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segunda-feira, 13 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25515: O Cancioneiro da Nossa Guerra (17): "Isto é tão bera"! (Letra do sportinguista e "caça-talentos futebolísticos", Aurélio Pereira, música da canção cubana "Guantanamera") (Gabriel Gonçalves, ex-1º cabo cripto, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71)


Gabriel Gonçalves: um grande voz, 
o "Joselito" de Bambadinca

1. Está por estudar o Cancioneiro da Guiné (*): só por si, é um tema que dá uma boa dissertação de mestrado ou tese de doutoramento... N
ão havia quartel no mato, onde não se cantasse o fado (em geral,  parodiado), um balada, um cantiga da moda (como as do Festival da Eurovisão), muitas vezes com letra adaptada às circunstâncias da vida do pobre Zé Soldado...   Havia sempre uma viola, um voz, um coro. E nalguns casos um acordeão. As letras poderiam ser mais eruditas ou mais "popularuchas", com ou  sem erros ortográficos. O que importava era cantar,  exteriorizar os nossos sentimentos recalcados,  "exorcizar os nossos fantasmas", e por vezes protestar, à boa maneira da época: iludindo a "censura"... Era também uma forma de "matar o tempo", mitigar a saudade, gerir "a usura física e mental" da guerra, enganar as insónias, disfarçar a angústia ou a ansiedade da próxima saída para o mato...

A letra que a seguir republicamos (agora nesta série "O Cancioneiro da Nossa Guerra")  foi-me 
enviada pelo Gabriel Gonçalves (ex-1º cabo op cripto,  CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71),  um excelente camarada (para além de uma grande voz) que veio comigo no T/T Niassa, em 24 de maio de 1969... e não regressou no Uíge, em 17 de março de 1971, porque teve que esperar pelo seu "periquito" (**). (Os graduados e especialistas da CCAÇ 12 e das outras companhias com praças guineenses, de recrutamento local,  eram de rendição individual.)

(...) Henriques: Lembrei-me que havia uma música que a malta entoava em tom de protesto, quando das nossas tainadas lá em Bambadinca e também no nosso encontro (da malta de Bambadinca, 1968/71) efectuado na herdade do Vacas de Carvalho (em Montemor-o-Novo) já há um anos. Segue os versos. (...) (***)

Agradeci-lhe: 

(...) Gabriel, que saudades, que maravilha!... Ainda me lembro bem  da letra e sobretudo da música (...)

E acrescento agora mais uns  comentários:  era cantada em noite de copos, de insónias e de raiva, pela noite dentro, suficientemente alto para os gajos do "Comando" [do Batalhão, primeiro, o BCAÇ 2852, e depois o BART 2917] nos ouvirem... 

A canção 'Isto é tão bera' (parodiando a letra da 'Guantanamera' e adaptando a sua música muito em voga nos anos 60 ) era  uma das nossas  preferidas, no bar da messe de sargentos de Bambadinca, em 1969/71, a par da 'Pedra Filosofal', do António Gedeão (letra) e Manuel Freire (música)... 

O poema do António Gedeão foi publicado no livro 'Movimento Perpétuo', em 1956, portanto muito antes da guerra colonial.  Dada a sua excelente ritmo, riqueza imagética, força poética e musicalidade e, apesar a sua extensão, o Manuel Freire pegou nele e fez da 'Pedra Filosofal' um verdadeiro de hino de resistência contra a situação política da época (a ditadura, a guerra colonial, as esperanças frustradas da abertura política com a 'primavera marcelista', etc.)
 

(...) Eles não sabem, nem sonham, 
que o sonho comanda a vida. 
Que sempre que um homem sonha
 o mundo pula e avança 
como bola colorida 
entre as mãos de uma criança.(...)


Foi o GG, o Gabriel Gonçalves  (a quem também chamávamos o "Arcanjo Gabriel", e que tocava viola e cantava divinamente) quem me deu informação sobre o autor da letra, o Aurélio Pereira. Aqui fica  feito o esclarecimento por ele, em 2007 (***):

 (...) Henriques: Ainda bem que te lembras da música. O Aurélio Pereira (n. 1947) é um camarada de Leiria do curso de escriturário no RAL 4. Para que conste trata-se do conhecido e conceituado técnico de futebol do SCP, para as camadas jovens, pois passaram por ele nomes como: Figo, Simão, Quaresma, Ronaldo, estes os mais conceituados. Que pena o Aurélio não ser do SLB. Um abraço, GG. (...)

