Mostrar mensagens com a etiqueta Cumeré. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Cumeré. Mostrar todas as mensagens

sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Guiné 61/74 - P24607: Facebook...ando (34): José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74): primeiro aerograma que escreveu à namorada, em 27/6/1972: fui almoçar num bar perto do Cumeré, paguei 70$00 e fiquei cheio de fome...





1. Postagem de José Claudino da Silva, 29 de agosto de 2023, no Facebook da Tabanca Grande Luís Graça  
 [é autor da série "Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) ", de que se publicaram 
mais de 70 postes (*); é membro da Tabanca Grande desde 18/10/2017); tem mais de meia centena de referências no blogue; foto à direita, o nosso camarada, nascido em Penafiel, em 1950; reside em Amarante; tem livros publicados e página no Facebook ]:

Cheguei á Guiné no dia 26 de junho de 1972, no dia seguinte em Cumeré paguei 70 escudos por uma refeição.

Naquele tempo a mesma custava 8 escudos na metrópole. Está a prova neste aerograma 
[que se reproduz e transcreve acima]. (**)




Primeiro  aerograma enviado pelo José Claudino da Silva, à sua namorada [Maria Amélia Moreira Mendes] depois de chegar à Guiné. 

Trata-se de um excerto. O aerograma não está completo, acaba aqui, deveria ter mais folhas; "Fiquei cheio de fome, e paguei 70$00, as cervejas são a" [...]. 

Vamos pedir ao nosso camarada para disponibilizar a segunda parte. Para além de informação sobre preços que se praticavam em 1972, em Bissau, o aerograma tem outro interesse documental, por nos dar conta das primeiras impressões de um "periquito" chegado à Guiné, "uma terra onde todas as pessoas nos parecem suspeitas, e hostis, e logo por azar nem bebidas há na cantina"... 


Transcrição  [fixação e revisão de texto: LG]

Cumeré, 27/6/72  1ª [folha]

Meli, saudosa e querida: 

Espero desde já dar-te um pouco de alegria com as poucas notícias que vou passar a contar-te, ou tristeza, isso depende de ti.

Devo dizer-te que o resto da viagem decorreu bem, e sinto-me para já óptimo.

No que diz respeito às impressões que me causou a Guiné, devo confessar-te que me sinto maluco, um calor que nem em calção se suporta, uma terra onde todas as pessoas nos parecem suspeitas, e hostis, e logo por azar nem bebidas há na cantina. A água parece que foi aquecida ao lume, e há pouca.  A única satisfação que me resta é que aqui não há guerra, e a vida que levo é boa, só tenho a dizer que isto não interessa a ninguém pelo resto.

Cumeré situa-se a 6 km de Bissau, mas para se chegar lá tem que se percorrer 45, por não haver estradas a direito, e ter um rio muito largo.

Eu vim para Cumeré separado da minha companhia, juntamente com mais 6 condutores, e só daqui a três semanas é que me junto a ela, por isso, embora me escrevas, não receberei correspondência de qualquer espécie, a não ser daqui a essas três semanas. Terei que ter paciência e suportar esse tempo, depois provavelmente recebo tudo junto, não tenho alternativa e resigno-me.

2ª [folha]

Espero que mesmo assim não me deixes de escrever, porque eu farei o mesmo. 

No local onde me encontro é um quartel  de instrução de adaptação ao terreno para condutores, e de I.A.O., e estão aqui mais de 600 homens, entre eles mais de 20 colegas de Penafiel, e conhecidos da recruta, etc., etc. Foi bom assim, [pois não me] sinto só.

A única coisa que me lixa é  a falta de bebidas, e o calor sufocante que aui está é insuportável. Além disso, os mosquitos  não nos deixam dormar, é uma loucura uma pessoa vir para aqui, mas não temos outro remédio, e temos que aguentar, ou melhor ou pior.

Aqui nos subúrbios do quartel há um bar, dirigido por um branco, onde servem refeições. Eu fui lá almoçar, pois aqui a comida não presta. Fiquei cheio de fome, e paguei 70$00, as cervejas são  a [...]


Foto (e legenda): © José Claudino da Silva (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. Excerto do poste P18002 (***):

(...) Estou agora a lembrar-me que fui sempre um pouco medricas e mesmo que, ao chegar a Bissau, tivesse sido separado dos meus camaradas da 3ª companhia porquanto eles foram para Bolama e eu fui para Cumeré. O que é certo, por aquilo que escrevi, logo no primeiro dia que pisei solo africano, não tive um receio por aí além. Dizia eu!

“Em Cumeré estamos a tirar o I. A. O. (Creio que a sigla significa: Instrução de Aperfeiçoamento Operacional) Aqui não há guerra mas as pessoas parecem-me todas hostis. Neste quartel estão cerca de 600 homens. O calor é sufocante e não há bebidas frescas, nem grande comida e se eu achava caro uma refeição no Porto custar7$50, já me avisaram que fora do quartel custa 70$00. Vê bem que ladrões. Acho que são brancos que vivem a explorar os 'Periquitos' como nós”. (**)


3. Comentário do editor LG:

Usando o conversor da Pordata, verificamos que 7$50 e 70$00 em 1972 valeriam hoje (2023),  2,00 €  e 18,00 €, respetivamente. 

Ao escudo ("peso") da Guiné (emitido pelo BNU - Banco Nacional Ultramarino), temos que abater 10% (de acordo com a taxa de câmbio que se praticvaa então em Bissau)...Se uma refeição no Porto custava, a preços de hoje, 2,00 €, em 1972, em Bissau, custaria  16, 2 €  (=18 € x 0,90).

Em 1969, uma refeição (bife com ovo a cavalo + cerveja) em Bafatá, no restaurante "Transmontana", custava-me  20 "pesos", o equivalente, hoje, a 6,30 €  (=7 €  x 0,90).

Como se vê, de 1969 para 1972, a inflação (ou a especulação, típica da economia de guerra) deu cabo do patacão dos desgraçados dos combatentes que íam parar com os quatro costados à Guiné!

