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quinta-feira, 28 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26210: Lembrete (49): Tabanqueiros/as do Centro, que não vos falte o fôlego para apagar amanhã as 100 velas do bolo!



Logo da Tabanca do Centro, que vai fazer amanhã o seu 100º encontro, como de resto já tínhamos anunciado no poste P26132 (*)...  



1. Na Ortigosa, concelho de Leiria, na nossa já conhecida Quinta do Paul (fizemos lá dois Encontros Nacionais da Tanca Grande, o III e o IV, em 2008 e 2009, respetivamente), amanhã há festa.  

As inscrições já fecharam, mas o nosso lembrete vem a propósito, porque amanhã é dia de "ronco" para os tabanqueiros do Centro. E  Tabanca Grande, que é, a bem dizer, ... "a mãe de todas as tabancas", vem regozijar-se e desejar, a todos e a todas, bom almoço e bom convívio. Que não lhes falte o fôlego para apagar as 100 velas do bolo... 

Hoje, no Centro Comercial Alegro, em Alfragide, encontrei o meu vizinho, e bom amigo,  Juvenal Amado e ouvi-o combinar com o Miguel Pessoa, que mora em Benfica, a hora e o local para apanhar a boleia do costume até à Ortigosa... 

Recorde-se que foi, em dezembro de 2009, que  o Juvenal Amado (na altura a viver em Alcobaça, e hoje na Reboleira, Amadora) , o Vasco da Gama (Figueira da Foz) e o Manuel Reis (Aveiro) tiveram a ideia de criar a Tabanca do Centro. 

Aos pais-fundadores juntaram-se o Joaquim Mexia Alves (Marinha Grande e Monte Real) e o Miguel Pessoa (Lisboa). E tudo começou regularmente à volta da mesa e do famoso "cozida à Portuguesa", servido às 4ªs feiras na Pensão Montanha, em Monte Real. E tão famoso que chegou a vir gente da Suécia para provar a iguaria da "chef" Dona Preciosa...

Depois o mundo deu muitas voltas, mas a Tabanca do Centro nunca perdeu o seu lugar de equidistância "geodésica" entre todas as tabancas da Tabanca Grande... Pois ela fica, rigorosamente, ao Centro, entre o Norte e o Sul, o Oeste e o Leste... Quem não acreditar, que vá lá medir...

100 encontros é mais do que uma "marca", é um "marco"... E no dia 27 de janeiro de 2025 haverá outro bolo, com 15 velas para soprar, comemorativo do 15º aniversário do primeiro (e histórico) encontro. 

Tenho pena de lá não poder estar amanhã. Mas daqui vão os meus xicorações, alfabravos, quebra-costelas, mantenhas e beijinhos para todos/as os/as tabanqueiros/as do Centro (que esse é do género...neutro). 

A Tabanca Grande também está bem representada na lista dos inscritos para o 100º convívio da Tabana do Centro (contámos pelo menos 15 grãos-tabanqueiros, que vão com links com as suas referências no nosso blogue).

A Tabanca Grande sente-se também  orgulhosa por estar na génese de todas as congéneres espalhadas pelo País, a começar, historicamente, pela Tabanca de Matosinhos, a Tabanca do Centro e, mais tarde, a Tabanca da Linha, dos Melros (Fânzeres, Gondomar), etc.
 
Estas, e outras Tabancas mais pequenas (da Maia, do Algarve, da Diáspora Lusófona, etc.), são um caso de estudo, surgidas quase espontaneamente, com o fim de manter o convívio entre velhos camaradas da Guerra do Ultramar / Guerra Colonial, que agora têm mais tempo disponível e perderam todo o tipo de complexos, por ventura imputados ao seu passado como combatentes nos territórios africanos de então.

Desejamos à Tabanca do Centro uma vida longa e activa, salientando o fundamental papel que têm mantido os  seus mentores, com destaque para o Joaquim Mexia Alves e o  Miguel Pessoa, sem esquecer os outros pais-fundadores. (LG)



29Nov2024 | Inscritos: 45
(Revisão / fixação de texto, links: LG)
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domingo, 6 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26015: (In)citações (265): "Entre o Sono e Sonho, Pesadelos", por Juvenal Amado, dedicado a "Manuela"

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 4 de Outubro de 2024:

Caros camaradas
A nossa geração foi moldada por tempos difíceis, mas nada nos preparou para vermos os nossos sofrer com impiedosas maleitas de fim incerto que a vida nos presenteia. 20 meses passados veio a notícia de que o mal disseminado pelo o corpo todo, tinha sido derrotado.

Mais uma vez o SNS na forma do hospital S. Francisco Xavier e IPO foram o caminho para esta vitória sobre o sofrimento e a adversidade. Bem hajam os médicos , técnicos e enfermeiros pelo o trabalho e carinho.
Abraços



ENTRE O SONO E SONHO
PESADELOS


A notícia chegou nas asas negras do desespero
Ouvíamos silenciosos
Expectantes incrédulos
Estaria a falar de ti ou seria um sonho?
A portadora tentava modelar o impacto
devastador da confirmação
A negritude da noite pairava
Apertei-te a mão
Vieram as sessões de quimioterapia
Num acto de coragem rapaste o cabelo
Ali estavas desprovida de adornos
Bela na sua face mais primária
Os vómitos as dores os desânimos
O internamento as transfusões
Regressaste a casa com uma força que nunca julgaste ter
A pele cor de terra
Afundada na neutropenia
A seguir emergias
Reerguias-te do vale de sombras
Para continuar o combate desigual
Perguntavas se terias salvação e sorrias
Orgulhosamente olhaste a morte de frente
O calvário continuou com a rádioterapia
Sem queixume sem pragas
Só doçura só amor pelos outros
Esperas o que Futuro nos trás
És a imagem própria coragem
Tu nunca aceitaste a finidade sem luta
O longo sono pode esperar
Mais uma vez venceste.


