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quarta-feira, 9 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P26998: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (2): José Henriques Mateus (1944-1966), sold at inf, CCAV 1484 (Catió, 1964/1966) - II (e última) Parte: testemunhos de camaradas


 Lourinhã > Areia Branca > 11 de maio de 2014 > A terra homenageou o seu herói, o  José Henriques Mateus (1944-1966).  Painel de azulejos, pintado à mão, e que faz parte do monumento, inaugurado no centro da povoação. Na parte superior do painel, ao centro está desenhado e pintado o guião da CCAV 1484, a que pertencia o Mateus.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


José Henriques Mateus (1944-1966), sold at inf, CCAV 1484 (Catió, 1964/66)



Guiné > Região de Tombali (?) > Catió (?) > s/l> s/d> CCAV 1484 (1483,  Nhacra e Catió, 1964/66)> O José Henriques Mateus. Foto gentilmente cedido pelo irmão mais novo, Abel Mateus, ao Jaime Bonifácio Marques da Silva.  O Zé Henriques era o "sustento da família" , o mais velho, o braço direito da mãe, viúva.

Foto (e legenda): © Jaime Silva (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  Continuamos a reproduzir, com a devida vénia,  alguns excertos  do livro recente  do Jaime Bonifácio Marques da Silva, "Não esquecemos os jovens militares do concelho da Lourinhã mortos na guerra colonial" (Lourinhã: Câmara Municipal de Lourinhã, 2025, 235 pp., ISBN: 978-989-95787-9-1), pp. 173/178. 


II (e última) parte  relativa às circunstâncias em que morreu, no CTIG, o lourinhanense José Henriques Mateus, o segundo em termos cronológicos, depois do José António Canoa Nogueira (*)

(...) Certidão de óbito

No seu livro, o Jaime Silva transcreveu integralmente o teor da certidão de óbito nº 594/967,  passada em janeiro de 1967,  pela Conservatória do Registo Civil da Comarca de Bissau, onde consta “morte em combate”, apesar do corpo do militar nunca ter aparecido, o que se justifica pelo facto de ser necessário para a família poder receber a pensão de preço de sangue.

Neste postes, limitamo-nos a reproduzir um excerto da parte final dessa certidão:

(...) "A declaração de óbito foi feita de conformidade com o ofício número sessenta e quatro/ sessenta e sete, processo número sete/sessenta e sete do Tribunal Judicial da Comarca da Guiné que acompanhou a certidão de sentença proferida pelo Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz, em Bissau, digo em vinte e três de janeiro de mil novecentos e sessenta e sete. 

"Depois deste registo ser lido e conferido com o seu extrato vai ser assinado por mim, Carlos Dinis de Figueiredo Júnior, conservador do Registo Civil. Conservatória do Registo Civil da Comarca da Guiné em Bissau, aos trinta dias do mês de janeiro de mil novecentos e sessenta e sete. "(...)



5. NOTAS À MARGEM DO PROCESSO: testemunhos

Testemunhos de camaradas que conviveram com José Henriques Mateus:

1º Testemunho: 

Transcrevo o que Benito Neves (2007) [1] relatou sobre o acidente ao Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné. O texto foi extraído da história da Companhia, da qual foi encarregue de escrever. Realça:


“Relatório da Operação Pirilampo - 10 de setembro de 1966:

 “Esta operação foi realizada pelas CCAV 1484, reforçada com 1 Gr Comb Pel  Mil 13 e CCAÇ 763, com a finalidade de bater a mata de Cabolol de modo a detetar e a destruir o acampamento IN localizado em (1510.1120.A2).

 Foi efetuada uma minuciosa batida à mata de Cabolol no sentido E-W. Pelas 14h30, não obstante as dificuldades que surgiram pela densidade da vegetação, foi detetado o acampamento IN em (1510.1120A3.15), composto por 16 casas, que foi destruído com fraca resistência do IN.

 Foram capturados documentos diversos e munições para espingarda Mauser. O IN, que deveria ter detetado as NT, havia evacuado grande parte do seu material para fora do acampamento.

Em continuação da ação, as NT seguiram em direção a Cabolol Balanta. Quando queimavam o seu primeiro núcleo de casas mais a sul, o IN, instalado na orla da mata, reagiu em força com fogo de morteiro, lança granadas-foguetes, metralhadora pesada, pistolas metralhadora e espingardas, causando 6 feridos ligeiros às NT. Após reação destas, o IN furtou-se ao contacto, sendo ainda queimados mais 3 núcleos de casas.

Pelas 17h00 as NT iniciaram o regresso, tendo sido flageladas com fogo de morteiro.

Quando as NT atravessavam o rio Tompar [afluente do Rio Cumbijã, a sudoeste de Bedanda], afogou-se o soldado nº 711/65, José Henriques Mateus, da CCAV 1484, não tendo sido possível recuperar o seu corpo, apesar de todas as buscas efetuadas. 

Pelas 22h30 as NT chegaram ao aquartelamento de Cufar, depois de uma marcha fatigante em terreno pantanoso. O que acima se transcreve é o que consta do relatório da operação, extraído da história da Companhia, de que fui encarregue de escrever.”

2º Testemunho: 

O José Francisco Couto, soldado nº 699/65 – SPM 3008, natural da freguesia da Roliça (Baracais), concelho do Bombarral, foi camarada de pelotão do Mateus e seu amigo. Participou com ele na Op Pirilampo, assistindo ao desaparecimento do Mateus quando ambos atravessavam o rio Tompar.

Durante a consulta ao espólio do Mateus, juntamente com o seu irmão, encontrei entre a sua correspondência dois aerogramas enviados à mãe do Mateus pelo soldado Couto. Neles, ele lamentava as circunstâncias da morte do filho e afirmava que a iria visitar logo que regressasse da Guiné, uma vez que eram naturais de concelhos vizinhos.

Transcrevo, ainda, parte do segundo aerograma, endereçado à mãe do Mateus, em 08.11.1966, a parte do texto em que lamenta a tragédia que roubou a vida ao amigo, como repete as circunstâncias do acidente:

 “Prezada Senhora: É com os olhos rasos de lágrimas que novamente me encontro a escrever-lhe sendo ao mesmo tempo a desejar-lhe uma feliz saúde a si e aos seus filhos que eu cá vou indo na graça de Deus. 

Sei senhora Rosa que ao receber esta minha notícia mais se recorda da tragédia que lhe roubou o seu querido filho, pois é com mágoas no coração que lhe respondo a tudo quanto me pergunta e peço a Deus que não a vá magoar mais com tudo o que lhe possa dizer. Pois compreendo que além da minha dor ser enorme a sua não tem palavras, pois o destino foi traiçoeiro. 