Uma explicaçáo sobre o converssor da Pordata: 

"Esta ferramenta permite converter para preços do ano corrente qualquer montante monetário do passado, desde 1960, utilizando o deflator anual do Índice de Preços no Consumidor (IPC) "base 2012". Trata-se de transformar valores a preços correntes/nominais em valores a preços constantes/reais, descontando a inflação"
_______________

Notas do editor:

(***) Último poste da série > 23 de agosto de 2023 > Guiné 61/74 - P24581: Facebook...ando (33): António Alves da Cruz, ex-fur mil, 1.ª CCaç / BCAÇ 4513 (Bolama, Aldeia Formosa, Nhala e Buba, mar1973 / set 1974); vive em Almada

quinta-feira, 24 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24583: História da CCAÇ 2792 (Catió e Cabedú, 1970/72) - Parte VII: agosto de 1982, rendição pela CART 6251/72 e reagrupamento no CIM do Cumeré, ao fim de 22 meses

Guião da CART 6251/72 (Catió, 1973/74) 

Cortesia de Carlos Coutinho, 2009) 


1. Continuação da publicação de alguns alguns excertos da história da CCAÇ 2792 (Catió e Cabedu, 1970/72) (**).

É mais uma das subunidades, que estiveram no CTIG, e que não têm até à data nenhum representante (formal) na Tabanca Grande.

Uma cópia da história da unidade foi oferecida ao Centro de Documentação 25 de Abril, em vida, pelo então major general Monteiro Valente, ex-elemento do MFA, com papel de relevo nos acontecimentos do 25 de Abril, na Guarda (RI 12) e Vilar Formoso (PIDE/DGS), bem como no pós- 25 de Abril. 

Acrescente-se ainda que o antigo cap inf Monteir0 Valente, foi também comandante da GNR, e era licenciado em História pela Universidade de Coimbra. Entre outros cargos e funções, foi instrutor, comandante de companhia e diretor de cursos de Operações Especiais, no Centro de Instrução de Operações Especiais, em Lamego (1968-1970, 1972-1974). (Foto à direita, cortesia do blogue Rangers & Coisas do MR", do nosso coeditor, amigo e camarada Eduardo Magalhães Ribeiro).

Uma cópia (parcial) desta história da CCAÇ 2792, chegou-nos às mãos há uns largos tempos.


História da CCAÇ 2792 (Catió e Cabedú, 1970/72) - Parte VII:

agosto de 1972:  a rendição pela CART 6251 e reagrupamento 
no CIM do Cumeré, ao fim de 22 meses


Perído de de 1 a 31 de agosto de 1972

1. Situação

Até 10 de agosto, decorreu o treino operacional da CART 6251 (*), que veio render a CCAÇ 2792.

A 11, iniciou-se o período de 10 dias de sobreposição. Às 24h00 do dia 20 cessou, para esta subunidade, a CCAÇ 2792, a respondabilidade do subsetor de Catió (zonas de ação de Catió e Cabedú), transitando para a CART 6251.

A 11, marcharam com destino ao CIM de Cumeré um Gr Comb e alguns elementos da formação da guarnição de Cabedú, e a 13 mais um Gr Comb e parte da formação da guarnição de Catió. A 25, sairam de Cabedú os restantes militares da companhia. E a 25 o comando e os restantes elementos que estavam em Catió. Seguiram em LDM com destino ao CIM do Cumeré, onde chegaram no dia seguinte.

A 25 de agosto de 1972, finalmente, processou-se o reagrupamento da companhia, após vinte e dois meses de separação.

2. Atividade IN

O IN, "em  sinal despedida" à CCAÇ 2792 e de "saudação" à CART 6251, levou a feito neste período flagelações sobre os aquartelamentos das NT, situadas na chamada Frente de Catió:
  • em 2, às 18h40, flagelou Cabedú  com mort 82 e canhão s/r , sem consequências;
  • a 18, às 18h39, flagelou Catió com foguetões 122 mm,  causando 3 mortos e 2 feridos entre a população;
  • no mesmo dia, às 20h30 e às 21h30, voltou a flagelar Catió com 2 foguetões 122 mm, mas desta vez sem consequências;
  • a 19,  às 5h50,  nova flagelação a Catió, sem consequèncias.
De destacar, no que se refere às NT, no campo socioeconómico e psicológico,  o apreço que foi transmitido, à CCAÇ 2792,  por parte do Com-Chefe, pelo bom rendimento dos trabalhos do reordenamento de Quibil (Nota nº 2227/POP/72 do QG/CCFAG).

3. Ficha de unidade > CART 6251/72

Companhia de Artilharia nº 6251/72
Identificação CArt 6251/72
Unidade Mob: RAP 2 - Vila Nova de Gaia
Cmdt: Cap Mil Art Virgílio Augusto da Silva Ferreira Martins
Divisa: -
Partida: Embarque em 22Jun72; desembarque em 22Jun72 | Regresso: Embarque em 09Ag074

Síntese da Actividade Operacional

Após efectuar a IAO, de 23jun72 a 22jul72, no CMI, em Cumeré, seguiu em 23jul72, para o subsector de Catió, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 2792.

Em 21ago72, assumiu a responsabilidade do referido subsector de Catió, com dois pelotões no destacamento de Cabedú, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCaç 4510/72. 

Em 12dez72, a zona de acção do destacamento de Cabedú passou a constituir um novo subsector, ficando então na dependência do COP 4, criado na referida data, e depois do BCaç 4514/72.

Em 1mar74, foi substituída no subsector de Catió pela 3ª Comp / BCav 8320/72, ali colocada do antecedente em reforço, tendo então assumido a responsabilidade do subsector de Cabedú em 3mar74 e ficando na dependência do BCaç 4514/72 e depois do BArt 6520/72. 

Entretanto, passou a ter dois pelotões destacados em Catió, em reforço da guarnição local e dar colaboração na segurança e protecção dos trabalhos da estrada Catió-Cufar, na dependência do BCaç 4510/72 e depois do BCaç 4510/73.

Em finais de jul74, foi substituída no subsector de Cabedú pela CArt 6552/72 e recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa nº 105 - 2ª Div/4ª Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: fichas das unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 484.

sábado, 3 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22339: Reavivando memórias do BENG 447 (João Rodrigues Lobo, ex-cmdt do Pelotão de Transportes Especiais, Brá, 1968/71) - Parte III: Cumeré, março de 1969




Guiné > Sector  de Bissau > Cumeré > Março de 1969 > Deslocámo-nos num zebro e estamos a subir o pontão. Aqui funcionava um CIM (Centro de Instrução Militar) e estava sediado o COMBIS .-Comando de Agrupamento de Bissau. Muitas unidaesd que chegavam ao CTIG, faziam aqui a IAO e, uma vez terminada a comissão, aguardavam aqui o embarque para a Metrópole.

