulada para estas situações de emegência.

Telegrafei de imediato para os escritórios centrais da SIDA (que são as iniciais ou o acrónimo da Agência Estatal Sueca para a ajuda aos países em vias de desenvolvimento) e, em muito curto espaço de tempo, tínhamos em Bissau um barco fretado, chinês, que transportava 3 mil toneladas de arroz para que a população não morresse de fome.

Estou a simplicar mas as coisas passaram-se basicamente assim.
História semelhante poderia ser aqui contada quanto ao enorme apoio económico sueco à indústria da pesca local.

São muitos os detalhes e sobre eles escrevi um romance publicado pela editora Atlantis. [Obs : Tenho em minha posse esses "detalhes"... Referência bibliográfica: Patrik Engellau - Genom Ekluten. Stockholm, Atlantis, 1980].

Pessoalmente acabei por me cansar destes contínuos fracassos na utilização de tão vastos recursos económicos, afastando-me de vez deste negócio escuro que é a assistência económica aos países pobres.(**)

Mas antes ainda de puxar a mim prórpio as orelhas, dei-me conta de que fui cúmplice no ato de destruição de um país.

Alguns anos depois, tanto o Ministério dos Negócios Estrangeiros como a 
agência sueca para o a cooperação internacional e o desenvolvimento (SIDA) cansaran-se, decidindo terminar com estes apoios à Guiné-Bissau, com o argumento de que este país, afinal,  não tinha o perfil adequado. Mas não podemos nem devemos "lavar as mäos" quanto ao processo e aos resultados.

Fomos nós, afinal, quem forneceu ao governo do PAIGC as ferramentas e as oprotuniades, para eles efectuarem as suas estúpidas experiências sociais...

Enquanto isto sucedia, nós estávamos ao lado deles e aplaudíamos este país heróico com os seus belos princípios sociais.

Agora que Guiné-Bissau se tornou num "narco-estado", o estado ganha dinheiro com a ajuda ao tráfego de droga da América Latina para os mercados europeus.

E o que pode fazer o pobre do governo? Os camiões Volvo são agora sucata e os libaneses provavelmente foram-se embora!



Em defesa das ajudas deste tipo aos países pobre, é claro que pode-afirmar-se que geralmente o seu montante é tão pequeno em relação aos recursos próprios do país destinatário que o eventual insucesso  não é assim  tão importante.

Patrik Engellanm 27/12/2015.
Publicado no "Alla Skribenter"


[Reprodução com a devida vénia... Tradução, revisão e fixação de texto: JB. O editor LG cotejou o original em sueco, e a tradução livre do JB, com tradução automática,pelo Google Translate, em inglês e português]. 

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 20 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20878: Da Suécia com Saudade (68): por causa da tal pandemia, as minhas renas não podem agora andar em bicha de pirilau e muito menos em manada... (José Belo)
 

(**) Vd, postes de:

3 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13842: Da Suécia com saudade (40): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte I)... à Guiné-Bissau, de 1974 a 1995, foi de quase 270 milhões de euros... Depois os suecos fecharam a torneira... (José Belo)

4 de movembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13847: Da Suécia com saudade (41): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte II)... Um apoio estritamente civil, humanitário, não-militar, apesar das pressões a que estavam sujeitos os sociais-democratas, então no poder (José Belo)


5 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13849: Da Suécia com saudade (42): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte III)... Pragmatismos de Amílcar Cabral e do Governo Sueco, de Olaf Palme, que só reconheceu a Guiné-Bissau em 9 de agosto de 1974 (José Belo)

6 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13853: Da Suécia com saudade (43): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte IV): Rússia e Suécia, vizinhos e inimigos fidalgais, foram os dois países que mais auxiliaram o partido de Amílcar Cabral (José Belo)

7 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13859: Da Suécia com saudade (44): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte V): Quando se discutia, item a item, o que era ou não era ajuda humanitária: catanas, canetas, latas de sardinha de conserva... (José Belo)

sábado, 11 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20843: (Ex)citações (364): o amendoim e o caju, a maldição do colonialismo, em tempo de pandemia de COVID-19 (Manuel Luís Lomba, alcaide de Faria, Barcelos)

I. Comentário(s) de Manuel Luís Lomba ao poste P20829 (*)

Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66)

(i) nasceu em Faria,  concelho de Barcelos, em 1 de Maio de 1942;