Sim (…), a Senhora pede-me que lhe explique como tudo se passou. Pois sou a dizer-lhe tudo o que sei. Foi uma das saídas que nós tivemos, durante o dia tudo se passou da melhor maneira na graça de Deus e nós nos sentíamos satisfeitos, mas no regresso tivemos que atravessar um rio e a corrente era enorme, como enorme era o peso que trazíamos, e que ele ao passar a corda se partiu e foi quando ele foi parar ao fundo sem mais ninguém o ver. Pois quatro camaradas nossos, mal pressentiram o que se estava a passar, atiram-se à água e mergulharam ao fundo para ver se o encontravam correndo o rio de cima para baixo e vice versa mas o resultado foi o que Senhora já sabe. 

(…) Esta é apenas a verdade que podem contar à Senhora e aos seus filhos. Sim, também me diz que apareceu alguma coisa dele e é certo, mas não o que a Senhora me diz. Apareceu sim o que lhe vou contar. Passados alguns dias nós voltámos a passar por lá, e foi nessa altura que um dos alferes encontrou uma parte da camisa e a carteira no bolso, pois a parte da camisa era só da frente e tinha o bolso onde estava a carteira, que o alferes tem para lhe enviar tudo junto que resta do seu querido filho. E a Senhora não precisa de tratar nada pois a companhia já tratou de tudo, pois também tratou dos papéis para a Senhora ficar a receber algum dinheiro que bastante falta lhe fará e assim, minha Senhora, não quero alongar mais as minhas notícias pois elas só lhe levam mágoas. 

Sem mais me despeço com muitas saudades para os seus filhos um aperto de mão para todos para a Senhora também deste que chora também a sua dor. José Francisco Couto."

Consegui o contacto com o José Francisco Couto, convidei-o para participar na cerimónia que a AVECO (Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste, com sede na Lourinhã) e a população da sua terra natal – lugar da Areia Branca – lhe prestou em 11 de maio de 2014. Após o serviço militar, o José Couto emigrou para o Canadá, onde vive atualmente e na troca de correspondência que efetuou comigo, em 3 de fevereiro de 2014, escreveu:

“Eu, José Francisco Couto estou-lhe respondendo à sua carta que recebi aqui há dias. Fiquei bastante surpreendido que ao fim de tantos anos verifiquei que afinal o José Henriques nunca foi esquecido (…).

"Eu gostava imenso de estar aí presente nesse dia para prestar a minha homenagem e ditar tudo o que se passou, mas como estou longe e por agora, não posso fazer planos, mas vou-lhes contar aquilo que se passou.

“O Batalhão ia fazer uma emboscada na qual o José Henriques estava incluído. Éramos bastante amigos. O alferes ia com uma corda atada à cintura para atar a uma árvore para nós podermos passar um a um. A corda atravessa o rio de um lado a outro. Ele agarrou-se à corda a seguir ao alferes. Quando o alferes já tinha passado para o outro lado, ele agarrou-se e a seguir ia eu e eu ouvi ele gritar e não o vi. Eu recuei para trás. Começaram as emboscadas por terra e por rio e nunca ninguém o viu mais. 

"Ao fim de quinze dias passámos ao rio e vimos a camisa dele pendurado numa árvore toda rota. Ele, umas semanas antes, tinha-me desafiado para nós fugirmos para os turras. Por isso, nunca pensei que ele tivesse morrido no rio e que ele se tivesse passado para algum lado porque ele sabia muito bem nadar. E pronto, é tudo o que sei para contar. De resto não sei mais nada. Não sei se foi comido por algum bicho do rio ou o que se passou mais. Quando cheguei a Portugal fui mandar dizer uma missa por ele. (…)”

3º Testemunho que me foi prestado pelo ex- fur mil  Estêvão Alexandre Henriques em 23.04.2014. 

O Estevão é natural de Fonte Lima, Stª Bárbara, e vive no Seixal. Com a especialidade de Radiomontador, embarcou para a Guiné, a 18 de agosto de 1965, a bordo do navio Niassa, chegando a Bissau a 24. Fez parte da Companhia  nº 1423, CCS que pertenceu ao BCAÇ 1858. 

Quando o Mateus chegou à Guiné o Furriel Estevão conseguiu o seu destacamento para a Messe de Sargentos, através do cozinheiro Santos, seu amigo e natural das Matas (Lourinhã). 

Na altura do acidente o Estevão não estava em Catió. Soube do acidente três dias depois, quando regressou de Empada onde tinha ido fazer reparações nos rádios. Pensa que se estivesse em Catió na altura da operação, seguramente o Mateus não teria sido nomeado para a mesma, uma vez que, no seu entender, ele já não era operacional. 

O que soube em pormenor do acidente foi-lhe contado pelo cozinheiro António José dos Santos, entretanto falecido. O furriel Henriques afirma que as Nossas Tropas só voltaram ao local do acidente uma semana depois, altura em que encontraram, então, a camisa ou um pedaço (farrapo) da camisa pendurada (presa) numa árvore. Não sabe quem a encontrou e nunca viu a camisa. No bolso da camisa estava uma carteira em forma de ferradura contendo uma medalha da Nossa Senhora, uma moeda portuguesa furada e um amuleto de cabedal. Foi o Estevão que entregou a carteira à mãe do Mateus. 

No final da Comissão o comandante do Batalhão 1858, cujo nome não se lembra, chamou-o e pediu-lhe expressamente que entregasse a carteira à mãe e lhe apresentasse as suas condolências e do pessoal do Batalhão pela morte do filho. O comandante nunca lhe falou das circunstâncias do desaparecimento do Mateus.

Diz, ainda, que foi sempre tudo um segredo bem guardado e nunca conseguiu que algum dos camaradas que participaram na operação lhe dissesse o que quer que fosse sobre o acidente. Afirma, ainda, que o Mateus nunca lhe falou em fugir.

O furriel Estevão regressou da Guiné em 9 de maio de 1967 e só em junho teve a coragem de entregar a carteira à mãe do Mateus. Lembra-se que nesse momento estava presente a irmã do Mateus.

Hipótese colocadas por seus camaradas acerca do seu desaparecimento:

Alguns camaradas do Mateus colocaram a hipótese de ele ter desertado ou ter sido preso pelo PAIGC, vindo a ser libertado na Operação Mar Verde. Entre eles, encontra-se José Francisco Couto, como referi anteriormente.