Fotos (e legenda): © João Rodrigues Lobo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Duas mensagens de João Rodrigues Lobo que agregamos num texto único:


[ João  Rodrigues Lobo, ex-alf mil, cmdt Pelotão de Transportes Especiais / BENG 447 (Bissau, Brá, dez 1967/fev1971): fez o 1º COM, em Angola, na EAMA, Nova Lisboa; vive em Torres Vedras onde trabalhou durante mais de 3 décadas como chefe dos serviços de aprovisionamento do respetivo hospital distrital; membro nº 841 da Tabanca Grande.]


Date: quarta, 23/06/2021 à(s) 15:50
Suject: PTE - BENG 447
Date: quinta, 24/06/2021 à(s) 16:44
Subject: Angola

Boa tarde,

Sobre o meu "curriculo": Não cheguei a frequentar o IST em Lisboa . Chumbei no exame de admissão realizado em Luanda. Depois da passagem á disponibilidade frequentei o Curso de Engenharia mecânica da Universidade de Luanda mas desisti porque arranjei um óptimo emprego como Agente de Navegação internacional.

Quanto a questões colocadas sobre as fotos de Angola (*):

Nas recrutas, em Nova Lisboa, quer no COM que fiz na EAMA quer depois na instrução que dei no CICA a arma diária era a Mauser. Só na parada usei a Uzi ou FBP, e de serviço, a pistola Walter 9mm.

A coluna da foto, era de instrução para os condutores auto se habilitarem a conduzir em coluna em condições reais. Mais uma vez com as Mauser embora na foto só se veja uma.

A zona era calma na data (1968) mas nunca se sabia se surgiriam surpresas.

A coluna parou para a "bucha" perto do "Paraíso " que ficava nos arredores de Nova Lisboa (Huambo).

As Fotos 13 e 14 são do Jornal publicado pela Região Militar de Angola (Só tenho o número 18). A assinatura da capa é "Higino".

Sobre outars questões e comentários que tenho lido no blog:

Residia em Luanda quando fui incorporado, nessa altura a regra era "quem chumbasse ia para a tropa" e eu chumbei !

Sobre a minha ida para a Guiné, sim, a única explicação foi o intercâmbio entre Províncias Ultramarinas.  Estava no Quartel General de Angola e um Tenente-Coronel foi ter comigo e anunciou a mobilização. Mais disse ter questionado o Ministério, por rádio, porque eu fazia lá falta já estando habituado ao serviço e a chefiar os MVL,  e, só lhe responderam que não tinham mais explicações e eu iria ser substituído por um ido da Metrópole. 

Do Primeiro COM em Nova Lisboa, dado por Comandos, só saímos 6 para Transportes Rodoviários pois tinhamos óculos, e não podiamos ficar nos Comandos. Um reprovou, ficámos 5 e eu fui para a Guiné!
 
Fui em rendição individual, não tendo conhecido quem fui substituir nem quem me substituiu (, ambos idos da Metrópole). Não vou especular sobre o que levou a tal decisão. Fui em avião militar de Luanda para a ilha do Sal em Cabo Verde , onde estive uma semana a aguardar outro voo militar para Bissalanca. (Base aérea em Bissau)

Não estive em Bambadinca,  aliás só saía esporadicamente acompanhando as viaturas ás obras, especialmente das estradas. (Bem protegidos pelos camaradas de armas) ( e embora levasse a minha G3 bem á mão, conduzindo sempre a viatura onde me deslocava).

A coluna das fotografias foi uma dessas colunas e a foto foi tirada após saída de Brá julgo que para a estrada de Có / Pelundo.

Por essa estrada, de Brá a Có, cheguei a ir em carro civil com outros camaradas, pois a guarnição da jangada de João Landim nos transportou para a outra margem, por, nessa data, a estrada até Có ser considerada segura. (Mas pouco , como depois vim a saber...)

Lembro-me das Galion que transportávamos, mas não reconheço o major numa fotografia junto dela, Não me parece ser de Engenharia, ou do meu tempo.

Sobre a tal construção, ou não, de pontões não posso esclarecer absolutamente nada pois não passava pelo meu pelouro.

Vou pôr a memória a funcionar para trocar mais recordações.

Junto duas fotos a caminho do Cumeré , mas subindo o pontão onde fomos num Zebro. (Março de 1969)

Sobre a minha passagem pela EAMA, poderei em próximo post juntar fotografias se tal considerares de interesse neste blog da Guiné.

Os melhores cumprimentos,
João Rodrigues Lobo



Guiné > Sector de Bissau > Carta de Bissau (1949) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Bissau, Brá, Bissalana e Cumeré (na maregm esquerda do canal do  Impernal)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2021)


2. Fichas de unidades> Comando de Agrupamento de Bissau (COMBIS)

Identificação: COMBIS

Cmdt: 
Cor Inf José Martiniano Moreno Gonçalves
TCor Art Aristides Américo de Araújo Pinheiro
Cor Cav Fernando Rodrigues de Sousa Costa
Cor Art Gaspar Pinto de Carvalho Freitas do Amaral
Cor Inf António Mendes Baptista
Cor Inf João Afonso Teixeira Henriques
Cor Inf António da Anunciação Marques Lopes

CEM: 
TCor Inf José Bonito Perfeito
TCor Cav António Maria Rebelo
TCor Art Aristides Américo de Araújo Pinheiro
TCor Inf Carlos Frederico Lopes da Rocha Peixoto
TCor Inf João Polidoro Monteiro
Maj Inf Arménio Soares da Cruz Sampaio Nunes
Maj Cav João Luís Moreira Arriscado Nunes
TCor Inf João Salavessa Moura
TCor Inf João Afonso Teixeira Henriques
TCor Art Altinino Fernandes Gonçalves
TCor Art João Augusto Fernandes Bastos

Divisa: -
Início: 8Jan69 
Extinção: 20Set74

Síntese da Actividade Operacional

Este comando foi constituído a partir do Comando de Agrupamento n." 2952, sendo o seu pessoal nomeado por rendição individual. 

