quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20390: Jorge Araújo: ensaio sobre as mortes de militares do Exército no CTIG (1963/74), Condutores Auto-Rodas, devidas a combate, acidente ou doença - Parte V


Foto 1 – Uma mina A/C (ao centro) e três minas A/P. Foto do P15813, de José Manuel Lopes, ex-fur mil da CART 6250/72, Mampatá, 1972/74, com a devida vénia.

Na legenda desta foto pode ler-se: "Das dezenas que o Vilas Boas e o Fernandes levantaram. Ainda hoje me interrogo como só tivemos uma baixa em minas, além dos seis trabalhadores que foram vítimas de uma mina A/C ao beber água de um carro cisterna que molhava a terra da estrada acabada de terraplanar para lhe dar consistência. A picagem era mesmo um trabalho bem planeado e bem feito, onde o método, o rigor e a paciência, eram fundamentais. A pica era mesmo o sexto sentido dos soldados da CART 6250."

A propósito desta rotina, com a qual o contingente da CART 6250 teve de conviver durante a sua missão no CTIG, José Manuel Lopes (Josema) escreveu, para memória futura, o seguinte poema:





O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, 
CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior, 
indigitado régulo da Tabanca de Almada; 
tem 230 registos no nosso blogue.


ENSAIO SOBRE AS MORTES DE MILITARES DO EXÉRCITO, NO CTIG (1963-1974), DA ESPECIALIDADE DE "CONDUTOR AUTO RODAS": COMBATE, ACIDENTE, DOENÇA – PARTE V


1. – INTRODUÇÃO

Este quinto fragmento da temática em título continua a unir o interesse pessoal com a procura de outros (novos) elementos historiográficos emergentes na natureza da guerra. Deste modo, prosseguimos com a divulgação e análise de mais alguns resultados apurados, tendo por objecto de estudo o universo das "baixas em campanha" de militares do Exército, e como amostra específica os casos de mortes de "condutores auto rodas", ocorridas durante a guerra no CTIG (1963-1974), identificados na literatura "Oficial" publicada pelo Estado-Maior do Exército.


2. - ANÁLISE DEMOGRÁFICA DAS MORTES DE MILITARES DO EXÉRCITO, NO CTIG (1963-1974), DA ESPECIALIDADE DE "CONDUTOR AUTO RODAS": COMBATE-ACIDENTE-DOENÇA (n=191)

Como temos vindo a referir, a análise demográfica incluída nesta investigação, e as variáveis com ela relacionada, foi feita a partir dos casos de mortes de militares do Exército durante a guerra no CTIG (1963-1974), da especialidade de "condutor auto rodas", identificados nos "Dados Oficiais", elaborados pela Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974), 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II, Guiné; Livros 1 e 2; 1.ª Edição, Lisboa (2001).



Quadro 1 – Distribuição de frequências das variáveis categóricas "em combate" ("contacto", "minas" e "ataque ao aquartelamento"), segundo a «Estação Seca», considerada entre 1 de Maio e 15 de Outubro.




Quadro 2 – Distribuição de frequências das variáveis categóricas "em combate" ("contacto", "minas" e "ataque ao aquartelamento"), segundo a «Estação das Chuvas», considerada entre 16 de Outubro e 30 de Abril.


3. – MAIS ALGUNS EPISÓDIOS E CONTEXTOS ONDE OCORRERAM MORTES DE CONDUTORES AUTO RODAS ["CAR"] POR EFEITO DE REBENTAMENTO DE "MINAS"

Neste ponto, continuamos a respeitar um dos principais objectivos deste trabalho onde, para além dos números, se recuperam algumas memórias, sempre trágicas, quando estamos em presença de perdas humanas. Serão mais quatro "casos" (de um total de trinta e três), enquadrados pelos contextos conhecidos. Como principal fonte de consulta, foi utilizado o espólio do blogue, ao qual adicionámos, ainda, outras informações obtidas em informantes considerados privilegiados.


3.13 – 25 DE AGOSTO DE 1966: A QUARTA BAIXA DE UM "CAR" POR MINA - O CASO DO SOLDADO FRANCISCO ANTÓNIO FERNANDES LOPES, DA CCAÇ 1566, ENTRE S. JOÃO E NOVA SINTRA

A quarta morte de um condutor auto rodas, do Exército, em "combate", por efeito do rebentamento de uma mina (fornilho), foi a do soldado Francisco António Fernandes Lopes, natural de Estômbar, Lagoa, ocorrida no dia 25 de Agosto de 1966, 5.ª feira, por volta das 18:00h, no regresso de uma actividade operacional na sua zona de acção, no itinerário entre S. João e Nova Sintra, a cerca de mil metros do aquartelamento.