Confesso que não sabia que o autor da letra da canção "Isto é Tão Bera" era um nome glorioso do nosso futebol (dizem até que foi o maior caçador de talentos futebolísticos do mundo, recentemente homenageado pelo seu clube de sempre.) (...)

Recorde-se, por outro lado, que a "Guantanamera" é uma canção patriótica cubana com letra do poeta José Martí (1858-1895) (herói da independência de Cuba), com música de Joselíto Fernández (1929). 


ISTO É TÃO BERA
(Letra de Aurélio Pereira / música Guantanamera)

I
Eu sou um pobre soldado
E esta farda é o fim,
Andando assim mascarado
Todos se riem de mim.

As minhas moças-meninas
São as malvadas faxinas.

(Refrão)

Isto é tão bera,
Ai é tão bera, tão bera,
Isto é tão bera,
Ai é tão bera, tão bera.

II
Logo de manhã cedo
Toca para levantar,
Se não acordas é certo
Logo vais estar a lerpar.

Mais um minuto na cama
Lá vai o fim-de-semana.

(Refrão)

Isto é tão bera,
Ai é tão bera, tão bera,
Isto é tão bera,
Ai é tão bera, tão bera.

III
Era um rapaz engraçado
E de carinha mimada,
Sempre tão bem penteado
Mas levou a carecada.

Agora está como o fel
Nem quer sair do quartel.

(Refrão)

Isto é tão bera,
Ai é tão bera, tão bera,
Isto é tão bera,
Ai é tão bera, tão bera.

_____________


(...) Coimbra > Claustros do antigo Colégio da Graça, hoje sede no núcleo local da Liga dos Combatentes, Rua Sofia, 136 > 27 de maio de 2023 > 50.º convívio de confraternização da CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, 1971/74) > O Carlos Alberto M. Simões, ex-1º cabo cripto (1971/72), que foi substituir o "nosso" GG - Gabriel Gonçalves, "grande baladeiro", também conhecido pelo "Joselito de Portugal"... Chegou tarde a Bambadinca, em maio de 1971, para desespero do "Arcanjo Gabriel" que já estava completamente passado dos carretos... Vive em Telheiras, Lisboa, e trabalhou nos seguros, tal como o GG... Disse-me que nunca saiu do seu buraco, em Bambadinca... Mas tem um louvor do comando do BART 2917 (...).

(***) Vd. poste de 24 de abril de  2007 > Guiné 63/74 - P1695: Cancioneiro de Bambadinca: Isto é tão bera (Gabriel Gonçalves) 

quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24725: O segredo de... (39): António Medina: O surpreendente reencontro, em Bissau, em junho de 1974, com o meu primo Agnelo Medina Dantas Pereira, comandante do PAIGC



Foto nº 1



Foto nº 2

Lisboa > Antiga sede do BNU,  na Rua Augusta, que hoje aloja o Museu do Design e da Moda (MUDE). Esculturas de Leopoldo de Almeida (1964), que representam a expansão do BNU como banco emissor pelos antigos territórios ultramarinos portugueses (Foto nº 2), e os respetivos escudos (Foto nº1), incluindo a Guiné (cujo escudo é o da direita, a contar de baixo para cima, inspirado no original, a seguir descrito

"Escudo composto tendo a dextra em campo de prata, cinco escudetes de azul, cada um com cinco besantes de prata em aspa e a ponta, de prata com cinco ondas de verde - pretendiam simbolizar a ligação à metrópole; a sinistra em campo de negro, um ceptro de ouro com uma cabeça de africano, alusão ao ceptro utilizado por D. Afonso V, rei de Portugal à época da exploração da região. Brasão de armas simplificado, de 8 de maio de 1935 a 24 de setembro de 1973."

Fonte: BNU. (Reproduzido com a devida vénia...)




