sábado, 14 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14365: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (24): Seria imperdoável não falar das motorizadas Suzuki, a marca nº 1, de então, sem desprimor para a Honda, e que o meu primo, Costa Pinheiro, vendia aos montes em Bissau (Carlos Pinheiro, ex-1.º cabo trms op msg, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70)

Susuki, motorizada AS 50 Maverick 1969  (Fonte: Susuki Cicles, com a devida vénia...)

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1. Mensagem, com data de ontem, de Carlos Pinheiro  [, ex-1.º cabo trms op msg, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70; vive em Torres Novas]

Camarigo Luís Graça


Falar de uma coisa, neste caso motorizadas, que nunca foi a minha especialidade, pode parecer um atrevimento, mas lembro-me bem de todas essas motorizadas de que fala o texto (*)  mas onde ainda faltam, entre outras, as ILO e as Zundap, mas acho que devo falar das Suzuki que ajudei a vender em Bissau.

O meu parente, Costa Pinheiro, estabelecido em Bissau desde os princípios dos anos 50 (**), importava e vendia de tudo, desde o alfinete ao camião.

E a Suzuki era a menina dos olhos de ouro de Bissau, sem desprimor para a Honda que era também uma grande máquina.

Mas a Suzuki vendia-se aos montes,  como aliás tudo o que meu parente representava se vendia bem porque era tudo de qualidade afiançada.
Carlos Pinheiro

Era a Toyota, a Sony, a JVC Nivico, as louças da Prago Export, os discos da Ansónia, a BIC, a Colgate Palmolive, a Max Factor, os tapates da Issing Trading, os relógios Seiko, as máquinas fotográficas Fujica e tanta coisa mais.

Mas a Suziki era de facto uma máquina entre tantas máquinas boas.

Tenho pena mas não tenho fotos daquelas máquinas, mas lembrei-me de dar só este lamiré já que nos postes não vi ninguém falar das Suzukis e, quanto a mim, seria imperdoável esquecermo-nos daquelas pequenas bombas.

Um abraço
Carlos Pinheiro

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Notas do editor:

(*) Vd. último poste da série > 13 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14358: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (23): precisam-se imagens de motorizadas de 50 cc , made in Portugal (Alma, Pachancho, Vilar Cucciolo, Famel, Macal, Sachs e Casal), ou nas ex-colónias (como a Fabimotor e a Ulisses, ambas angolanas)... Para edição de livro dos CTT.

(**) Vd. poste de 20 de abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8138: Memória dos lugares (152): A cidade de Bissau em 1968/70: um roteiro (Carlos Pinheiro)

(...) Mas na Avenida principal [, Av da República], do porto ao Palácio do Governo, também havia o “Bento”, café e esplanada característica da cidade a que vulgarmente nós, os militares, chamávamos de “5ª Rep.” já que o Quartel-general só tinha 4 Rep’s, 4 Repartições. (...)

(...) Para a malta, ali era portanto a 5ª repartição onde quem chegava do mato se encontrava com os residentes, onde se trocavam informações e onde, se dizia, que essas informações vadiavam ali dum lado para o outro do conflito. Ao lado do “Bento” mais para o interior, era a Bolola, onde esteve o Serviço de Material, depois transferido para Brá, e onde era o Cemitério que ainda guarda os restos mortais de muitos camaradas nossos.

Nessa avenida estavam talvez as maiores casas comerciais. Por exemplo a “Casa Gouveia”, da CUF, que vendia ali de tudo e que tudo comprava o que os naturais produziam, principalmente a mancarra (...), o Banco Nacional Ultramarino, o banco emissor da Província, o Cinema UDIB e ao lado uma boa gelataria, mais acima a Pastelaria, Padaria e Gelataria Império, assim baptizada por estar já na Praça do Império onde se situava o Palácio do Governo e Associação Comercial.

Também era nessa Avenida que estava a Sé Catedral, templo de linhas tão simples quanto austeras.
(...) A caminho de Brá e da “SACOR”, havia um local chamado “Benfica” onde havia um café com o mesmo nome e onde se apanhavam os transportes para os vários quartéis daquela zona como eram o Hospital Militar 241, o Batalhão de Engenharia 447, os Comandos, os Adidos e mais à frente a BA 12 e o BCP 12.

Mas havia outros estabelecimentos dignos de recordação. A casa de fados “Nazareno”, mais tarde rebaptizada de “Chez Toi”, a “Meta” com as suas pistas de automóveis eléctricos, e como novidade também apareceu naquela altura “O Pelicano”, café-restaurante construído pelo Governo e explorado por privados, com uma belíssima vista sobre o Geba e avenida marginal.

Na Avenida Arnaldo Shulz, que ligava a Estrada de Santa Luzia à tal SACOR, a caminho de Brá, sempre ao lado do Cupelão [ou Pilão], estava o Comando Chefe das Forças Armadas à esquerda de quem subia, um pouco mais abaixo, os Bombeiros Voluntários de Bissau num grande quartel nessa altura muito bem equipado, a Cruz Vermelha, estes do lado direito e até a Sede local da PIDE, que nessa altura já se chamava DGS, também do lado direito mas já junto ao Largo do Colégio Militar.

Era uma avenida nova, como se fosse uma circular urbana onde as boas vivendas também começaram a aparecer.

No princípio da Avenida que ia para Santa Luzia, antes de se chegar ao Hospital Civil, estava o Grande Hotel, nome pomposo do melhor estabelecimento hoteleiro da cidade. O resto era pensões, algumas de quinta escolha.

Mas o comércio de Bissau não era constituído só por cafés, restaurantes e tascas. Havia de tudo. E há nomes que não se esquecem. Para além da Casa Gouveia, o maior empório daquele então Província Ultramarina, como então se dizia, a Casa Pintosinho, a Taufik Saad, a Costa Pinheiro, e muitas outras vendiam de tudo, são nomes que ficaram para sempre na memória. (...)

Guiné 63/74 - P14364: Memórias de Gabú (José Saúde) (53): A mota da malta. Um brinquedo adorável.

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua magnífica série.

As minhas memórias de Gabu

A mota da malta

Um brinquedo adorável

Em instantes de ócio o pessoal encantava-se com um pequeno brinquedo que nos enchia de prazer: uma mota que nos conduzia em pequenos passeios pelo interior de Nova Lamego.

Quem era o seu verdadeiro dono? Uma resposta à qual não consigo responder com precisão. Constava-se que o seu legítimo proprietário era um furriel miliciano das BAA (Baterias Anti-Aéreas), de nome Couto, sendo que o adorável veículo se apresentava sempre ao dispor daqueles que, esporadicamente, quisessem dar uma volta sobre duas rodas.

Dizia-se, também, que mais tarde o brinquedo foi pertença do furriel miliciano Godinho, um camarada, mecânico, da minha Companhia.


Uma deslocação pelas ruelas térreas de Nova Lamego sentado na motinha apresentava-se como um autêntico delírio. Enfrentar o vento a uma velocidade reduzida enchia-me de prazer.

O espontâneo piloto, longe dos circuitos de altas velocidades, ressacava-se com os prazeres debitados pela fraca potência do motor e passeava-se calmamente pelo interior da urbe, deparando-se com encantadoras bajudas que lançavam olhares discretos sobre um furriel, vaidoso, que fazia jus ao ronco que despretensiosamente apresentava em público. Momentos de eloquentes prazeres que contrastavam com ensejos de stress absolutos.