Essa hipótese não se confirmou, de acordo com o testemunho de alguns dos seus camaradas:

i) Benito Neves (CCAV 1484, Nhacra e Catió 1965/67) escreve:

 “Relativamente a reservas que ainda hoje tenho sobre esta morte, na medida em que se levantou a hipótese de ter sido capturado e libertado mais tarde no decurso da operação Mar Verde [Conacri, 22 de novembro de 1970]. Porém, oficialmente, conforme documento anexo, foi considerado “morto em combate”. (Luís Graça & Camaradas da Guiné, Post1676).

ii) Benito Neves e Hugo Moura Ferreira juntam cópia do Ofício do Arquivo Geral do Exército, nº 112/STAG, Proc. 6.2, de 23 de maio de 2007, em resposta a um requerimento do nosso camarada Hugo Moura Ferreira, de 16 de abril de 2007, pedindo informações do Soldado José Henriques Mateus. Cópia facultada pelo Benito Neves. Em traços largos, o teor do ofício é o seguinte: 

1. O José Henriques Mateus foi dado como morto em combate, “conforme a História da sua unidade (CCAV 1484)"

2. Segundo o Arquivo Histórico Militar, há uma relação de militares falecidos e desaparecidos, do CTIG/QG/1ª Repartição, datada de 21 de maio de 1974, donde consta o nome do José Henriques Mateus,  “dado como desaparecido em combate na região de Catió, em 10 de setembro de 1966 e que mais tarde foi considerado morto, juntamente com outros militares, nos termos do n.º 3 do art 1º do Decreto 350/71, e 12 de agosto de 1971”.

3. Não faz parte dos militares resgatados através da Operação Mar Verde [em que foram libertados 26 prisioneiros portugueses, em Conacri];

4.Também não consta da base de dados referente à lei dos ex-combatentes (Lei nº 9/2002).

(Vd. poste de 9 de maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2821: Aqueles que nem no caixão regressaram: o caso do José Henriques Mateus, da CCAV 1484, natural da Lourinhã (Benito Neves / Hugo Moura Ferreira).

(Revisão/ fixação de texto: LG)
 ________________

Nota do autor, JBMS:

[1] In: Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné, quinta-feira, 19 de abril de 2007. Guiné 63/74 - P1676: Vivo ou morto, procura-se o Soldado Mateus, da CCAV 1484, natural da Lourinhã (Benito Neves). https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2007/04/guin-6374-p1676-vivo-
-ou-morto-procura.htm
________________

Nota do editor LG:


Vde. postes anteriores:

30 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26968: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (1): José António Canoa Nogueira (1942- 1965) (sold ap mort, Pel Mort 942 / BCAÇ 619, Catió, 1964/ 1966) - Parte II: o Manuel Luís Lomba estava lá, em Cufar, em 23 de janeiro de 1965

terça-feira, 8 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P26993: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (2): José Henriques Mateus (1944-1966), sold at inf, CCAV 1484 (Catió, 1964/1966) - Parte I: nota biográfica


JOSÉ HENRIQUES MATEUS (Lourinhã, 
17.10.1944 - Guiné, 10.09.1966)


TO do falecimento - Guiné

Posto: Soldado atirador infantaria nº E – 69516/65

Subunidade: CCAV 1484 (

Naturalidade - Areia Branca, Lourinhã

Local da sepultura - Corpo, desaparecido no rio Tompar (afluernte do rio Cumbijã), , no decurso da Op Pirilampo, e  não encontrado


I. Continuamos a reproduzir, com a devida vénia,  alguns excertos  do livro recente  do Jaime Bonifácio Marques da Silva, "Não esquecemos os jovens militares do concelho da Lourinhã mortos na guerra colonial" (Lourinhã: Câmara Municipal de Lourinhã, 2025, 235 pp., ISBN: 978-989-95787-9-1), pp. 169/173.


1. REGISTO DE NASCIMENTO

José Henriques Mateus nasceu a 17 de outubro de 1944, às 11.30 horas, no lugar de Areia Branca. 

Filho legítimo de Joaquim Mateus Júnior, de 42 anos, casado, com a profissão de jornaleiro e natural da freguesia e concelho de Lourinhã, e de Maria Rosa Mateus, de 20 anos, doméstica, casada, natural da freguesia de Atouguia da Baleia, concelho de Peniche, e domiciliados no lugar de Areia Branca. (...)

A declaração do registo de nascimento foi feita pela mãe, teve como testemunhas José Borges, operário reformado do Arsenal da Marinha, morador na vila de Lourinhã, e Manuel da Cruz, casado, proprietário e morador no lugar da Marqueiteira, foi assinado pelas testemunhas e não assinado pela declarante por não saber escrever e lavrado pelo Ajudante da Conservatória, Francisco Rocha, em substituição do Conservador por se encontrar legalmente de licença. Registo nº 503, de 14 novembro 1944, da Conservatória do Registo Civil da Lourinhã.

2. REGISTO MILITAR

Recenseamento: José Henriques Mateus foi recenseado no ano de 1964. Alistado a 3 de junho de 1964. Era solteiro, com a profissão de trabalhador agrícola,  e analfabeto

Inspeção militar: foi inspecionado a 16 de março de 1965 na DRM 5. Tinha 1.67 de altura, 65 kg de peso, cabelos lisos de cor castanho escuro e olhos de cor cinzento esverdeado. Em resultado da inspeção foi “apurado para todo o serviço Militar” e atribuíram-lhe o número mecanográfico E – 6951665.

Colocação durante o serviço: a 4 de maio de 1965 é incorporado como recrutado no RI 7, em Leiria. Fica adstrito à 1ª CI com o nº 1820/65. De 21 a 26 tomou parte nos exercícios de campo (OS 146). Faz o Juramento de Bandeira a 1 de julho. Termina a instrução básica a 03.07.65, sendo transferido para o RC 7 a 4 de julho, destinado à especialidade de atirador de infantaria, sendo aumentado ao efetivo da CCAV 1484 com o nº 711/65. Pronto da Escola de Recrutas a 22 de agosto de 1965 na especialidade de Atirador.

2.1. Comissão de serviço no ultramar, Guiné

Mobilizado: em outubro de 1965 nos termos da alínea c) do artº 3 do Decreto 42937, de 22/04/60, para servir CTI da Guiné, fazendo parte da CCAV 1484.

Embarque: no dia 20 de outubro, a bordo do navio Niassa, em Lisboa. Desembarque: a 27 de outubro em Bissau, desde quando conta 100% de aumento no tempo de serviço.