1. O António Medina (ex-fur mil op esp, CART 527, 1963/65) (foto acima)  não é homem para levar segredos para o outro mundo (*)... Desde que aderiu ao nosso blogue, em 15/2/2014, já partilhou aqui connosco alguns, a começar pelo seu "desenfianço" em Bissau, quando estava destacado no Cacheu, e que lhe poderia ter valido uma dura pena de prisão... por "deserção" (**).

Recorde-se que o nosso veteraníssimo António Medina, hoje com 84 anos feitos, já aqui nos contou como é que andou três dias "desenfiado" em Bissau, por causa de uns primos que tocavam no conjunto "Ritmos Caboverdianos"... (Ah! A saudade, quando dá num ilhéu! )

Estávamos em meados de 1964 e o que valeu ao Medina, que já não era "pira", mas já andava "apanhado do clima", foi um taxista, seu patrício, cabo-verdiano, que aceitou o risco de o levar de volta, de Bissau até Teixeira Pinto, por mil pesos, sem qualquer escolta (!)...

A única arma que o Medina levava debaixo do assento da viatura, e0ra a sua pistola-metralhadora FBP (de que pouco lhe valeria em caso de mina A/C ou de emboscada)...

Em João Landim, na travessia do Rio Mansoa, deu boleia a uma mulher que vendia ostras, e que ele já conhecia do Cacheu (onde estava destacado)... E lá seguiu a "coluna solitária" até ao Canchungo: o Medina, a mulher, o taxista... A história, completa, desta "pequena loucura" já foi reproduzida no poste P14945 (**)

Talvez o facto de viver nos EUA há mais de 40 anos, facilite a apetência do Medina para "ir ao confessionário" mais vezes do que outros camaradas, mais contidos.

Mas nem todos os seus segredos, já aqui contados, constam da competente série, "O segredo de...", que já tem 4 dezenas de postes.(*)

Alguns dos segredos aqui partilhados são "segredos de... Polichinelo", que poderiam também ser contados por qualquer um de nós... Todos tivemos, afinal, durante o serviço militar (de pelo menos 3 anos), alguns "pecados e pecadilhos", que nunca confessámos a ninguém, nem às paredes do nosso quarto... Às vezes apenas por falta de interlocutor ou "confessor", ou de ocasião ou de ambiente, e não tanto por autocensura ou receio da censura dos outros...

 Noutros casos nem se trata propriamente de "pecados ou pecadilhos", mas de situações que implicam alguma reserva, pudor, acanhamento,  constrangimento,  medo de ser julgado pelos antigos camaradas de armas, etc.

Mas já se ouviram aqui histórias espantosas que seria uma pena ficarem para sempre no "segredo dos deuses", o mesmo é dizer, perderem-se na voragem do tempo... São histórias que seguramente nunca chegaram (nem chegarão) ao Arquivo Histórico-Militar, ou outr0s arquivos públicos, mas que não sobreviverão ao "guardião da memória", que é cada um de nós, se não forem contadas...

Claro que nenhuma destas histórias vem "alterar" a visão final da História com H grande... Mas essa será sempre mais pobre, e mais descolorida, sem as nossas histórias com h pequeno...

É o caso desta, passada em Bissau, em junho de 1974, já com o PAIGC a preparar-se para se instalar nas cadeiras do poder, ainda dois meses antes da assinatura do acordo de Argel (25 de agosto de 1974) e três meses antes  da partida do "último soldado do império". 

Muitos dos nossos leitores não conhecem ainda este episódio, aqui contado no já  longínquo ano de  2014 (***).

Como está aceite, tacitamente, entre nós, não há críticas negativas ou depreciativas (por parte dos nossos comentadores) em relação a estes "segredos de confessionário". Tal como não há penitèncias...




Guiné > Região do Cacheu > Teixeira Pinto > Jolmete > CART 527 (1963/65) > O António Medina à esquerda, de perfil.

Foto (e legenda): © António Medina (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradasas da Guiné]


O segredo de António Medina > O surpreendente reencontro, em Bissau, em junho de 1974, com o meu primo Agnelo Medina Dantas Pereira, comandante do PAIGC


Ano de 1974, da revolução de cravos em Portugal. A voz da liberdade e a derrota do fascismo soaram aos residentes civis em Bissau, Guiné, bastante cedo, na manhã do dia 26 de Abril.