O Agrupamento tinha a missão de garantir a defesa da ilha de Bissau, de assegurar a manutenção da ordem pública e de controlar as vias de comunicação, as populações e os
abastecimentos, utilizando meios e pessoal dos três ramos das Forças Armadas
e das forças militarizadas sediadas em Bissau.

Em 8Jan69, substituindo o CmdAgr 2952, assumiu a responsabilidade da referida zona de acção, com a sede em Bissau e integrando as forças instaladas no respectivo sector, o qual englobava os subsectores de Brá (Bissau), Nhacra e Quinhámel.

Em 6Ag070, este comando passou a ter integrado na sua orgaruca o BArt 2866 e depois o BCaç 2929, incluindo as respectivas CCS, cujo pessoal passou a desempenhar funções no COMBIS. 

Em 1Set72, foi constituída e organizada a Formação do COMBIS, a qual substituíu a CCS do BCaç 2929 nas respectivas funções.

Em 18Nov71, por criação do COP 8, a sua zona de responsabilidade foi reduzida do subsector de Nhacra tendo, a partir de lJu173, o sector de Bissau sido articulado nos subsectores de Brá, Bor, Sa fim, Quinhámel e Prábis, este, apenas de nível pelotão.

Comandou e coordenou a actividades das forças atribuídas, em acções de patrulhamento e reconhecimentos, a par do controlo e fiscalização das populações e das acções de polícia militar e da segurança e protecção das instalações e pontos sensíveis da respectiva zona de acção.

Após ter voltado a integrar a zona de acção do COP 8, extinto em 12Set74, e depois da organização e montagem do dispositivo final das tropas portuguesas em Bissau, foi extinto em 20Set74, passando os subcomandos então definidos a assumir a responsabilidade das respectivas áreas, sob a dependência directa do Comando-Chefe.

Observações - Não tem História da Unidade.

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas das Unidades: Tomo II - Guiné - 1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002, pp. 597/598

sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20393: Memória dos lugares (402): Nhacra, a guarda avançada da capital, Bissau: afinal, era um sítio onde se podia ir, com relativa tranquilidade, até ao final da guerra... (Eduardo Campos, ex-1º cabo trms, CCAÇ 4540 /72, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar, Bissau, Nhacra, 19 set 1972/ 25 ago 1974)


Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477, "Os Gringos de Guileje"  (Guileje, Nhacra e Brá, 1971/73) > O fur mil Herlander Simões numa patrulha nas imediações de Nhacra.

Foto (e legenda)  © Herlander Simões (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Como era Nhacra ao tempo do nosso grã-tabanqueiro Eduardo Campos, ex-1º cabo trms, CCAÇ 4540 /72 (Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar, Bissau, Nhacra, 19 set 1972/ 25 ago 1974) ? (*)


(...) Em Nhacra, fomos encontrar os camaradas do Pelotão de Morteiros 4581/72 e os do 3º Pelotão AA da Btr AAA 7040/72, além de dois pelotões de Milícias: o 329,  aquartelado em Oco Grande, e o 230, aquartelado em Bupe, ambos pertencendo à Companhia de Milícias de Nhacra e que ficaram adidos à CCAÇ 4540.

O IN não possuía, dentro da ZA, pessoal suficiente em quadros e grupos que lhe permitisse desenvolver uma actividade dinâmica e poderosa, quer para flagelar e atacar o aquartelamento e o Centro Emissor de Nhacra, quer para emboscar as NT fora do aquartelamento. 

No entanto, fomos informados que Nhacra e o Centro Emissor foram flagelados pelo IN duas vezes:

(i) a primeira ao tempo da CCAÇ 3326, em maio de 1972, por um grupo equipado com armas automáticas e RPG-2 e 7;

(ii)  e a segunda em agosto de 1972, utilizando também um canhão s/r. 

Em ambos os casos sem qualquer consequência material ou pessoal para as NT.

Sabíamos que o IN andava por ali perto e que atravessava, frequentemente, algumas linhas principais de infiltração, para o interior da nossa ZA, a saber: de Choquemone, Infaide, Biambe, pela península de Unche para Iuncume, quando se dirigiam para Nhacra.

As principais prioridades da nossa Companhia eram: 

 (i) a garantia da segurança do Centro Emissor de Nhacra; 

(ii) o itinerário Bissau–Mansoa; 

(iii)  e, através de intensa actividade (patrulhamentos e reconhecimentos), evitar que o IN se aproximasse de forma a impedir que pudesse atacar a cidade/capital de Bissau, o Aeroporto de Bissalanca, os complexos milttares de Brá e da Sacor, bem como as instalações militares e civis do Cumeré.

Em onze meses de permanência em Nhacra, nunca tivemos contacto com IN, nem as instalações sofreram qualquer ataque.


Os aglomerados populacionais da ZA da nossa Companhia, distribuíam-se por dois regulados: 

(i) o Regulado de Nhacra com as tabancas de Nhacra (Nhacra, Teda, Sal, Bupe, Sucuto, Incume, Sumo, Nhoma e Cholufe);

(ii)  e o Regulado do Cumeré com as tabancas do Cumeré, Com, Cuntanga, Quide, Birla, Caiana, Som Caramacó, Cola, Nague, Ocozinho, Rucuto e Oco Grande (reordenamento zincado).

A estrutura agrícola existente baseava-se numa economia básica de subsistência, cujos produtos, que ocupavam lugares especiais de relevo, eram o amendoim, o arroz, o milho, a mandioca, o feijão, a cana sacarina e pouco mais.Na pecuária existiam boas condições para a criação de gado, condicionante porém pelo ancestral costume tribal, que considerava o gado como um sinal exterior de respeito e riqueza e não com um factor económico.

Era evidente e manifesto o desagrado em abater, ou mesmo vender, qualquer cabeça de gado, fosse para alimentação ou para outros fins industriais. Em toda aquela zona predominava a etnia Balanta, coexistindo com algumas minorias étnicas que se estabeleceram em chão Balanta, vindas de outras regiões, escorraçadas pela insegurança que a guerra originava, principalmente Fulas, Mandingas e alguns Manjacos.