A Guiné não era apenas palco de guerra. De tiros; minas; emboscadas; ou de ataques aos quartéis. Na minha opinião existiam razões paralelas ao conflito que nos conduziam, entretanto, a pequenos espaços de prazer.

Hoje, numa apelação à minha memória já devassada pelo tempo, verifico que nas “Minhas Memórias de Gabu” lá está um cantinho reservado para aqueles limitados ciclos pontuais em que os meus vastos cabelos no coro cabeludo, pretos como uma amora e sobejamente fartos, desalinhados pelo vento, me incutiam no espírito prazeres inesquecíveis. Ah, como o tempo passa!

Aquela motinha deixou-me saudades.

Um abraço camaradas, 
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 



Guiné 63/74 - P14363: Convívios (657): XXXII Encontro do pessoal da CCAÇ 2317, dia 30 de Maio de 2015, no Restaurante Choupal dos Melros - Quinta dos Choupos - Fânzeres - Gondomar (Joaquim Gomes Soares)

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Gomes Soares (ex-1.º Cabo da CCAÇ 2317/BCAÇ 2835, Gandembel / Ponte Balana, 1968/70), com data de 12 de Março de 2015:

Amigo Vinhal
Conforme a nossa conversa aqui envio a ementa e o texto para comunicar aos meus companheiros o nosso almoço de convívio a 30 de Maio.

Joaquim Soares



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Nota do editor

Último poste da série de 12 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14352: Convívios (656): IX Encontro dos Combatentes do Ultramar do Concelho de Matosinhos, levado a efeito no passado dia 7 de Março de 2015, em Leça da Palmeira (Carlos Vinhal)

Guiné 63/74 - P14362: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (2): Viagem até Mansambo

1. Em mensagem do dia 10 de Março de 2015 o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art da CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) enviou-nos a sua segunda recordação da CART 2520:


Recordações da CART 2520

2 - Viagem até Mansambo

Caro amigo Luís Graça
Ao terceiro dia de estadia no Xime, seguiu o meu 3.º Pelotão da CART 2520 com destino a Mansambo, com uma paragem em Bambadinca.
Foi uma jornada feita com muitos receios, pois era a primeira vez que saíamos do arame farpado e com poucos dias de Guiné. Tudo nos parecia muito estranho, até o facto de um alferes correr atrás das bajudas, quando parávamos nas tabancas que fomos encontrando pelo caminho. Mas o que mais me marcou foram algumas crateras que foram surgindo ao longo da picada, supostamente provocadas pelos rebentamentos de algumas minas e até chegámos a ver pedaços de camuflados pendurados nalgumas árvores.

De vez em quando descíamos das viaturas e fazíamos determinados percursos a pé. As matas eram muito cerradas, às vezes ouvíamos "ladrar", mas a tropa de Mansambo dizia:
- Tenham calma, são apenas macacos.

Chegados ao nosso destino e para minha grande alegria, encontrei à entrada do aquartelamento, o furriel Afonso, de Armas Pesadas e que tinha sido meu camarada, como Cabo Miliciano, no RAL 4 em Leiria.

Em Mansambo permanecemos cerca de três semanas, tivemos um treino operacional tranquilo, com uma ou duas idas a Bambadinca, nas quais eu não participei, curtas saídas ao mato e algumas idas a uma fonte para abastecimento de água.
Nesta fonte a Companhia aí sediada teve graves problemas.

Deste quartel, lembro-me apenas do nome de um furriel, que era Rei, além do Afonso que já era meu conhecido. Recordo-me do furriel enfermeiro que me tratou dos pés, pois ao fim de 10 ou 12 dias, estavam cheios de micose, talvez por descuido meu. A partir daí aceitei os seus conselhos, pois estar em África não é o mesmo que estar na Europa.

Findo este tempo voltámos ao Xime, não sem antes fazermos nova passagem e pernoita em Bambadinca e se a memória não me falha, foi na noite seguinte que fomos pela primeira vez fazer segurança à ponte sobre o rio Udunduma, que o IN tinha dinamitado havia pouco tempo.

Acontece que os "turras" a partir da zona dos Nhabijões, atacaram Bambadinca e nós sem termos a mínima ideia do sítio onde estávamos, atirámos na direcção dos clarões, duas ou três morteiradas, contribuindo assim para a retirada do IN. Se tivéssemos já alguma experiência, podíamos ter feito "ronco".
No dia seguinte apareceu o oficial de operações de Bambadinca para saber o que se tinha passado. Mandou chamar o Cabo Cordeiro, operador do morteiro 60 e deu-lhe os parabéns.

Foto 1 - Sou o primeiro da direita, a seguir é o furriel Afonso dos Obuses. O que está sentado é o furriel enfermeiro. Dos dois alferes e que estão de pé, não me lembro do nome. 

Foto 2 - O primeiro da direita é o furriel Rei, o terceiro é o rapaz encarregado da messe. 

Com um grande abraço
José Nascimento
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Nota do editor

Vd. primeiro poste da série de 10 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14341: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (1): Os Cabos também faziam Planos de Operações

Guiné 63/74 - P14361: Memórias da CCAÇ 1546 (Domingos Gonçalves) (9) - Reportagens da Época (1967): Golpe de mão à casa de mato de Mampatás

1. Mensagem do nosso camarada Domingos Gonçalves, (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68) com data de 10 de Março de 2015:

Braga,10/03/2015
Prezado Luís Graça:
Votos de boa saúde.
Depois, tomo a liberdade de enviar mais um pequeno têxto, que poderá ser publicado.

Um abraço amigo do
Domingos Gonçalves


MEMÓRIAS DA CCAÇ 1546 (1967)   
REPORTAGENS DA ÉPOCA

9 - Golpe de mão à casa de mato de Mampatás

Binta, 13/03/1967

De tarde, por volta das quatro horas, partiu rumo a Guidage uma coluna de viaturas, transportando dois grupos de combate da minha Companhia, sendo um, o meu, a milícia de Binta, e os “Roncos” de Farim. Lentamente, sob um sol maldito, envoltas em nuvens de pó, as viaturas levaram-nos até cerca de dois quilómetros de Guidage. Aí, na margem da estrada, ficámos à espera que a noite chegasse, enquanto as viaturas, escoltadas por um pelotão de morteiros, regressavam a Farim.
A população de Guidage não podia saber, antes do anoitecer, da nossa passagem pela localidade. Quando anoiteceu iniciámos, a pé, a marcha para Guidage.

No destacamento, comeu-se alguma coisa, planeou-se a operação, interrogou-se o guia e, pouco depois das 23 horas, iniciou-se a marcha para o objectivo, constituído pela casa de mato de Mampatás, situada a sul de Jeribâ, dentro do nosso território, a cerca de 200 metros da fronteira com o Senegal.

Dia 14

A marcha para o objectivo fez-se sem problemas, sempre pelo território senegalês,

Cerca das cinco horas e meia, a vanguarda da nossa força atingiu o objectivo. Abriu-se violento fogo sobre o mesmo e queimou-se tudo quanto havia para queimar. Capturaram-se três armas, entre as quais uma FBP portuguesa, bastantes munições, granadas de mão, fardas, livros de instrução do PAIGC, etc.
Estou convencido de que não se destruiu Mampatás, mas apenas uma pequena parte do acampamento inimigo, na periferia do mesmo.

Houve mortos confirmados, sem contar com duas mulheres, que terão morrido queimadas.
Por certo que havia lá, também, crianças (?) inocentes, que não têm nada a ver com isto, e que terão morrido queimadas.
É complicado, e difícil viver no meio desta guerra, onde muitas vezes a guerrilha se mistura com a população, ou se confunde com ela.