Era eu empregado do BNU desde 1967 e vivia como é obvio em Bissau com a minha mulher e três filhos pequenos, os dois primeiros já quase em idade escolar.

Não me vou alongar nesta estória mas julgo ser um facto bastante interessante que merece ser mencionado, até porque os protagonistas são relacionados com a guerra e tem laços de família.

Depressa reinou uma grande euforia em toda a cidade de Bissau. A caça ao homem e o saneamento começaram, alguns que por qualquer divisionismo familiar eram falsamente acusados, outros por terem sido informadores da PIDE, perseguição e prisão para aqueles que exerciam cargos de chefia nas repartições públicas ou privadas e que não mais mereciam confiança, aqueles que supostamente apoiaram o regime fascista, etc. Arruaças, espancamentos, ofensas, fuzilamentos (o mais notório foi do respeitado Régulo Batican Ferreira, de Teixeira Pinto, que foi do meu conhecimento pessoal quando estive no chão manjaco em 1963/65).

Tempos difíceis vividos sob a pressão constante de ser perseguido, espancado ou aprisionado, aliado à falta de géneros alimentícios que se fazia sentir em todos os aspectos.

Entretanto, chegam as forças do PAIGC a Bissau depois de parte das tropas Portuguesas começarem já a regressar a Lisboa, instalando-se em quartéis e ocupando outras instalações. O Banco Nacional Ultramarino (BNU), esse, lá continuava fazendo as suas operações diárias sem qualquer inconveniente.

Num daqueles dias de calor e humidade, já típico da época das chuvas, depois das 10:00 da manhã, fui chamado para atender um cliente que me procurava - era um militar natural da Guiné, das forças do PAIGC, armado com uma Kalashnikov.

Senti um calafrio pela espinha abaixo quando me aproximei dele que, sem qualquer preâmbulo, apenas me comunicou que eu teria de estar ao meio dia na sede do Partido, ao lado do Palácio. Esperando o pior, prontifiquei-me a estar presente, não perguntando de quem ou de onde vinha tal ordem, o militar mais não disse, retirando-se apressadamente.

Comuniquei imediatamente à minha mulher o assunto, pedindo-lhe que se mantivesse calma, que se me pusessem sob custódia ela deveria seguir quanto antes para Cabo Verde, Ilha do Fogo, onde tinha familiares. Aliás, ia sendo este o procedimento com quantos prontos para embarcarem foram proibidos de seguir viagem, sem justa causa.

Imaginem o meu sofrimento durante aquele tempo de espera, contando os minutos e segundos no meu relógio Cortebert. Foram os piores momentos da minha vida, os nervos e o medo não me deixaram mais trabalhar. Irrequieto e preocupado, sem qualquer concentração, andava de um lado para outro sem saber o que se me adivinhava. Na hora certa, saí correndo em direcção à sede do PAIGC para me apresentar a quem (?), no edifício da antiga messe dos Oficiais da Força Aérea Portuguesa.

Quando chego ao pé do sentinela, deparo-me com um sujeito, a uma curta distância, de meia estatura, barba cerrada, com a farda dos revolucionários mas desarmado, sorrindo para mim. Era o meu primo Agnelo Dantas, filho de uma tia, irmã do meu pai. Fiquei deveras surpreendido quando vi a realidade à minha frente, meu primo, um dos combatentes do PAIGC (#)

Ponderei surpreso por alguns momentos, me aproximei sem qualquer relutância e demo-nos então um caloroso e prolongado abraço fraterno. A convite dele entrámos no edifício e depois de um trago de whisky John Walker Black que me ofereceu, senti-me mais relaxado para se conversar.

O ambiente era confuso e barulhento, alguns deles sentados cavaqueando com outros das mesas ao lado, à espera que o almoço lhes fosse servido, outros de pé, encostados ao balcão do Bar conversando em alta voz, pessoas entrando e saindo, mostrando falta de preconceitos e princípios pela maneira como se sentavam e se comportavam à mesa, fruto de terem andado longe da civilização na floresta da Guiné, durante aqueles anos todos.