“Para Manuela”.
Juvenal Sacadura Amado

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Nota do editor

Último post da série de 26 de setembro de 2024 > Guiné 61/74 - P25984: (In)citações (264): Naquela época era-nos proibido falar muito sobre a política da guerra em África (Tony Borié, ex-1.º Cabo Op Cripto)

quarta-feira, 14 de agosto de 2024

Guiné 61/74 - P25842: (In)citações (269): Quantos somos ainda? (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR do BCAÇ 3872)

Galomaro, 1973 > 3.º Natal do BCAÇ 3872 na Guiné

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 10 de Agosto de 2024:


QUANTOS SOMOS AINDA?

Talvez 500.000? Hoje não passamos de um retrato para aí numa gaveta e já nem nós nos reconhecemos.

No ultimo almoço do 3872 dei por mim a perguntar ao Félix do Pel Rec por ele, só depois de ver o olhar dele percebi que tinha metido a pata na poça.
Entre as desculpas por o não reconhecido logo, deitei as culpa para a PDI que resulta sempre.

Falamos mais de doenças do que paródias e aproveitamos para dizer mal dos governos com alguma razão.

Nas redes sociais fala-se das facilidades e dificuldades que temos em beneficiar de alguns créditos onde desaguam promessas do poder político que vão passando de mão em mão.
Não queriam mais nada que fosse reconhecido o serviço que em tempos fomos obrigados a fazer mas nem por isso dignos de recompensa.

Há dias o José Marcelino Martins publicou no facebook uma efeméride relacionada quando se mudou de armas e bagagens para Canjude. Termo que sempre ouvi mas nunca com tamanha objectividade. O José já deve constatar que hoje mandam-no para outras partes.

Quando regressamos, ignoraram-nos, hoje dizem “lá vêm eles falar do mesmo”. Mas será que não se cansam?
Que sabem eles da nossa sede, do nosso calor, das nossas privações de pequenas coisas, das nossas saudades se os que lá estiveram nada fizeram e estes que já são netos dos combatentes nada sabem?

É comum falar-se da gratuitidade dos museus mas ao que parece, nos que estão em mãos privadas não temos esse direito. Que a maior concentração dessas instituições se encontra nas grandes cidades e também que nos falta a vontade para nos deslocar até eles, já que na maioria, hoje somos mais pilotos experimentais de sofá e as pernas também não ajudam. Nas grandes cidades os passes para transportes públicos dizem que funciona bem.

Eu, fico-me pelo os meus afazeres com a família a visitas ao médico que não se pode abusar delas, supermercado, tenho vasto conhecimento de tudo o que é parque infantil da região pelos motivos que nós avós sabemos. Construo baloiços que ele derrete à medida que cresce e mais pesa, vou com ele às terapias e rego as plantas, coisa que ele frequentemente usa como urinol e assim, tento salvá-las de morte certa.

Há dias li que os combatentes iam ter direito a medicamentos grátis mas só em 2026. Acho bem porque assim como assim, ainda morrem muitos e são uns tostões que se poupam, é que por cá ainda se poupa nos alfinetes para se gastar nas lagostas.

Mas também reparei que as esposas e viúvas não serão incluídas nessa benesse independentemente do rendimento familiar. É injusto porquanto nós sabemos que muitas milhares de esposas sofreram com a nossa ausência e tiveram uma vida de sofrimento depois do nosso regresso.
O stress pós traumático e o alcoolismo, atiraram essas mulheres e também os filhos para o inferno individual que cada veterano transportava.

E fala-se, fala-se e fala-se... E eles não ouvem não ouvem…

Já por diversas vezes foi chumbada uma proposta de dar 50 € a cada combatente, o que para a esmagadora maioria seria uma preciosa ajuda nas suas magras reformas. Entretanto os governantes falam em milhões e milhares de milhões para aqui e para ali, a verdade seja dita, parece que muito desse dinheiro (quando as cativações estão na ordem do dia) chegam tarde ou nunca aos organismos beneficiários.

Ficam com a fama e o resto não interessa nada, porque a oposição di que não e eles dizem que sim. Ficam empatados e nós lixados.
Mas fica a intenção que é muito importante.

Só por uma vez que fosse, gostava que o beneficio fosse anunciado e executado automaticamente. Bem sei que o pobre desconfia da fartura mas...

Um abraço e não desanimem porque água mole em pedra dura tanto dá até que encharca tudo.

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Nota do editor

Último post da série de 1 de agosto de 2024 > Guiné 61/74 - P25799: (In)citações (268): Horizontes da Memória (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705)

segunda-feira, 24 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25678: (In)citações (267): Compensações às colónias (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR)

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 22 de Junho de 2024:

Meus caros camaradas e amigos,
Começo por agradecer os votos pelo meu aniversário, embora nós tenhamos muitos anos de prática, sabe sempre bem sentir o aconchego dos amigos.
Assim envio uma reflexão sobre estes tempos mais menos conturbados, que povoam os nossos dias.

Um abraço
Juvenal Amado



COMPENSACÕES ÀS COLÓNIAS

E de repente, o senhor Presidente da Republica sai-se desta forma ligeira sobre o assunto, tal como comentou o decote da senhora no Canadá numa das suas visitas de Estado.

Foi saudado com um enorme coro de críticas mais menos violentas, onde pontua muita gente de direita saudosista e, muitos veteranos ressentidos não sei bem do quê.

Portugal foi ao seu tempo “descobridor” que, não pediu licença para ocupar vastas regiões das quais não tirou mais proventos, porque não teve nunca força para ocupação total dos territórios reclamados para si no contexto das nações colonizadoras. Mesmo assim de Angola, Moçambique e Brasil, as riquezas o comércio de escravos os seus lucros escorreram para a capital do reino em quantidades consideráveis, não fosse a avareza da nobreza e clero, teriam feito de Portugal uma nação próspera, com resultados que teriam chegado aos dias de hoje.

Ao contrário sabemos das enormes dívidas que foram contraídas no sistema financeiro internacional por reis e por fim pela república até aos dias de hoje.

