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terça-feira, 26 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26196: Agenda cultural (872): Convite, que nos chega através do António Graça de Abreu, para a 1ª Jornada de Tradução Chinês-Português, quinta, dia 28, às 11h00, na Universidade do Minho, Gualtar

 

Convite para a 1ª Jornada de Tradução Chinês-Português, Universidade do Minho, Gualtar, quinta, 28 de novembro de 2024, às 11h00, no Auditório B1.  Destaque para a participação,  neste evento, do nosso grão-tabanqueiro  António Graça de Abreu, conhecido sinólogo e tradutor de grandes clássicos da poesia chinesa.

Recorde-se que, há 34 anos, obteve o Prémio Nacional de Tradução 1990, do PEN Clube Português/Associação Portuguesa de Tradutores, com a tradução dos Poemas de Li Bai.

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Nota do editor:

Último poste da série > 25 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26190: Agenda cultural (871): Lançamento do livro "Manecas Santos: Uma Biografia da Luta", de Rosário Luz, dia 6 de Dezembro pelas 18 horas, no Grémio Literário de Lisboa, Rua Ivens, 37 - Baixa-Chiado


quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26173: Nos 500 anos do nascimento do nosso poeta maior, Luís de Camões (c. 1524 - c.1579/1580) - Parte I: "Soube moldar o génio de todo um povo nessa língua portuguesa que, como escreveu Engels, é como as ondas do mar sobre flores e prados " (António Graça de Abreu. In "Diário Secreto de Pequim",. inédito, 12 de setembro de 1980)(



Camões (c. 1524 - c.1579/80)  e Engels (1820-1894)



António Graça de Abreu,
Pequim, 1980
António Graça de Abreu

(i) viveu na China, em Pequim e em Xangai, entre 1977 e 1983; 

(ii) foi professor de Português em Pequim (Beijing) e tradutor nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras; 

(iii) na altura, ainda era, segundo julgamos saber, simpatisante ou militante do Partido Comunista de Portugal (marxista-leninista), o PC de P (m-l), fação Vilar (Eduíno Gomes), alegadamente o único (dos portugueses) reconhecido pela República Popular da China;

 (iv) ex-alf mil, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74);

 (v) membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com mais de três centenas e meia de  referências;

(vi) compulsivo viajante, tem "morança" em Cascais; 

(vii) é um cidadão do mundo, poeta, tradutor, reputado sinólog, escritor, autor de mais de 2 dezenas de títulos publicados;

 (viii) nasceu no Porto em 1947; 

(ix) é casado com a médica chinesa Hai Yuan, natural de Xangai, e tem dois filhos dessa união, João e Pedro.
 

1. Mensagem do Antonio Graça de Abreu:

Data: 1 de novembro de 2024 01:05
 
Assunto: Camões, Engels e a China n
o meu 'Diário Secreto de Pequim0, inédito, escrito há 44 anos atrás.


Pequim, 12 de Setembro de 1980

No número deste Setembro de 1980, a revista China em Construção, edição em português, a propaganda, a divulgação oficial de tudo o que é China comunista, elaborada aqui nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras (onde, com a Adélia Goulart, trabalho há mais de um ano), saiu um extenso texto meu. 

Antes da publicação, o que escrevi e que passo agora integralmente a transcrever, foi traduzido para chinês e levado à consideração, ou chamemos-lhe assim, foi à censura dos nossos poderosos chefes chineses. Não me cortaram uma só palavra, não limparam uma vírgula, passou tudo pelo entendimento do pente de quem manda. Aí vai o meu texto:


4º  Centenário de Luís de Camões comemorado na China

Nos últimos dias de Junho passado, tive a honra de participar numa pequena reunião e convívio luso-chinês realizado na Faculdade de Línguas Estrangeiras de Pequim que teve como motivo a comemoração do 4º Centenário da morte do maior poeta português, Luís de Camões (1524-1580).

Foi um encontro muito simples, mas cujo significado e importância merecem destaque no contexo das relações culturais entre Portugal e a China. Quatro alunos dos cursos de Língua e Cultura Portuguesas da Faculdade de Línguas Estrangeiras de Pequim disseram um soneto e uma redondilha de Camões, Alma minha gentil que te partiste e Descalça vai para a fonte, em português e numa bonita tradução para chinês.

Vieram a esta Faculdade, o embaixador de Portugal na China, Dr. António Ressano Garcia, o conselheiro da Embaixada, Dr. João de Deus Ramos, a profª Conceição Afonso, eu próprio, o vice-director da Faculdade e decano dos cursos de Estudos Ibero-Americanos, prof. Liu Zhengquan e, fundamental, as quase quatro dezenas de chineses que na capital da China estudam a língua portuguesa.

 Sob a égide de Camões, as pessoas encontraram-se, conversaram, deram conteúdo a uma das mais bonitas palavras da língua chinesa, youyi 友 谊,que significa “amizade”.

O Embaixador de Portugal na China referiu a satisfação que sentia, por, a propósito de Luís de Camões, se poder encontrar com tantos jovens chineses que estudam português e que, no futuro, desempenharão um papel importante nas relações não só entre Portugal e a China, mas entre a China e o vasto mundo da língua portuguesa.

Que interesse poderá ter hoje recordar, na República Popular da China, o grande poeta português quando este país se procura projectar no futuro através das “quatro modernizações”?