Sentamo-nos os dois numa mesa mesmo no canto da sala, foi ele pessoalmente ao balcão, pediu duas cervejas fresquinhas. Falamos da nossa infância e dos familiares que se queixavam da falta de notícias dele desde que seguiu para estudar em França. Atentamente ia eu ouvindo o tecer da sua experiência no mato, satisfazendo a minha curiosidade com as perguntas que lhe fazia.

Fiquei sabendo que não desconhecia a minha presença na Guiné, não só do tempo militar assim como de empregado bancário. Que tinha sido aliciado e recrutado com a idade de 20 anos por Amílcar Cabral, para a luta de Libertação da Guiné e Cabo Verde. Que embarcou para Cuba e se formou na Escola Militar em Havana. Que no tempo do general Spínola foi ele quem numa das noites bombardeou Bissau com três misseis teleguiados disparados da Ponta de Cumeré. Carregava com ele um diário repleto de informações recebidas dos colaboradores do Partido.

Chegam mais elementos, identifiquei-os como cabo-verdianos e reconhecemo-nos como amigos de infância, alguns ex-colegas do Liceu Gil Eanes em S. Vicente, Cabo Verde:

  • Honório Chantre,
  • Silvino da Luz,
  • Júlio de Carvalho,
  • Osvaldo Lopes da Silva, etc.

Era um grupo que também queria exteriorizar a sua alegria pelo fim da guerra e a independência da Guiné, reconhecida por Portugal, aguardando a vez de também lhes ser servido o almoço logo após haver mesas desocupadas.

Reinou grande alegria entre todos nós pelo reencontro e amizade, rejuvenescida no momento. Foi bebida à vontade para quem quisesse, cerveja Sagres bem geladinha, goles de whisky Johny Walker com gelo, eram sobras da velha senhora deixadas aí a custo zero por aqueles que partiram.

Como petisco, ostras e camarões cozidos e temperados com molho de piri-piri forte, mancarra torrada sem casca, tudo para matar a sede e o suor que trazia aquele calor asfixiante. De Jure, não sabia absolutamente nada que fossem filiados no Partido como combatentes. Apenas se ouvia dizer que tinhajm saído à procura de trabalho no estrangeiro.

Quando regresso a casa para o meu almoço, encontro a minha esposa bastante preocupada, com os nervos à flor da pele, sem ainda saber do que se tratava. Teve ela um grande alívio quando pela primeira vez conheceu o primo Agnelo mas discretamente me consciencializou e me convenceu que devíamos deixar a Guiné para outras paragens onde pudéssemos cuidar da educação dos nossos filhos e viver com mais tranquilidade.

Durante algum tempo o primo Agnelo esteve em Bissau e mantivemos ótimas relações. A minha mulher passou a cuidar das roupas dele, com frequência se juntava-se a nós para o nosso rancho.

Depois seguiu para Cabo Verde e ocupou o cargo de Chefe das Forças Armadas Revolucionárias do Povo (FARP). Mais tarde foi Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas.

Hoje é reformado como Coronel do Exército cabo-verdiano e vive na cidade da Praia. Comunicamo-nos com frequência através da Net mas nunca voltámos a falar da guerra, águas passadas nao movem moinhos.

Antonio Cândido Medina


(Revisão / fixação de texto / negritos: LG)



(#) Nota biográfica baseada em A Semana, [Em Linha], 27 de janeiro de 2007. "Retratos: Agnelo Dantas, soldado de Cabo Verde", por Gláucia Nogueira



Agnelo Medina Dantas Pereira (foto acima)
Fonte: Casa Comum / Arquivo Amílcar Cabral, com a devida vénia)


(i) o pai é da Brava e a mãe de Santo Antão, nasceu nesta ilha em 1945;

(ii) em 1965, ainda com 19 anos, encontrava-se em Paris quando foi contactado por Pedro Pires, e depois por Cabral, e convidado a integrar "o grupo de estudantes e operários" que iria fazer um treino militar em Cuba;

(iii) chegou à ilha, depois de uma passagem pela Argélia, onde já se encontrava uma parte do grupo, formado por 30 homens e uma mulher; o chamado "grupo de Cuba” durante dois dois anos recebeu treino militar, com o objectivo de fazer "um desembarque armado em Cabo Verde";