(ii) foi funcionário da construtora Soares da Costa onde alcançou o cargo de Director;

(iii) promoveu o renascimento e é presidente da Direcção do Grupo Alcaides de Faria

(iv) é autor dos dois volumes de Faria: "Terra-mãe da Nacionalidade":

(v) é autor dos livros:  “Guerra da Guiné: A Batalha de Cufar Nalu” (por Manuel Luís Lomba, Terras de Faria, Lda., 2012); "Da Senhora e Da Franqueira: Memórias das nossas Origens" (Barcelos,  edição de autor, 2019); 

(vi) tem cerca de 70 referências no nosso blogue; está na Tabanca Grande desde  17/9/2012 (**)


1. Em tudo o relativo à Guiné, nós, veteranos da sua guerra, não raro evidenciamos o romantismo ou o amor (platónico) àquela terra e gente.

Para introduzir a cultura do amendoim (mancarra, para os guineenses e alcaguita, para os alentejanos) e do caju ou "fruto falso", na economia da Guiné-Bissau, os nossos antepassados, inventores do "colonialismo", tiveram de descobrir o Brasil...

Na réplica do Cherno Baldé ao poste do Patrício Ribeiro está implícito um protesto: antes da chegada dos portugueses, do seu amendoim e do seu caju, já os guineenses eram auto-suficientes - morreriam de vírus, mas não morriam à fome!

A propósito da Guerra da Guiné, a ordem dos factores não é arbitral.

A sua iniciativa será "património imaterial" dos seus naturais e à custa dos "colonialistas portugueses". Consta-nos que Nuno Tristão e a sua malta andavam em turismo aquático (em demanda de "galinha à cafreal"?), os nalus montaram-lhe uma emboscada e ele "lerpou" com uma seta envenenada e sem dar um tiro. Nalús e balantas esperaram 500 anos e, à molhada (e sem fé em Alá, como animistas), atacaram o quartel de Tite - "património material", como o momento do início da Guerra da Libertação, que durou 11 anos para libertar seu território, mas vai para 60 anos que não liberta o seu Povo...

Será que o caju substituiu o amendoim?

A CUF (Casa Gouveia) fora sempre o maior comprador de amendoim e, acontecido o cessar-fogo, foi o primeiro "capitalista-monopolista" português a entender-se com o PAIGC em matérias de negócio. Ambas foram nacionalizadas. Ao desmantelar-se, a CUF generalizou a fome na península de Setúbal, um "bispo vermelho" emergiu à altura da situação (D. Manuel Martins); a Casa Gouveia e a sua organização foi reciclada em Armazéns do Povo e as suas prateleiras e armazéns vazios foram uma das razões para o golpe de Estado de 1980, em Bissau.

O modelo de "economia planificada" foi concebido e materializado pela "inteligência" do PAIGC, obra-prima do desconhecimento do país e povo, reforçada pela "inteligência" de outros de diferentes nacionalidades, entre os quais portugueses, militantes do nosso PREC e da sua falência. A Guiné-Bissau será um caso-vítima do tráfico da "Cooperação".

A dinâmica da fileira do amendoim assentava no micro-produtor e no comércio retalhista, que, pelo novo paradigma, passaram a "funcionários públicos", mas, em vez de o entregar aos Armazéns do Povo e à sua burocracia, passaram a contrabandeá-lo pelas fronteiras da Guiné-Conacri e do Senegal, o que provocará a ruptura dos fornecimentos à indústria portuguesa.

2. O comentário ao tema do Patrício Ribeiro-Cherno Baldé (*)  saiu-me longo, a culpa principal será imputável ao "terrorista" Covid 19 e a secundária ao alvoroço que sinto em comunicar com dois camaradas, com os pés e a vida no chão da minha nostálgica Guiné. Levo 4 semanas de confinamento, e, se escapei ao dito cujo, não escapei aos tormentos do ácido úrico e da tormento - a "gota".

O que acabo de dizer acerca da dinâmica da cultura do amendoim reflecte a auto-crítica do seu primeiro PR Luís Cabral na RTP, que disse também ter fundado uma fábrica de sumos, com a exportação garantida para um supermercado de Cascais (era o Pão de Açúcar) e que morreu sem funcionar (o destino do Complexo do Cumeré e das principais indústrias, que a sua "Economia planificada" instalou).