A retirada do local iniciou-se no meio de alguma confusão, como acontece quase sempre nestas situações.

A cerca de 500 metros esperava-nos uma emboscada dos gajos, que entretanto se tinham reorganizado. Eles fizeram algumas rajadas de armas ligeiras sobre a nossa força, mas sem consequências graves.

Quando já estávamos a uma distância razoável do objectivo, ele começou a ser bombardeado pela artilharia, a partir de Bigene. No ataque sofremos dois feridos, entre os quais o guia, um prisioneiro, que levou um tiro nas costas, e um Cabo da Companhia 1546.

O regresso a Guidage fez-se, também, por território do Senegal.

Pelas onze horas atingimos Guidage, onde se deslocaram dois helicópteros, para transportar os feridos para Bissau.

Depois iniciou-se a viagem de regresso a Binta.

Pelas oito horas da noite a artilharia de Bigene começou a bombardear a área de Sambuiá.

À noite, os furriéis, e bastantes soldados, andaram pelos domínios de Baco. Foi uma noite de bebedeiras. No fim de uma operação como a de hoje, talvez não haja nada melhor do que uma bebedeira para retemperar as forças, e esquecer o que se viu, e o que se ajudou a fazer. Directamente, os homens da Companhia até não fizeram nada de especial.
O grupo de assalto era, como quase sempre, constituído por tropa nativa. Eles são duros, aguerridos e destemidos. Mas, às vezes, também são demasiado selvagens.
Eles actuam sob as nossas ordens. Cumprem os objectivos que lhes traçamos. Vão onde os mandamos. E quando se chega a um local como o de Mampatás, ou qualquer outro do género, apenas há duas hipóteses: ou se incendeia, se mata, e se foge, ou se cai, e se fica no local, na trajectória dos tiros que o inimigo dispara, ou de qualquer estilhaço de granada, que o acaso faça explodir perto de nós.
Mas, os comandos nativos também são motivados, muitas vezes, pela ideia de saque.

Eles transportam com eles tudo quanto conseguem apanhar. O interesse nos bens abandonados pelos guerrilheiros mortos, ou em fuga, não deixa de ser para eles, e quase sempre, uma forte motivação.
Trata-se, geralmente, de despojos de guerra sem grande interesse material, pelo menos para nós, europeus. Mas para esta gente, habituada a um nível de vida muito baixo, sem padrões de consumo mínimos, as coisas mais insignificantes revestem-se de importância significativa.
Apressadamente, no fim do assalto aos acampamentos, ou bases terroristas, eles passam revista ao campo de batalha e transportam tudo o que podem.
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Nota do editor

Último poste da série de 10 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14239: Memórias da CCAÇ 1546 (1967) - Reportagens da Época (Domingos Gonçalves) (8): Guidaje 1967 - 10 de Fevereiro, ataque a Guidaje

Guiné 63/74 - P14360: Parabéns a você (874): Leopoldo Correia, ex-Fur Mil Art da CART 564 (Guiné, 1963/65)

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Nota do editor

Último poste da série de 12 de Março de 2015 > Guiné 63/74 - P14350: Parabéns a você (873): Manuel Luís R. Sousa, Sargento Ajudante Ref, ex-Soldado At Inf do BCAÇ 4512 (Guiné, 1972/74)

sexta-feira, 13 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14359: Notas de leitura (691): “As Mulheres e a Guerra Colonial”, por Sofia Branco, A Esfera dos Livros, 2015 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 11 de Março de 2015:

Queridos amigos,
Os elogios são merecidos, é uma reportagem em grande ecrã, relevam-se os principais tipos de protagonistas, nada nem ninguém fica descriminado nestas mulheres que têm pano de fundo histórico, valores, princípios e afetos.
Há casos visados que conhecemos bem, outros não tanto. Mulheres marcadas pela educação, pelo quadro ideológico, pela extrema dedicação, do princípio ao fim, e muitas delas ainda hoje vivem em estado de guerra, assediadas pelo fantasma do stresse pós-traumático.
E, obviamente, vistos no espelho, estamos todos lá, em todas as fases da guerra. Não sei o que são livros indispensáveis, mas este é verdadeiramente indispensável na marcha dos corações e dos agradecimentos pela ternura recebida ou vivida.

Um abraço do
Mário


As Mulheres e a Guerra Colonial, por Sofia Branco

Beja Santos

Tanto quanto me é dado saber, é a mais longa e detalhada viagem ao comportamento das mulheres durante a guerra, degrau a degrau, e numa rotação prismática onde vemos apoiantes entusiásticas, mães, mulheres e namoradas resignadas que esperam vestidas de preto os seu entes queridos, mulheres de oposição, mulheres que acompanham militares, enfermeiras paraquedistas, em “As Mulheres e a Guerra Colonial”, por Sofia Branco, A Esfera dos Livros, 2015, estão inúmeras formas de representar, de pontuar, valores, sentimentos, até o próprio termómetro com que se media o entusiasmo e depois o desfalecimento, na hora do regresso com a descolonização.

Veja-se o Traje do Ultramar em Glória do Ribatejo: “Quando os homens partem para a tropa, mães, mulheres ou namoradas passam a vestir roupa mais escura, enquanto pagam promessas a Nossa Senhora da Glória, que segue para as províncias ultramarinas em formato de postal para guardar na algibeira da farda militar. Isenta de serviço militar até à segunda metade do século XIX, Glória do Ribatejo adota um conjunto de rituais relacionados com a guerra. Os rapazes estreiam fato na inspeção militar, levam lenços oferecidos pelas namoradas, seguem cantando e tocando concertina, na camioneta, até Salvaterra de Magos. As glorianas preparam os comes com que vão recebê-los na volta”.

Temos aqui o MNF – Movimento Nacional Feminino em corpo inteiro, com ideologia e também sentida dádiva, exemplos de abnegação não faltavam.

Há as mulheres que abraçaram a clandestinidade e que protestam contra a guerra colonial e as que partem para o exílio com os seus companheiros, permanecerão em Paris, Londres, Lovaina, Lund, entre tantos outros destinos. E há as mulheres que ficam em franca oposição, manifestando-se no catolicismo de vanguarda, como Conceição Moita. As mulheres dos militares sempre com o credo na boca, os maridos partem para missão e às vezes não haverá regresso. Há até aquelas, como Dulcinea que acompanham o marido em Bissorã, experimentou uma flagelação brutal. Em Junho de 74 ela regressa a Lisboa, Henrique regressa a Bissorã mais um mês, despedida dolorosa: “Despede-se à pressa, com tristeza, de Inhatna Biofa, o rapaz órfão da guerra, de origem Balanta, que o acompanhara sempre, para todo o lado. Começara por trabalhar para a tropa em troca de comida, mas era tão especial que Henrique tomara-o por seu mainato. Acompanhava-o para todo o lado e era tratado como membro de família.
Henrique deixa-lhe o relógio Citizen, com cronómetro e de ponteiros brilhantes que se iluminam de noite”.