Data do falecimento: 10.07.1966

Causa da morte: desaparecido ao atravessar o rio Tompar

Local do acidente: Catió

Abatido ao efetivo: de acordo com a Ordem de Serviço (OS), e 21 de setembro de 1966, assinada pelo comandante de companhia,  capitão Virgílio Fernando Pinto, no quartel em Catió, na secção “Orgânica – Alterações para os mapas permanentes, alínea c) – Praças: Abates, consta: “Que seja abatido ao efetivo da CCAV 1884 do BCAÇ 1858, data em que desapareceu ao atravessar o Rio Tompar, o soldado José Henriques Mateus”.

Despacho Superior: por despacho de 24.10.67 foi confirmado como ocorrido em 10.09.66 e por motivo de serviço o acidente referido do qual lhe resultou a morte (OS 265).

Tempo de serviço: 1965, 241 dias e 1966. 252 dias.

2.2. Registo disciplinar: condecorações e louvores

Medalha: de segunda classe de comportamento (Artº 188.º do RDM) é-lhe atribuída em 4 de maio 1965.


3. PROCESSO DE AVERIGUAÇÕES AO ACIDENTE: ANOTAÇÕES E CONTEXTO

Em consequência do acidente, o Ministério do Exército, através do Comando Territorial Independente da Guiné (CTIG), determina que se organize um processo de averiguações. 

O CTIG informa, ainda, que, na sequência do acidente, “foi enviado telegrama à família do desaparecido comunicando a ocorrência” de acordo com ofício nº 1893, de 14 de setembro de 1966, emitido pelo Comandante do Depósito Geral de Adidos em Lisboa, coronel de infantaria Amândio Ferreira. 

Este informa, também, as várias instâncias superiores do “Desaparecimento de praça no Ultramar”: 

  • Chefe da 1ª Secção da Rep do Gabinete do Ministro do Exército,
  •  Chefe da Rep Geral DSP/ME, 
  • Chefe do Serv Inf Pública das Forças Armadas do Dep da Defesa Nacional, 
  • Chefe do Estado Maior do GG/GML, 
  • Chefe da Rep de Sargentos e Praças DSP/ME,
  •  Chefe da Agência Militar 
  • e Comandante do RC 7.

A 22 de setembro de 1966 dá-se início ao Processo de averiguações em cumprimento do despacho 13919 / processo nº 131, ponto três, exarado pelo QG/CTIG. Para o efeito, o Comandante da CCAV1484 nomeia o alferes miliciano José Rosa de Oliveira Calvário, do Serviço de Material, para elaborar o respetivo processo.

1. O Alferes Calvário, para apurar as circunstâncias em que terá desaparecido o soldado nº 711/66, José Henriques Mateus, ouviu, primeiro, o comandante interino da CCAV 1418, cap inf Virgílio Fernando Pinto, que declarou: 

"Que, a ocorrência tinha sido participada no relatório da operação 'Pirilampo' e no qual se encontram como testemunhas o alf mil cav de Fernando Pereira Silva Miguel, o 1º cabo, radiotelegrafista, nº 1055/65, Osvaldo Freitas de Sousa, e o alf mil cav Cav José Martinho Soares Franco Avillez."

A primeira testemunha, o alf mil cav Fernando Pereira Silva Miguel, CCAV 1484, solteiro, de vinte e quatro de idade e natural de Lisboa declarou:

“Que, após terem sido atingidos os objetivos da operação 'Pirilampo', e se terem evacuado os feridos e se ter dado início à retirada das nossas tropas levantou-se uma tempestade, que fez com que diminuíssem as condições normais de visibilidade, já por si escassas, por ser ao anoitecer. 

Que, quando o acidente se deu eram cerca das dezassete horas e quarenta e cinco minutos, quando da travessia do segundo e último rio, que as nossas tropas tinham de atravessar no regresso, e que naquele dia e àquela hora não dava passagem a vau por se encontrar a maré cheia. 

Mais disse que o soldado José Henriques Mateus se encontrava a atravessar o rio, agarrado a uma corda, quando esta se partiu. Em consequência disto, o sinistrado desapareceu imediatamente não dando mais sinal de si. Mais disse que ouviu o primeiro cabo Osvaldo gritar - «está um homem debaixo de água».

Mais declarou que ele próprio se atirou ao rio o que foi imediatamente secundado por outros camaradas seus, levando em buscas durante cerca de quarenta minutos, mergulhando e tentando tatear e detetar o corpo do sinistrado. 

Mais disse que em virtude da impossibilidade de o encontrar, devido à má visibilidade e forte corrente das águas, e depois de se empregarem todos os esforços, inspecionando a zona várias vezes, regressaram a quartéis. E mais não disse.”

A segunda testemunha, o 1º cabo radiotelegrafista, nº 1055/65, Osvaldo Freitas de Sousa, CCAV 1484 de vinte e um anos, solteiro e natural da Freguesia e Concelho de Fafe, disse: 

“Que se encontrava, quando do acidente, na extremidade da corda que atravessava o rio para apoio da sua passagem, a ajudar seus camaradas a saltarem para a margem. E que, quando o sinistrado se encontrava a meio da travessia, agarrado à corda, esta rebentou. Ao ver que o seu camarada se afundava, jogou-se à água para tentar agarrá-lo. Mais disse que conseguiu chegar junto do mesmo, e que o agarrou ainda por um ombro, embora ele se encontrasse submerso. Mais disse, que começou a gritar pelo que foi ouvido pelos seus camaradas, os quais se lançaram à água tentando auxiliá-lo. Que um deles (talvez uma milícia – não o reconheceu devido à pouca visibilidade) o segurou quando ele já se encontrava também prestes a ser arrastado para o fundo, devido ao peso do corpo do sinistrado. E que em virtude de se encontrar agarrado não conseguiu mais sustentá-lo por mais tempo.

"Mais disse que depois em companhia de outros seus camaradas, tentou detetar o corpo que nunca mais fora visto. Que levaram cerca de trinta minutos em busca, mergulhando e inspecionando a zona, pelo que eram impossibilitados pela escuridão, pela forte corrente das águas e também por estas se encontrarem turvas. E mais disse que após todo este tempo de buscas regressaram a quartéis. E mais não disse.”