Os maiores poetas -  na China um Qu Yuan, um Li Bai, um Du Fu, em Portugal um Camões ou um Fernando Pessoa -, os nossos maiores poetas não morrem, são passado, presente e futuro e continuam, século após século, a ser a voz de todo um povo.

Entender Camões é, quatrocentos anos depois da sua morte, conhecermo-nos melhor, como cidadãos à deriva, ou de pés bem assentes na terra, no embate, no extravagante diluir pelo mundo. Vamos ver porquê.

Luís de Camões, fidalgo pobre, valdevinos, desregrado e brigão, apanhado pela engrenagem complexa da sociedade do seu tempo, participou activamente, até à exaustão, na grande aventura dos Descobrimentos Portugueses. Antes de quaisquer outros povos, os homens do Douro e do Tejo chegariam por mar, às costas de África, América, Índia e também China.

Aqui em Pequim encontrei alguns amigos que eram de opinião que Camões teria sido um precursor do colonialismo português. É verdade que durante o longo governo dos reaccionários Salazar e Caetano, derrubado em 1974, o poeta foi transformado numa espécie de arauto do expansionismo português. 

De facto, em Os Lusíadas, o grande poema épico da nossa língua, Camões cantou o ilustre peito lusitano e os que entre gente remota edificaram "Novo Reino que tanto sublimaram.”

 Mas Camões também reconhece, nas últimas estrofes dos mesmos Lusíadas, que o Portugal que cantava estava metido “no gosto da cobiça e da rudeza / duma austera, apagada e vil tristeza". 

Camões, profundamente humano, nunca rejeitou, antes assumiu plenamente, a contradição das palavras e da vida.

Camões é o português de corpo inteiro, aventureiro, apaixonado e triste, cavaleiro andante errando pelas mais estranhas paragens do mundo, contraditório, lapidarmente humano. É o poeta que traduz, em versos maravilha, o que de bom e de mau se conjugam no génio português. 

Homem do Renascimento, Camões buscou uma sociedade mais justa. Um campeão dos humildes, “um socialista antes do tempo”, como lhe chamou, talvez com um certo exagero, o camonista brasileiro Afrânio Peixoto. Teve perfeito conhecimento dos males do mundo, porque os viveu, estudou e sofreu e diz:

Não me falta na vida honesto estudo
Com longa experiência misturado…


Como afirmou o prof. Rodrigues Lapa, “Camões inseriu corajosamente em Os Lusíadas alguns versos que nos asseguram uma posição político-social de cidadão vigilante”:

Vejamos no canto VII de Os Lusíadas:

Também não cuideis que cante
Quem, com hábito honesto e grave, veio,
Por contentar o Rei no ofício novo
A despir e roubar o próprio povo!
Nem quem acha que é justo e que é direito
Guardar-se a lei do rei, severamente,
E não acha que é justo e bom respeito
Que se pague o suor da servil gente.


Camões, um colonialista? 

Se participou na grande expansão portuguesa pelo mundo, que de resto abriu caminhos ao desenvolvimento da Humanidade, isso deveu-se à dinâmica do período histórico em que viveu. Se é verdade que os Portugueses oprimiram outros povos na sequência dos Descobrimentos, Camões assumiu uma atitude crítica e não foi um elemento passivo capaz de assistir, impávido e sereno, às muitas injustiças cometidas. Se tal não tivesse acontecido, o poeta não teria morrido pobre e miserável, vivendo, praticamente, nos últimos anos da sua atribulada existência, de esmolas, de caridade, de amigos.

Como homem do Renascimento, Camões foi o poeta de um mundo novo e diferente, mais amplo, mais vasto, que então começava e se abria a todos os homens.

Na sua obra lírica, foi também o grande poeta do Amor, e da negação do Amor. Ninguém como ele, na língua portuguesa, cantou o Amor, a complexidade de quem ama e é amado, as desilusões, o sofrimento, as “memórias da alegria”, essa pura paixão tão portuguesa de amar e não amar.

O jovem Friedrich Engels, companheiro de Marx, numa carta escrita a 30 de Abril de 1839 ao seu amigo Wilhelm Graeber, diz que está a estudar a língua portuguesa que “é como ondas do mar sobre flores e prados” e depois confessa-lhe que, de manhã cedo, gosta de “se sentar num jardim com o o sol batendo-lhe nas costas lendo Os Lusíadas.” 

O que levaria Engels a gostar de Camões e de Os Lusíadas?

Um historiador português deste século, Jaime Cortesão, dá uma das muitas respostas possíveis:

“O português de Camões foi moldadado pelas águas e pelos ventos, foi enriquecido pelas verdades de outras gentes e alumiado pelas estrelas de todos os céus. É o português-tritão que se misturou a todas as ondas e ao amargo sargaço dos oceanos; é o português suave que se diria respirar como as velas, ao sopro perene dos alisados; é o português amoroso que lançou os fundamentos do Império no sangue de outras raças; é o português para quem o perigo é o sal da vida e todos os homens são camaradas; e a Pátria, na própria frase do poeta, é toda a Terra.”[1]

Em Pequim, Junho de 1980, quatrocentos anos depois da morte de Luís de Camões, portugueses e chineses recordaram o grande poeta que soube moldar o génio de todo um povo nessa língua portuguesa que, como escreveu Engels, “é como as ondas do mar sobre flores e prados.”

António Graça de Abreu
__________

[1] Jaime Cortesão, História dos Descobrimentos Portugueses, III vol., Lisboa, Círculo de Leitores, 1979, pag. 219.

