Foto (e legenda) © Herlander Simões (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Como era Nhacra ao tempo do nosso grã-tabanqueiro Eduardo Campos, ex-1º cabo trms, CCAÇ 4540 /72 (Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar, Bissau, Nhacra, 19 set 1972/ 25 ago 1974) ? (*)
(...) Em Nhacra, fomos encontrar os camaradas do Pelotão de Morteiros 4581/72 e os do 3º Pelotão AA da Btr AAA 7040/72, além de dois pelotões de Milícias: o 329, aquartelado em Oco Grande, e o 230, aquartelado em Bupe, ambos pertencendo à Companhia de Milícias de Nhacra e que ficaram adidos à CCAÇ 4540.
O IN não possuía, dentro da ZA, pessoal suficiente em quadros e grupos que lhe permitisse desenvolver uma actividade dinâmica e poderosa, quer para flagelar e atacar o aquartelamento e o Centro Emissor de Nhacra, quer para emboscar as NT fora do aquartelamento.
No entanto, fomos informados que Nhacra e o Centro Emissor foram flagelados pelo IN duas vezes:
O IN não possuía, dentro da ZA, pessoal suficiente em quadros e grupos que lhe permitisse desenvolver uma actividade dinâmica e poderosa, quer para flagelar e atacar o aquartelamento e o Centro Emissor de Nhacra, quer para emboscar as NT fora do aquartelamento.
No entanto, fomos informados que Nhacra e o Centro Emissor foram flagelados pelo IN duas vezes:
(i) a primeira ao tempo da CCAÇ 3326, em maio de 1972, por um grupo equipado com armas automáticas e RPG-2 e 7;
(ii) e a segunda em agosto de 1972, utilizando também um canhão s/r.
Em ambos os casos sem qualquer consequência material ou pessoal para as NT.
Sabíamos que o IN andava por ali perto e que atravessava, frequentemente, algumas linhas principais de infiltração, para o interior da nossa ZA, a saber: de Choquemone, Infaide, Biambe, pela península de Unche para Iuncume, quando se dirigiam para Nhacra.
As principais prioridades da nossa Companhia eram:
Sabíamos que o IN andava por ali perto e que atravessava, frequentemente, algumas linhas principais de infiltração, para o interior da nossa ZA, a saber: de Choquemone, Infaide, Biambe, pela península de Unche para Iuncume, quando se dirigiam para Nhacra.
As principais prioridades da nossa Companhia eram:
(i) a garantia da segurança do Centro Emissor de Nhacra;
(ii) o itinerário Bissau–Mansoa;
(iii) e, através de intensa actividade (patrulhamentos e reconhecimentos), evitar que o IN se aproximasse de forma a impedir que pudesse atacar a cidade/capital de Bissau, o Aeroporto de Bissalanca, os complexos milttares de Brá e da Sacor, bem como as instalações militares e civis do Cumeré.
Em onze meses de permanência em Nhacra, nunca tivemos contacto com IN, nem as instalações sofreram qualquer ataque.
A estrutura agrícola existente baseava-se numa economia básica de subsistência, cujos produtos, que ocupavam lugares especiais de relevo, eram o amendoim, o arroz, o milho, a mandioca, o feijão, a cana sacarina e pouco mais.Na pecuária existiam boas condições para a criação de gado, condicionante porém pelo ancestral costume tribal, que considerava o gado como um sinal exterior de respeito e riqueza e não com um factor económico.
Era evidente e manifesto o desagrado em abater, ou mesmo vender, qualquer cabeça de gado, fosse para alimentação ou para outros fins industriais. Em toda aquela zona predominava a etnia Balanta, coexistindo com algumas minorias étnicas que se estabeleceram em chão Balanta, vindas de outras regiões, escorraçadas pela insegurança que a guerra originava, principalmente Fulas, Mandingas e alguns Manjacos.
Os Balantas eram dotados de uma impressionante constituição física, trabalhadores, valentes, enérgicos e com grande força de vontade pela vida, ao que acrescentaria que eram bons agricultores, arrancando da terra os meios de subsistência de que necessitavam, alimentando-se à base de arroz, azeite de palma, milho e mandioca. Além disso, eram polígamos e condenavam o celibato. Extremamente supersticiosos, acreditavam na transfiguração da alma, atribuindo à feitiçaria as suas desgraças.