Perdido que foi o Brasil ficamos com duas colonias muito cobiçadas que pela sua riqueza serviriam de penhor no sistema financeiro internacional.

Mas lá diz o ditado que não há bem que sempre dure, nem mal que nunca acabe e, 500 anos em que se mantiveram esses territórios num imobilismo confrangedor para onde era preciso carta de chamada, fomos acordados na nossa precoce juventude muitos de nós na escola primária, para uma realidade dura, que foi o eclodir de violência armada com intuito de nos expulsar de lá. Durante 13 anos de guerra fez-se pela modernização o que não se tinha feito até então. O rastilho estava aceso e já não havia forma de o apagar. O direito à autodeterminação consagrado na carta das Nações Unidas foi exigido, aliás sendo Portugal o ultimo a enfrentar o problema, que ao contrário de alguns ex-colonizadores, não manteve poder através do neocolonialismo onde as potências outrora dominantes exerceram a sua vontade sobre os novos países atrás de golpes de estado, ou guerras civis incessantes. Homens da sua confiança possibilitaram em troca de umas de migalhas a uma clique governativa que vendeu assim o futuro do seu povo.

Mas voltando ao tema levantado por Sua Ex.ª, o problema não é só português. A Bélgica, a França, a Inglaterra, a Holanda, a Espanha e até a Alemanha ocuparam, dominaram e extorquiram de riquezas vastos territórios do nosso globo.
Sufocaram com sangue revoltas, segregaram, escravizaram as populações indígenas fisicamente e nas suas crenças, impondo religião dominante no Ocidente.

A Bélgica é acusada de genocídio de mais 10.000 de congoleses, mas os outros, também impuseram a sua vontade com massacres mais ao menos documentados.

Durante as duas Grande Guerras os colonizadores utilizaram milhões de súbditos coloniais nas suas guerras na Europa e na Ásia. O resultado era de prever findo que foram os conflitos, logo estes se apressaram a pedir a independência, facto que acabou nas guerras de libertação. Os que lutaram contra a nova ordem Mundial da Alemanha e Japão imperiais transformaram-se em opressores dos povos sob a sua tutela. Voltaram as tropas expedicionárias o ódio das posições oficiais e da propaganda do regime, voltaram-se irmãos contra irmãos.

Esta nossa Europa dos “bons costumes” tem que reconhecer que é rica à custa de muita miséria do terceiro Mundo.

A aceitação desses novos países provocou rios de sangue refugiados e deslocados. Quando digo que não sei bem de quê de que os veteranos se ressentem é pelo simples facto, que nós fomos também fomos carne para canhão e deixamos a nossa juventude nas matas e bolanhas, quando não deixamos lá a pele.

Para além do direito a estarmos orgulhosos por termos vestido a farda, não somos heróis, somos vítimas e é preciso interiorizar esse sentimento.

E assim chegamos ao cerne da questão. Será que não se deve algo aos povos que estiveram sob nossa administração cinco séculos?

Está claro que não pode haver sentido literal na devolução de alguma coisa material, uma vez que nem juros podiam pagar, mas há formas de compensação que passa pela cooperação, por apoio na saúde, na educação, tecnologia, verdadeira amizade e tudo tratado sem sobranceria nem paternalismo que sobra por cá, quando se fala dos novos países de expressão portuguesa. Distanciarmo-nos de discursos de ódio e xenofónicos é pois um imperativo.

São países muitos jovens e necessitam quase tudo, pese as enormes riquezas de que são detentores, também precisam de tempo e respeito, para assim encontrarem um caminho melhor para os seus povos.

Um abraço
21/06/2024
Juvenal Sacadura Amado

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Nota do editor

Último post da série de 31 DE MAIO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25590: (In)citações (266): Vamos identificar as Unidades com as Divisas, lemas e designações mais curiosas e divertidas (Augusto Silva Santos, ex-Fur Mil Inf)

segunda-feira, 3 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25598: Os 50 anos do 25 de Abril (25): Hoje, na RTP1, às 21:01, o 8º (e penúltimo) episódio da série documental, "A Conspiração", do realizador António-Pedro Vasconcelos (1939-2024)


Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Posto com reforço  Imagem, entre outras, gentilmente cedidas pelo nosso blogue (e pelo Juvenal Amado)  (*) à pelo à equipa de produção de "A Conspiração".

Foto (e legenda): © Luís Sacadura / Juvenal Amado (2011). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


RTP > Ptrogramas > A Conspiração >  Episódio n.º 8 > Hoje na RTP1, às 21;01

Sinopse: 

Episódio 8 de 9

Depois de ter obtido o apoio da Assembleia Nacional, era a vez agora das chefias militares manifestarem o seu apoio incondicional a Marcello Caetano e à sua política ultramarina.

Este "beija-mão" ficaria coloquialmente conhecido como a "brigada do reumático". Costa Gomes e Spínola não compareceram na reunião o que dava uma desculpa a Marcelo para exonerar os dois generais.

É então que se dá a sublevação das Caldas. (**)


Próximas emissões: 

03 Jun 2024 21:01 RTP1 |   03 Jun 2024 21:01 RTP Internacional | 
05 Jun 2024 15:00 RTP Internacional Ásia |  06 Jun 2024 02:15 RTP Internacional América


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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 16 de março de 2024 > Guiné 61/74 - P25279: Os 50 anos do 25 de Abril (2): O meu primo Luís Sacadura, furriel miliciano, natural de Alcobaça, hoje a viver nos EUA, estava lá, no RI 5, Caldas da Rainha, no 16 de marco de 1974, e mandou-me fotos dos acontecimentos (Juvenal Amado)

(**) Vd poste de 20 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25542: Os 50 anos do 25 de Abril (23): Hoje, na RTP1, às 21:01, o 6º episódio da série documental, "A Conspiração", do realizador António-Pedro Vasconcelos (1939-2024)

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2024/05/guine-6174-p25542-os-50-anos-do-25-de.html

Último poste da série > 24 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25557: Os 50 anos do 25 de Abril (24): "As gargalhadas" de Salgueiro Maia (Victor Costa, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 4541/72)

segunda-feira, 22 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25423: Estórias do Juvenal Amado (64): A estória de David Leão que queria ser mobilizado para Angola para combater o IN que lhe matou o irmão em 1963

Memorial aos Combatentes de Gondomar, inaugurado em 1971


1. Em mensagem de 17 de Abril de 2024, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), enviou-nos a estória do seu camarada de Batalhão, David Leão, que depois de ver morrer o seu irmão mais velho em Angola, acabou mobilizado para a Guiné.