Há a história de Deonilde e Manuel Joaquim, dois anos de separação, ele regressa em 1967 e traz um órfão de guerra: “Quando o paquete Uíge chega ao Cais da Rocha do Conde de Óbidos, o menino vem fardado, segurando uma bandeira nacional”. A mãe de Manuel Joaquim embevece-se com a criança e apresenta às vizinhas a prenda que o seu Manel lhe trouxera da Guiné. Manuel e Deonilde casam e o menino será educado por a família, terá duas irmãs brancas. O menino, de nome Adilan, voltou à Guiné em 1978. Ficou desiludido, era já um “africano com educação europeia”. E há Natércia e Fernando Salgueiro Maia. Em Maio de 1973, quando Salgueiro Maia está pronto para regressar à metrópole, tem que partir numa emergência, Guidage está cercada: “Natércia fica 18 dias sem notícias de Fernando. Há chegada, Fernando repara como Natércia envelhecera”.

Há as filhas dos militares de carreira, acompanhando a guerra do princípio ao fim. Há as mulheres que pressentem o desastre, caso da Manuela, mulher de Fernando José, aviador. O General Fernando Neto bate à porta da casa de Manuela em 7 de Março de 1974, ela está a ajudar a filha mais velha nos trabalhos da escola. O sexto sentido feminino dá-lhe para perceber tudo, o General abraça-a e comunica que Fernando José fora abatido por um tiro direto, durante uma operação em Tenente Valadim, na província do Niassa.

Para muitas mulheres, a guerra não acabou com a descolonização, ficam os feridos, os deficientes e há o stresse pós-traumático, Sofia Branco é bem-sucedida a percorrer todas as tonalidades da palheta, ao sintetizar contextos históricos, usou de extrema correção não descriminando quaisquer protagonistas, as madrinhas de guerra, as que trataram deles quando voltaram, mutilados e traumatizados. E a autora tem razão quando nos diz: “Cada uma à sua maneira, as protagonistas deste livro foram pioneiras, desbravando caminhos outrora vedados às mulheres. Mães, irmãs, filhas, amantes, companheiras, amigas, muitas mulheres viveram a guerra colonial como se também elas tivessem sido mobilizadas. Depois da guerra, também para elas nada foi como dantes”.
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Nota do editor

Último poste da série de 10 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14343: Notas de leitura (690): "Neste mar é sempre inverno", romance de Tibério Paradela (edição de autor, 2014) (Parte I): a epopeia da pesca do bacalhau à linha, em plena guerra colonial (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P14358: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (23): precisam-se imagens de motorizadas de 50 cc , made in Portugal (Alma, Pachancho, Vilar Cucciolo, Famel, Macal, Sachs e Casal), ou nas ex-colónias (como a Fabimotor e a Ulisses, ambas angolanas)... Para edição de livro dos CTT.


Guiné > Região do Oio > Bissorã > CCS/BCAÇ 2861 (Bula e Bissorã, 1969/70) >Guiné > O furriel miliciano João Rebola na motorizada Honda, 50 cc, que comprou em Bissau, por seis contos (um pouxco mais do que o vencimento mensal de um furriel no CTIG). O João Rebola acompanhava, à viola, o nosso fadista Armando Pires. Tornaram-se grandes amigos e tudo começou por causa desta motorizada...(*)

Foto (e legenda): © Armando Pires (2014) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Mensagem, de 10 do corrente,  de Maria Manuel Sousa

Bom dia Luís Graça

Estou a trabalhar num livro, desta vez sobre motorizadas portuguesas de 50 cc, e encontrei esta foto no seu blog. Achei muito interessante porque mostra um soldado e é tirada na Guiné, ex-colónia nossa à época… Acha que seria possível ceder esta imagem, com maior resolução, para a nossa publicação, com a devida autorização do dono e /ou do soldado representado na foto?

Agradecendo desde já a sua colaboração, apresento os meus cumprimentos,

Maria Manuel Alves Sousa
CTT Correios de Portugal
Filatelia/Conceito e Design
Philatelic Unit/Design Dept.
Av. D. João II - Lt. 01.12.03, 1.º
1999-001 LISBOA
Telef.: +351 210470578

2. Em mensagem de ontem, a Maria Manuel Alves Sousa, a meu pedido,  explicitou melhor o que pretendia:

O livro chamar-se-á Motorizadas Portuguesas de 50 cc. A edição é dos CTT.

O fabrico destas motorizadas em Portugal (Alma, Pachancho, Vilar Cucciolo, Famel, Macal, Sachs e Casal, e outras marcas fabricadas nas ex-colónias, como a Fabimotor e a Ulisses, ambas angolanas) começa no início dos anos 1950, e vai até cerca de finais de 1990.

Maria Manuel Sousa



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS/BART 1913 (1967/69) > Álbum fotográfico do nosso saudoso Vitor Condeço  (1943-2010) > Catió - Quartel > Foto nº 21: "Na arrecadação antiga de material de guerra, o 1º Cabo Camarinha e o Fur Mil Victor Condeço [sentado]. A motorizada que se vê não era material de guerra, foi comprada avariada ao electricista da central civil,  sr.Jerónimo,  por 250 pesos, foi reparada e ainda serviu para dar umas voltas". (**)

Foto (e legenda): © Vítor Condeço (2006) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados




Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > CCAÇ 18 (1970/72) > O 1º cabo Ieró Embaló, prémio Governador da Guiné em 1972, com a sua motorizada. (***)

Foto (e legenda): © Rui Alexandrino Ferreira (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados



Guiné > Região de Cacheu > Cacheu > Destacamento de Fuzileiros Especiais, DFE 21 (Cacheu e Bolama, 1973/74) > O Ten Fuzileiro Especial, Zeca Macedo, com a sua bela moto, no cais da vila de Cacheu... (****)

Foto: © Zeca Macedo (2013). Todos os direitos reservados.


3. Depois de a pôr em contacto com o João Rebola e o Armando Pires, mandei a seguinte informação à Maria Manuel Alves Sousa:

Mas havia mais motorizadas na Guiné no tempo da guerra colonial... Use a funcionalidade "Pesquisar neste blogue" (coluna do lado esquerdo) e escreva "motorizada"... Podem é ser "japonesas"... O régulo de Badora, em Bambadinca, no meu tempo (1969/71) tinha uma, de 50 cc, oferecida pelo Spínola ou pelo Schulz (, não posso precisar; era um homem poderoso, foi fuzilado depois da independência)... Temos mais imagens)... É procurar... Boa pesquisa... 

De qualquer modo, vamos dar uma ajuda, pedindo à malta do blogue para colaborar. Haverá, por certo, fotos de motorizadas portuguesas da época, nos nossos álbuns fotográficos. Tudo o que é português merece o nosso carinho, ternura, cuidado... E para mais tratando-se de gente como nós, ex-.combatentes da Guiné que somos uma espécie em vias de extinção... (*****)



4. Mensagem de ontem enviada pela Maria Manuel ao João Rebola (que , entretanto, tem novo endereço de email):

Não consigo perceber a marca da motorizada. Será uma Honda? É que se for, não dá porque não é de fabrico nacional….

É tão complicado arranjar imagens assim da época. Esta era mesmo uma maravilha duma foto! Se se lembrar de alguém que tenha tido uma motorizada de fabrico nacional, e que possa ter fotografias…

Espero não estar a perturbar demasiado com o meu pedido.

Com os meus cumprimentos,

Maria Manuel

____________________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:


(...) A modos que a conversa terminava ali, posto que fomos almoçar à D. Maria, mulher do Sr. Maximiano, dois cabo-verdianos que recebiam uma subvenção da companhia para nos dar de comer.

Saímos de casa, e, quando íamos a atravessar a rua, quase fui abalroado por um gajo em grande velocidade numa motorizada que fez duas “chicuelinas” para me evitar, seguindo em frente sem dizer água vai nem água vem.