Os Balantas eram dotados de uma impressionante constituição física, trabalhadores, valentes, enérgicos e com grande força de vontade pela vida, ao que acrescentaria que eram bons agricultores, arrancando da terra os meios de subsistência de que necessitavam, alimentando-se à base de arroz, azeite de palma, milho e mandioca. Além disso, eram polígamos e condenavam o celibato. Extremamente supersticiosos, acreditavam na transfiguração da alma, atribuindo à feitiçaria as suas desgraças.
Bissalanca, BA 12, c. 1972/74: os alf mil
 Eduardo Jorge Ferreira (1952-2019) ~
e Jorge Pinto, prontos para ir até Nhacra,
de motorizadas, comer umas ostras (**)...
Foto: Jorge  Pinto (2019).

Praticavam o roubo, em especial de gado, com a consciência de um acto não criminoso, mas sim um admirável e enaltecedor sinal que revelava a perícia pessoal, bem com de toda a sua própria tribo. O gado bovino que possuíam destinavam-no às cerimónias de sacrifício, nomeadamente nos seus rituais de acompanhamentos fúnebres (choros).

Os Fulas, de um modo geral,  eram hospitaleiros, considerando mesmo a hospitalidade como um dever sagrado.Apesar da influência que o Islamismo tinha entre eles, praticavam ainda o feiticismo e criavam gado, considerado este facto como um sinal de respeito e nobreza.

A acção psicológica desenvolvida pela NT na zona era bastante intensiva, apesar de se constatar em alguns núcleos, certa reserva em relação à mesma, quando não nula, com maior evidência nas tabancas de Sal e Bupe.

As populações tinham apoio médico/sanitário, transporte em viaturas militares, assistência educativa prestada por missões religiosas em várias escolas, um professor militar e vários elementos africanos que estavam adidos à Companhia, sendo também de salientar a assistência religiosa prestada por padres missionários aos domingos. (...).

(...) A área do subsector de Nhacra tinha por limite a norte o Rio Mansoa, a sul o Rio Geba, a oeste o Canal do Impernal e, a leste, confinava com o Dugal.

Era atravessada, nos seus limites, por uma estrada asfaltada (com grande movimento de pessoas e viaturas), que ligava Bissau a Mansoa e, ainda, pela ligação entre Nhacra e Cumeré, também ela em estrada asfaltada. 

A piscina de Nhacra.
Foto de Eduardo Campos (2009)
As tabancas mais populosas tinham ligações com as estradas principais, através de picadas largas. Sobre o Canal de Impernal e no itinerário Bissau – Mansoa, encontrava-se a Ponte de Ensalmá, onde se mantinha em permanência um destacamento da Companhia, dada a sua importância estratégica e pelo facto capital de ser a única ponte que permitia a ligação por terra, entre Bissau e o resto do território da Guiné.

O terreno apresentava uma uniformidade e configuração incaracterísticas, em que os relevos praticamente não existiam, apenas entrecortado pelas bolanhas que abundavam nessa região, visto formarem-se a cotas inferiores às do terreno.

Hidrograficamente a região era rica, com os importantes rios Mansoa e Geba, bastante caudalosos na praia-mar, que chegavam a atingir cerca de três metros de amplitude e invadiam uma série de canais, do qual se destacava o Canal do Impernal, que estabelecia a ligação entre eles, dando origem à ilha de Bissau… Sim, disse ilha, porque Bissau era uma ilha e, curiosamente, muitos dos nossos camaradas desconheciam o facto.

A mata era muita reduzida nessa região, exceptuando-se pequenas manchas existentes no extremo norte do Rio Geba e nas proximidades do Canal do Impernal. Na zona interior a savana arbustiva, era salpicada, aqui e além, por árvores de grande porte (poilões), mangueiros e cajueiros.

Nas Zonas marginais dos rios e dos canais, zonas extremamente pantanosos, abundavam as plantas hidrófilas que se ramificavam em múltiplas raízes, formando o que se designava por “tarrafo”. A fauna, sem ser abundante, poderia considerar-se rica em diversas espécies.

Afinal, Nhacra, a 25 / 30 km, a nordeste de Bissau, era um sítio onde se podia ir, de carro, de moto ou de motorizada, com relativa tranquilidade, até ao final da guerra. (***)
_________

Notas do editor:



27 de novembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20386: (De)Caras (117): Eu e o saudoso Eduardo Jorge Ferreira (1952-2019), prontos para ir a Nhacra, de motorizada, comer umas ostras (Jorge Pinto, ex-alf mil, 3.ª CART / BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74)

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Guiné 61/74 - P19328: Blogoterapia (290): O Medo - como nunca pensei que sentisse (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor do BCAÇ 3872)

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), autor do livro "A Tropa Vai Fazer de ti um Homem", com data de 21 de Dezembro de 2018:

Carlos e Luís
Após a leitura do livro do nosso camarada António Martins de Matos e em especial o capitulo escrito pela psicóloga Teresa Matos sobre o medo, resolvi fazer uma pequena viagem sobre o meu medo ou medos.
Junto vai uma foto onde estão vários dos que seriam sobreviventes da emboscada do Quirafo em Abril de 1972. De notar que o que está na primeira fila ao centro é o condutor único sobrevivente da primeira viatura. Ao lado dele, à nossa esquerda, é o condutor da segunda.

Um Feliz Natal e um próspero Ano Novo para todos os membros da tabanca mais para as suas famílias.

Abraços
Juvenal Amado


O MEDO

No dia 24 de Dezembro faz 47 anos que desembarquei em Bissau integrado no meu Batalhão 3872, o que quer dizer, que no momento que escrevo estas linhas navegava ou estava ao largo da ilha da Madeira. Não tive medo quando fui mobilizado, nem quando embarquei, nem quando desembarquei. Havia um misto de curiosidade e distanciamento, que quase parecia que não me estava a acontecer aquilo e que era um simples observador.

Mas na noite do desembarque, já no Cumeré, provei o medo como nunca pensei que existisse tal sentimento. A violência da guerra chegou até mim, que tinha dado duas dúzias de tiros de G3 e era esse o som mais próximo que tinha dela. Não sabia na altura que a espiral do medo tinha tantos patamares e que, aquele som das antiaéreas, a fazer batimento de zona, que faziam tremer o chão, não era nada comparado com som de um ataque onde as explosões e o matraquear das armas ligeiras têm um resultado tão aterrador.