O condutor Francisco Lopes pertencia ao 1.º Gr Comb da CCAÇ 1566 [26Abr66-23Jan68, do Cap Mil Inf António dos Santos Paula (1.º); Alf Mil Inf Vladimiro de Pinho Brandão (2.º) e Cap Inf Adolfo Melo Coelho de Moura (3.º)], unidade que, após a sua chegada a Bissau, substituiria a CART 676 [13Mai64-27Abr66, do Cap Art Álvaro Santos Carvalho Seco (Pirada, Bajocunda e Paunca)] que de imediato embarcou no N/M «UÍGE», por ter concluído a sua comissão.

Durante a sua curta permanência em Bissau, na dependência do BCAÇ 1876 [26Jan66-04Nov67; do TCor Inf Jacinto António Frade Júnior], a CCAÇ 1566 teve por missão a segurança e protecção das instalações e das populações da área, efectuando, simultaneamente, a instrução de adaptação operacional na região de Mansoa.

Em 30Abr66, cedeu, temporariamente, um Gr Comb para reforço da guarnição de Pelundo, na dependência do BCAV 790 [28Abr65-08Fev67; do TCor Cav Henrique Alves Calado (1920-2001)] e depois do BCAÇ 1877 [08Fev66-06Out67; do TCor Inf Fernando Godofredo da Costa Nogueira de Freitas] e onde se manteve até 26Jun66.

Em 30Mai66, iniciou o deslocamento dos seus efectivos para Jabadá, tendo seguidamente rendido a CCAÇ 797 [28Abr65-19Jan67; do Cap Inf Carlos Alberto Idães Soares Fabião (1930-2006) - Militar de Abril], assumindo, em 03Jun66, a responsabilidade do subsector de S. João, incluindo o destacamento de Jabadá e ficando integrada no dispositivo e Manobra do BCAÇ 1860 [23Ago65-15Abr67; do TCor Inf Francisco da Costa Almeida] e depois do BART 1914 [13Abr67-03Mar69; do TCor Art Artur Relva de Lima (1.º).

A partir de 28Nov66, a sede do subsector passou para Jabadá, ficando o 1.º Gr Comb a guarnecer um destacamento em S. João, sob o comando do Alf Mil José Inácio Leão Varela. Em 11Jan68, o Gr Comb em S. João foi substituído pela CART 1802 [02Nov67-23Ago69; do Cap Mil Art António Nunes Augusto (1.º) e em 13Jan68, dois Grs Comb da CART 1743 [30Jul67-07Jun69; do Cap Mil Inf José de Jesus Costa (1.º)] passaram a guarnecer a povoação de Jabadá, tendo a subunidade recolhido a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso. [Ceca; 7º vol. p 354]



Foto 2 - S. João (1967) - O 1.º Gr Comb da CCAÇ 1566, do Alf Mil Leão Varela - P14007
Após confirmado o óbito do soldado "CAR" Francisco António Fernandes Lopes ocorre, no aquartelamento, uma segunda baixa, a do soldado José Maria Fernandes Carvalho, natural de Aião, Felgueiras, devido a paragem cardiorrespiratória.

Os corpos dos malogrados Francisco Lopes e José Carvalho seriam, no dia seguinte, inumados no cemitério de Bolama, em campas uma ao lado da outra [poste P3421].

Na caixa de comentários ao poste P3389, Leão Varela deixou a seguinte mensagem:

"Caros amigos e camaradas: acabo de ler o relato dos falecimentos dos nossos saudosos camaradas José Maria Fernandes Carvalho e Francisco António Fernandes Lopes que, naturalmente, me deixou bastante comovido pela recordação do momento mais triste que tive na Guiné. Um daqueles momentos que jamais esquecemos mas que nos custa reviver. Ia de imediato relatar-vos [29Jan2015] como as tristes ocorrências se passaram. Mas não fui capaz… quase que as lágrimas me rompiam.