(Revisão / fixação de texto: LG / Não atualizámos a ortografia, do textro, que é de 1980)

domingo, 10 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26138: As nossas geografias emocionais (33): Oslo, Noruega (António Graça de Abreu)





Noruega > Oslo > 2023

Fotos (e legenda): © António Graça de Abreu (2023). Todos os direitos reservados [Edição e lendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




O escritor, sinólogo, 
tradutor e "globe-trotter"  
António Graça de Abreu
com a esposa, médica,
Hai Yuan
1. Mensagem do nosso amigo e camarada António Graça de Abreu ( ex-alf mil, CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), ainda no rescaldo de mais um cruzeiro que efetuou, com a esposa, em agosto de 2023, desta vez à Gronelândia e à Islândia (*):

Data - terça, 29/10/2024, 16:00
Assunto - Oslo


Oslo, Noruega

Na essência de nós, questionar o que pretendemos ser, dar as mãos abertas, não fechar o punho, abrir o entendimento e a alegria, esconder as lágrimas, 
segurar o cajado e o vento. No caminho por 
múltiplas paisagens, deslumbramentos 
breves, os desvairos, a sacanagem das 
gentes, buscar a harmonia do mundo

Nostálgico, meio triste, chego a Oslo, por mar, pelo fiorde que conduz à cidade. Nas encostas, casinhas 
de campo e outras, subindo, descendo por reentrâncias do mar, enseadas, marinas, abraçando a terra. No silêncio das águas, uns tantos barcos à vela e lanchas a motor, reentrâncias pelas terras nórdicas, tudo organizado, disciplinado, sob um sol de Verão claro e limpo. Estou numa terra de excelência e paz, mas não alheia à loucura e à insensatez dos homens.

Aqui, ao lado de Oslo, fica a ilha Utoya onde algumas centenas de jovens, gozando férias no Verão de 2011, foram brutalmente atacadas, em ritual de morte, por um celerado norueguês chamado Anders Breivik, e setenta e sete deles mortos a tiro e á bomba. Aconteceu nesta pacata Noruega, um dos países mais ricos e civilizados do mundo.

Oslo é uma cidade onde impera a liberdade, o objectivo dos políticos desta terra será organizar, disciplinar, pôr ainda mais ordem numa sociedade já de si tão pacífica e próspera.

Passeio-me nos jardins com centenas de pessoas deitadas na relva, descansando ao sol estival, os parques polvilhados de flores e originais esculturas, os imponentes edifícios do governo, entro no palácio onde todos os anos é entregue o Prémio Nobel da Paz. O porto de mar, o centro do burgo, os lagos, as pontes, a cidade estendendo-se, para norte, crescendo. Serenidade e paz.

© António Graça de Abreu (2023)

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Nota do editor:

domingo, 3 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26111: Notas de leitura (1740): "Poemas de Han Shan" (China, séc. VIII), organização, tradução e apresentação de António Graça de Abreu, no Centro Científico e Cultural de Macau, Lisboa, 26/9/2024

 


1.  Para aqueles que não puderam estar presentes na sessão de apresentação do livro "Poemas de Han Shan", organizado e traduzido por António Graça de Abreu, no passado dia 26 de setembro, no Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) (*),  o nosso amigo e camarada disponiblizou-nos os "slides" que elaborou para a ocasião.  

Perdemos a sua conversa ao vivo, mas temos ao menos o privilégio de poder aceder ao essencial daquilo que ele quis transmitir ao público sobre o lendário poeta e monge ligado ao Budismo chan (ou zen, como é conhecido no Japão), Han Shan, do séc. VIII (em chinês, quer dizer "Montanha Fria"),


Já agora esclarecemos os nossos leitores sobre o que é o CCCM e a sua missão:

(i) tem por missão produzir, promover e divulgar conhecimento sobre Macau enquanto plataforma entre Portugal e a República Popular da China, assim como entre a Europa e a Ásia;

(ii) é, também, um espaço dedicado ao estudo e ensino da língua, cultura e história chinesas, e um centro de investigação científica e de formação contínua e avançada sobre as relações entre Portugal e a China, assim como entre a Europa e a Ásia;

(iii) dotado de autonomia administrativa e património próprio, é um instituto público integrado na administração indireta do Estado e sob tutela do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O António Graça de Abreu não precisa de apresentações. Honra-nos com a sua presença na Tabanca Grande desde 5/2/2007, e tem 354 referências no nosso blogue.


Templo de Han Shan, Suzhou, China (Suzhou é uma cidade a oeste de Xangai, no delta do rio Yangtzé, famosa pelos seus cnais,, pontes e jardins clássicos, classificados pela UNESCO com o património  material da humanidadfe em 1997 e 2000).


O António Graça de Abru no templo de Han Shan


Templo de Han Shan


A ponte de Fenqiao (séc. VIII), Suzhou


Famoso poema do poeta ZhangJi (766?-830?), "À noite, ancorando em Fengqiao"...





O poeta 寒 山 Han Shan (700?-780?)


Han Shan e Shi De no Japão, ou seja, Kan Zane Jitttoku. 
O budismo Chan ou Zen que só chega ao Japão em 1191.


Matsuo Bashô (1644-1694), o grande mestre dos haikus japoneses, adorava Han Shan









No meu prefácio aos poemas de Li Bai (1990) tentei explicar,  de forma exaustiva,  os processos que por norma utilizo na tradução e reinvenção de um poema chinês em língua portuguesa. 