Quanto ao caju, a Guiné começou a sua exportação em 1966, ano do meu regresso, tendo saboreado o seu "falso fruto" em Buruntuma e em Camajabá, (bem maduro, senão queimava-nos a boca), que parou pós-independência. Foi retomada em 1984 e alcançou elevada massa crítica, como riqueza da Guiné-Bissau.

E, retomando o parágrafo inicial, do feitiço da Guiné aos ex-combatentes, o comandante Alpoim Calvão passou de "terrível", na guerra de libertação, a dedicado amante da Guiné, tendo alcançado o estatuto de maior empreendedor país, criando centenas de postos de trabalho na cultura e fabricas de caju.

Vou aproveitar o espaço para bicar o comentário do Luís Graça  [, que citou  São Jerónimo, padre da Igreja do séc. IV: um cristão, depois de batizado, não precisa de tomar banho] (*).

S. Jerónimo, campeão do assédio e das tentações do sexo oposto, terá razão. Se o baptismo lava a alma para sempre e,  sendo o corpo o invólucro da dita, logo também ficará lavado.

Depois das suas comissões em Jerusalém, em contacto com as civilizações e culturas de judeus e muçulmanos, os cavaleiros medievais regressados criaram grandes choques sociológicos nos seus países - haviam assimilado a higiene deles, aparavam a barba, lavavam-se, tomavam banho e... perfumavam-se!

Os Templários viviam com tal carga de piolhos que o combate era um lenitivo - as estucadas e as lançadas amenizavam-lhes a coceira...

Cuidem-se dos IN - invisíveis mas sentidos. (***)
Ab

Manuel Luís Lomba
_________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 8 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20829: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (11): Viagem a Mansoa e a Bafatá, onde estamos a levar a água potável aos hospitais... Este ano, muita gente vai morrer, não da COVID-19, mas de fome: o caju ninguém o vem cá comprar...


(***) Último poste da série >  30 de março de 2020 > Guiné 61/74 – P20791: (Ex)citações (363): Os conflitos e a dedicação do povo (José Saúde)

quinta-feira, 21 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18762: Fotos à procura de... uma legenda (105): O 'rancho dos pobres'... (Virgílio Teixeira / Luís Graça / Cherno Baldé / Valdemar Queiroz)


Foto nº 1 A


Foto nº 1 B


Foto nº 1 C


Foto nº 1 > Guiné > Região de Cacheu >São Domingos > CCS/BCAÇ 1933 > 1968 > "O rancho dos pobres"

Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 

1. Legenda, completa, do autor, Virgílio Teixeira:

"Mais uma vez apresenta-se aqui a vergonha das nossas vidas. ‘O rancho dos pobres’. Eram miúdos indígenas, que vinham no fim das refeições, com as suas latas, à procura dos restos do rancho ou das messes para comerem, eles e famílias. Depois de levarem para as suas palhotas, voltavam novamente para levar o máximo possível. Isto chocava-me muito, mas nada poderia fazer, a não ser facilitar estas operações, a sopa dos pobres. São Domingos,  1968. (*)

2. Comentários dos leitores (*):

(i) Tabanca Grande [Luís Graça]:

Notável,  a foto... Não direi que diz "tudo", mas diz "muito"... O fotógrafo estava lá, milhares de nós assistíamos, quotidianamente, a esta cena, tão "comovedora" quanto "constrangedora",  dos meninos e meninas que viviam nas imediações dos nossos quartéis, com as latas (recuperadas do lixo da tropa) a servirem de marmitas, à cabeça, ordeiramente, pacientemente, à espera dos "restos do rancho da tropa"...

Parabéns, Virgílio,  pela tua sensibilidade e sentido de oportunidade... É uma foto com grande interesse documental...

50 anos depois continua a haver fome na Guiné-Bissau... Ainda há dias falei, ao telefone, com um desgraçado de um camarada nosso, o ex-1º cabo António Baldé, de Contuboel, que regressou à Guiné, sem um tostão, sem uma pequena reforma, e que, aos setenta e tal anos, passa fome em Caboxanque, no Cantanhez... O tal que tinha o sonho de vir a ser apicultor. E que era o pai da infeliz Alicinha do Cantanhez... Trabalhou com o Pepito, no DEPA... Vou ter que fazer alguma coisa por ele, para o ajudar... São situações que nos destroçam o coração... [O António Baldé esteve no CIM, Bolama (1966/69), Pel Caç Nat 57 (São João, 1969/70) e CART 11 (Paunca e Sinchã Queuto, 1970/71): é membro da Tabanca Grande,  nº 610].