"Na verdade, trata-se dos dois camaradas que pertenciam ao 1.º Pelotão que eu comandava… que dia triste. Por isso, não consigo escrever mais… desculpem-me… mas hoje não dá para ir mais longe… deve ser por causa das muitas luas que já passaram por mim. Dentro de alguns dias voltarei aqui, ou por mail, para vos descrever como tudo se passou. Até lá aqui fica o meu abraço para todos e os meus sentimentos para os familiares destes dois saudosos amigos e camaradas. Que descansem em paz. Leão Varela (ex-Alf Mil)." [Poste P3389]


3.14 - O CASO DO SOLDADO 'CAR' VÍTOR MANUEL RIBEIRO LOPES, DO PEL REC DAIMLER 2045, EM 01.NOV.1968, ENTRE CATIÓ E CUFAR

A morte em "combate" do soldado condutor auto rodas Vítor Manuel Ribeiro Lopes, natural de São Sebastião da Pedreira, Lisboa – a vigésima primeira de um "CAR" –, ocorreu no dia 01 de Novembro de 1968, 6.ª feira, por efeito do rebentamento de uma mina anticarro, no itinerário Catió e Cufar, durante a realização de uma coluna auto.

O condutor Vítor Lopes pertencia ao Pelotão de Reconhecimento Daimler 2045 [Pel Rec Daimler  2045], uma unidade mobilizada pelo Regimento de Cavalaria 6 [RC6], do Porto, tendo desembarcado em Bissau a 07Mai68, e o seu regresso a verificar-se a 10Mar70. Após a sua chegada a Bissau, a unidade comandada pelo Alf Mil Cav Alfredo Cardoso seguiu para Catió, a fim de substituir o PRecD 1132 [Ago66-Mai68], onde permaneceu durante os vinte e dois meses da sua comissão. Em Fev70, foi rendida pelo PRecD 2205.

Perante a não existência de referências históricas no blogue relacionadas com cada um dos três Pel Rec Daimler  acima identificados: "1132", "2045" e "2205", a concretização do principal objectivo deste trabalho ficou dependente do que, eventualmente, pudesse encontrar ao longo da pesquisa. No final, podemos dizer que tivemos algum sucesso, pouco, é certo, mas foi o possível.

Localizámos uma notícia publicada no «Mafra Hoje» online, do dia 20 de Setembro de 2011, a propósito da inauguração de um Monumento aos Combatentes da Freguesia de Azueira (Mafra) que tombaram na Guerra do Ultramar. Trata-se de uma revista com 4 páginas, onde em cada uma delas se dá conta dos conteúdos expressos nas diferentes intervenções previstas para esta cerimónia pública.



Na terceira e quarta página, O Alf Mil Cav Alfredo Cardoso, Cmdt do Pel Rec Daimler 2045, faz uma alusão à morte em combate do soldado "CAR" Vítor Manuel Lopes, referindo:

"Embarcámos em Abril de 1968 [chegada a 7 de Maio de 1968 e regresso a 10 de Março de 1970] no navio «Niassa», rumo à Guiné onde o pelotão [PRecD 2045] permaneceu cerca de dois anos. Infelizmente o Vítor Manuel não teve a sorte de estar connosco até ao fim da Comissão de Serviço porque uma mina traiçoeira, rebentando debaixo da viatura Daimler que conduzia, pôs fim à sua vida promissora passados apenas seis meses após a nossa chagada à Guiné. O Vítor Manuel como homem e como militar foi sempre, em todos os momentos, um exemplo de colega respeitador, voluntarioso, dedicado e sempre amigo de todos os colegas e seus superiores, tendo sempre desempenhado as suas funções com empenho e dedicação. Por tais motivos acho de toda a justiça esta homenagem que a Associação de Ex-Combatentes do Ultramar, os seus amigos, familiares e conterrâneos resolveram prestar-lhes." 

Fonte:
https://www.yumpu.com/pt/document/read/12731083/monumento-aos-combatentes-freguesia-de-azueira-ultramar


3.15 - O CASO DO SOLDADO 'CAR' MANUEL DA COSTA SOARES, DA CCAÇ 12, EM 13.JAN.1971, EM NHABIJÕES (BAMBADINCA)

A morte em "combate" do soldado condutor auto rodas Manuel da Costa Soares, natural de Palmaz, Oliveira de Azeméis – a vigésima sétima de um "CAR" –, ocorreu no dia 13 de Janeiro de 1971, 4.ª feira, por volta das 11:25h, por efeito do rebentamento de uma mina anticarro, à saída do reordenamento de Nhabijões, um aglomerado populacional de maioria balanta, situado nos arredores de Bambadinca [Sector L1].