Referi também, em detalhe, muitas das características da língua chinesa, talvez a mais depurada de todas as falas e escritas existentes debaixo do céu. 

Os anos passam e um continuado contacto com os grandes poetas da China confirma, convence-me de que, se já é muito difícil traduzir poesia em qualquer língua, no que ao chinês diz respeito a tarefa é impossível. E porque é impossível, as traduções avançam. Trata-se de caminhar pela impossibilidade, é necessário transformar o impossível em possível.

Ao traduzir poesia chinesa sei que trabalho na sombra, iluminado sobretudo pelo silêncio da sombra.

Camilo Pessanha, no prefácio à sua tradução das oito elegias chinesas, escrevia por volta de 1910, referindo uma expressão de Herbert Giles, um dos primeiros tradutores de poesia chinesa para língua inglesa, que escreveu “a chinese poem is at best a hard nut to crack”,  que Pessanha traduziu como “toda a composição poética chinesa é para o tradutor uma noz de casca dura”.

Trata-se de caminhar pela impossibilidade e de transformar o impossível em possível. O resultado é sempre um poema em língua portuguesa que procura ser fiel ao significado dos caracteres e à sensibilidade do poeta chinês, tão próximo do verso original quanto o rigor exige mas reinventado numa outra língua. 

É já um outro poema, quase sempre distante da estrutura poética do chinês porque o poema passa a ser português. Falamos de traduções, do comboio de caracteres que precisamos de identificar, de versões possíveis, da natureza do trabalho do tradutor, enfim, de questões fundamentais amplamente analisadas e debatidas nos estudos e cursos de tradução um pouco por todo o mundo.

Gil de Carvalho, um dos raríssimos críticos portugueses que, com alguns laivos de conhecimento da língua chinesa, se referiu às minhas traduções, considerou “ a vocação missionária e estética de Graça de Abreu” e o “querer fazer poesia sua através do poema ou do poeta chinês”.

Em carta pessoal, Eugénio de Andrade escrevia-me em novembro de 1993: 

Num parecer sobre as minha traduções, que guardo comigo, escrevia Óscar Lopes, em 28 de Janeiro de 1993:

 “Conheço a obra de tradução do Chinês para Português da autoria de António Graça de Abreu, nomeadamente Poemas de Li Bai e Poemas de Bai Juyi, publicados ambos com excelentes introduções históricas e literárias. 

"Não leio directamente textos chineses, mas tive a oportunidade de, num seminário do Curso de Mestrado da Universidade do Minho, apresentar o primeiro deste livros à discussão de duas alunas chinesas (Drªs. Wang Ting e Sun Lin) com boa preparação cultural, quer sinológica, quer ocidental e verifiquei que o tradutor conseguiu equivalências extremamente difíceis de encontrar e de condensar, de um poeta clássico oriental do século VIII.”

Até há poucos anos, o poeta Han Shan era completamente desconhecido em Portugal, o que de resto acontecia com quase todos os grandes poetas chineses. 

Isto apesar de Macau e de uma continuada presença portuguesa de quatrocentos e cinquenta anos nas terras da China. Mas, mesmo na cidade do Nome de Deus na China, a poesia chinesa também já desceu do grande Império do Meio, a norte, atravessou as Portas do Cerco e entrou mui de leve na sensibilidade de alguns dos seus melhores habitantes lusitanos.

Existe o caso singular de Camilo Pessanha que em Macau traduziu, deu forma a poemas a que chamou “oito elegias chinesas”,  oriundas de um álbum de poetas menores da dinastia Mingque, e que  o autor da Clepsidra nos diz ter comprado “pelo preço vil de duas patacas numa casa de prego” .

É pena o genial Pessanha não ter descoberto os grandes poetas da China, Li Bai, DuFu, Wang Wei, Han Shan. Somos o que somos e, apesar de Macau, a Sinologia portuguesa, o estudo sério e rigoroso das coisas do mundo chinês, também o depurar das sensibilidades com o Império do Meio por horizonte, quase não consegue crescer.

Em 1997, o PenClub Português nas suas pequenas “Folhas Soltas” publicou Nove Poemas de Han Shan, a minha primeira tentativa de tradução da poesia do mestre da Montanha Fria.

Em 2003, Ana Hatherly que tão bem conhece o ofício do poeta, companheira de entusiasmantes conversas sobre poesia chinesa e de jantares do PenClub, deu ao prelo as suas originais versões poéticas elaboradas a partir das traduções francesas de Jacques Pimpaneau com o título "O Vagabundo do Dharma, 25 Poemas de Han Shan".

Quem gosta de poesia, quem deseja abrir a mente para as mil subtilezas –chamemos-lhe outra vez assim –, do budismo chan m ou zen, quem procura a simples inteligência do saber encontrará em Han Shan um mestre, um confrade, um amigo. O poeta da Montanha Fria « nous révèle cette esprit de la Chine qui dort aussi en notre tête et attend, telle la Belle au Bois Dormant, qu’un prince comme Han Shan vienne l’y éveiller»,  disse Jacques Pimpaneau .[ Tradução do francês parea português: "revela-nos esse espírito da China que também dorme nas nossas cabeças, à espera, como a Bela Adormecida, que um príncipe como Han Shan venha despertá-lo". (LG)]




Flores no templo de Han Shan, Suzhou, minha foto 2011




"Slides" (incluindo texto): © António Graça de Abreu (2024). Todos os direitos reservados. [Edição, revisão / fixação de texto, links: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