– Que é isto, ó Filipe?

Com um largo sorriso na cara, responde-me ele, “é pá, é o maluco do Rebola, furriel da 2444”.

Apresentado assim pelo Filipe, a espantação passou-me e pensei para com os meus botões:
– Queres ver que já estou com a minha gente? (...)



27 de março de  2014 > Guiné 63/74 - P12905: Furriel Enfermeiro, ribatejano e fadista (Armando Pires) (13): O fadista regressa ao palco


(...) Pois deu-se o caso que num certo fim de tarde, indo eu de 7 [ Quartos de sargentos da CCS e bar] para 12 [Armazém de armamentos, enfermaria da CCS e Oficinas auto]  passei em 10 10 [ Bar de sargentos da CCAÇ 2444, depois da CCAÇ 13]  ouvi uma viola a tocar.

Poupando-lhes a maçada de revisitarem a legenda, quero eu dizer que tendo saído do meu quarto para ir à enfermaria ver como marchavam as coisas, passei à porta do bar de sargentos da 2444 de cujo interior saiam uns acordes de viola, que por acaso até me soarem bem ao ouvido.
– Pode-se entrar, camaradas?

Entrei, apresentámo-nos, sai um Johnnie Walker com duas pedras de gelo a selar o momento, e dei comigo a pensar que o gajo da viola era o mesmo que, no dia da minha chegada, me ia “atropelando” com a mota.
– Ouve lá, pá, tu não és o João Rebola?

Claro que era ele, sim senhor, contei-lhe que tinha sido o Filipe a dizer-me quem ele era, que isso se passara logo no dia da minha chegada, quando, à saída dos quartos de sargentos da CCS, ele, João Rebola, que vinha de mota, desenhara uma perfeita “chicuelina” para evitar atropelar-me (P12023).

Gargalhada geral, venha de lá esse abraço, “agora tenho de ir lá acima à enfermaria ver como estão as coisas, mas hei de vir aqui mais vezes que talvez ainda façamos umas fadistices".

Lá na enfermaria estava tudo bem, o que nem era de estranhar dada a qualidade do pessoal da minha equipa, saí para ir jantar “à D. Maria” e tropecei, de novo, no João Rebola.
– Queres boleia, pá?

Primeiro: a D. Maria e o marido, o senhor Maximiano, um velho casal de cabo-verdianos, tinham um restaurante que era subvencionado pelo exército para funcionar como messe de sargentos. Segundo: o Rebola vinha a sair do quarto de sargentos da 2444, que era ali quase paredes meias com a minha enfermaria, e indo jantar à messe, tal como eu ia, convidou-me a fazer “a viagem” na sua motorizada.
– Tens medo de andar nisto, pá?
– Só não sei andar, mas medo de andar não tenho.
– Ó pá, mas se quiseres aprender eu ensino-te já. Isto é o mesmo que andar de bicicleta.

E foi assim que o João Rebola, antes de ser meu viola privativo, se transformou no meu instrutor de motorizada.(...)


(**) Vd. poste de 9 de junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6563: Banco do Afecto contra a Solidão (11): Vamos telefonar ao Victor Condeço (que vive no Entroncamento)



(*****) ÚLtimo poste da série > 11 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14349: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (22): Procura-se letra e/ou registo sonoro de "Djiu di Galinha" [Ilha das Galinhas], canção de José Carlos Schwarz, imortalizada por ele e por Miriam Makeba, a 'Mama Africa' (Helena Pinto Janeiro, investigadora, FCSH / Universidade NOVA de Lisboa)

Guiné 63/74 – P14357: Divagações de reformado (Pacífico dos Reis) (7): Vivo num país que não me faz chorar, faz-me enraivecer

1. Em mensagem do dia 8 de Março de 2015, o nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), envia-nos mais uma Divagação de um Reformado, no caso o Cor Cav Ref Pacífico dos Reis, ex-Capitão Cav e Comandante da CCAÇ 5 entre 1968 e 1970:

Bom dia
Tive ontem noticias do "meu comandante" e nosso camarigo Pacifico dos Reis.
Junto o texto recebido, depois de complementado com fotos.

Bom Domingo para todos.
Zé Martins

Divagações de Reformado

7 - Vivo num país que não me faz chorar, faz-me enraivecer


Já estou na idade da “lágrima fácil“. Vivo no entanto num país que não me faz chorar, faz-me enraivecer. Li que 26% dos portugueses não ”mexeriam uma palha” se tivessem que defender o seu País. De quem é a culpa? Deles? Não! Dos muitos pseudo políticos que inculcaram nos jovens uma vida de facilitismo, das famílias que não souberam passar valores à nova geração, dos progenitores que pretendiam que os filhos não passassem as dificuldades que eles passaram.
Nas décadas de 60/70 muitos milhares defenderam o Portugal de então. Nessa altura o nosso Portugal estava espalhado por três continentes. Íamos para o Ultramar com Portugal no Coração. Agora os políticos pavoneiam-se com Portugal na lapela.
Morria-se a defender o País. Neste momento a gente séria morre de vergonha com a catadupa de escândalos de corrupção, lavagens de dinheiro, subserviência ao poder estrangeiro, etc., etc.
À, Eça tanto material que terias agora para as tuas escritas.

Secção de Comando Dragão 
© Foto: José Martins

Por isso prefiro relembrar as saudades que tenho da Guiné e dos tempos que passei em Canjadude, a comandar homens com H grande, guinéus mas portugueses completos, que tinham Portugal no Coração. Sofremos, mas todos em conjunto. Combatemos lado a lado. Sentimos a dor dos feridos (felizmente nunca tivemos mortos debaixo do meu comando) que caíram ao nosso lado.

Prefiro recordar as bolanhas, os espaços livres, a vida simples da população, todo um conjunto de pequenas coisas que sociedade europeia já esqueceu preferindo viver sem valores, formatada pelos grandes banqueiros, secundados pelos políticos corruptos e por um sistema que prepara todo um envolvimento para facilitar a vida a uma corja de privilegiados.

Recordo que muitas vezes saí em operações somente com a secção de Comando (10 homens), todos africanos, sem qualquer problema. Porque eles eram e sentiam-se portugueses. Tinham algo para mostrar ao Mundo. Queriam ser portugueses para todo o sempre. Tinham valores que respeitavam. Muitos depois do 25/4 morreram por manterem esses ideais.

2.º Sargento Enfermeiro Cipriano Mendes Pereira, tombado em 16 de Novembro de 1970, durante um ataque a Nova Lamego 
© Foto: José Manuel Corceiro

Prefiro recordar com saudade o meu Sargento Enfermeiro, também guinéu, que me salvou a vida por duas vezes. A primeira quando adoeci com paludismo cerebral, que geralmente é fatal, mas que conseguiu debelar pelo seu enorme conhecimento das doenças tropicais e grande dedicação.
A segunda quando um dos militares da Companhia se etilizou e meteu na cabeça que queria matar o Comandante. Estava à espera na Parada que chegasse ao pé de mim. Era fundamental para a minha credibilidade na Unidade. Já tinha visto que a Madsen que ele trazia estava em segurança. Não havia perigo iminente. No entanto o sargento Cipriano com risco para si próprio injectou-lhe um calmante que o pôs a dormir.
Este homem bom, cidadão português, corajoso, foi morto em Nova Lamego conjuntamente com a família pelos “libertadores“, já depois de eu ter saído da Companhia

É isto que, já no final desta passagem por este mundo louco, pretendo recordar.
É por isso que nesta ”idade do condor“ esqueço as dores nas articulações e recordo com saudade as dores em todo o corpo ao fim de 4 a 5 dias de operações.
Recordo com saudade a “granada de 60“ vulgo garrafa de cerveja que me vinham trazer mal chegava. Nunca mais bebi uma cerveja tão gelada e tão boa. Recordo emocionado o dia em que retornei a Canjadude para desactivar um campo de minas e toda a Companhia me levou em ombros até ao meu antigo gabinete julgando que ia regressar ao Comando da Unidade. Foi difícil e pungente desenganá-los. E mais tarde, já no ”Puto“, tive o prazer de receber muitos daqueles portugueses africanos que removeram céus e terra para me encontrarem. Muitos com marcas do que sofreram às mãos dos “libertadores”, com histórias daqueles que fugiram e agora eram mercenários noutras terras, aqueles cujas famílias desapareceram, etc..