O condutor Manuel da Costa Soares pertencia à CCAÇ 2590 [CCAÇ 12, desde 18Jan70], uma subunidade constituída por quadros e especialistas metropolitanos a que se juntaram outros elementos de recrutamento local, da etnia Fula.

Este colectivo efectuou a 2.ª fase da instrução de formação em Contuboel, entre 02Jun69 e 12Jul69. Em 18Jul69, foi dada como operacional, sendo colocada em Bambadinca, como força de intervenção de reserva do Agr 2957 [15Nov68-19Ago70; do Cor Inf Hélio Augusto Esteves Felgas (1920-2008)], na zona Leste [com sede em Bafatá, e abrangendo os sectores de Bambadinca, Bafatá e Nova Lamego], ficando adida ao BCAÇ 2852 [30Jul68-16Jun70; do TCor Inf Manuel Maria Pimentel Bastos (1.º) e TCor Cav Álvaro Nuno Lemos de Fontoura (2.º)]. Em 07Jun70, foi rendido no sector [L1] pelo BART 2917 [25Mai70-24Mar72; do TCor Art Domingos Magalhães Filipe (1.º) e TCor Inf João Polidoro Monteiro]. 

A CCAÇ 2590/CCAÇ 12, por períodos variáveis, destacou forças para guarnecerem diversos destacamentos em Sinchã Mamajã, Sare Gana, Sare Banda e Ponte do Rio Udunduma, colaborando ainda, de Nov69 a Jul70, na construção do reordenamento de Nhabijões. Em 18Jan70, a subunidade passou a designar-se CCAÇ 12, sendo considerada subunidade da guarnição normal, desde aquela data. (Ceca; 7º vol. p 380).

Quanto à descrição da ocorrência é de relevar o testemunho singular de quem nela esteve envolvido, neste caso, o Alf Mil Sap da CCS/BCAÇ 2917, Luís Rodrigues Moreira.

No poste  poste P10936, o camarada Luís Moreira, em narrativa enviada para publicação titulada «Efemérides: Nhabijões, 13 de Janeiro de 1971, morte na picada» refere:

"Passam hoje quarenta e dois anos [1971-2013] sobre aquele fatídico dia em que, no destacamento de Nhabijões bem no centro da Guiné-Bissau e cerca das 11:25 horas, faleceu um jovem pai de seu nome [Manuel da Costa] Soares, condutor auto rodas da CCAÇ 12, destacado naquele reordenamento juntamente com outros camaradas da mesma companhia e ainda alguns camaradas sapadores da CCS do BART 2917 e eu Alf Mil Sapador do mesmo Batalhão que comandava aquela força há pouco menos de um mês, vítima de uma mina anticarro quando nos conduzia, a mim, ao furriel Fernandes da CCAÇ 12 e ainda a um jovem africano com menos de 10 anos de idade e não me recordo se mais alguém; à sede do Batalhão em Bambadinca onde eu iria almoçar e presumo que o mesmo iria fazer o Fernandes, regressando depois o Soares com o Unimog 411 que lhe estava distribuído e o almoço para os restantes camaradas que aguardavam no destacamento.

"Não tenho nenhuma memória dos factos que se sucederam excepto daqueles que me contaram os camaradas que nos socorreram e, saiba-se lá porquê, das últimas palavras que o Soares proferir: "vamos fazer gincana, meu alferes".

E explico a razão das suas palavras:

"A estrada por onde circulámos era de terra batida como a maioria das estradas da Guiné naquele tempo. No lado esquerdo da estrada e no sentido em que seguíamos, portanto em contramão para nós, havia um enorme buraco, em diâmetro, não muito fundo mas que todas as viaturas que por ali passavam evitavam até porque a maioria delas passava carregada de bidões de água que iam buscar à Ponte do Rio Udunduma, a alguns quilómetros de distância, e não convinha partir alguma peça da viatura ou perder alguma água com os solavancos. - Ao dizer estas palavras, o Soares desviou a viatura do trajecto normal para descer e subir aquele obstáculo. Foram as suas últimas palavras já que dentro do buraco estava dissimulada uma mina anticarro que rebentou sob o rodado do lado do condutor, deixando o Unimog 411 reduzido a um monte de escombros como se pode ver na foto 3 abaixo." [ver, também, P5717, P11508 e P12139].