Caros camaradas
Cá estou a enviar o que recolhi sobre o meu camarada David Leão, de Rio Tinto, que foi parar à Guiné com a esperança de ir para Angola.

Juvenal Amado



José Carlos Cordeiro Pinto, trolha de profissão, natural de Rio Tinto, morreu em combate em 1963, 12 dias depois de desembarcar em Angola.

Os pais receberam a dolorosa notícia e também documentação, que livraria de mobilização qualquer filho quando chegasse a altura de ser chamado à vida militar.

O irmão David Leão, oito anos depois é incorporado no exército em 1971 no R14 de Viseu, fez a especialidade de Sapador de Infantaria no BC 3 de Bragança, acabando colocado no BC 5 Lisboa.

Mobilizado, apresentou-se em Novembro de 1971 no RI 2 de Abrantes, para formar batalhão. Este seria o seu destino, o BCAÇ 3872 que iria para a Guiné.

A mãe perguntava-lhe se ele tinha metido os papéis que o livrariam de uma mobilização, ele dizia que sim, mas no íntimo esperava ser mobilizado para Angola e ter oportunidade de combater contra quem lhe tinha matado o irmão. Uma ideia um pouco romântica e de difícil concretização na verdade.

O Batalhão 3872 embarcou para a Guiné no Angra do Heroísmo no dia 18 de Dezembro de 1971 e o nosso David vai integrado no Pelotão de Sapadores.

A promessa feita à mãe não passou disso mesmo de uma promessa.

O nosso camarada passou por aquilo que os outros passaram. Picagens, colunas, emboscadas, patrulhas nocturnas, armadilhar sítios para evitar infiltrações do inimigo, etc. No fim da comissão, em Janeiro de 1974, todo o Pelotão de Sapadores acabou por ser enviado para Buruntuma onde, sobre as ordens de Marcelino da Mata, foi encarregue da minagem em redor do referido destacamento.

Não foram boas noticias pois já tínhamos acabado a comissão, mas a zona leste junto à fronteira estava a ferro e fogo, e o comando achou no maior secretismo, enviar uma coluna para levar esses elementos bem como o equipamento necessário para o efeito.

O esperado ataque acabou por não vir porque o PAIGC acabou por atacar com foguetões outros destacamentos. Se não estou em erro, Canquelifá foi um dos premiados com a atenção do IN.

Felizmente para todos o camaradas, tudo correu bem e o regresso fez-se a Galomaro já o 3872 está espera de ser rendido, o que aconteceu em Fevereiro, acabando por embarcar em Março para Bissau.

A 28 do mesmo mês embarcou no Niassa, desembarcando em Lisboa no dia 4 de Abril de 1974.

Bem, é mais uma história com gente dentro, com os seus desejos e anseios talvez com uma grande dose de ingenuidade.

David Leão, na foto, o terceiro a partir da direita, sentado no chão

O David é figura presente sempre que pode nos almoços da CCS, embora com grande dificuldade pois tem que pedir boleia a quem vá o que nem sempre é possível.

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Nota do editor

Último post da série de 29 DE DEZEMBRO DE 2019 > Guiné 61/74 - P20510: Estórias do Juvenal Amado (63): Galomaro, 1972 - Outros Natais

quinta-feira, 11 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25372: Os 50 anos do 25 de Abril (9): Honra a dois dos heróis que o país esqueceu, Salgueiro Maia e José Afonso (Juvenal Amado, ex-1.ª Cabo Condutor Auto da CCS/BCAÇ 3872)

Os Nossos Heróis

Muito se fala de heroísmo e acabamos por pensar neles em termos de perfil como ficam bem nas capas da revistas onde passam a ser ícones, admirados como exemplo como estrelas de cinema onde são glorificados. Olham a morte de soslaio com o cigarro ao canto da boca, compondo imagem de deixós-poisar tipo super-homem que só temia a criptonite.

De heróis fala história, pelas suas conquistas, pelos seus actos de bravura e pelo que deram aos impérios.

Esses heróis foram-se com o fim dos mesmos impérios, não poucas as vezes receberam os louros pelo que outros menos importantes fizeram, mas que não tinham estatuto para isso. Foram mais os esquecidos dos que premiados.

Mas os heróis que eu conheci eram jovens perfeitamente normais e que se olhassem para eles em nada se vislumbraria essa gesta guerreira. Não eram bons soldados e não eram exemplos de postura, alguns não sabiam ler e escrever para além do nome. Iam para o mato com pouca ou nenhuma vontade e, não poucas vezes, remoíam e praguejavam contra quem os obrigava a ir. Tinham medo? Ter medo é normal e a valentia só aparece quando o vencemos.

As razões porque rejeitaram um impedimento na cantina para ficarem com os seus camaradas de pelotão e o caso do meu camarada David Leão, que rejeitou a hipótese de não ser mandado para a Guiné por o irmão ter sido morto em combate em Angola, são uma daquelas coisas difíceis de explicar.

Será que as escolhas nos definem ou é irreverência, falta de bom censo ou ainda a curiosidade pelo caminho que temos pela frente?

Contaram-me que um capitão de uma companhia, condecorado por feitos em Angola, fugiu para o quartel quando os homens que comandava caíram numa emboscada onde morreram vários. Era um herói que quebrou?