(ii) Cherno Baldé:

É verdade que os miúdos iam lá pedir sobras do rancho, eu fui um deles [, em Fajonquito,], mas também, não vamos exagerar ao ponto de afirmar que era para comerem eles e suas famílias,  o que não corresponde à verdade. Primeiro porque, normalmente e por regra, as sobras não eram tão abundantes que dessem para alimentar a população. Em Segundo lugar, a população,  mesmo pobre,  era muito digna e conformava-se com o pouco que tinha em suas casas e, no caso das populações de confissão muçulmana, os adultos não comiam nada que viesse dos quartéis por motivos religiosos. Às vezes as aparências iludem e penso que foi este o teu caso.

A minha experiência de rafeiro de quartel diz-me que a quantidade das sobras dependia mais da qualidade da comida do que da bondade alheia, pois variava em função do prato do dia. Assim, nos dias em que havia carne de vaca ou cozido à portuguesa, não sobrava nada, mesmo para os soldados que se atrasavam a chegar ao refeitório.

(iii) Virgílio Teixeira:

Sobre os teus comentários a esta foto, a única que tenho, apesar de ter presenciado esta cena e outras imensas vezes, e só por vergonha nunca mais tirei nenhuma. Conheces aqueles ex-militares, com uma abraçadeira vermelha no braço esquerdo? Lembras-te ou não? Faziam de Oficial de Dia, os responsáveis por tudo o que acontecia durante 24 horas, incluindo nessa missão, assistir a todas as refeições nos refeitórios das praças e também provar e até muitas vezes também comiam do rancho.
Esses meninos e meninas, cujo exemplo estão aí, não fabriquei essa foto, fui eu o fotógrafo, mas não tenho abraçadeira, não estava de serviço, e quando estava não podia fazer fotografias a tudo. Mas a minha memória visual fenomenal não me deixa esquecer, e sei todos os pormenores de tanta coisa, mas não de tudo. Estes aqui que relatei são autênticos, só não sei se iam levar a comida à tabanca para alimentar os familiares ou se era com outros fins, por exemplo a pecuária.

Não sabia sequer,  nessa altura, os hábitos dos muçulmanos, palavra que estava longe de pensar que não comiam carne de porco e outras coisas. Por isso em Chão Fula, Nova Lamego,  não era tão gritante esta prática, mas existia na mesma. Mas em especial no Quartel de Brá, nos Adidos, onde se serviam mais de 1000 militares todos os dias, e sobrava muito e as filas eram imensas, eu vi isso, pois estive lá com o meu Batalhão durante o mês de Março de 68 e fiz vários serviços de Oficial de Dia e assistia obrigatoriamente a estas cenas, tanto eu, como os outros. 

A minha sensibilidade não dava para ver isto, por isso tentei esquecer, até ao dia que voltei a ver as fotos, 50 anos depois.

Não queria de modo nenhum alimentar uma polémica sobre este assunto, que não me agrada, mas espero que aceites - tu e os outros - esta minha versão dos acontecimentos, pois esta é a minha versão e não a dos outros, cada um pensa o que sente, e não, nunca faria quaisquer juízos de valor sobre isto. Sabes que eu gosto muito da população guineense, durante a guerra e depois dela, nunca esquecerei.
Quando estive aí, em 1984/85, três vezes, voltei a ver a fome nas populações, eram eles que me diziam, voltem para cá....

(iv) Cherno Baldé: 

As tuas fotografias são excepcionais e muito importantes sob todos os pontos de vista. Não há motivo para vergonha nenhuma nas fotos que, com todo o mérito, conseguiste salvar e conservar em muito bom estado. A pobreza não é uma desgraça em si e, na verdade, ela é sempre relativa, pois, se não existissem pobres, não haveria ricos no mundo.

Também não alimento polémicas, tão só tento corrigir possíveis erros de interpretação, muitas vezes, puramente subjectivos,  que os antigos combatentes metropolitanos podem estar, injustamente, a cometer sem ter a noção completa dos seus erros. A minha função é tentar corrigir os tiros da malta que se embala no entusiasmo das palavras, tal Homem Pereira de Melo, como uma vez disse o nosso amigo Valdemar Queiroz.