Quanto ao camarada Alf Luís Moreira, que ficara gravemente ferido, foi evacuado para o HM 241, em Bissau, onde permaneceu até ser considerado apto. Após reavaliação clínica, foi reclassificado para "serviços auxiliares", tendo passado o restante tempo da sua comissão no CTIG, cerca de dezasseis meses, agora no Batalhão de Engenharia (BENG 447) - poste P10936.


Foto 3 – Estado em que ficou o Unimog 411, depois de accionar uma mina anticarro à saída do reordenamento de Nhabijões, em 13 de Janeiro de 1971, onde tombou o condutor auto rodas Manuel da Costa Soares, da CCAÇ 12. Foto de Humberto Reis, com a devida vénia.



3.16 - O CASO DO SOLDADO 'CAR' ANTÓNIO LUÍS DO COUTO TOSTE PARREIRA, DA CCAÇ 3414, EM 29.MAI.1973, ENTRE BINTA E GUIDAGE


A última referência que elegemos para incluir nesta quinta narrativa, de um quadro de trinta e três casos onde se verificaram mortes em "combate" de "condutores auto rodas" provocadas por engenhos explosivos (minas), tem por contexto as movimentações militares realizadas pelas NT em Maio de 1973, na região de Guidage (Sector Oeste), cujos episódios ficarão gravados, para sempre, na historiografia da Guerra, como «O Cerco de Guidage».

Estão nesta circunstância as ocorrências que determinaram a morte em combate do soldado "CAR" António Luís do Couto Toste Parreira, da CCAÇ 3414 [02Jul71-23Set73; do Cap Inf Manuel José Marques Ribeiro de Faria], natural de Ribeirinha, Angra do Heroísmo, Ilha Terceira (Açores).
Para a elaboração deste ponto foram utilizadas as seguintes fontes históricas:

«P9972: … A coluna do dia 29 de maio de 1973: a participação da 38.ª CCmds (Pinto Ferreira / Amílcar Mendes / João Ogando»;

«Os Marados de Gadamael e os dias da Batalha de Guidage, do Fur Mil Daniel Rosa de Matos (1950-2011), da CCAÇ 3518 [Gadamael, 24Dez71-28Mar74, do Cap Mil Inf Manuel Nunes de Sousa]»;

«https://pt.slideshare.net/ Cantacunda/cercados-em-guidage» e «P6201» e

«https://www.cmjornal.pt/mais-cm/ domingo/detalhe/mata_me_acaba_com_esta_agonia».

Das análises realizadas, retivemos as seguintes:


[…] "À hora aprazada do dia 29/05/1973 [3.ª feira], a coluna saiu de Binta pela seguinte ordem: à frente um grupo/secção de Picadores, depois a 38.ª CCmds a 3 grupos, com uma viatura de Engenharia e outras duas viaturas, uma delas com o Morteiro 81. A seguir, ia a Companhia de Cavalaria do Cap Cav Fernando José Salgueiro Maia (1944-1992), [CCAV 3420; 09Jul71-03Out73] e na rectaguarda a do Cap Inf Manuel José Marques Ribeiro de Faria [CCAÇ 3414; 02Jul71-23Set73], que fechava a coluna.

"Verificando-se que alguns Picadores tinham dificuldades em avançar, passámos a deslocarmo-nos ao lado deles no sentindo de lhes levantar o moral. Por esse facto, os elementos da 1.ª Equipa do Gr Comb da 38.ª CCmds, que seguia na frente, acabaram por se juntar a nós. Entre eles encontrava-se o Furriel Ludgero Sequeira e o 1.º Cabo "Barbeiro" ["Bombeiro" (?), alcunha de Luís Alberto Costa, CAR da CCS/BCAÇ 4512, in: https://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/mata_me_acaba_com_esta_agonia.

"Depois de nos deslocarmos durante algum tempo nestas circunstâncias, fomos surpreendidos por uma forte explosão. Inicialmente pensou-se que seria mais um ataque, mas olhando para trás, verificou-se que um dos Picadores fora projectado pelos ares. Também o Furriel Sequeira estava gravemente ferido no rosto.