(iv) “foram cerca de dois anos, isolados nas montanhas, ou em quartéis formados ad hoc, para nós. Foi muito exercício táctico, físico, até o dia do juramento - 15 de Janeiro de 1967 - quando Cabral se desloca a Cuba para se reunir connosco”, conta Agnelo Dantas, que diz, estarem, na altura, todos “prontos para o desembarque”;

(v) pouco tempo depois, com a morte de Che Guevara (em outubro de 1967), os cubanos têm a noção de que os seus serviços de informação estavam infiltrados, já que o próprio cerco a Che terá resultado desse facto; foi então adiada "sine die" a ida para Cabo Verde, e os militantes partiram para a União Soviética para complementar a formação;

(vi) ao longo de 1968, Dantas especializa-se em artilharia e explosivos; a ida para Cabo Verde ia ficando cada vez mais longínqua; para não ficarem indefinidamente inactivos é-lhes proposta, pela direcção do Partido, a ideia de ir para a Guiné;

(vi) tem o seu baptismo de fogo no início de 1969, quando foi aberta a Frente Leste; daí em diante e até 1974, ora ao lado de Nino Vieira, ora de Pedro Pires, participou em todas as frentes de combate, sempre no mato: primeiro, foi chefe de pelotão, depois chefe de bateria; e em 1973 já tinha o seu posto de comando, na Frente Norte;

(vii) depois do 25 de Abril e durante o período de transição para a independência de Cabo Verde, altura de intensa luta política e diplomática, foram trazidas armas da Guiné, "para qualquer eventualidade", sendo nessa altura que se começaram a formar as Forças Armadas cabo-verdianas: a 5 de Julho, de 1975, data da independência de Cabo Verde, "já tínhamos exército";

(viii) em 200, à data da entrevista, era coronel reformado das Forças Armadas de Cabo Verde, foi condecorado a 15 de janeiro de 2007 com a medalha da Estrela de Honra pelo chefe do Estado-Maior das FA (cargo que também ocupou);

(ix) tem página no Facebook: Agnelo Dantas.

2. Comentário do editor LG:

Esta é uma realidade, ignorada ou esquecida por muitos de nós... Na Guiné, no teatro de operações da Guiné, houve familiares e parentes que se combateram de armas na mão, em campos opostos, quer guineenses, quer cabo-verdianos...

Não chegou a ser o caso do nosso camarada António Medina, já que o primo Agnelo era mais novo (cerca de seis anos) e ainda devia estar em Paris (ou já a caminho de Cuba) (#), quando o primo António terminou a sua comissão em 1965 e regressou à vida civil, acabando por se fixar em Bissau e ingressar, como bancário, em 1967, no BNU...

Não temos (eu não tenho...) estatísticas sobre os cabo-verdianos que combateram de um lado e do outro... De qualquer modo, é interessante a referência do António à presença, nesse encontro com o primo Agnelo, em Bissau, em junho de 1974, de outros combatentes do PAIGC, de origem cabo-verdiano, ex-colegas do Liceu Gil Eanes, no Mindelo, em São Vicente... (Nomes sonantes ou pesos pesados do PAIGC como Honório Chantre, Silvino da Luz, Júlio de Carvalho, ou Osvaldo Lopes da Silva.)

No Liceu Gil Eanes, fundado no tempo da I Repúblcia, em 1917, com a designação de Infante Dom Henrique (que manteve até 1938), estudou Amílcar Cabral bem como a "elite portuguesa-cabo-verdiana". Até 1961 era o único estabelecimento de ensino secundário do arquipélago, e por lá passou praticamente toda a elite local...

Os mais afortunados, os filhos das famílias com posses, seguiam depois para a metrópole para prosseguir os estudos superiores na universidade, ou até para o estrangeiro (como fpoi o caso do Agnelo, que em 1965 era estudante em Paris). Eram os/as "m'ninos/as de São V'cente"...

(Fonte: Luís Batalha, investigador do ISCPS, autor do capº 6º ("A elite portuguesa cabo-verdiana: ascensão e queda de um grupo social intermediário") do livro coordenado por Clara Carvalho e João Pina Cabral, "A persistência da história. Passado e contemporaneidade em África" (Lisboa, ICS, 2004, pp. 191-225).