Praticavam o roubo, em especial de gado, com a consciência de um acto não criminoso, mas sim um admirável e enaltecedor sinal que revelava a perícia pessoal, bem com de toda a sua própria tribo. O gado bovino que possuíam destinavam-no às cerimónias de sacrifício, nomeadamente nos seus rituais de acompanhamentos fúnebres (choros).
Os Fulas, de um modo geral, eram hospitaleiros, considerando mesmo a hospitalidade como um dever sagrado.Apesar da influência que o Islamismo tinha entre eles, praticavam ainda o feiticismo e criavam gado, considerado este facto como um sinal de respeito e nobreza.
A acção psicológica desenvolvida pela NT na zona era bastante intensiva, apesar de se constatar em alguns núcleos, certa reserva em relação à mesma, quando não nula, com maior evidência nas tabancas de Sal e Bupe.
As populações tinham apoio médico/sanitário, transporte em viaturas militares, assistência educativa prestada por missões religiosas em várias escolas, um professor militar e vários elementos africanos que estavam adidos à Companhia, sendo também de salientar a assistência religiosa prestada por padres missionários aos domingos. (...).
(...) A área do subsector de Nhacra tinha por limite a norte o Rio Mansoa, a sul o Rio Geba, a oeste o Canal do Impernal e, a leste, confinava com o Dugal.
Era atravessada, nos seus limites, por uma estrada asfaltada (com grande movimento de pessoas e viaturas), que ligava Bissau a Mansoa e, ainda, pela ligação entre Nhacra e Cumeré, também ela em estrada asfaltada.
Em onze meses de permanência em Nhacra, nunca tivemos contacto com IN, nem as instalações sofreram qualquer ataque.
Os aglomerados populacionais da ZA da nossa Companhia, distribuíam-se por dois regulados:
(i) o Regulado de Nhacra com as tabancas de Nhacra (Nhacra, Teda, Sal, Bupe, Sucuto, Incume, Sumo, Nhoma e Cholufe);
(ii) e o Regulado do Cumeré com as tabancas do Cumeré, Com, Cuntanga, Quide, Birla, Caiana, Som Caramacó, Cola, Nague, Ocozinho, Rucuto e Oco Grande (reordenamento zincado).
A estrutura agrícola existente baseava-se numa economia básica de subsistência, cujos produtos, que ocupavam lugares especiais de relevo, eram o amendoim, o arroz, o milho, a mandioca, o feijão, a cana sacarina e pouco mais.Na pecuária existiam boas condições para a criação de gado, condicionante porém pelo ancestral costume tribal, que considerava o gado como um sinal exterior de respeito e riqueza e não com um factor económico.
Era evidente e manifesto o desagrado em abater, ou mesmo vender, qualquer cabeça de gado, fosse para alimentação ou para outros fins industriais. Em toda aquela zona predominava a etnia Balanta, coexistindo com algumas minorias étnicas que se estabeleceram em chão Balanta, vindas de outras regiões, escorraçadas pela insegurança que a guerra originava, principalmente Fulas, Mandingas e alguns Manjacos.
Os Balantas eram dotados de uma impressionante constituição física, trabalhadores, valentes, enérgicos e com grande força de vontade pela vida, ao que acrescentaria que eram bons agricultores, arrancando da terra os meios de subsistência de que necessitavam, alimentando-se à base de arroz, azeite de palma, milho e mandioca. Além disso, eram polígamos e condenavam o celibato. Extremamente supersticiosos, acreditavam na transfiguração da alma, atribuindo à feitiçaria as suas desgraças.
Bissalanca, BA 12, c. 1972/74: os alf mil Eduardo Jorge Ferreira (1952-2019) ~ e Jorge Pinto, prontos para ir até Nhacra, de motorizadas, comer umas ostras (**)... Foto: Jorge Pinto (2019). |
Praticavam o roubo, em especial de gado, com a consciência de um acto não criminoso, mas sim um admirável e enaltecedor sinal que revelava a perícia pessoal, bem com de toda a sua própria tribo. O gado bovino que possuíam destinavam-no às cerimónias de sacrifício, nomeadamente nos seus rituais de acompanhamentos fúnebres (choros).
Os Fulas, de um modo geral, eram hospitaleiros, considerando mesmo a hospitalidade como um dever sagrado.Apesar da influência que o Islamismo tinha entre eles, praticavam ainda o feiticismo e criavam gado, considerado este facto como um sinal de respeito e nobreza.
A acção psicológica desenvolvida pela NT na zona era bastante intensiva, apesar de se constatar em alguns núcleos, certa reserva em relação à mesma, quando não nula, com maior evidência nas tabancas de Sal e Bupe.