A terceira testemunha, o alf mil cav José Martinho Soares Franco Avillez, CCAV 1484 de vinte e dois anos de idade, solteiro, natural da Freguesia de Alcântara, concelho de Lisboa, declarou que:

 “após ter sido dado o alarme sobre o desaparecimento do sinistrado, correu até junto da margem e lançou-se à água, para participar nas buscas do corpo do companheiro. Mais declarou que houve impossibilidade da sua parte e de outros seus camaradas, nas buscas feitas na zona onde desapareceu o sinistrado em virtude da escuridão que se encontrava, da forte corrente das águas do rio e além disso por estas se encontrarem bastante turvas. Mais declarou que levou cerca de quarenta e cinco minutos dentro de água, com outros seus camaradas, tenteando detetar o corpo do desaparecido, esforço, aliás infrutífero. E dado que a coluna estava a ser flagelada na cauda e que havia possibilidade de sofrer emboscadas no regresso e dado também à adiantada hora, foi dada ordem para regressarem a quartéis. E mais não disse.”


Relatório final e Conclusões: Após ter ouvido as testemunhas, o alferes Calvário elabora o relatório final, tirando as seguintes conclusões:

RELATÓRIO:

"1) Que no retorno de uma operação a CAV 1484 teve de transpor um rio bastante caudaloso;

2) Que para o transpor teve-se de utilizar como apoio à tropa que o atravessava, uma corda, cujas extremidades se encontravam presas em ambas as margens, do mesmo;

3) Que em dada altura a referida corda se partiu, precisamente no momento em que se encontrava a transpor o rio, o soldado n.º 711/65, José Henriques Mateus;

4) Que o mesmo soldado se afundou após a corda ter quebrado:

5) Que elementos da companhia, seus camaradas, o tentaram socorrê-lo, atirando-se à água e procurando socorrê-lo;

6) Que se fizeram buscas, durante cerca de quarenta minutos, na zona do desaparecimento, imediatamente, procurando detetar o corpo, sem qualquer resultado;

7) Que as águas do respetivo rio se encontravam bastante turvas e corriam a grande velocidade;

8) Que o incidente se deu ao anoitecer e debaixo de mau tempo."

Conclusões:

"a) Factos provados:

1) Que no acidente não houve culpabilidade do sinistrado, nem de outrem. 

2) Que o sinistrado desapareceu tragado pelas águas do rio, após se ter partido a corda de apoio, na travessia. 

3) Que em virtude das infrutíferas buscas que se fizeram durante 40 minutos, devido a uma série de fatores como: má visibilidade, forte corrente nas águas do rio, adiantado da hora (anoitecer) e as águas do rio bastante turvas, não se conseguiu recuperar o corpo. 

4) Que em virtude do depoimento das testemunhas, concluo a morte do soldado nº 711/65, José Henriques Mateus. 

b) Factos não comprovados: Nenhum”.

Termo de entrega: a 24 de setembro de 1966 o alf mil José Rosa de Oliveira Calvário dá por terminado o Processo de Averiguações e entrega o Relatório final e as Conclusões do mesmo na Secretaria da Unidade, quartel em Catió, para o devido destino”.

Informação superior do comandante: a 20 de outubro de 1996 o Processo de Averiguações segue para conhecimento e decisão superior, com a informação do comandante do Batalhão.

“Informação, 1. O soldado nº 711/65, José Henriques Mateus, da CCAV 1418, foi tragado pelas águas do rio que atravessava, desapareceu e nunca mais foi encontrado; 2. Face às circunstâncias apresentadas concordo com a opinião do Oficial Averiguante que conclui pela morte do referido soldado; 3. Sou do parecer que o acidente deve ser considerado como ocorrido em serviço.

Quartel em Catió, 20 de outubro de 1966”



Parecer do Comando Militar do CTI da Guiné, em Bissau: a 2 de novembro de 1966, o QG/CTIG, através de ofício assinado pelo Comandante Militar, brigadeiro António Reymão Nogueira, emite a seguinte informação: Informação nos termos do Dec. 3ª da OE nº 6-1.ª Série, de 30 junho 66. “Sou de parecer que deve ser considerado em serviço” o desastre de que teria resultado a morte ao sol. 711/65, José Henriques Mateus, da CCAV 1418 a que se refere o presente processo”.

Fonte: adapt. de Jaime Bonifácio Marques da Silva, op. cit.,  2025


(Revisáo / fixação de texto: LG)


(Continua)

______________

Nota do editor LG:

Postes anteriores  da série > 

26 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26957: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (1): José António Canoa Nogueira (1942-1965), sold ap mort, Pel Mort 942 / BCAÇ 619 (Catió, 1964/1966) - Parte I: nota biográfica


4 de julho de 2025 Guiné 61/74 - P26983: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (1): José António Canoa Nogueira (1942-1965), sold ap mort, Pel Mort 942 / BCAÇ 619 (Catió, 1964/1966) - Parte III: notícia do funeral no jornal da terra, "Alvorada" (de 23/5/1965)

domingo, 20 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P13012: Homenagem póstuma, na sua terra natal, Areia Branca, Lourinhã, 11 de maio próximo, ao sold at cav José Henriques Mateus, da CCAV 1484 (Nhacra e Catió, 1965/67), desaparecido em 10/9/1966, no Rio Tombar, no decurso da op Pirilampo. Parte I: Preparativos e pedido de ajuda aos seus antigos camaradas (Jaime Bonifácio Marques da Silva)



Jaime Silva, Atalaia, Lourinhã, 2013
1. Mensagem, com data de 18 do corrente, do nosso camarada e amigo Jaime Bonifácio Marques da Silva [, natural da Lourinhã e residente em Fafe,   onde foi autarca (com o pelouro da cultura, e onde é mais conhecido como Jaime Silva), ex-alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72), membro da nossa Tabanca Grande]

Caro Luís

Aqui vai o ponto da situação da cerimónia de homenagem ao José Henriques Mateus da Areia Branca e, para a qual pedia o teu empenhamento.

(i) A cerimónia realiza-se, efetivamente no dia 11 de maio de2014, no lugar da Areia Branca, Lourinhã.

Acabo de telefonar a um dos membros da Comissão, José Rufino [ex-combatente que esteve na Guiné], que mo confirmou. A hora da cerimónia depende do final da missa em sua memória. A Missa começará às 10 ou 10 e 30 horas. Talvez a cerimónia seja por volta das 11.30 /12.00 horas.

(ii) Se entenderes como oportuno, poderias fazer o favor de mobilizar já o pessoal da Guiné através do Blogue, dando como certa a data e local e, se quiseres, poderás usar os dados da sua biografia que te envio em texto anexo bem como a sua fotografia de passe.