O homem e as suas contingências.
Salgueiro Maia comanda uma coluna de blindados e soldados no Terreiro do Paço, no dia 25 de Abril de 1974
Foto de Eduardo Gageiro - Com a devida vénia a Visão

Durante aqueles anos morreram em emboscadas, minas e ataques de artilharia aos destacamentos. Também morreram de acidentes e hepatite bem como outras maleitas adquiridas lá.

Por muito que nos custe, depois do regresso morreram camaradas, que durante as suas comissões praticamente nunca saíram do quartel onde tinham impedimentos, que serve de prova que nós não fazemos o caminho mas o caminho é que nos faz a nós.

Mas voltamos aos que gostariam de ser glorificados e para isso até fariam o pino. Mas o herói é aquele que dá com a mão direita sem que a esquerda veja. Perdoem-me a utilização deste trocadilho normalmente usado para fins de caridade. Melhor, o herói age em prol dos outros com desprezo pelo seu bem estar físico, mas não pensa nisso. Dá o que tem, mesmo que lhe custe a vida para a qual não instituiu preço nem contrapartida.

Aproxima-se uma data que encheu Portugal de actos heróicos. Marcharam pela paz e derrubaram com risco da sua vida e carreira, contra um regime que nos tinha mandado para um atoleiro que custou tantas vidas e lágrimas.

Não actuaram sozinhos, outros durante anos combateram, sofreram nas prisões e morreram para abrir o caminho para uma realidade nova, longe do obscurantismo pequenino e castrador.

Libertaram outros heróis anónimos, deram a esperança daquela madrugada à esperança de um país sem grades e sem correntes.

Foram homens que não correspondiam a nenhuma matriz, mas que o coração excedia em muito a país que os viu nascer.
José Afonso
Com a devida vénia a TimeOut

A História dos países faz-se desses homens que um dia resolvem que têm outra coisa a fazer do que preservar a sua vida.

O 25 de Abril é um dia inesquecível, impar e nada do que disserem dele lhe retirará o brilho, quando uma nação inteira rejubilou com a liberdade alcançada.

Honra a dois dos heróis que o país esqueceu, Salgueiro Maia e José Afonso.

Viva o 25 de Abril
Juvenal Sacadura Amado
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Nota do editor

Último post da série de 11 de Abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25369: Os 50 anos do 25 de Abril (8): Convite para a inauguração da exposição "O MFA e o 25 de Abril", amanhã, dia 12 de Abril, pelas 17h00, na Gare Marítima de Alcântara - Lisboa (Pedro Lauret, Capitão-de-Mar-e-Guerra Reformado)

sábado, 16 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25279: Os 50 anos do 25 de Abril (2): O meu primo Luís Sacadura, furriel miliciano, natural de Alcobaça, hoje a viver nos EUA, estava lá, no RI 5, Caldas da Rainha, no 16 de marco de 1974, e mandou-me fotos dos acontecimentos (Juvenal Amado)


Foto nº 1 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Posto com Reforço.


Foto nº 2 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Capitão Virgílio Varela,  um dos comandantes da revolta


Foto nº 3 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Preparados para defender o quartel


Foto nº 4 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Oficiais revoltosos


Foto nº 5 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Junto à porta de armas: tempo de incerteza (i)


Foto nº 6 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Junto à porta de armas: tempo de incerteza (ii)


Foto nº 7 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > 
Junto à porta de armas: tempo de incerteza (iii)


Foto nº 8 >  Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > O quartel já cercado pelas forças governamentais


Foto nº 9 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Jipe com parlamentar governamental, o brigadeiro Pedro Serrano


Foto nº 10 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Pelo aspecto do brigadeiro,  já se estava no capitulo das ameaças. (A imagem original tem um defeito de revelação ou de exposição, que procurámos corrigir.)


Foto nº 11 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Serviço audiovisuais


Foto nº 12 > Caldas da Rainha > RI 5 > 16 de março de 1974 > Furriel mil Luís Sacadura, meu primo  que me enviou as fotos dos EUA.

Fotos (e legendas): © Luís Sacadura / Juvenal Amado (2011). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Reproduzimos aqui a mensagem de Juvenal Amado (ex-1.º cabo cond auto-rodas, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74), com data de 28 de maio de 2011, publicada no poste P8359, de 1 de junho de 2011 (*):
 
O 16 DE MARÇO DE 1974 EM FOTOS

O meu Batalhão estava no Cumeré já a aguardar embarque quando se deu o levantamento das Caldas da Rainha.

Foi com natural apreensão que essas notícias chegaram até nós, pois, já com 27 meses de comissão, os nossos receios viram eventuais atrasos no nosso embarque resultante da situação que se vivia na Metrópole.

Ainda foi alvitrado no gozo, por alguém, que quando desembarcássemos nos seria distribuída novamente as G3 e ainda acabávamos na Serra da Estrela.

Quanto a mim juntava a essas preocupações o facto de o meu primo direito Luís Sacadura, que era furriel miliciano, e o Caetano, que era alferes miliciano, os dois de Alcobaça, estarem nessa altura a cumprir serviço militar no referido quartel e que decerto se teriam envolvido nos acontecimentos, de que resultaram à volta de 200 prisioneiros.

O meu primo já estava em liberdade quando desembarquei em 4 de Abril de 1974, mas o Caetano só o vi depois do 25 de Abril quando foi solto.

Hoje quem lê sobre os acontecimentos os nomes de militares ligados à Guiné, são prova de que o facto terem sido lá combatentes, assumiu um peso muito grande tanto neste levantamento como no 25 de Abril, que levaria por diante o derrube do regime.

Por último, as fotos foram-me enviadas dos EUA pelo o meu primo com a devida autorização para as publicar (...)

2. Comentário do editor LG (*):

(i) Recebemos do Juvenal Amado a seguinte mensagem, com data de 27 de maio de 2011:

"Carlos: Recebi fotos do 16 de Março 1974 a quando do levantamento das Caldas da Rainha. As mesmas foram-me enviadas por um primo meu a morar nos USA que participou na referida tentativa.