22 de setembro de 2024 > Guiné 61/74 - P25968: Agenda cultural (860): Convite para o lançamento do livro "Poemas de Han San", organizado e traduzido por António Graça de Abreu, dia 26 de Setembro de 2024, pelas 18h30, no Auditório CCCM, Rua Guerra Junqueira, 30 - Lisboa

17 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26054: Agenda cultural (862): Lançamento do livro Poemas de Han Shan (edição bilingue, seleção, tradução, prefácio e notas de António Graça de Abreu): 19 de outubro, sábado, 17h00 | Casa do Comum, Bairro Alto, Lisboa

sábado, 26 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26081: As nossas geografias emocionais (27): Berlim, 2023: junto aos restos do muro mais tristemente famoso do mundo: "Mein Gott, hilf mir diese tödliche Liebe zu überleben" / “Meu Deus, ajuda-me a sobreviver a este amor fatal" (António Graça de Abreu)







Alemanha > Berlim > Agosto de 2023

Fotos (e legenda): © António Graça de Abreu (2023). Todos os direitos reservados [Edição e lendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem do nosso amigo e camarada António Graça de Abreu ( ex-alf mil, CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), ainda no rescaldo de mais um cruzeiro que efetuou, com a esposa, em agosto de 2023, desta vez à Gronelândia e à Islândia (*):

Data -  25 out 2024, 19:15

Assunto - Berlim 2023- .. Dá para publicar ?


Berlim, 2023, Alemanha

por António Graça de Abreu


"Para lá das portas de Brandenburgo e da Praça de Potsdam, reina a fria inteligência marxista, onde os soldados soviéticos, alguns deles sobraçando espingardas-metralhadoras, parecem sentinelas de um angustiante rigor, tolhendo toda a alegria de viver."  (Urbano Tavares Rodrigues, em 1954)


Regresso a Berlim no Verão de 2023, cinquenta e quatro anos depois, agora em avião da TAP e aterragem em Brandenburg, um dos aeroportos da cidade.

Caudais imensos de água límpida e poluída correram entretanto sob as pontes do rio Spree, que atravessa Berlim. E eu cresci, em conhecimento, em aspecto, hoje muito mais largo e gasto do que o rapazinho de há cinco décadas atrás. Levo comigo o gosto de regressar a uma cidade que marcou os meus anos de juventude, que me fez definitivamente descrer no modelo soviético de governo das gentes do mundo.

Para esta viagem de 2023, procurei na net um hotel situado na antiga parte oriental de Berlim, a mais rica em monumentos e História, e acho que acertei. Fico no Arcotel John F. Kennedy, logo ao lado da chamada ilha dos museus. Um quatro estrelas, noventa euros por noite, um pequeno almoço digno de marqueses, viscondes e barões pequeninos. Na mesma rua situa-se o vasto edifício do actual Ministério dos Negócios Estrangeiros, já aqui instalado nos tempos da Alemanha comunista.

Tenho cinco dias para conhecer, reconhecer Berlim, sem muros, nem arame farpado. Há muitos quilómetros para fazer a pé, de metro, compro um passe de dois dias para os autocarros vermelhos Hop on Hop off que dão uma volta à cidade em duas horas, passando pelos mais importantes lugares turísticos. Sobe-se, desce-se do autocarro, somos levados para quase tudo quanto é sítio.

Caminho algo perdido pela malha da cidade, em busca do norte/sul/leste e oeste, procurando o recortado traçado do velho Muro como referência. No mapa, no telemóvel, quanta sinuosidade, quantos espaços terraplanados, quanta reconstrução, quantas paredes tapadas, quanto rasgar doloroso na memória do coração de Berlim...

Hoje, o que é que resta do Muro, como recordar a humilhação de todo um povo? Em Charlie Point, tiro uma fotografia da fronteira entre as duas Berlins. Por aqui passei, engolindo sapos e petróleo, de carro, atravessando para o lado dos camaradas comunistas, em 1969. 

Agora, 2023 o posto militar ainda de pé, atravancando a Friedrichstrasse, mas funcionando para definir o avançar da avenida ladeada, entre outros, por um museu do Muro, um MacDonald e um Kentucky Fried Chicken. Não longe, há um pedaço do Muro honestamente conservado. E um extenso passeio com reconstituições rigorosas, com fotografias e texto, do que foram esses tempos sofridos de divisão da cidade.

Numa outra parte de Berlim, junto ao rio Spree, na Mühlenstrasse mantém-se de pé um pedaço do Muro com quase um quilómetro de extensão. Transformaram-no num original museu a céu aberto, com as secções do Muro decoradas com dezenas e dezenas de largas pinturas alusivas à liberdade, e outros temas da autoria dos mais diversos pintores. 

Sobressai uma cópia em grande de uma famosa fotografia de Leónidas Brejnev, o líder russo, beijando gloriosamente na boca o líder alemão comunista, Erich Honecker. A foto verdadeira foi tirada aqui em Berlim em 1979. Por baixo do rosto dos dois senhores está escrito em russo e em alemão Mein Gott, hilf mir diese tödliche Liebe zu überleben, o que significa “Meu Deus, ajuda-me a sobreviver a este amor fatal.”

Os museus da cidade, o Altes e o Neues Museun, o Bode, o Pergamon, a Nationalgalerie. Neste último espaço, numa sala enfeitada de magia, tiro uma fotografia entre dois retratos de mulher, à minha direita uma dama linda de rosto alongado pintada por El Greco (1541-1614), à minha esquerda, uma espaventosa senhora saída da imaginação de Pablo Picasso (1881-1973). A perfeição do traço, a serenidade do olhar, a esfusiante loucura. Que maravilha!