Tudo isto faz uma vida.
Tudo isto recordo com saudade.

Pacífico dos Reis
Gato Preto
“Faca de Mato “
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de agosto de 2010 > Guiné 63/74 – P6911: Divagações de reformado (Pacífico dos Reis) (6): TAP ou TAPioca…? (José Martins)

Guiné 63/74 - P14356: A minha mãe, Maria Eugénia da Conceição Vitorino Gaspar, a minha Padeira de Aljubarrota (Mário Vitorino Gaspar)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 3 de Março de 2015:

Caros Camaradas e Amigos
Nós temos bem de agradecer aos nossos pais: – e “Meu pai, meu velho, meu camarada".
Idêntico o procedimento para as “Nossas mães, verdadeiras padeiras de Aljubarrota”.
E como foi afirmado, e com pleno direito de não esquecer: - “… fotos do álbum de família que correm o risco de desaparecer com o tempo… Interessa-nos salvaguardar (e divulgar) aquelas que têm a ver com a juventude e a tropa dos nossos progenitores...
Sabemos das dificuldades que eles passaram nos anos 30/40, ensombrados pela tragédia da crise económica e social e pelas guerras que também nos tocaram, directa ou indirectamente (guerra civil de Espanha, II Guerra Mundial…)”.

Atrevo-me a enviar também um texto sobre “A Minha Mãe”, e não fico chateado, de modo nenhum, por não ser publicado.

Tenho a dizer-lhes que sinto enorme prazer em pertencer a uma Família de Amigos que possuem elos fortes com a Guiné. Fui, sou e continuarei a ser contrário a qualquer guerra, mesmo a que vem mascarada como de “Missão de Paz, Técnico-Militar no Estrangeiro” e outros termos para emoldurarem a guerra.
Sou contra, mas cumpri, não com Portugal, o Estado ou país, mas cumpri o que a consciência ordenou. Fui combatente, sou combatente e combato e jamais deixarei de o fazer.

A Amizade está em segundo lugar em toda a minha vida. Prezo e defendo os Amigos.
Mas tinha de ser: em primeiro lugar está a Família.

Gosto muito do Tejo e da minha bonita terra onde nasci: Sintra.

Um abraço a todos os Amigos da Tabanca Grande
Mário Vitorino Gaspar


A minha mãe, Maria Eugénia da Conceição Vitorino Gaspar


Para mim chama-se simplesmente MÃE – filha de José Vitorino e Rosa Vitorino, nasceu em A-do-Barriga, concelho de Arruda dos Vinhos, distrito de Lisboa.
A minha mãe teve mais dois filhos: o Ramiro Fernando e o José Alberto. A minha mãe foi, e é, o primeiro e grande amor da minha vida.

Tenho-a prisioneira dentro de mim, no meu coração, na minha mente, desde que os meus olhos se abriram para o mundo. Ali estava ela, sorrindo. Hoje continua a sorrir e sempre sorrirá.
Um sorriso da minha mãe, que supera em beleza o mais belo quadro pintado por um grande mestre da pintura, um artista, talvez uma rosa vermelha, que significa amor e paixão, luzindo suas coloridas cores irisada, ou ainda a papoila, com o significado de fragilidade, que parece de beleza efémera e mensagem, num vasto campo de trigo e um girassol, que dizem significar felicidade, e possuindo um ano de vida, que abre suas pétalas mui luzidias de manhã e fecha à tardinha.

Um sorriso da minha mãe que supera em beleza quem sabe se a dança aérea, como se de ballet se tratasse – num qualquer palco do mundo – de borboletas, que é um símbolo de ligeireza e de inconstância, de transformação e de um novo começo, voando livremente num dia de primavera. E o voo em liberdade das andorinhas, vestidas como viúvas, na primavera ou no verão em Portugal – e que passam o outono e o inverno em África – que simbolizam a boa sorte, a pureza e a fidelidade.

Um sorriso da minha mãe que supera em beleza as pombas brancas, que simbolizam a paz, que o mundo e principalmente o homem necessitam, esvoaçando pelo céu pintado pela natureza de um azul puro.

Mentalmente, beijei milhões de vezes a minha heroína, o meu grande primeiro amor – quando algum problema me surgia, ou surge, é ela que me ajuda – na realidade, beijei-a milhares de vezes. Senti e sinto o aroma dos seus beijos no meu rosto.

O amor que sentia pelos seus três filhos e seis netos, não igualava qualquer outro amor, consigo avaliá-lo quando recordo o nascimento dos meus sobrinhos, e principalmente do nascimento dos meus filhos, visto ter sido eu que dei a notícia dos acontecimentos. Senti a sua alegria.
Algo me intrigava, era o amor que sentia também pelos sete sobrinhos. Hoje entendo! Vivia em paz, pretendendo a paz para os seus entes queridos.

A minha mãe é simplesmente o amor – o primeiro e único verdadeiro e puro sentimento – que perdurará para toda a minha vida.
A minha mãe, foi e será, a minha padeira de Aljubarrota, e que já me perdoou pelas ocasiões em que a fiz chorar – embora não fosse essa a minha intenção – tanto de tristeza como de alegria.

Em ocasiões amargas da vida não brotava dos seus olhos uma lágrima, pretendendo assim não levar os outros a pensar ser dolorosa a situação.
Via-a chorar muitas vezes, mas fazia-o silenciosamente. Bebi, por vezes, as suas lágrimas
Foi o amor de mãe que me deu a força anímica para fazer frente à minha vida.

Na minha despedida dos meus pais, quando parti para a Guiné, não verteu uma lágrima. Meu pai, que nunca vira sinais de água salgada vertida dos olhos, chorou. A única vez que o vi chorar.

Nos seus olhos, na sua boca e nos seus gestos, encontrava o amor de mãe, um amor mais destemido que todos os amores, muito mais inflexível, um amor para durar para sempre.

Estive junto dela quando estava à porta da morte. Depois de ser sujeita a uma operação cirúrgica no Hospital de Vila Franca de Xira, teve alta e fui visitá-la. Preparei-lhe um banho, visto ela já não estar em condições de o fazer e, e enquanto a lavava ela disse:
– Filho, tantas vezes que te dei banho, e agora és tu que me dás banho!

Depois piorou, informaram-me que tinha sido internada e fui visitá-la. Quando entrei no Serviço de Urgência do Hospital não a reconheci entre os doentes, em qualquer cama na enfermaria. Vim mais tarde, ter passado por ela.
Perguntei à enfermeira onde se encontrava a minha mãe, tendo-me dado a informação. Descobria-a finalmente. Voltei para junto da sua cama. Sei que me reconheceu. Fiquei envergonhado, sentindo-me muito mal comigo.