(iii) Envio-te, também, alguns excertos de relatórios e um depoimento, bem como um conjunto de fotografias no sentido do pessoal do tempo do Mateus fazer o favor de analisar, dar a sua opinião ou acrescentar algo de novo, se houver. Por isso, agradecia que enviasses as fotos e texto aos teus contactos, sobretudo ao Benito. E provavelmente podes publicar já algumas das fotos de grupo.

(iv) Estou a reconstituir a sua história militar e irei mandar imprimir 3 ou 4 cartazes grandes para fazer uma exposição no Clube da Areia Branca (talvez se organize um colóquio na véspera com a abertura da exposição dos cartazes, ainda não sei...) .

(v) Estou a trabalhar, nesse sentido, com um amigo que tem uma empresa de publicidade aqui em Fafe e que me dará, também em suporte informático, os elementos finais e, a partir desse momento enviar-te-ei para os tratares como bem entenderes no blogue.

Quanto às fotos e relatórios precisava que o pessoal [do blogue] tentasse, concretamente:

(vi) Identificar o nome e local de alguns camaradas que estão com o Mateus nas fotografias;

(vii) Analisar os textos que envio e vejam se conseguem acrescentar mais elementos esclarecedores da situação / acidente / Operação Pirilampo, etc. [, a publicar em poste a seguir];

(viii) Precisava desses elementos o mais tardar até à próxima 4.ª feira, dia 23 de abril, em virtude de ter que os entregar na Tipografia.

(ix) Vê se haverá alguém do seu tempo (Pelotão ou companhia) que possa intervir na cerimónia (irei propor isso à Comissão, ainda não é seguro);

(x) Não tens nenhum amigo que domine as questões da Cartografia e que me possa enviar até 4.ª feira um Mapa da Guiné [, vd. mapa de Bedanda,] com boa resolução, assinalando com um círculo ou seta os locais por onde o Mateus passou e que estão referenciados nos documentos anexos ao texto 2

Abraço,

Jaime



Foto nº 1... 



Foto nº 2


Foto nº 3 > Na piscina, em Nhacra, onde CCAV 1484 esteve sediada na primeira parte da sua comissão


Foto nº 4...  Nhacra ou Catió...



Foto nº 5... Em Catió, desmanchando um vaca, oferta da Casa Gouveia, do fur radiomontador da CCS, o Estêvão Alexandre Henriques...  O Mateus, à esquerda, com outro lourinhanense, das Matas, o Manuel Santos, que era cozinheiro da CCS


Foto nº 6... Catió (?)


Foto nº 7... Fotografia de grupo frente às instalações de comando de Catió... Secção do Mateus, que pertencia ao 3º pelotão. Ao centro, na 2ª fila, de pé, o fur mil, Egídio Teles, que vive hoje no Funchal,


Foto nº 7 - A... Catió.. À esquerda, na 2ª fila, com um macaco-cão, o Egídio Teles


Foto nº 7- B... Catió... Mais camaradas da secção do Mateus

Fotos, sem legenda, do álbum do José Henriques Mateus, gentilmente cedidas pelo irmão Abel Mateus ao Jaime Bonifácio Marques da Silva. Agradece-se a indicação de quaisquer elementos identificações (nomes, topónimos, datas...), nomeadamente por parte dos seus antigos camaradas da CCAV 1484, Nhacra e Catió, 1965/67)...

Brasão da CCAC 1484, cortesia de Benito Neves [, ex-fur mil at cav, camarada do Mateus, bancário reformado, vivendo em Abrantes

2. Ficha biográfica militar do José Henriques Mateus

1.ª Parte (em construção) [Elementos recolhidos por Jaime Bonifácio Marques da Silva]

EXÉRCITO PORTUGUÊS > RI 7 (Regimento de Infantaria N.º 7)

Classe – 1965

Nome – José Henriques Mateus

Nascido em – 17.10.1944

Posto – Soldado

Filho de – Joaquim Mateus Júnior e Maria Rosa Mateus

Nascido na freguesia de – Lourinhã (Lugar da Areia Branca)

Concelho de – Lourinhã

Distrito de – Lisboa

Profissão – Trabalhador agrícola

Recenseado no ano de – 1964: alistado em 3 de junho

Apresentou-se na unidade em – 4.5.1965

COLOCAÇÃO DURANTE O SERVIÇO MILITAR

Ano de 1965

§ 4 de maio – Incorporado como recruta na 1.ª Companhia de Instrução com o n.º 1820/65

§ 21 a 26 de junho – tomou parte nos exercícios de campo

§ 1 de julho – Ratificou o Juramento de Bandeira

§ 3 de julho – Terminou a Instrução Básica Militar

§ 4 de julho – é transferido para o RC 7, destinando-se à Especialidade de Atirador de Cavalaria. Fica adstrito à CCAV nº º 1485 com o nº 711/65

§ 22 de agosto – Pronto da Escola de Recrutas - Concluiu a Especialidade de Atirador.

§ Outubro – Nomeado nos termos da Alínea c) do Art.º 3 do Dec. n.º 42937 de 22.4.60 para servir no CTI da Guiné, fazendo parte da CCAV 1484 / R.C. 7

§ 20 de outubro – embarcou em Lisboa a bordo do Navio Niassa

§ 27 de outubro – Desembarca em Bissau (desde quando conta 100% de aumento do tempo de serviço.

ANO DE 1966

10 de setembro – Baixa de serviço: Data em que desaparece ao atravessar o rio Tompar  [, afluente do Rio Cumbijã, na região de Cabolol, vd. carta de Bedanda] (O.S. 268 do RC 7 de 22.11.66) [,

Novembro - Abatido ao efetivo do Regimento e da Companhia de Cavalaria n.º 1484

ANO DE 1967

Novembro – por despacho de 24.10.67 foi confirmado como ocorrido em e por motivos de serviço o acidente referido, e de que lhe resultou a morte. (O.S. 265).

(Continua)

quinta-feira, 19 de abril de 2007

Guiné 63/74 - P1676: Vivo ou morto, procura-se o Soldado Mateus, da CCAV 1484, natural da Lourinhã (Benito Neves)





Através do Benito Neves, fiquei hoje a saber as circunstâncias, misteriosas, em que desapareceu num dos rios da Guiné, em 1966, o Soldado Mateus, da CCAV 1484, meu conterrâneo... É mais um dos nossos camaradas que não constam da lista oficiosa dos mortos da guerra do ultramar. A sua terra, Lourinhã, fez-lhe, porém, uma justa homenagem: é dos vinte que não regressaram... Mas será que ele não chegou a morrer, afogado, tendo sido feito prisioneiro pelo PAIGC?