Todas as críticas e/ou observações que os bloguistas fizerem dos trabalhos (textos e fotos) publicados, só servirão para testar, enriquecer e consolidar os conteúdos assim expostos à observação e crítica do vasto auditório para uma eventual validação. Por isso, não convém que sejamos muito sensíveis nem que sejamos tentados a defender a todo o custo aquilo que expomos ao público da nossa Tabanca Grande.

Muito obrigado pelas simpáticas palavras de amizade dirigidas ao povo da Guiné-Bissau, em geral, e a mim, em particular. 

(v) Valdemar Queiroz:

Muito interessante a foto nº. 1. Era habitual a 'formatura' das crianças à espera das sobras do rancho da tropa. Também assisti em Bissau a uma 'formatura' destas, mas com muitas dezenas de crianças, quando estive de 'Sargento de Dia' no Quartel dos Adidos. Mas, bem longe daquelas terras, na Europa da abundância, que até deita por fora, e há cerca de uns vinte anos, assisti à porta das instalações militares ou da Academia Militar ou dos Comandos, na Amadora, a uma 'formatura', de lata na mão, que me fez lembrar aquelas que nós muito bem conhecemos na Guiné.

(vi) António Rosinha:

O Cherno esclarece um pouco o que era ir ao quartel apanhar restos, mas ainda não diz completamente tudo sobre o assunto para não melindrar algumas sensibilidades (penso eu)

Aqueles pretos não eram assim tão "coitadinhos", como havia uma tendência para os julgar assim, para quem passava lá 24 meses.

Na África subsariana não havia fome, aquela fome que nos era exibida em Lisboa e Porto e menos em cidades e aldeias mais pequenas do interior.

Aquela fome que as guerras provocavam foram uma excepção, assim como a fome e carências primárias de algumas independências com total desorganização.

Ainda há três ou quatro dias uns repórteres entrevistaram uns jovens gambianos que,  rejeitados pelos italianos, vieram para Valência, e o problema deles não era a fome nem a guerra, estavam bem tratados e bem dispostos, e um deles apenas queria uma oportunidade de poder jogar à bola.

As carências africanas nunca foram a  alimentação, tal como a conhecíamos aqui, antes de haver os peditórios à porta dos supermercados para as pessoas e para os animais.[Referência ais bancos alimentares].

Ao contrário das nossas tribos,  as tribos na África "partem" tudo entre si, dá para todos, aqui,  como cantava o Zeca Afonso, :eles comem tudo e não deixam nada.

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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 19 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18758: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXVI: História e imagens de São Domingos: fotos de 1 a 8

(**)  Último poste da série > 18 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18432; Foto à procura de...uma legenda (104): O caso da mulher fula amamentando, com o leite do seu próprio peito, a "sua" cabrinha... O João Martins queixa-se de escesso de zelo censório por parte do Facebook...

sábado, 2 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12236: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (32): Segurança alimentar: aposta na produção da tapioca em substituição do arroz está a ser um sucesso


Vídeo (7' 39''). Alojado em You Tube > ADBissau [Reproduzido com a devida vénia; repare-se na música, que é do grande, promissor e malogrado músico José Carlos Schwarz  (Bissau, 1949-Havana, 1977)]



A TVK foi premiada no Festival Internacional Agrofilm 2013, realizado na Eslováquia, de 30 de Setembro a 4 de Outubro de 2013, com o Osiris FAO Prize, pela realização do filme "Tapioca, fonte de nutrição e apoio na economia familiar".

Apresentaram-se a concurso 158 filmes, dos quais foram pré-selecionados apenas 50. O júri internacional considerou que se tratava de "um filme bem estruturado em termos pedagógicos, simples e com boa mensagem",  concebido na perspectiva do desenvolvimento sustentado.

Segundo se pode ler na página dos nossos amigos da AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau, "o prémio Osíris, patrocinado pela FAO, é uma estatueta do Deus egípcio que representa a 'encarnação das forças da terra e das plantas' ".