____________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 12 de junho de 2023 > Guiné 61/74 - P24390: O segredo de... (38): António Branquinho (1947-2023): Passei-me dos carretos... Perante a recusa dos helis em levaram os nossos dois mortos, puxei a culatra atrás da G3 e gritei: 'Levais os mortos ou… dou-vos um tiro nos c….!' (Acção Galhito, 22/6/1971, regulado do Cuor, sector L1)

(**) Vd. poste de 29 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14945: O segredo de... (19): António Medina (ex-fur mil, CART 527, 1963/65, natural de Cabo Verde, mais tarde empregado do BNU, e hoje cidadão norte-americano): Desenfiado em Bissau por três dias, por causa dos primos Marques da Silva, fundadores do conjunto musical "Ritmos Caboverdeanos"... Teve de se meter num táxi, até Teixeira Pinto, que lhe custou mil pesos, escapando de levar uma porrada por "deserção"!

(***) Vd. poste de 21 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12753: (De)caras (15): O meu primo Agnelo Dantas, e meu conterrâneo da ilha de Santo Antão, comandante do PAIGC, com quem me reencontrei no pós-25 de abril, em Bissau, era eu empregado bancário, no BNU - Banco Nacional Ultramarino (António Medina, ex-fur mil op esp, CART 527, Teixeira Pinto, 1963/65, a viver nos EUA, desde 1980)

quarta-feira, 15 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24145: Historiografia da presença portuguesa em África (359): "Notas Sobre o Tráfico Português de Escravos", por António Carreira, 2.ª edição revista; Universidade Nova de Lisboa, 1983 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Junho de 2022:

Queridos amigos,
Veja-se o pormenor da capa deste livro, parece objeto estranho, mas é peça em chapa de ferro espessa, destinada à prisão de escravos pelos tornozelos e pelos pulsos, simultaneamente. O indivíduo era obrigado a permanecer sentado, sem se poder levantar; a peça é provida de um fecho com chave, tem 35cm de comprimento, e é proveniente de Ouro Preto, pertence à coleção do Museu Nacional de Etnologia. No seguimento da primeira narrativa, estamos chegados agora à existência de companhias majestáticas, António Carreira encontrou documentação do maior interesse nos arquivos, refere os dois grandes mercados do tráfico, a Senegâmbia e Angola e a importância de Santiago, daqui "a mercadoria" partia para o Brasil e Cuba. Obra fértil em explicações quanto à importância da economia cabo-verdiana, a contabilidade das companhias majestáticas, ficamos a saber como era identificados os escravos, a conhecer os tipos de instrumentos de prisão, de tortura ou de humilhação, a dor maior virá na descrição dos tipos de castigos corporais, é arrepiante. Obra pioneira, é justo aqui realçá-la por ter aberto portas a estudos mais fundamentados para o conhecimento de aspetos do nosso colonialismo que permaneceram muito tempo na penumbra.

Um abraço do
Mário



Notas sobre a escravização, a pensar sobretudo na Senegâmbia (2)

Mário Beja Santos

O livro Notas Sobre o Tráfico Português de Escravos, por António Carreira, 2.ª edição revista, Universidade Nova de Lisboa, 1983, é obra pioneira. Estava esgotada a edição de 1977, havia muitas solicitações, as investigações sobre o comércio negreiro estavam em alta. Carreira adianta explicações: “Concordámos com a ideia da reedição até porque durante os últimos meses voltámos a frequentar com assiduidade os Arquivos Históricos do Ministério das Finanças e Ultramarino, fazendo pesquisas nos livros de contabilidade das Companhias monopolistas do século XVIII com vista a detetar novos elementos sobre o tráfico negreiro e o comércio em geral nas áreas de Cabo Verde, Cacheu, Bissau, Angola, Pernambuco, Maranhão e Pará (…) Por duas razões insistimos na análise do tráfico português: chamada de atenção dos estudiosos deste País para a necessidade de se ocuparem em trabalhos de investigação arquivística, para o que fornecemos pistas; tentativa de anular a alergia que eles têm manifestado a respeito do tema”.