"A evacuação não poderia ser feita por via aérea, pois aquela explosão seria o sinal para o inimigo aparecer. Passado algum tempo acercou-se de nós o Cap. Salgueiro Maia, ao qual foi pedido que, com as suas forças se deslocasse para Binta, para a execução de uma evacuação, através de meios navais, pelo Rio Cacheu.

"Resolvido o problema da evacuação, os elementos da 38.ª CCmds passaram para a frente abrindo uma nova picada. Reiniciou-se o deslocamento da coluna, de modo a afastarmo-nos da zona de minas ao mesmo tempo que se salvaguardava uma maior capacidade de reacção ao provável ataque dos grupos do PAIGC.

"Mal se tinha reiniciado a marcha, fomos fortemente atacados sobre o flanco direito. As forças que aí estavam (um Gr Comb da 38.ª CCmds e os restantes elementos da coluna dessa zona) responderam com serenidade ao fogo inimigo. (…)

"A partir da posição Pára, a progressão tornou-se muito difícil, pois o terreno estava cheio de espinheiros muito cerrados, que impediam a passagem das viaturas. Decidimos pois voltar à picada, assumindo o risco de haver mais minas. Contudo, já não estávamos longe do Quartel…
Infelizmente o primeiro Unimog da Cª. do Cap. Ribeiro da Fonseca acabou por rebentar uma mina. Por simpatia, explodiu uma granada de lança roquetes o que veio somar à morte do condutor, vários feridos com estilhaços entre os homens da 38.ª CCmds. Logo de seguida um Milícia pisou uma mina antipessoal, ficando sem o pé e parte da perna. Como estávamos já perto de Guidage, a evacuação teria de ser feita por lá."

Ainda sobre esta missão, o Fur Mil Daniel de Matos (1950-2011), no seu livro: «Os Marados de Gadamael e os dias da Batalha de Guidage", pp 59-60, refere:




Foto 4 – «Operação Ametista Real»; o "Levantar do Cerco". In: Nuno Mira Vaz. Guiné - 1968 e 1973 - Soldados uma vez, sempre Soldados! Tribuna da História. Lisboa, 2003, pp 75-91; de autor desconhecido, com a devida vénia.



Foto 5 - Berliet destruída numa das colunas entre Binta e Guidage em Maio de 1973, com a devida vénia, publicada em 07Set2014 no Correiro da Manhã.

Outras viaturas destruídas deste contexto em P11516: «Álbum fotográfico de Carlos Fraga (ex-alf mil 3.ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1973».

(Continua)

Fontes Consultadas:

- Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 1; 1.ª edição, Lisboa (2001); pp 23-569.

- Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 2; 1.ª edição, Lisboa (2001); pp 23-304.

-  Outras: as referidas em cada caso.

Termino, agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

03Nov2019
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Nota do editor:

Último poste da série > 28 de outubro de  2019 > Guiné 61/74 - P20283: Jorge Araújo: ensaio sobre as mortes de militares do Exército no CTIG (1963/74), Condutores Auto-Rodas, devidas a combate, acidente ou doença - Parte IV

2 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Foi um dia trágico para a CCAÇ 12 bem como para a CCS/BART 2917... o 13 de janeiro de 1971... Também sobrou para mim, que voei não quantos metros numa GM movida a trotil...


11 DE OUTUBRO DE 2013
Guiné 63/74 - P12139: A minha CCAÇ 12 (29): 1 morto e 6 feridos graves em duas minas A/C, no reordenamento de Nhabijões, Bambadinca, em 13/1/1971, aos 20 meses de comissão (Luís Graça)



O infeliz do meu camarada, sold cond auto, da CCAÇ 12, António Manuel Soares, deixou ´
órfã uma filha que nunca chegou a conhecer... Será que alguém tem o contacto da viúva, da filha ou de outros familiares ?

Anónimo disse...

O malogrado António Luís do Couto Toste Parreira, CAR, CCaç 3414/BII17, tinha um irmão mais velho na CCaç 3327/BII17, o Francisco Parreira, imigrante na Califórnia. Este insistiu várias vezes com o irmão António para que pedisse adiamento da sua mobilização. Felizmente, na Guiné, ainda tiveram a oportunidade de se encontrar uma vez, naquele que foi o último abraço entre os dois irmãos.
Melhores cumprimentos.
José Câmara