O medo tolda-nos os sentidos, desfaz-nos o discernimento, penetra perniciosamente nos músculos, tolhe-nos as passadas, encharca-nos a roupa com suor gelado, deixamos de ver e ouvir com clareza, por vezes não se tem controle sobre as mais elementares necessidades fisiológicas, a irracionalidade sobrevem à amálgama de sensações descontroladas, em que nos tornamos seres sem quereres nem vontades próprias. Desse estado, saímos em várias direcções e soluções impensáveis, quando, no estado da razão de que normalmente somos proprietários, faríamos ao contrário .

Ao longo da vida passamos por diversos medos por ou ignorância rotulamos de medo, pois o medo na infância do escuro, do professor, do resultado do exame, o medo de ser rejeitado, o medo do ridículo, em nada é equiparado ao medo que nos descontrola ao ponto de nada mais ter interesse que a preservação da vida.

O medo como escreve a psicóloga clínica Teresa Matos* (vale a pena ler) é bem mais complexo do que até aqui eu pensava. Envolve a produção ou ausência de substâncias que na nossa condição de humanos produzimos. Escreve ela, que sujeitos ao medo o nosso corpo se transforma com reacções físico-químicas, que nos preparam para receber em antecipação o impacto de qualquer agressão que nos ponha em perigo.

Depois respondemos ao medo por ordem de um superior, porque por vezes existe o medo hierárquico, que suplanta o medo do inimigo. Se assim não fosse, como se explicaria, que à ordem de comando um soldado salta para a frente afrontando cortinas de balas?

Noutras, o individuo reage em autodefesa, porque é necessário responder à agressão. Finalmente o medo pode tolher de tal maneira o individuo que nada fará para se defender.

No principio da guerra, falou-se de quem se matou após a mobilização com medo de morrer na guerra, quando afinal dessa forma certeira cumpriu o destino que temia mas, que lhe era incerto.

“o medo tem alguma utilidade, mas a covardia não”. Mahatma Gandhi

Quem esteve em situações de combate, ou participou em colunas em que minas mataram camaradas, sabe do terror que se sente após os acontecimentos, a dificuldade de abandonar a vala e em especial, em mexer os pés do sítio onde nos abrigamos na urgência.

Conheço um camarada que tendo sofrido uma emboscada onde morreram vários companheiros (Quirafo - Saltinho) sofre de stress pós-traumático e o medo apodera-se dele de tal forma que não consegue responder-lhe, não dorme, é visitado pelos acontecimentos e as caras dos que morreram não lhe saem da cabeça. Os sons da tragédia compõem a banda sonora do que poderia ser um filme. Neste caso são os psicólogos e psiquiatras a administrar químicos em substituição dos que não se produzem naturalmente de que fala a autora Teresa Matos. O organismo do nosso camarada não consegue responder ao medo que se pegou a ele de forma visceral. Cumpre-me aqui informar, que já não falo com o camarada desde que ele começou a ser tratado e por isso, não ter real conhecimento do seu estado hoje.

Alguns destes camaradas sobreviveram à emboscada do Quirafo. O que está na primeira fila ao centro é o condutor único sobrevivente da primeira viatura. Ao lado dele, à sua direita, é o condutor da segunda

Naquele tempo também sofri do medo real e em antecipação ao que poderia acontecer quando ia em colunas mas por outro lado pernoitei em sítios onde só alguma inconsciência da minha parte, permitiu ignorar o perigo. Conheci quem com medo dos ataques, só se deitava após as 11 horas da noite, pois era norma que se não nos atacavam até aquela hora, já não fariam com medo de serem apanhados pela madrugada na retirada.

Fez no dia 1 de Dezembro anos que fomos atacados ao arame farpado. O sentinela na dúvida se eram cabras a pastar ou guerrilheiros, não quis disparar com medo de levar uma porrada do comandante. Valeu-nos outro camarada que pegou na G3 e despejou o carregador sobre os vultos.

Mas o medo também é motor da actividade humana. O medo de ficar para trás, o medo que pareça mal, o medo da solidão e da incompreensão, o medo da velhice quando afinal devíamos ter mais medo de não chegarmos a velhos.

Assim existem vários patamares para o medo. O medo é um sentimento que se revisita como nenhum outro, pois há quem tenha medo de ter medo.

“Todos os homens têm medo. Quem não tem medo não é normal; isso nada tem a ver com a coragem”. Jean Paul Sarte

Um Feliz Natal em paz é o meu maior desejo para todos os camaradas

(*) - Livro de António Martins de Matos Voando Sobre Um Ninho de Strelas, capitulo 42
____________

Nota do editor

Último poste da série de 29 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19145: Blogoterapia (289): Aquele toque a finados é uma coisa que me arrepia... (Virgílio Teixeira, ex-alf mil SAM, CCS/BCAÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Guiné 61/74 - P18002: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 7 e 8: O Cumeré, os mosquitos, o patacão, a correspondência, os preservativos...

Ontem (à esquerda) e hoje (à direita, em baixo): o José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74.

Nascido em Penafiel, em 1950, criado pela avó materna, reside hoje em Amarante. Está reformado como bate-chapas. Tem o 12º ano de escolaridade. Foi um "homem que se fez a si próprio", sendo hoje autor, com dois livros publicados (um de poesia e outro de ficção). Senta-se debaixo do poilão da Tabanca Grande no lugar nº 756. (*)

Fotos e texto: © José Claudino da Silva (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Prosseguimos a pré-publicação do próximo livro (na versão manuscrita, "Em Nome da Pátria") do nosso camarada José Claudino Silva:

Sinopse (*):

(i) foi à inspeção em 27 de junho de 1970, e começou a fazer a recruta, no dia 3 de janeiro de 1972, no CICA 1 [Centro de Instrução de Condutores Auto-rodas], no Porto, junto ao palácio de Cristal;

(ii) escreveu a sua primeira carta em 4 de janeiro de 1972, na recruta, no Porto; foi guia ocasional, para os camaradas que vinham de fora e queriam conhecer a cidade, da Via Norte à Rua Escura.

(iii) passou pelo Regimento de Cavalaria 6, depois da recruta; promovido a 1º cabo condutor autorrodas, será colocado em Penafiel, e daqui é mobilizado para a Guiné, fazendo parte da 3ª CART / BART 6250 (Fulacunda, 1972/74);

(iv) chegada à Bissalanca, em 26/6/1972, a bordo de um Boeing dos  TAM - Transportes Aéreos Militares; faz a IAO no quartel do Cumeré.


2. Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 7 (A estada no Cumeré) e 8 (Raios dos mosquitos)


[O autor faz questão de não corrigir as transcrições das cartas e aerogramas que começou a escrever na tropa e depois no CTIG à sua futura esposa. Esses excertos vêm a negrito. O livro, que tinha originalmente como título "Em Nome da Pátria", passa a chamar-se "Ai, Dino, o que te fizeram!", frase dita pela avó materna do autor, quando o viu fardado pela primeira vez. Foi ela, de resto, que o criou. ]


7º Capítulo > ESTADA NO CUMERÉ


Posso afirmar perentoriamente que 90% dos soldados que “Em Nome da Pátria” estiveram nas ex-províncias ultramarinas, passaram pelo mesmo ritual que acabei de descrever. Geralmente, com uma instrução básica, éramos despejados nos locais de conflito e, somente aí, adquiríamos os conhecimentos necessários para sobreviver, se tivéssemos a sorte de aguentar os primeiros meses.

Foi estudando a batalha de Aljubarrota, mais precisamente, a famosa “Ala dos Namorados”, que tive a noção do quanto é ridículo o que os senhores da guerra fazem com os jovens. Incutem-lhes um fervor patriótico, ou religioso, que os torna, na naioria das vezes e sem se aperceberem, “carne para canhão”. Na referida batalha de Aljubarrota, os primeiros a avançar e como tal, os primeiros a morrer, foram os mais novos.

Estou agora a lembrar-me que fui sempre um pouco medricas e mesmo que, ao chegar a Bissau, tivesse sido separado dos meus camaradas da 3ª companhia porquanto eles foram para Bolama e eu fui para Cumeré. O que é certo, por aquilo que escrevi, logo no primeiro dia que pisei solo africano, não tive um receio por aí além. Dizia eu!

“Em Cumeré estamos a tirar o I. A. O. (Creio que a sigla significa: Instrução de Aperfeiçoamento Operacional) Aqui não há guerra mas as pessoas parecem-me todas hostis. Neste quartel estão cerca de 600 homens. O calor é sufocante e não há bebidas frescas, nem grande comida e se eu achava caro uma refeição no Porto custar7$50, já me avisaram que fora do quartel custa 70$00. Vê bem que ladrões. Acho que são brancos que vivem a explorar os “Periquitos” como nós”. (Periquitos, era o nome pejorativo, usado para descrever os soldados recém-chegados da metrópole). (**)

Pelos vistos, a minha preocupação prendia-se com a comida e bebida. Também havia outra preocupação, a que me referia na mesma carta - a correspondência. Pois é! Eu podia escrever, como o fiz todos os dias. A namorada, família e amigos podiam responder-me. Eles saberiam de mim, e eu, só um mês mais tarde, teria notícias deles.

Meus amigos! Isto passou-se há 45 anos. Hoje contactamos, com qualquer parte do mundo, em segundos. A guerra também me deixou sem amor dos meus, mesmo por palavras escritas; por muitos dias, por muitas semanas. É uma das coisas mais difíceis de suportar, após a partida. Não sabermos se alguém sabe da nossa chegada! Imaginem o que aconteceu com todos aqueles que,  para a guerra nas ex-colónias, viajaram de barco.



8º Capítulo > RAIOS PARTAM OS MOSQUITOS


Os mosquitos guineenses rapidamente perceberam que a minha pele branquinha era um convite a picar-me e não tardou que o meu corpo estivesse repleto de pequenas manchas avermelhadas. Sem nada para me proteger, pois o repelente antimosquito estava, há muito, esgotado, a comichão era insuportável; somente debaixo do chuveiro conseguia acalmar essa sensação dolorosa. Mas até isso era difícil, porque a água era escassa e só podíamos tomar duche uma vez por dia. Fiquei a saber que o mosquito se chama “Anófele” e que as fêmeas são o ser vivo mais perigoso para o ser humano, devido às infecções que provoca, ao introduzir o parasita no nosso organismo.

Decerto, compreendem que com tantas picadelas, rapidamente me convenci, quando me começou a doer a cabeça, um pouco de febre e falta de apetite, que já tinha Paludismo. Já me doía tudo. O médico, porém, receitou-me uns comprimidos e o certo é que, dias depois, já me sentia melhor. Juro que até pensei que se adoecesse gravemente me mandavam para casa. Quanto errado estava pois, meses mais tarde, mesmo estando muito doente, continuaram a dar-me os mesmos comprimidos. Que eu tivesse conhecimento, nesse pequeno período, em que estive no Cumeré, só regressou à Metrópole um militar que fora atingido pelo rebentamento de uma granada na instrução e ficara muito ferido.

Felizmente, dia 2 de julho de 1972 foi a um domingo. O comandante do aquartelamento do Cumeré autorizou a nossa ida a Bissau. Já poderia comprar o que me fizesse mais falta, estando no topo das prioridades, mesmo sem saber se iriam ser necessários, preservativos. O comandante alertara com muita ênfase, que se morria mais com paludismo e doenças venéreas do que em batalha. Mais valia prevenir.

(Continua)




Guiné > Mapa geral da província (1961) > Escala 1/ 500 mil > Posição relativa do Cumeré, a nordeste de Bissau, abaixo de Nhacra, na margem direita do estuário do Rio Geba.

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2016)

_____________

Notas do editor:

(*) Postes anteriores da série:

11 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17961: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capº 1: Aprovado para todo o serviço militar


16 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17976: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 3 e 4: Promovido a 1º cabo condutor autorrodas e colocado no RAL 5, em Penafiel

18 de novembro de  2017 > Guiné 61/74 - P17983: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 5 e 6: Partida nos TAM, com destino ao inferno:

(**) Usando o conversor da Pordata, verificamos que 7$50 e 70$00 em 1972 valeriam hoje, 1,74 € e  16,27 €, respetivamente. Ao escudo ("peso") da Guiné, temos que abater 10%...Se uma refeição no Porto custava, a preços de hoje, 1,74 €, em 1972, em Bissau, custaria 14,643 € (90% de 16,27 €, o equivalente a 70 escudos da metrópole).