"Não sendo assunto directamente associado com a Guiné, venho então saber se ao blogue interessa o assunto. Fico a aguardar a tua opinião e se ela for um sim escreverei alguma coisa para acompanhar as fotos." (...)


(ii) A nossa resposta dos editores só podia ser sim, sem quaisquer reservas... Independentemente da "leitura" dos acontecimentos, e da contextualização do 16 de Março de 1974, seria no mínimo uma "pena" que estas fotos, tiradas pelo Luís Sacadura, de grande interesse documental, e até de boa qualidade estética (traduzindo o momento de grande tensão dramática que foi esse dia), fossem um dia parar a um "caixote do lixo" americano...

Obrigado, Luís ("God Save You!"), obrigado, Juvenal... Tudo o que diz respeito à nossa Pátria e à nossa História, nos interessa, embora com particular enfoque na guerra da Guiné (1961/74)... Mas onde começa e acaba a "guerra da Guiné"? Para nós, que ainda estamos vivos, e cultivamos a arte e o prazer da memória, ela ainda não acabou de todo... 
 
(iii) Cinquenta anos depois do 16 de março de 1974, e do 25 de Abril, todas estas fotos são preciosas (**). O 16 de Março não teve um grande fotógrafo à altura como o Alfredo Cunha (que fez na madrugado do 25 de Abril fez a reportagem da sua vida)... 

São fotos, amadoras, que merecem ser republicadas. Aliás, temos escassas referências no blogue ao "16 de Março" e a imprensa da época, devido à censura, não pôde dar informação detalhada sobre o ocorrido...

Três dias depois os leitores do "Diário de Lisboa", como eu (na época), ficaram a saber, por uma pequena notícia da SEIT (antigo SNI) que tinham  sido presos 33 oficiais (e não 200, como dizia alguma imprensa estrangeira) "implicados na insubordinação verificada no Regimento de Infantaria nº 5"... (Repare-se que nem a RTP Arquivos tem imagens do cerco ao RI 5)...

3. O historiador e biógrafo de Spínola, Luís Nuno Rodrigues, escreveu: 

"No rescaldo do episódio, cerca de duas centenas de militares são presas, entre ele os membros do MFA mais próximos do general António de Spínoala, como Almeida Bruno, Manuel Monge, Casanova Ferreira, Armando Ramos e Virgílio Varela" (...). 

E mais adianta: 

"O '16 de Março'  tinha sido, por conseguinte, uma tentativa algo atabalhoada da 'ala spinolista' do MFA de fazer despoletar um movimento para o derrube do regime e para a entrega do poder ao general. 

"A acção fora em grande parte motivada pela tomada de posição de algins oficiais do CIOE de Lamego (que acabariam por não sair do quartel), pelas atitudes de dois antigos oficiais de Spínola na Guiné (Leuschner Fernandes e Carlos Azeredo) e pelo impeto dos oficiais oriundos de milicianos do RI5  das Caldas da Rainha". (Fonte: Excertos de "Spínola: biografia",  Lisboa: A Esfera dos Livros, 2010, pág. 236).




Diário  de Lisboa, edição de terça feira, 19 de março de 1974, pág, 1
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Notas do editor:

domingo, 21 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25096: Blogpoesia (795): "Os sítios que são só recordações", por Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR da CCS / BCAÇ 3872

Galomaro depois de forte chuvada. Foto: © Ex-Fur Mil Sapador António Maria Fernandes (BCAÇ 3872)


1. Em mensagem de 20 de Janeiro de 2024, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), enviou-nos este seu poema:


Os sítios que são só recordações

Vivíamos para o futuro
Como se estes momentos fossem um interlúdio
Um compasso de tempo
Sabíamos da beleza que nos rodeava
Não sei se estávamos tão presentes para ela
Estávamos obcecados por outras paragens.
Depois veio a saudade.
Fizemos planos para voltar
Chamemos-lhe quimera dos sentidos
Utopia que construímos
Nunca reencontraríamos a nossa juventude
Há muito perdida naqueles lugares.


Juvenal Sacadura Amado
09/01/2024

A caminho do Dulombi
Pôr-do-sol
Pôr-do-sol

Fotos: © Ex-Fur Mil Sapador António Maria Fernandes (BCAÇ 3872)
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Notado editor

Último poste da série de 17 DE SETEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24665: Blogpoesia (794): "Lágrima de Sol", por Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (Canquelifá e Bigene, 1966/68)

domingo, 3 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24913: Efemérides (421): À beira de fazer 52 anos do embarque do BCAÇ 3872 para a Guiné, admiro-me hoje da forma complacente com que encarei a viagem bem como o destino (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR)


1. Em mensagem de 29 de Novembro de 2023, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), relembra o triste ano de 1971, quando embarcou para a Guiné:

Vai fazer 52 Anos

À beira de fazer 52 anos volvidos a 18 de Dezembro de 1971, sobre o embarque do Batalhão de Caçadores 3872 no Angra de Heroísmo para a Guiné, tento lembrar o acontecimento e o que senti e admiro-me hoje da forma complacente com que encarei a viagem bem como o destino.

Talvez os anos que a guerra já durava tivessem o efeito anestesiante nos nossos sentimentos e medos. Assim assentei praça à beirinha dos 21 anos esperançoso de que tudo ia correr bem, tudo parecia um sonho mesclado entre a dúvida, a ignorância e a curiosidade que aquela aventura me trazia para a qual eu não tive vontade própria. Como milhares de jovens não escolhi, escolheram por mim.

As alternativas eram difíceis como me lembro. Fugir da incorporação era muito doloroso pelo que, acarretava o julgamento público de cobardia também a perca de cidadania dos lugares e da família, do emprego e de toda uma vida até aí programada.

Também pesou o tipo de guerra em fogo lento em que os mortos não eram parangonas dos jornais mas sim pequenas notícias perdidas nas suas páginas. Quando morria ou voltava gravemente ferido algum filho da terra era quase noticiado a meia voz. O tempo se encarregava de nos distanciar dos dramas que a perda causava. Muitas as vezes se instalaram as dúvidas se era verdade ou se tinha sido assim que aconteceu e se um dia destes ele não aparecia por cá.