Via-a, embora ficasse triste por verificar tão diferente se encontrava. Era a minha mãe e aproximei-me, após a enfermeira me ter feito sinal para ir junto do seu leito. Beijei-a na testa. Foi o único beijo que até à data dava na testa da minha mãe. Após a enfermeira me ter feito sinal para me afastar, dei-lhe outro beijo na testa. Num rosto desfigurado pela doença, nasce o sorriso da minha mãe. Ela não falou. Foi a despedida. Foi a despedida.
Foi a despedida.
Foi d derradeira vez que a beijei, ainda com vida. Não o esqueço!

Faleceu nesse mesmo dia. E não chorei. Nem sequer no velório, onde a beijei pela última vez. Acho que verti lágrimas interiormente.

Guardo o seu sorriso, segurei-o entre mãos e transporto comigo para sempre…

“Tudo aquilo que sou, ou pretendo ser, sou devedor ao devo-o ao anjo, minha mãe”.
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Guiné 63/74 - P14355: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXIX: Quando falhava o abastecimento, ainda havia o recurso à "bianda com marmelada"...


Beldade... de Canjambari [Fotógrafo desconhecido]


Canjambari... Um bar ou cantina onde podia faltar muita coisa, até o feijão mas não a cerveja... "estupidamente gelada", como na letra da célebre canção de Chico Buarque, de 1977 (*) [Fotógrafo desconhecido]


1. Continuação da publicação das "histórias da CCAÇ 2533", a partir do documento editado pelo ex-1º cabo quarteleiro, Joaquim Lessa, e impresso na Tipografia Lessa, na Maia (115 pp. + 30 pp, inumeradas, de fotografias). (**)

Hoje reproduz-se  mais dois textos deliciosos, da autoria do ex-alf mil Timóteo Rosa, do 4º pelotão : (i) o cardápio do rancho da CCAÇ 2533, planeado para o mês de jullho de 1969 (p, 94); e (ii) o "apicultor" da companhia, o srgt Félix (p. 97)...

Quem disse que a malta rapava fome no CTIG e não tinha sentido de humor ?... Por outro lado, nunca será de mais recordar, como facto digno de nota, que esta publicação é uma obra coletiva, feita com a participação de diversos ex-militares da CCAÇ 2533 (oficiais, sargentos e praças), num louvável esforço  de partilha de memórias comuns...

A brochura, com cerca de 6 dezenas de curtas histórias, de uma a duas páginas, e profusamente ilustrada (cerca de meia centena de fotos), chegou  às mãos dos nossos editores, em suporte digital, através do Luís Nascimento, que vive em Viseu, e que também nos facultou um exemplar em papel. para consulta. Até ao momento, e com muita pena nossa, ele é o único representante da CCAÇ 2533, na nossa Tabanca Grande, apesar dos convites, públicos, que temos feito aos autores cujas histórias vamos publicando.

Temos autorização dos responsáveis pela edição e pelos  autores para dar a conhecer, a um público mais vasto de amigos e camaradas da Guiné, as aventuras e as desventuras vividas pelo pessoal da CCAÇ 2533, companhia independente que esteve sediada em Canjambari e Farim, região do Oio, ao serviço do BCAÇ 2879, o batalhão dos Cobras (Farim, 1969/71). O primeiro excerto destas histórias foi publicado em 16 de abril de 2014, com um texto do ex-comandante da companhia, o cap inf Silvino R. Silva, hoje cor ref.


P. 94

p. 97

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Notas do editor:

(*) Feijoada completa 
Chico Buarque/1977
Para o filme Se segura malandro de Hugo Carvana

[Letra, reproduzida aqui, com a devida venia... da página oficial do cantor]


Mulher
Você vai gostar
Tô levando uns amigos pra conversar
Eles vão com uma fome que nem me contem
Eles vão com uma sede de anteontem
Salta cerveja estupidamente gelada prum batalhão
E vamos botar água no feijão

Mulher
Não vá se afobar
Não tem que pôr a mesa, nem dá lugar
Ponha os pratos no chão, e o chão tá posto
E prepare as linguiças pro tiragosto
Uca, açúcar, cumbuca de gelo, limão
E vamos botar água no feijão

Mulher
Você vai fritar
Um montão de torresmo pra acompanhar
Arroz branco, farofa e a malagueta
A laranja-bahia ou da seleta
Joga o paio, carne-seca, toucinho no caldeirão
E vamos botar água no feijão

Mulher
Depois de salgar
Faça um bom refogado, que é pra engrossar
Aproveite a gordura da frigideira
Pra melhor temperar a couve mineira
Diz que tá dura, pendura a fatura no nosso irmão
E vamos botar água no feijão


1977 © Marola Edições Musicais
Todos os direitos reservados. Copyright Internacional Assegurado. Impresso no Brasil


14 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13893: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXVI: O finório e o 1º sargento (José Luís Sousa, ex-fur mil, 1º pelotão)

6 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13854: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXV: (i) o final da comissão em Farim, com os últimos mortos e feridos na zona de Lamel;: (ii) humilhados e ofendidos: regressados á Pátria, somos obrigados a ir a Chaves, num comboio ronceiro, entregar meia dúzia de trapos desfeitos, os restos das nossas fardas ! (Agostinho Evangelista, 1º pelotão)

8 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13709: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXIV: o Artur, que arranjava sempre desculpas para se baldar... ao mato. Porque, afinal, na guerra e noutras situações-limite em que se arrisca a vida, "quem tem cu tem medo"... (Agostinho Evangelista, ex-sold inf, 1º pelotão)

24 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13642: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXIII: O quotidiano em Canjambari...(Agostinho Evangelista, 1º pelotão)

16 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13614: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXII: No T/T Niassa,, em 24/5/1969, a caminho do "desterro"... (Agostinho Evangelista, 1º pelotão)

28 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13542: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXI: Lembranças de Chaves (Agostinho Evangelista, 1º pelotão)

10 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13481: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XX: a festa dos meus 25 anos, em Farim (Carlos Simões, ex-fur mil op esp. 1º pelotão)

quinta-feira, 12 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14354: Meu pai, meu velho, meu camarada (42): 1.º Cabo Manuel de Assunção Peres (1912-1997), meu sogro, que fez tropa em Elvas... Um dia, quando teve uma curta licença para férias, foi a pé até Castro Verde (, o que em linha reta são mais de 200 km)... (José Colaço)

1. Mensagem do nosso camarada José Colaço (ex-Soldado TRMS da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65), com data de 4 de Março de 2015:

O meu pai, meu velho, na inspecção saiu-lhe a fita vermelha. Mas,  como os pais das nossas mulheres nossos pais são, apresento-lhes o meu sogro, meu camarada, pai da  mulher com a qual casei em 1973 e que tem tido a paciência de me aturar e desculpar desde essa data até aos dias presentes.

José Colaço



Manuel de Assunção Peres


2. Este nosso camarada Manuel de Assunção Peres, nasceu em 17 de Abril de 1912  e faleceu em 29 de Dezembro de 1997, vítima de cancro pulmonar, talvez devido ao tabaco pois era um fumador viciado desde os bancos da escola primária. Quando morreu, tinha uma memória perfeita tanto em matemática como em português, disciplinas que gostava e que dominava com alguma facilidade.

Fez a tropa no quartel de Elvas, tendo sido promovido a 1.º Cabo.