Em 1969, uma refeição (bife com ovo a cavalo + cerveja) em Bafatá, no restaurante "Transmontana", custava 20 "pesos", o equivalente, hoje, a  5,328 € (=5,98 € x 0,90).

Como se vê, de 1969 para 1972, a inflação (ou a especulação, típica da economia de guerra) deu cabo do patacão dos desgraçados dos combatentes que íam parar com os quatro costados à Guiné!

Vd. os nossos postes sobre o patacão.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15655: Álbum fotográfico de António José Pereira da Costa, Coronel de Art.ª Ref (ex-Alferes de Art.ª na CART 1692; ex-Capitão de Art.ª e CMDT das CART 3494 e CART 3567 (1): BAA 3434, dispositivos para iluminação do campo de batalha e Cumeré

1. Mensagem do nosso camarada António José Pereira da Costa, Coronel de Art.ª Ref (ex-Alferes de Art.ª na CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-Capitão de Art.ª e CMDT das CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74), com data de 10 de Janeiro de 2016, com as primeiras fotos para o seu Álbum fotográfico:

Olá Camaradas
É minha intenção enviar todas as minhas fotos da Guiné. Vou enviá-las por assuntos:
Segue o primeiro - a Btr AA 3434 que defendia heroicamente (digo eu) a Base Aérea 12 contra ataques aéreos e terrestres como aconteceu por duas vezes que me recorde.
Depois do guião e do emblema de peito um portefólio feito numa noite de exercício de defesa Anti-Aérea.
O Malogrado TCor Brito voava num T-6 e largou um ou dois flares - dispositivos para iluminação do campo de batalha) que ficavam a pairar à vertical da base e os artilheiros, PUMBA! Fogo neles.
E até acertaram... Era incipiente, mas era o que se podia arranjar. A defesa AA da Base tinha muitas limitações, como já se disse, mas se houvesse tempo era possível pôr tiros no ar que é o que faziam todas as AA da II GM que utilizavam os materiais de que dispúnhamos. O resto era rezar e esperar que Deus fosse português (e do Benfica de preferência...). Caso contrário poderia ser uma tragédia.
Seguem duas fotos do Cumeré, em MAI71. Ainda não estava completamente acabado, mas já fazia serviço e "embrulhou" na noite de 9 para 10UN71, quando foram atacados todos os quartéis à volta de Bissau e ao mesmo tempo 6 foguetões de 122 mm caíam à beira do "Pelicano" um restaurante bem agradável de que todos nos lembramos.
Voltarei à antena com mais fotos.

Um Ab.
António J. P. Costa



 





____________

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15614: Álbum fotográfico de Armando Costa, ex-fur mil mec auto, CCAV 3366 / BCAÇ 3846 (Susana, 1917/73): Parte II: Chegada a Bissau e ao Cumeré


Foto nº 1 >  Guiné > Bissau > A zona portuária vista do convés do T/T Angra do Heroísmo, à chegada da em 9/3/1971 (1)


Foto nº 2 > Guiné > Bissau > A zona portuária vista do convés do T/T Angra do Heroísmo, à chegada, em 9/3/1971 (2)


Foto nº 3 > Guiné > Bissau > A zona portuária vista do convés do T/T Angra do Heroísmo, à chegada da em 9/3/1971 (3)


Foto nº 4 > Guiné > Bissau > Abril de 1971 > Avenida marginal


Foto nº 5 > [Sem indicação de fonte, não sendo do autor, trata-se de um bilhete postaol:] Guiné > Vista aérea parcial e Ilhéu do Rei. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 142". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte - Publicações e Artes Gráficas, SARL).




Foto no 6 > Guiné > Bissau > Cumeré > Abril de 1971 > A CCAV 3366 fez aqui a IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional).

Fotos (e legendas): © Armando Costa (2016). Todos os direitos reservados.



1. Segunda parte da publicação de fotos do álbum do Armando Costa, ex-fur mil mec auto, CCAV 3366 / BCAV 3846, Susana, 1971/73) (*) [, foto atual à direita[.


Recorde-se que ele partiu para a Guiné em 3 de março de 1971,  num navio da carreira Lisboa-Madeira-Açores, o Angra do Heroísmo, fretado ao Exército para transporte de tropas e material.

O BCAV 3846, além da CCAV 3366 (Susana, Cumeré), era composta pelas CCAV 3364 (Ingoré, Cumeré) e CCAV 3365 (S. Domingos, Cumeré),

A unidade mobilizadora foi o RC 3. O Comando e a CCS ficara m em Ingoré; o comandante do Batalhão era ten cor cav António Lobato de Oliveira Guimarães.

O pessoal deste Batalhão regressou a casa em 8/3/1973, exceto o da CCAV 3365 que embarcou mais tarde (17/3/1973).

Não sabemos quanto tempo a CCAV 3386 esteve no Cumeré. Provavelmente só de passagem, ou pelo menos até abril de 1971 (fotos nº 4 e 6). Fez aqui a IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional). Em junho de 1971 já há fotos de Susana e Varela,. no álbum do nosso camarada Armando Costa, membro nº 707 da Tabanca Grande.

2. Comentário dos editores:

Armando: começámos a publicar as tuas fotos... É pena terem pouca "resolução"...Tivemos que as ampliar para o dobro (200%). As próximas que mandares vê se as podes mandar com pelo menos 300/400 Kb, as que mandaste têm à volta de 30/40 kb... Estes parâmetros têm que ser definidos na digitalização... De qualquer modo, o nosso muito obrigado. Manda sempre as legendas.


Guiné > Mapa geral da província (1961) > Escala 1/ 500 mil > Posição relativa do Cumeré, a nordeste de Bissau, abaixo de Nhacra, ma margem direita do estuário do Rio Geba.

Infogravura: Blogue Luís Grça & Camaradas da Guiné (2016)

_____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste anterior  da série > 11 de janeiro de  2016 > Guiné 63/74 - P15607: Álbum fotográfico de Armando Costa, ex-fur mil mec auto, CCAV 3366 / BCAÇ 3846 (Susana, 1917/73): Parte I: A caminho de CTIG, de 3 a 9/4/1971, no navio "insular" Angra do Heroísmo, fretado nesse ano ao Exército para transporte de tropas