 Os jovens técnicos da TVK, assim como os seus formadores (Tina Lobo, formadora em guionismo; Andrzej Kowalski, que esteve na origem da criação de todas as televisões comunitárias da Guiné-Bissau, formador de operadores de câmara; e  Assimo Baldé, que assegurou a formação em jornalismo televisivo) são um motivo de orgulho para a ONG AD  que está de parabéns, juntamente com os seus colaboradores: 

"Para a AD é um orgulho ter apostado nestes jovens e ter contribuído para levantar alto o nome da Guiné-Bissau, no meio dos outros países premiados, como a Alemanha, China, Israel, Polónia, Espanha, Irão, Hungria, Eslovénia, Eslováquia e Republica Checa".

Os amigos portugueses da Guiné-Bissau e da AD - Acção para o Desenvolvimento, reunidos sob o poilão da Tabanca Grande, ficam também orgulhosos desta distinção e solicitam ao Pepito que faça chegar à jovem equipa da TVK uma palavra de apreço e de incentivo!


A ONG AD iniciou há dois anos o processo de vulgarização de transformação da mandioca em tapioca, com a colaboração da UICN (National Committee of the Netherlands) na zona norte e a SOLSOC (Solidarité Socialiste) na zona sul.

"A simplicidade de procedimento de transformação e sobretudo a qualidade do alimento que deixa os consumidores de 'barriga cheia', explica o aumento da sua produção agrícola e a opção por este produto em vez do arroz. Depois de uma fase inicial de teste para a apreciação da resposta dos agricultores à tecnologia e às qualidades nutritivas da tapioca, a AD passou à fase de difusão em pequena escala em polos espalhados em certos locais".

Garantido o sucesso,  passa-se agora a outra fase, a da vulgarização em larga escala em todas as zonas onde a AD intervém.

Belo trabalho, Pepito e colaboradores. Vocês merecem as nossas palmas!
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Nota do editor:

Último poste da série > 25 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12083: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (31): testemunho gravado em Gadamael, a história do Oh! Alexandre, que conheceu o alf mil Manuel Vaz, da CCAÇ 798, bem como o pessoal da CCAÇ 1659, os Zorba

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8614: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (20): Rezando pela chuva, lá, no tempo dela; imprecando contra o vento, estival, cá... (Luís Graça)





Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > Título da foto: Aí está a época das chuvas de 2011 > Data de Publicação: 10 de Julho de 2011 > Data da foto: 26 de Junho de 2011 > Palavras-chave: Segurança alimentar > Legenda:

"Já começou a época das chuvas na Guiné-Bissau com grandes tornados e ventos muito fortes, mas ainda com …pouca chuva, para os agricultores ficarem satisfeitos e iniciarem as suas lavouras e sementeiras.

"Este começo,  atrasado e muito irregular, tem levado a uma diminuição notória do ritmo da lavoura dos planaltos e encostas onde se produzem as culturas de sequeiro (milho, sorgo, milheto, arroz, mancarra, batata doce, mandioca e feijão), o que faz temer uma má colheita este ano. 

"Quanto às bolanhas salgadas, a situação é ainda mais grave, uma vez que é necessário chover muito e de forma concentrada, para diminuir a salinidade e acidez dos solos, pondo a salvo qualquer interrupção brusca do fim do ciclo das chuva".

Foto:  Cortesia de  © AD - Acção para o Desenvolvimento  (2011). Todos os direitos reservados.





1. Cada vez mais a expressão "segurança alimentar" faz sentido e nos põe em sentido... Como alimentar 9 mil  milhões de seres humanos, em 2050, com o planeta azul a "rebentar pelas costuras" ? 


Há muito a ONG AD - Acção para o Desenvolvimento tem um discurso e uma prática neste domínio, dando o exemplo ao Estado, à sociedade civil, ao povo e às elites da Guiné-Bissau... Através da série "foto da semana", no seu sítio institucional, e agora também no Facebook, a sua mensagem chega mais longe. 


Os agricultores guineenses, esses,  esperam a chuva, no tempo dela, como um milagre do céu. Nós, que queremos sol e praia, rogamos pragas ao vento... Para os antigos combatentes que conheceram a Guiné do tempo das chuvas abundantes e milagrosas - ainda não se falava em " mudanças climáticas" nem de avanço do Sara - esta foto tem uma forte carga simbólica, poética e emocional... 


Se é verdade que nem no tempo das chuvas as armas se calavam, também é certo que abrandava a actividade operacional, de um lado e do outro, por imperativo da natureza... As picadas transformavam-se em rios. As colunas logísticas, um inferno. As minas e armadilhas eram arrancadas do chão pela força das águas... As viaturas atascavam-se... Entretanto a savana arbustiva tornava-se uma imensa "seara de capim", verde que rapidamente cobria tudo, homens, animais, arbustos...