As populações tinham apoio médico/sanitário, transporte em viaturas militares, assistência educativa prestada por missões religiosas em várias escolas, um professor militar e vários elementos africanos que estavam adidos à Companhia, sendo também de salientar a assistência religiosa prestada por padres missionários aos domingos. (...).
(...) A área do subsector de Nhacra tinha por limite a norte o Rio Mansoa, a sul o Rio Geba, a oeste o Canal do Impernal e, a leste, confinava com o Dugal.
Era atravessada, nos seus limites, por uma estrada asfaltada (com grande movimento de pessoas e viaturas), que ligava Bissau a Mansoa e, ainda, pela ligação entre Nhacra e Cumeré, também ela em estrada asfaltada.
A piscina de Nhacra. Foto de Eduardo Campos (2009) |
As tabancas mais populosas tinham ligações com as estradas principais, através de picadas largas. Sobre o Canal de Impernal e no itinerário Bissau – Mansoa, encontrava-se a Ponte de Ensalmá, onde se mantinha em permanência um destacamento da Companhia, dada a sua importância estratégica e pelo facto capital de ser a única ponte que permitia a ligação por terra, entre Bissau e o resto do território da Guiné.
O terreno apresentava uma uniformidade e configuração incaracterísticas, em que os relevos praticamente não existiam, apenas entrecortado pelas bolanhas que abundavam nessa região, visto formarem-se a cotas inferiores às do terreno.
Hidrograficamente a região era rica, com os importantes rios Mansoa e Geba, bastante caudalosos na praia-mar, que chegavam a atingir cerca de três metros de amplitude e invadiam uma série de canais, do qual se destacava o Canal do Impernal, que estabelecia a ligação entre eles, dando origem à ilha de Bissau… Sim, disse ilha, porque Bissau era uma ilha e, curiosamente, muitos dos nossos camaradas desconheciam o facto.
A mata era muita reduzida nessa região, exceptuando-se pequenas manchas existentes no extremo norte do Rio Geba e nas proximidades do Canal do Impernal. Na zona interior a savana arbustiva, era salpicada, aqui e além, por árvores de grande porte (poilões), mangueiros e cajueiros.
Nas Zonas marginais dos rios e dos canais, zonas extremamente pantanosos, abundavam as plantas hidrófilas que se ramificavam em múltiplas raízes, formando o que se designava por “tarrafo”. A fauna, sem ser abundante, poderia considerar-se rica em diversas espécies.
O terreno apresentava uma uniformidade e configuração incaracterísticas, em que os relevos praticamente não existiam, apenas entrecortado pelas bolanhas que abundavam nessa região, visto formarem-se a cotas inferiores às do terreno.
Hidrograficamente a região era rica, com os importantes rios Mansoa e Geba, bastante caudalosos na praia-mar, que chegavam a atingir cerca de três metros de amplitude e invadiam uma série de canais, do qual se destacava o Canal do Impernal, que estabelecia a ligação entre eles, dando origem à ilha de Bissau… Sim, disse ilha, porque Bissau era uma ilha e, curiosamente, muitos dos nossos camaradas desconheciam o facto.
A mata era muita reduzida nessa região, exceptuando-se pequenas manchas existentes no extremo norte do Rio Geba e nas proximidades do Canal do Impernal. Na zona interior a savana arbustiva, era salpicada, aqui e além, por árvores de grande porte (poilões), mangueiros e cajueiros.
Nas Zonas marginais dos rios e dos canais, zonas extremamente pantanosos, abundavam as plantas hidrófilas que se ramificavam em múltiplas raízes, formando o que se designava por “tarrafo”. A fauna, sem ser abundante, poderia considerar-se rica em diversas espécies.
Afinal, Nhacra, a 25 / 30 km, a nordeste de Bissau, era um sítio onde se podia ir, de carro, de moto ou de motorizada, com relativa tranquilidade, até ao final da guerra. (***)
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Notas do editor:
(*) Vd. postes de:
30 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5729: Histórias do Eduardo Campos (7): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 7): Nhacra 2
26 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5711: Histórias do Eduardo Campos (6): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 6): Nhacra
(**) Vd, postes de:
30 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5729: Histórias do Eduardo Campos (7): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 7): Nhacra 2
26 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5711: Histórias do Eduardo Campos (6): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 6): Nhacra
(**) Vd, postes de:
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