Nascido à beira-mar, na Areia Branca, entre moinhos e dunas de areia, era muito provável que o Mateus soubesse nadar... É estranho o seu desaparecimento no Rio Tombar, no sul da Guiné (actual região de Tombali) e sobretudo, uns dias depois, a localização da sua camisa com uma imagem da Nossa Senhora de Fátima, uma nota de 50 pesos e a sua identificação... (LG).

Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.



Guiné-Conacri > Conacri > Instalações do PAIGC > 1970 > Prisioneiros portugueses, fotografados pelo fotógrafo húngaro Bara István (nascido em 1942). Legenda em húngaro: "Bara István: Portugál foglyok a PAIGC börtönében, Guinea Bissau, 1970".


1. São raras as fotos dos nossos camaradas em cativeiro, até à sua liberção em 22 de Novembro de 1970, na sequência da Operação Mar Verde. Estamos gratos a este conhecido grande fotógrafo magiar pelas imagens sobre a guerra colonial na Guiné-Bissau que disponibilizou na sua página.

Há tempos perguntei aos amigos e camaradas, se alguém era capaz de reconhecer estes rostos ? Boa parte deles faziam parte da CART 1690 (Geba, 1967/69), a que pertenceu o nosso camarada A. Marques Lopes, ex-alf mil e hoje coronel, DFA, na reforma. O Benito Neves, da CCAV 1484, admite a hipótese de o segundo prisioneiro, da fila de trás, a contar da esquerda - devidamente assinalado com um círculo a amarelo - poder ser o seu camarada José Henriques Mateus, dado como desaparecido no Rio Tombar, afluente do Rio Cumbijã, na sequência da Operação Pirilampo, e que por sinal era natural da Lourinhã, logo meu conterrâneo (LG).

Fonte / Source: Foto Bara > Fotogaleria (com a devida vénia / with our best wishes...)


2. Texto do Benito Neves, com data de 14 de Março de 2006

Luís, solicito e agradeço desde já a melhor colaboração, até porque se trata de um conterrâneo teu.

Benito Neves
Abrantes
Ex-Fur Mil At
CCAV 1484
(NNhacra e Catió, 1965/67).


OPERAÇÃO PIRILAMPO - 10 de Setembro de 1966


Com a finalidade de bater a mata de CABOLOL [vd. carta de Bedanda], de modo a detectar e a destruir o acampamento IN localizado em (1510.1120.A2) esta operação foi realizada pelas CCAV 1484,  reforçada com 1 Gr Comb Mil 13 e CCAÇ 763 (-), reforçada com 2 Sec Mil 13.

Foi efectuada uma minuciosa batida à mata de CABOLOL no sentido E-W. Pelas 14H30, não obstante as dificuldades que surgiram pela densidade da vegetação, foi detectado o acampamento IN em (1510.1120A3.15), composto por 16 casas, que foi destruído com fraca resistência do IN. Foram capturados documentos diversos e munições para espingarda Mauser.

O IN, que deveria ter detectado as NT, havia evacuado grande parte do seu material para fora do acampamento.

Em continuação da acção, as NT seguiram em direcção a CABOLOL BALANTA.

Quando queimavam o seu primeiro núcleo de casas mais a sul, o IN, instalado na orla da mata, reagiu em força com fogo de morteiro, lança granadas-foguete, metralhadora pesada, pistolas metralhadora e espingardas, causando 6 feridos ligeiros às NT. Após reacção destas, o IN furtou-se ao contacto, sendo ainda queimados mais 3 núcleos de casas.

Pelas 17H00 as NT iniciaram o regresso, tendo sido flageladas com fogo de morteiro.

Quando as NT atravessavam o rio TOMPAR [, afluente do Rio Cumbijã, a sudoeste de Bedanda], afogou-se o soldado nº 711/65, José Henriques Mateus, da CCAV 1484, não tendo sido possível recuperar o seu corpo, apesar de todas as buscas efectuadas.

Pelas 22h30 as NT chegaram ao aquartelamento de Cufar, depois de uma marcha fatigante em terreno pantanoso.

O que acima se transcreve é o que consta do relatório da operação, extraído da história da Companhia, de que fui encarregado de escrever.


Um camisa com uma imagem de Nossa Senhora de Fátima

A travessia do Rio Tompar foi extremamente difícil. A maré estaria a encher ou a vasar, com forte corrente e foi decidida a colocação de uma corda de margem a margem, que serviu de suporte. O soldado Mateus, que transportava ou umas fitas para metralhadora ou umas granadas para morteiro ou para LGF, no meio da travessia, largou a corda e submergiu. Foram batidas as margens do rio sem que tivesse sido possível a recuperação do corpo.

Dias depois deste acidente, voltou a ser feita nova batida na zona, à procura do corpo ou outros indícios. Foi encontrada na margem a camisa que o Mateus envergava, tendo no bolso (i) a sua identificação, (ii) uma imagem da Virgem de Fátima e (iii) uma nota de 50 pesos. Mais nada.

Anteriormente havia quem alvitrasse a possibilidade do desaparecimanto ter sido causado por crocodilo mas, agora, seria fácil concluir que o ataque de qualquer animal, fosse ele qual fosse, não implicava o prévio despir da camisa.

A Companhia regressou [a Portugal] em 1967 e só em 2006 tivemos o primeiro reencontro, o primeiro almoço de confraternização. Foram muitos os anos que passaram, cerca de 40, porém, o Mateus nunca foi esquecido.


O Mateus era natural da Areia Branca, concelho de Lourinhã


Em Fevereiro de 2007 recebi um telefonema de um ex-cabo enfermeiro da CCAV 1484 que me transmitiu ter estado em Cadaval [, concelho do oeste, também do distrito de Lisboa], com um outro elemento da CCAV1484, que lhe disse que o Mateus estava vivo, que teria estado preso na Guiné Conakry, que inclusivamente alguns anos após o regresso da CCav  1484, terá estado na Lourinhã, em casa da mãe do Mateus e que a senhora lhe confirmou que o filho estava vivo.

O Mateus era oriundo do concelho da Lourinhã [, Estremadura, Oeste].

Por coincidência, no dia seguinte ao do telefonema do meu ex-cabo enfermeiro, foram publicadas no blogue algumas fotos tiradas a prisioneiros portugueses na prisão de Conakry (2). Decidi enviar a foto ao ex-Furriel Teles, residente na Madeira, que era o comandante de Secção do Mateus, pedindo-lhe para ver se, entre os presos, estaria o Mateus. Em resposta disse-me que sim e que era o 2º da fila de trás, a contar da esquerda.