Toda esta zona da cidade foi intensamente bombardeada durante a II Guerra Mundial, houve grandes destruições, mas os nazis tinham já cuidado de guardar, em precária segurança, muitos dos fundos culturais mais valiosos. 

Os russos, os primeiros a chegar à Alemanha derrotada em 1945, levaram para Moscovo e São Petersburgo muitas das peças dos museus alemães. Estão ainda hoje, no Museu Pushkin e no Ermitage. A Alemanha reivindica o seu regresso, e há negociações para que tal aconteça.

Passear-me em absoluto prazer pela Avenida Unter der Linden, a Ópera com o Daniel Barenboim como o maestro, adiante o Reichstag, o parlamento da terra germânica. Logo depois, as Portas de Brandenburgo, ao fundo, silenciosamente abertas para a liberdade do mundo.

(Revisão / fixação de texto, bold, itálicos, título: LG)

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26070: As nossas geografias emocionais (26): Esta Alemanha debruçada sobre o Báltico: Lübeck, Travemünde, Rostock, Warnemünde, Alemanha (António Graça de Abreu)




Alemanha > Costa báltica >Agosto de  2023 

Fotos (e legenda): © António Graça de Abreu (2023). Todos os direitos reservados [Edição e lendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 

1. Mensagem do nosso amigo e camarada António Graça de Abreu ( ex-alf mil, CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), ainda no rescaldo de  mais um cruzeiro que efetuou, com a esposa, em agosto de 2023, desta vez à Gronelândia e à Islândia (*):

Data - segunda, 21/10/2024, 22:34
Assunto - Viagens... Dá para publicar ?
 

Lübeck, Travemünde, Rostock, Warnemünde, Alemanha


As minhas aventuras por esta Alemanha debruçada sobre o Báltico começaram no Verão de 1967 (**). 

Eu era um rapazinho de vinte anos, encalhado em Hamburgo, na margem do rio Elba, estudando, trabalhando, meio falho de ternura, entregue aos cuidados da minha menina alemã, companheira e amiga, a Inge Balk, dezanove anos, loiros e doces.

No abrir do Verão, aí viemos ambos de comboio desde Hamburgo até Lübeck, a cidade de Thomas Mann (1875-1955), prémio Nobel da Literatura em 1929, espairecendo pelo burgo hanseático, a liga antiga que unia uns tantos portos de mar do Báltico e do Atlântico Norte. Lübeck, cheia de igrejas, de ruas com casinhas do século XVI, a Holsten Tor, uma das quatro portas da cidade datada de 1464, tudo hoje Património Mundial pela Unesco.

Em Travemünde se apanhavam os navios que faziam a ligação com a Suécia e a Finlândia. Em meia dúzia de horas de navegação chegava-se, e chega-se, às capitais do Báltico.

Avançando para o mar, tínhamos também praia em Travemünde. Foi tempo de estender o corpo na areia tépida e de ir molhar os pés nas águas ainda frias no mês de Junho. A praia cheia de barracas de verga, com a abertura orientada a sul, para se protegerem do vento.

Logo ali, do outro lado da foz do rio Trave, começava o arame farpado, com uma alta torre de madeira de vigilância da DDR, a Alemanha Oriental. Os camaradas comunistas tomavam conta da fronteira. Pela primeira vez, eu via a Alemanha dividida, o outro lado aparentemente inacessível.

Ano de 2023, viagem pelas quase mesmas paragens, agora, desde Berlin, 250 quilómetros de comboio, com passagem por Rostock até chegar a Warnemünde, velho porto germânico fundado em 1195. Há cinquenta anos atrás tudo isto era território da DDR, a Alemanha Comunista mas desse lado o sistema político não trouxe liberdade, nem democracia, raramente chegou um pouco mais de felicidade às pessoas. 

Hoje é tudo Alemanha, respira-se um ar mais puro, desinfestado de pestilências políticas do passado. Venho para continuar viagem num navio rumo à Gronelândia e aproveito um dia inteiro para testemunhar as semelhanças entre Travemünde e Warnemünde, ambas portos de mar na margem esquerda da foz de um rio, o Trave e o Warnow, as duas debruçadas sobre o mar Báltico, a 150 quilómetros uma da outra, com praias famosas para alemão fruir. 

Outra vez em Junho, e o tempo ainda frio, 17 graus, mas a cidadezinha já cheia de veraneantes e turistas, alguns de passagem, como eu, em navios de cruzeiro. Desta vez não fui molhar os pés no Báltico, apenas o largo passear pela cidade e, para matar saudades de um glorioso tempo do passado, num imbiss, um tasquinho germânico, comer duas salsichas e beber uma cerveja alemã. (***)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 5 de dezembro de 2023 > Guiné 621/74 - P24920: Dos calores da Guiné aos frios da Gronelândia (6): Em Reykjavik, Islândia, onde nada nos assusta: se a terra treme,é porque o vulcão, não longe, barafusta (António Graça de Abreu)

(**) Vd. poste de 31 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22418: Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo (António Graça de Abreu) - Parte XIII: Hamburgo, Alemanha Federal, 1967

(***) Último poste da série > 24 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25679: As nossas geografias emocionais (25): Quase todos partimos, até 1972, num navio de transporte de tropas, a partir do Gare Marítima da Rocha Conde Óbidos, e não da Gare Marítma de Alcantara...