Não me despedi dos meus país como se não fosse a ultima vez que os via. Disse-lhes até para a semana, pois ainda cá vamos fazer o IAO e só depois saberíamos a data de embarque.

Formámos batalhão em Abrantes e aí conheci e comecei a criar laços com os camaradas com quem ia conviver nos próximos dois anos. Na altura não sabíamos que alguns não voltariam vivos, mas isso estava longe das preocupações pois como eu muitos deviam viver o dia-a-dia sem pensar no tempo e o que íamos encontrar. A realidade se encarregou de afugentar medos e comprovar muitos dos nossos receios. A realidade era muito diferente do que imaginei, não digo para melhor nem para pior, era simplesmente surreal e muito improvisado. E era surreal porque muitas das coisas não faziam sentido, estávamos mal preparados, íamos aprender a combater como os trolhas aprendem o ofício de pedreiro a alombar baldes de massa e tijolos.

Não abundava a confiança, por outro lado a vida fluía, bebíamos, jogávamos, discutíamos e cumpríamos as tarefas sem caracter de urgência, as centenas de vezes que as cumpríamos isolava-nos do perigo real, que estaria um dia à nossa espera de certeza com resultados funestos. Não aconteceu só aos outros.

Que jovens eram aqueles? O que deviam à Pátria que tão mal os tinha tratado, com trabalho infantil pesado nos campos e nas fábricas, falta de oportunidades para estudar e no fundo a ansiar pelo fim do serviço militar obrigatório para que os deixassem em paz e muitos milhares emigrarem em busca de oportunidade que este país não lhes dava?

Ligava-nos a língua, o sangue e a vontade de regressar sãos e salvos.

Quantos anseios ficaram por cumprir, quantos filhos conheceram os pais quando já andavam, quantos filhos não chegaram a conhecer os pais?
Dezembro de 1971 > Partida do BCAÇ 3872 para a Guiné no navio Angra do Heroísmo

Regressámos não como heróis libertadores, mas como fazendo parte da máquina opressiva que nos dominava. Fomos olhados de lado e escarneceram do nosso sofrimento. Tentamos esquecer o mais rapidamente possível, só nunca nos esquecemos uns dos outros.

Aquele tempo funcionou como uma grande família se tivesse formado, dela saíram milhares de irmãos, que ainda hoje são motivo para encontros onde brindamos ao tempo, outro tempo e a outra idade. De facto fomos mas nunca regressamos inteiramente de lá, mas relembrar o passado não implica vivermos presos a ele.

Estes 52 anos passaram a correr, não sentimos o peso físico das peripécias que ultrapassamos, são só datas, que passaram como escolhos no caminho, pois foi assim que ele foi feito.

Dezembro de 1971 > A bordo do Angra do Heroísmo, a caminho da Guiné

Os relógios contaram tempo
O tempo marcou os dias
Os dias somaram calendários
Dos calendários desprenderam-se as folhas
E, nós ficamos nus
Despojados como Plátanos no Inverno
Porque os relógios nunca param

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Nota do editor

Último poste da série de 24 DE NOVEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24880: Efemérides (420): A 35ª CCmds (Teixeira Pinto, Bula e Bissau, 1971/73) partia, há 52 anos, às 11h00, para o CTIG no T/T Angra do Heroísmo (Ramiro Jesus, Aveiro)

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Guiné 61/74 - P24869: (In)citações (260): Ainda os Esquecidos. Para o António Silva, Soldado Paraquedista morto em Angola em 1963 (Juvenal Amado)

Lobão da Beira, Tondela, 2017 > Funeral do Soldado Paraquedista António Silva

1. Em mensagem de 19 de Outubro de 2023, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), fala-nos dos (combatentes) Esquecidos, nós todos afinal, mortos ou vivos.


Ainda os Esquecidos

Para o António Silva, Soldado Paraquedista morto em Angola em 1963

Patriotismo é querermos o melhor para o nosso país.
Nacionalismo é querermos o país só para nós.

Os dois foram homenageados na Assembleia da República por diferentes razões a meu ver. Mereceram a homenagem?

Um era esquivo, não tinha travões na língua, discreto quanto à sua vida pessoal, rico dono de uma cadeia de supermercados, que se enchem quase todos os dias de gente que o enriqueceu e promete continuar a enriquecer os seus familiares nos anos mais próximos. Dizem que à custa de salários baixos e de o defender com a boca toda, era responsável pelo fecho de milhares de pequenas empresas, lojas, talhos, mercearias, retrosarias e até ao definhar de mercados tradicionais, onde os produtores vendiam os seus produtos directamente ao consumidor.

Digno de todas a honras, para além de entender que devia pagar o menos possível aos seus trabalhadores, também não estava de acordo com a tributação devida no seu país e passou a sede das suas empresas para a Holanda, onde paga menos. Era comendador pelos serviços prestados ao nosso país, aliás como muitos que o merecem, e outros tantos ou mais que o não merecem, como se veio a comprovar-se nos anos seguintes.

Quanto ao outro que vi actuar desde cedo como músico, era como dizem, um gajo porreiro, amigo do seu amigo, que integrado numa banda primeiramente punk e depois rock, que quer se goste ou não, marcou trinta e tal anos das nossas vidas, pois a sua música não nos atingiu a nós, atingiu os nossos filhos e também netos. Na verdade ele não explorou ninguém, não enriqueceu (quem é que enriquece pela música em Portugal?) mas levava milhares de apreciadores atrás dele para onde fosse, como eu fui testemunha disso. Quando ele estava no palco sabíamos que conhecia muita gente que ali estava e nós, tínhamos a sensação de pertencermos ao seu núcleo de amigos sem nunca termos estado a menos de trinta metros dele. Tenho pena que ele tenha morrido, do outro tenho uma dualidade entre o lamento e a embirração.