Histórias da sua vida militar não as registei em papel nem em memória, culpa minha porque ele falou várias vezes no assunto, mas uma que me chamou a atenção e que registei em parte, foi quando lhe foi concedido um curto período de férias.

Ele  mais um camarada do concelho de Odemira  deram corda aos cordões das botas e marcharam a pé,  de Elvas...  até Castro Verde [, são mais de 200 km em linha reta!].

Um abraço
Colaço
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14353: Meu pai, meu velho, meu camarada (41): Jorge Manuel Augusto da Silva, o "binte oito", era um orgulhoso sapador de assalto, da arma de engenharia... Fez a tropa em Tancos, em 1947, ainda chegou a jogar futebol e era amigo do histórico guarda-redes do Porto, o Barrigana (Henrique Cerqueira)

Postes anteriores (desde o nº 30 da série):

3 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14316: Meu pai, meu velho, meu camarada (40): Torcato Prudêncio da Silva (1915-1977) faria 100 anos no passado dia 28 de fevereiro...Na tropa (entre 1936/37 e 1943), foi da arma de artilharia, como o filho que o recorda hoje com muita saudade (Torcato Mendonça, ex-alf mil art, CART 2339, Mansambo, 1968/69)

4 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11803: Meu pai, meu velho meu camarada (39): Amadeu Simões Picado, ilhavense, 1º cabo quarteleiro, da arma de engenharia, integrou o corpo expedicionário português, em França, na I Guerra Mundial (1917/18), e emigrou depois para os EUA onde trabalhou quase sempre como pescador... Só o conheci aos 9 anos, em 1946... (Jorge Picado)

8 de abril de 2013 > Guiné 63/74 - P11358: Meu pai, meu velho, meu camarada (38): Evocando a figura de Luís Henriques (1920-2012) que há precisamente um ano se despedia da terra da alegria (Luís Graça / Pedro Martins)

19 de março de 2013 > Guiné 63/74 - P11275: Meu pai, meu velho, meu camarada (37): Memórias do Mindelo, São Vicente, Cabo Verde, no dia do pai...

11 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10924: Meu pai, meu velho, meu camarada (36): Fotos recentes do Mindelo, em memória do meu avô Luís Henriques (1920-2012) (João Graça)

13 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10793: Meu pai, meu velho, meu camarada (35b): José Baptista de Sousa (1904-1967), capitão médico-cirurgião, expedicionário, um 'anjo di céu', em São Vicente, fev 1942/ set 1944 - Parte II (Adriano Miranda Lima)

12 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10790: Meu pai, meu velho, meu camarada (35a): José Baptista de Sousa (1904-1967), capitão médico-cirurgião, expedicionário, um 'anjo di céu', em São Vicente, fev 1942/ set 1944 - Parte I (Adriano Miranda Lima)

23 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10712: Meu pai, meu velho, meu camarada (34): Tropas expedicionárias portuguesas, em São Vicente, Cabo Verde, 1941/45, mostram solidariedade com o povo sofrido da ilha (Adriano Miranda Lima, cor inf ref, Tomar; cortesia de Praia de Bote)

7 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10496 Meu pai, meu velho, meu camarada (33): Mais notícias das forças expedicionárias da ilha de São Vicente, Cabo Verde (1941/45) (Adriano Miranda Lima, cor inf ref)

Guiné 63/74 - P14353: Meu pai, meu velho, meu camarada (41): Jorge Manuel Augusto da Silva, o "binte oito", era um orgulhoso sapador de assalto, da arma de engenharia... Fez a tropa em Tancos, em 1947, ainda chegou a jogar futebol e era amigo do histórico guarda-redes do Porto, o Barrigana (Henrique Cerqueira)


Jorge Manuel Augusto da Silva, natural do Porto, fez a tropa em 1947... 
Era soldado sapador de assalto... e conhecido pelo "Binte Oito"


1. Mensagem do nosso amigo e camarada Henrique Cerqueira [ [ex-fur mil, 3.ª CCAÇ / BCAÇ 4610/72, Biambe e Bissorã, e CCAÇ 13, Bissorã, 1972/74; casado com a Maria Dulcinea (NI), também nossa grã-tabanqueira]


Data: 8 de março de 2015 às 11:32
Assunto: Meu pai,meu velho , meu camarada


Caro Camarada Luís Graça:

Há muito tempo, mais precisamente a partir da altura em que publicaste um dos primeiros postes sobre o tema " Meu pai, meu velho, meu camarada " (*),  que senti um grande carinho pelo tema. No entanto não ganhava coragem para escrever sobre o pai do qual passei quase toda a minha vida a ouvir as suas estórias de quando esteve na tropa (hoje são os nossos filhos e netos a ouvir as nossas).

Bom,  e vai daí, tu relanças novamente o tema e então lá fui procurar no meu "baú" das recordações e encontrei a caderneta militar do meu pai . E assim sendo vou tentar escrever algo que homenageie a memória do meu e de todos os nossos pais que são: "O Meu Pai , Meu Velho, Meu Camarada ". Espero não ser muito aborrecido mas vou escrever principalmente com o coração e amor pelo meu pai já retirado desta vida terrena.

Apresento o Meu pai, Jorge Manuel, que  foi Sapador de Assalto em Tancos [em 1947].

Sempre ouvi falar o meu pai e muitos dos seus amigos da altura que ele era um pouco irrascível na sua vida militar, mas sempre que era necessária aplicação da sua especialidade,  ele então tinha que ser o melhor. Era com muito orgulho que me contava a vitória obtida numa competição (???) entre vários países da NATO, numas provas militares . E como ele era Sapador de Assalto, orgulhava-se de ser bom a lidar com explosivos.

Uma outra estória muito engraçada (para mim,  claro) foi a sua narrativa de uma célebre "fuga" de que foi protagonista precisamente do interior do Castelo de Almourol. Segundo ele a tropa de Tancos na altura fazia serviço nesse famoso Castelo. Pelos vistos,  o meu pai era um "bom Casanova" e nem as muralhas de um Castelo o detinham quando havia "rabo de saia" nas redondezas.

Já agora o meu pai também foi um excelente jogador de futebol mas, que também acabou por ser irradiado dessa atividade por ter "acertado o passo" a um árbitro e a um polícia. Não pensem que o meu pai era um violento, era sim um rebelde e talvez em demasia para a época.

Estou aqui a pensar que tinha tanto, mas tanto para contar sobre o meu pai, mas não sai... não sai mesmo e por isso vou ficar por aqui e até vou pensar ainda se mando ou não este escrito para a malta ler.

Ah!,  é verdade,  o meu pai era conhecido na tropa pelo "Binte Oito" (28),  á moda do Porto,  já se vê. Era eu miúdo e conheci um famoso jogador da altura que era o saudoso Barrigana [, Frederico Barrigana, 1922-2007], penso que jogava no Salgueiros ou Porto. Estava ele junto do meu pai e só falavam da tropa e era então "Binte oito prá qui....binte oito prá acolá"....

Meu Pai, Meu Amigo, Meu Camarada,  que saudades tenho de ti. Dá um beijo à Mãe e aguarda por mim.

Um grande abraço a todos os Pais, Amigos e Camaradas da nossa Tabanca Grande.
Henrique Cerqueira

PS  - Envio em anexo algumas imagens possíveis da Caderneta militar do meu pai, achei particular graça às páginas descritivas do material  recebido para uso pessoal.












Folhas da caderneta militar de Jorge Manuel Augusto da Silva, pai do nosso camarada Henrique Cerqueira


Fotos : © Henrique Cerqueira (2015). Todos os direitos reservados.