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26054: Agenda cultural (862): Lançamento do livro Poemas de Han Shan (edição bilingue, seleção, tradução, prefácio e notas de António Graça de Abreu): 19 de outubro, sábado, 17h00 | Casa do Comum, Bairro Alto, Lisboa



Capa do livro "Han Shan: Poemas": seleção, tradução, prefácio e notas de António Graça de Abreu. Edição bilingue. Lisboa, Grão-Falar, 2024 (*)


Lançamento do Livro "Poemas de Han Shan" | 19 de Outubro  | 17h00 | Casa do Comum | Bairro Alto, Lisboa (**)



“Lê os verdadeiros escritores, lê Balzac, Han Shan, Shakespeare, Dostoieveski.”

Jack Kerouac

O homem que um dia se chamou Han Shan, ninguém sabe quem foi. Quando alguém o via, considerava-o um doido, um pobre diabo. Vivia retirado na montanha Tiantai, sete léguas a oeste do distrito de Tangxing, num lugar chamado Han Shan (Montanha Fria), entre rochas e falésias. Daí descia frequentemente para o templo de Guoqing, ao encontro do seu amigo Shi De, encarregado da limpeza da cozinha do mosteiro que lhe guardava restos de comida em malgas feitas com cana de bambu.

Lu Qiuyin (Séc. IX)

Quem gosta de poesia, quem deseja abrir a mente para as mil subtilezas do budismo chan, quem procura a simples inteligência do saber encontrará em Han Shan um mestre, um confrade, um amigo.

 António Graça de Abreu

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António Graça de Abreu

O escritor, tradutor e nosso
camarada António Graça
de Abreu com a esposa,
Hai Yuan

  • nasceu no Porto, em 1947; 
  • licenciado em Filologia Germânica, mestre em 
  • História da Expansão e dos Descobrimentos Portugueses
  • foi professor de Português em Pequim e tradutor nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras;
  • viveu em Pequim e Xangai entre 1977 e 1983;
  • foi professor do ensino secundário e assistente convidado leccionando Sinologia no Instituto de Estudos Orientais  da Universidade Nova de Lisboa, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas e na Universidade de Aveiro;
  • traduziu para português a peça de teatro Xi Xiang Ji (O Pavilhão do Ocidente), de Wang Shifu (1260?-1320?), editada em 1985 pelo Instituto Cultural de Macau;
  • e também as antologias Poemas de Li Bai, Poemas de Bai Juyi, Poemas de Wang Wei, Poemas de Han Shan e Poemas de Du Fu publicadas em Macau, respectivamente, em 1990, 1991, 1993, 2009 e 2015;
  • traduziu também o Tao Te Ching, editado em Portugal pela Vega Ed., 2013;
  • o seu livro Toda a China I e II, 2013 e 2014, é um extenso conjunto de textos sobre as suas muitas viagens e vivências exactamente por todo o território da República Popular da China, mais Taiwan, Hong Kong e Macau;
  • historiador e poeta, é também autor da biografia de D. Frei Alexandre de Gouveia, Bispo de Pequim (1751-1808), co-autor dos dois volumes da Sinica Lusitana, 2001 e 2004, e dos livros de poesia China de Jade, China de Seda, Terra de Musgo e Alegria, China de Lótus, Cálice de Neblinas e Silêncios, A Cor das Cerejeiras e Lai Yong, Bernardo e outros Poemas;
  • publicou ainda o Diário da Guiné, o relato da sua experiência de guerra durante os anos 1972/1974; e dois livros de viagens, sobre as suas duas voltas ao mundo, Notícias Extravagantes de uma Volta ao Mundo e Odisseia Magnífica;
  •  entre 1996 e 2002 pertenceu ao Board da European Association of Chinese Studies (Heidelberg, Edimburgo e Turim);
  • com a tradução dos Poemas de Li Bai, obteve o Prémio Nacional de Tradução 1990, do PEN Clube Português/Associação Portuguesa de Tradutores.


(aberto, sábado, das 12h00 às 2h00)  

(...) A Casa do Comum, projecto da Ler Devagar e imaginado por José Pinho, inaugurado a 31 de outubro de 2023, no Bairro Alto, é um espaço que se propõe como um ponto de encontro da cidade com a cultura.

Num edifício com 3 pisos coexistem uma sala de espectáculos com possibilidade de apresentação de cinema, artes performativas, concertos e conferências, uma livraria generalista, uma livraria alfarrabista e um bar, devolvendo ao Bairro Alto a sua participação na cena cultural da cidade e restituindo aos residentes da cidade um espaço que alia a fruição cultural à vida social no centro histórico. (...)


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Notas do editor:


(**) Último poste da série > 12 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26039: Agenda cultural (861): Convite para o lançamento do livro "CRÓNICAS DE PAZ E DE GUERRA, de Joaquim Costa, a ter lugar no próximo dia 9 de Novembro, pelas 16h00, na Bibliotaca Municipal de Gondomar, Av. 25 de Abril. Apresentação do livro a cargo do Dr. Manuel Maria

terça-feira, 15 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26046: As nossas geografias emocionais (26): Durban, África do Sul, 2022: aqui vivera,m Fernando Pessoa, Mahatma Gandhi e Nelson Mandela... (António Graça Abreu)



África do Sul > Durban > 2022

Fotos (e legenda): © António Graça de Abreu (2024). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].