No dia que eram homenageados na AR, chegava a Portugal finalmente o soldado paraquedista António Silva morto em combate Angola 1963. Morreu por uma Pátria que já não existe.

Essa Pária alterou no seu conceito, já não tem guerra, modernizou-se, encheu-se autoestradas, dos tais supermercados, de temas musicais que não lhe diriam possivelmente nada, tem uma juventude que não sabe o que é ter guerra estar longe de casa sem telefone por vezes sem água e com uma alimentação que faria torcer o nariz a qualquer jovem frequentador de centros comerciais de hoje.

O soldado António Silva por lá esteve morto e enterrado 11 anos antes da viragem do seu país e, se voltou no dia 6 de Dezembro de 2017 a pisar solo pela Pátria, pela qual deu a vida, não foi o Estado que lhe prestou esse derradeiro e devido serviço.

No dia em que homenagearam dois, talvez, discutíveis portugueses na AR, esqueceram aquele que morreu pela Pátria, lamentavelmente não lhes mereceu uma só palavra, que era indiscutível.

Os esquecidos, continuam isso mesmo, esquecidos.

Feliz Natal e um Grande Ano para todos os camaradas.

Escrevi em 2017 mas como continua actual cá vai.
Juvenal Amado

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Foto: Nuno André Ferreira - Com a devida vénia ao Correio da Manhã
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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE NOVEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24860: (In)citações (259): Depois da "mina A/P" que me atirou, em 29/10/2023, para um leito de hospital, com o fémur partido, estou de regresso à vida, à luta, a escrita, enquanto a a recuperação prossegue (José Saúde, Beja)

domingo, 4 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23844: Blogoterapia (308): As desejadas férias e a angústia do regresso à Guiné (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR)

1. Em mensagem de 1 de Dezembro de 2022, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), fala-nos das suas férias na metrópole e na angústia do regresso  Guiné.


As desejadas férias

Gozei os meus trinta e cinco de férias entre Outubro e Novembro de 1972.

As férias eram ansiosamente esperadas e assim eram, não muitas vezes, um pouco decepcionantes em relação às expectativas criadas. É como desejar muito uma coisa, que se transforma num balão e que esvazia lentamente. O facto de ter de regressar tirou muito do prazer de voltar a casa, abraçar os meus pais e irmãos, percorrer os locais beber um café na esplanada do Trindade, estar longe da bianda com estilhaços, das latas com cavala, da ração de combate, o pó da picada. Tudo sabia a ilusão estar ali.

Bem sei que praticamente todos os amigos da minha geração estavam a cumprir as suas comissões. Quando ia ao café,  era quase um estranho só os mais velhos ou mais novos me conheciam.

Por assim dizer a minha vida estava parada, não podia ou não queria ter esperança ou dar esperança, aos que me rodearam com todo o carinho e que tudo fizeram para não me sentir deslocado, mas de alguma forma eu também estava ausente como se não tivesse vindo todo no 727 da TAP . Parte de mim tinha ficado lá, junto dos camaradas nos dias tórridos, nos cheiros bem como nos sons que se expandiam pelo ar logo de madruga.

Hoje encontrei o recibo de uma prestação da minha viagem, 2.235$50 julgo que (pesos) escudos da Guiné. Uma pequena fortuna para aquele tempo, se fizer as contas custou todo o dinheiro que cá ficava depositado até à data.
Uma curiosidade era ter a data do meu desembarque e o fim da comissão para 17 de Setembro de 1973 . Uma espécie de futurologia falhada uma vez que só em finais de Março de 1974 o meu batalhão embarcou no Niassa de regresso a casa.

Vim mais o furriel Fonseca e um camarada do Dulombi a quem chamavam o “Espanhol”. Este camarada era uma pessoa extremamente alérgico a qualquer picada. Assim bastava ser picado por uma formiga daquelas pequeninas pretas para ficar complemente deformado. No avião sentiu-se indisposto e a hospedeira veio com um alka-seltzer. Bom, a reacção alérgica foi de tal ordem, que julgamos que ele não chegava vivo à ilha do Sal. Também viajou no mesmo avião o meu colega de escola primária, Augusto, que estava nos comandos.

Como todos imaginam foi uma festa com uns whiskies, porque o avião era coisa fina e não se bebia lá bejecas nem se comia mancarra.

Fui padrinho de casamento do meu irmão e assim à medida que se aproximava o regresso mais fechado eu me tornei e para os últimos dias eu só desejava desaparecer dali para fora e, já que tinha que ser regressar a Galomaro, que fosse o mais depressa possível.

Parece triste para quem tanto desejou a minha companhia saber que eu não conseguia viver com aquela espada suspensa sobre a cabeça.

Chegado a Bissau, outro problema se pôs que foi o de regressar a Galomaro,  o que não era fácil porque a grande via de acesso era o Geba e não se podia ir a nado. Após alguns dias consegui transporte numa LDG até ao Xime onde fui recolhido por uma coluna do meu batalhão.

Por estranho que pareça senti-me seguro como se o que acontecesse não fosse o esperado.
Foto da festa do meu regresso. Nessa noite atacaram Campata com pelo o menos seis mortos confirmados entre os guerrilheiros, dois milicias e varios feridos entre a população. Na foto estão o Ivo, o Catroga, o Silva, eu, o Passos, o Silva e o Ferreira.

Assim regressei a tempo de infelizmente assistir ao período mais difícil do meu destacamento, com ataques a aldeias em auto-defesa, com minas, com o primeiro morto na picada do Saltinho, com a morte do alferes Mota e por fim com o ataque ao arame no dia 1 de Dezembro.

Quando regressei de vez, voltei aos mesmos sítios e encontrei os que já tinham regressado. O ar era mais leve porque a minha ansiedade tinha desaparecido após deixar o Niassa, agora era para ficar.

Um abraço
Juvenal Amado

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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23835: Blogoterapia (307): Nós e eles (Tony Borié, ex-1.º Cabo Op Cripto do CMD AGR 16)