Quem não se lembra do tempo das chuvas ? E das medonhas trovoadas tropicais ? E das moranças queimadas por raios, com pessoas e gado calcinados ?... Quem não se lembra dos milhões de insectos, de todos os tamanhos e feitios, que nos "bombardeavam" o prato da sopa, ao jantar, logo que acabava a chuvada da tarde ? Quem é que não veio para a rua, feito criança, com as primeiras chuvadas, apanhar a molha monumental, da cabeça aos pés, um  ritual obrigatório naquelas paragens, para todos os viventes ? Quem, enfim, não estremece de emoção ao rever este  céu carregado, a prenunciar borrasca, algures na Guiné-Bissau de hoje, a "nossa terra verde e vermelha" de ontem  ? 


Entretanto, a guerra recomeçava, com outro vigor, e violência, no tempo seco... Em Dezembro, no leste, tiritava-se de frio, à noite, nos postos de sentinela ou nas emboscadas no mato,  quando as temperaturas baixavam até aos 15 graus...


2. Por outro lado, recebi há dias notícias do nosso amigo Pepito, anunciando a sua chegada à terra da sua mãe (Lisboa), dos seus filhos e da sua esposa Isabel, nestes termos sempre bem humorados e telegráficos, levemente irónicos: 


"Chegada à Metrópole de Graciosa: 16 de Julho de 2011. Amigos Alice e Luís: Estou em Lisboa. Vim tratar da vistoria do veículo de transporte... Vamo-nos encontrar. Abraço. Pepito".


Recorde-se que os funcionários públicos do Ultramar (se não todos, pelo menos algumas categorias, como professores, médicos, militares, etc.), ao fim de 4 anos de serviço, tinham direito a uma licença dita graciosa, cuja duração podia ir até aos seis meses, com viagens pagas no todo ou em parte pelo erário público... Continuavam a receber o seu vencimento, não sei se na totalidade ou em parte... 


Os pais do Pepito, ele jurista, ela professora no Liceu Honório Barreto, beneficiavam naturalmente deste "privilégio" do funcionalismo público ultramarino... Fixaram-se na Guiné em 1949, mas mantendo casa em Lisboa. O Pepito e os seus irmãos, enquanto crianças e adolescentes, devem ter acompanhado os pais, numa ou mais viagens à Metrópole, em gozo de licença graciosa... Enfim, deve ser esse o sentido (figurado) do título da mensagem...


Aproveito o ensejo para desejar ao Pepito, à Isabel e ao resto da família, incluindo a nossa Clara Schwarz, a decana da nossa Tabanca Grande, a caminho dos seus corajosos e maravilhosos 97 anos de vida, os mais ardentes votos de boa, prazenteira, descontraída, feliz e saudável estadia na Tabanca de São Martinho do Porto, com muito sol e a brisa q.b., que refresca a casa e faz cantar os pinheiros que a protegem, tornando ainda mais fantástica e poética a vista que se desfruta desse lugar mágico (uma das mais belas vistas do Portugal litoral, ao fim da tarde: de um lado, o Atlântico, as Berlengas; do outro, a baía de São Martinho do Porto)... 


Espero poder em breve ir lá dar-vos um abraço, a vocês e ao vizinho JERO, outro  apaixonado de São Martinho do Porto (e residente de verão)... Claro, eu, a Alice, se possível a Joana (entretanto, em viagem por Itália), e obviamente o João, se os Melech Mechaya deixarem, passe a publicidade  (...Nesta noite, ele está a tocar, com os Melech Mechaya, em Alcains, Castelo Branco; no dia 13, vai estar em grande, em Sagres, no Superbock Surf Fest, na praia do Tonel, a tocar para um público esperado de mais de 10 mil; e depois a 21 e 28, em Espanha...). Em suma, vamos ter que gerir muito bem, como acontece todos os anos em Agosto, as nossas "agendas sociais"... Brincadeira aparte,  aquele xicoração lusoguineense! Luís Graça

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Nota do editor:

Último poste da série > 28 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8480: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (19): Em louvor da Ajuda Amiga e do Carlos Fortunato, divulgador de tecnologias simples e amigas do ambiente