1. Texto (e fotos) enviado pelo António Graça de Abreu, com data de 13/10/2024, 17:48



Durban, África do Sul, 2022

por António Graça de Abreu


Entrar por esta terra dentro. Chegar ao reino dos zulus, a cultura tribal, a história, também com um “Napoleão Negro”, vencendo e subjugando outros povos rivais em tremendas rivalidades étnicas. A minha vasta ignorância sobre as margens destes povos.

Aqui, como por todo o mundo, o entendimento entre os homens jamais foi fácil. E vieram os brancos, o apartheid, os deuses e os diabos, quantos ódios, quanto sofrimento, quanta humilhação…

Uma certa curiosidade em conhecer a terceira maior cidade da África do Sul, depois de Joanesburgo e da Cidade do Cabo. Durban associada ao jovem Fernando Pessoa que aqui viveu na sua infância e juventude, lugar onde modelou parte do seu entendimento do mundo, e modo de expressá-lo em poesia e cultura, influenciado por cânones ingleses bebidos nas escolas desta terra.

Durban foi também a cidade onde o então jovem advogado indiano Mahatma Gandhi (1869-1948) chegou em 1896, após os estudos em Londres. Face às prepotências dos colonos ingleses, tentou defender os direitos dos emigrantes indianos que, em busca de um futuro melhor, aqui desembarcavam aos milhares vindos da Índia. Gandhi permaneceu na África do Sul durante vinte e um anos. Foi toda uma gesta pessoal de consciencialização política e de defesa dos direitos dos expatriados indianos.

No vasto território das extremas de África, também Nelson Mandela que aqui nasceu apregoou a paz e lutou por um mundo mais humano e fraterno.

Cinco dias em Durban, 2022. Alojamento no Suncoast Hotel, um quatro estrelas bonito, com piscina e macacos selvagens à solta nas árvores junto à piscina, o hotel debruçado sobre a extensa praia a norte da cidade, para minha surpresa ligado por um corredor interior a um conjunto de cinemas, restaurantes, tudo desembocando num enorme casino que me dizem ser o maior de todo o continente africano. 

Tocado pelo bichinho da curiosidade, para lá encaminhei os pézinhos, não para jogar mas ao encontro de moderníssimas máquinas multibanco para trocar euros por rands, a moeda local. Não tenho hábitos de jogador, não gosto da atmosfera pesada dos casinos, mas neste havia festa, um cantor da moda debitava conhecidas canções que as pessoas da terra, negros e negras irradiando alegria, dançavam em volta do palco, saracoteando as ancas, bamboleando os rabos. Bem compostas de gente estavam as slot-machines, as bancas de bacarat, as roletas.

Em Durban, cerca de 70% da população é negra, quase toda de etnia zulu, 20% são de origem indiana e 8% são brancos. Os africanos zulu prevaleciam no pequeno/grande desvairo do jogo. Ainda hoje, nesta província, contam com doze milhões de pessoas, um etnia aguerrida, com um enorme prazer de viver.

No complexo do casino, entre outros, havia um restaurante português. Lá fui comer um bife, pensava ir matar saudades da comidinha de casa, mas os meus dentes e o palato protestaram, a tirinha do lombo da vaca sabia imenso a boi velho e duro.

As rondas pela cidade, avançando com um certo cuidado porque consta serem frequentes os assaltos e roubos a turistas. Não tive nenhum problema.

Nas praias, logo de manhã cedo, em frente do hotel e ao longo dos quilómetros e quilómetros de areal, famílias inteiras, grupos de amigos, com as damas negras com trajes brancos, com crianças e homens, todos vestidos com arrendados e funcionais trajes de festa, exultantes e bem-dispostos entrando por dentro das águas. Tudo parecido com o que acontece no Brasil com o culto de Iemanjá, rainha do mar, ou a saudação às orixás, divindades benfazejas comandando o destino das gentes.

Visita ao Jardim tropical, o mais antigo de África, no extremo sul da praia, já junto ao porto. Passarinhos e passarões para todos os gostos, golfinhos e focas, e sobretudo vegetação luxuriante, jardins, a profusão das flores. O centro da cidade, as ruas com o desenho em quadrícula do século dezanove, o mercado de Vitoria Street com uma grande quantidade de lojas indianas e quinquilharia a granel, pouca coisa interessante para comprar, prédios antigos e históricos, como a grande Câmara Municipal construída entre 1906 e 1910, exactamente durante os anos em que Fernando Pessoa aqui viveu.

Depois, duas grandes voltas no autocarro Durban Ricksha Bus aberto para a vista total sobre a cidade. Os arranha-céus, de tamanho médio, estendendo-se do centro até à orla costeira – há muito dinheiro à solta crescendo em Durban –, o estádio Moses Mabhida com capacidade para 70 mil espectadores, construído para o campeonato do mundo de futebol 2010, o jardim zoológico em Mitchell Park, o contraste entre as zonas mais pobres e as mais ricas. 

Por aqui, entre parques verdejantes e jardins, algumas das escolas secundárias mais caras de toda a África do Sul, formatadas no sistema inglês.. Dizem-me que o Hilton School College, tem uma propina anual de vinte e tal mil euros. Pagos pelos pais de uns tantos meninos ricos, a maioria brancos, alguns negros, mais uns raros indianos e chineses, todos filhos da sorte, da igualdade difícil, dos desequilíbrios do mundo.

António Graça de Abreu

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