Porém, conheci em Alter do Chão um ex-combatente - Jacinto Madeira Barradas - que esteve preso em Conakry e que foi um dos libertados pela operação Mar Verde. Diz-me que o prisioneiro que lhe indiquei não tinha o nome de Mateus, que não conheceu lá nenhum Mateus. Poderá haver aqui alguma mudança de identidade?

Na lista, organizada pelo José Martins, dos militares que tombaram em campanha na Guiné (1961/74), não consta o nome do José Henriques Mateus (3).

Posso afirmar que a notícia de que o Mateus está vivo (e Deus queira que esteja!) se espalhou entre os elementos da Companhia e não há quem não queira ter o Mateus connosco no nosso 2º. convívio, em Maio próximo.

Luís, és natural da Lourinhã, conterrâneo do José Mateus (ou pelo menos do mesmo concelho), saberás alguma coisa sobre este caso? O Mateus, a estar vivo, terá agora 62/63 anos. Valerá uma consulta às várias Juntas de Freguesia do concelho da Lourinhã?

Luís, desde já grato por toda a ajuda possível.

Um abraço.

Benito Neves.





Lourinhã > Aspecto parcial do Monumento aos Mortos do Ultramar. 2005. Arquitecto: Augusto Silva. Escultora: Andreia Couto... O meu primo, José António Canoa Nogueira, foi o primeiro soldado da Lourinhã a morrer, em terras da Guiné, em 1965, em Ganjolá, Catió... Lembro-me do seu impressionane funeral e quanto a palavra Guiné me marcou... Tinha eu 18 anos, já feitos... O Soldado Mateus terá sido o segundo, natural da Lourinhã, a tombar em terras da Guiné, também no sul... nas proximidades da mata de Cabolol Balanta, na margem direitra do Rio Cumbijã... (LG).


Lourinhã > Monumento aos mortos da Guerra do Ultramar > Guiné > 2005 > Quando o monumento foi inaugurado, em 2005, na placa relativa aos mortos na Guiné constava o nome de José Henriques Martins... As placas foram depois substituídas, já em 2007, segundo creio, e corrigido o erro... O nome correcto era José Henriques Mateus, natural de Areia Branca, morto em 9 de Setembro de 1966... Haverá também aqui um erro de data... O Benito Neves diz que a Operação Pirilampo foi a 10 de Setembro... (LG)

Fotos: © Luís Graça (2005). Direitos reservados.



3. Benito: O teu telefonema de ontem e o teu email (já de há um mês e que reli, com outra atenção) emocionaram-me. Este caso é espantoso e, no mínimo, intrigante. Fui vizinho do Mateus (ele é natural do lugar da Areia Branca, povoação que deu o nome à conhecida Praia da Areia Branca, concelho da Lourinhã). Eu saí da Lourinhã, há trinta e tal anos, e já não me lembro deste caso. Mas tenho lá casa e vou lá com regularidade. Tenho seguramente amigos e conhecidos da família Mateus, mas já não seria capaz de reconhecer, a não ser eventualmente por fotografia, o teu camarada José Henriques Mateus. E, no entanto, o seu nome consta da lista dos naturais da Lourinhã que tombaram na Guiné, o primeiros dos quais foi o meu primo - em 3º grau - José António Nogueira Canoa (4), morto em Ganjola, um ano antes (1965).

Já aqui dei notícia da homenagem que a minha terra, através da autarquia local, prestou aos seus filhos que tombaram na guerra do ultramar (5), com a inauguração, em 26 de Junho de 2005, de um monumento, obra do arquitecto Augusto Silva e da escultora Andreia Couto. Ao todo, foram vinte os mortos do concelho, incluindo seis na Guiné. A placa em bronze com os nomes dos nossos camaradas mortos em combate, em cada um das províncias, foi recentemente substituída. No caso da Guiné, havia um erro: O José Hemriques Mateus constava com um apelido trocado: José Henriques Martins. Por outro lado, faltava a data do falecimento e a localidade onde haviam nascido. Junto fotos das duas placas.

Benito: vou sentar saber mais pormenores sobre o Mateus, através da comissão organizadora desta iniciativa, onde tenho pelo menos amigos e conterrâneos, o João Delgado, o Jaime Bonifácio Marques da Silva e o José Picão de Oliveira: este último, foi furriel miliciano na zona leste da Guiné, mesmo na ponta nordeste, em Canquelifá, tendo regressado já em Setembro de 1974, enquanto o Jaime foi alferes miliciano paraquedista em Angola, sensivelmente na mesma época em que eu fui mobilizado para a Guiné (1969/71). O João Delgado, por sua vez, esteve em Angola, segundo creio.

De qualquer modo, obrigado pelas tuas diligências. Quem nos dera que o Mateus estivesse vivo algures, e nos pudesse contar a sua odisseia, e rever as dunas da sua praia. Em todo o caso, se ele efectivamente morreu ou desapareceu, é muito importante para os seus amigos, conterrâneos e familiares saber as circunstâncias em que ocorreu a sua morte ou o seu misterioso desaparecimento. Pagaste-lhe uma dívida de amizade, ao publicares parte do rekatório da Operação Pirilampo e o episódio do seu acidente... Estamos-te gratos por isso. Luís

__________

Notas de L.G.:

(1) Vd. pots de 18 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1673: O blogue do nosso contentamento (Benito Neves, CCAV 1484, Nhacra e Catió, 1965/67)

(2) Vd. post de 28 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1468: Mortos que o Império teceu e não contabilizou (A. Marques Lopes)

(3) Vd. Lista disponível, em formato pdf, no sítio do António Pires > Moçambique - Guerra Colonial, orgnaizada pelo nosso camarada e membro da nossa tertúlia José da Silva Marcelino Martins > Militares que Tombaram em Campanha (1961-1974) > Guiné

(4) Vd. posts de:

8 de Setembro 2005 > Guiné 63/74 - CLXXXI: Antologia (18): Um domingo no mato, em Ganjolá (Luís Graça / José António Canoa Nogueira)

22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira

8 de Março de 2007 > Guiné 63/74 -P1574: Uma estória dos Gringos de Guileje (CCAÇ 3477): Estás f..., pá! (Amaro Samúdio)

(5) Vd. post de 24 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXXV: Homenagem aos mortos da minha terra (Lourinhã, 2005)