O comércio negreiro feito por portugueses irá sofrer uma profunda alteração em 1755 com a criação da Companhia do Grão-Pará e Maranhão, que iria atuar numa área entre o Cabo Branco a Angola, limites que vieram a ser restringidos para a área entre o Cabo Branco e o Cabo das Palmas, limitação que tinha em vista a formação de uma outra empresa, a Companhia de Pernambuco e Paraíba, atuando no setor de Angola. Interessa-nos falar da primeira, António Carreira encontrou farta documentação sobre este tráfico e procura explicações para o seu reduzido volume: a existência entre grupos étnicos de cultura islâmica de um forte poder dos régulos, em particular dos Mandingas; o desvio de levas de escravos para os mercados do interior (no Senegal, no Mali, e zonas periféricas). É uma pertinente investigação, que ele assim remata: “A conclusão a tirar da análise da evolução do tráfico através dos tempos e dos sectores é de que foi a Angola a grande sacrificada. O sector Senegal-Serra Leoa gozou de verdadeiro privilégio. O território angolano sofreu uma sangria demográfica em benefício da América do Sul (em especial o Brasil) e central (Cuba)”. Mas também esclarece o seguinte: “Por reduzidos que tivessem sido os contingentes saídos dos rios de Guiné e de Cabo Verde, não podiam ser tão insignificantes. E se não tivéssemos levado a efeito o levantamento da contabilidade da empresa monopolista do século XVIII, pouco ou nada se podia apresentar”.

A posição portuguesa que fora de relevo no século XVI e até às primeiras décadas do século XVII não suportou a concorrência da Inglaterra, da Holanda e da França, que passaram a ter um papel dominante nesta área do Atlântico. E tece o seguinte comentário: “O nosso traficante era tímido e hesitante. Não se aventurava a empates de dinheiro a médio ou longo prazo. Tanto na Inglaterra como na Holanda as casas reinantes e a alta finança investiam no tráfico e em navios para o corso. O século XVII marcou a viragem para a formação de companhias fortemente apetrechadas, destinadas aos tratos e aos resgates. A situação na Guiné e em Cabo Verde continuou a piorar e levou à formação da Companhia de Cacheu, Rios e de Comércio da Guiné, mal terminou o prazo concedido a esta empresa foi criada a Companhia do Estanco, do Maranhão e Pará, empresa que foi muito mal recebida. Anos volvidos é formada outra empresa, a Companhia de Cacheu e Cabo Verde”.

O investigador António Carreira analisa um conjunto de fenómenos sociopolíticos e económicos suscitados pelo aparecimento do ouro e de diamantes no Brasil, que vai criar um entusiasmo entre os portugueses para ali irem viver, e disserta sobre as relações económicas entre a colónia brasileira e Lisboa. Os dados que compulsou permitiram-lhe apresentar dados sobre os escravos comprados pela Companhia do Grão-Pará e Maranhão, o papel económico desempenhado pela urzela de Cabo Verde, os panos de algodão produzidos nas ilhas de Cabo Verde, a natureza de subsídios, donativos e outras taxas, as alcavalas cobradas na última fase do tráfico e assim chegamos à marcação a ferro quente dos escravos. Escreve Carreira: “Numa primeira fase a marcação tinha por finalidade principal a identificação dos escravos pertencentes à Coroa, fossem eles adquiridos, fossem recebidos em pagamento de direitos ou de rendas pelos contratadores. Poucos anos depois, os contratadores, para não serem defraudados, passaram igualmente a marcar os seus escravos”.

Refere também a identificação dos escravos, e desperta-nos para alguns aspetos curiosos quanto a designações:
“Adultos: cabeça; peça; marfim ou ébano de Guiné; escravo ou negro lotado; escravo ou negro com ponta de barba; escravo ou negro boçal; escravo de grilhão; escravo mulato; escravo mascavo ou mascavado.
Adolescentes: moleque ou moleca; moleque ou moleca lotado; molecão ou molecona; molecona de peito atacado (a que tivesse os seios bem formados); mocetão ou mocetona.
Crianças: minino; cria de peito; cria de pé (a que anda).
Peça-de-Índia definia o escravo jovem, alto, robusto e sem defeitos físicos. Em época adiantada do tráfico, usou-se a bitola de 1,75m de estatura para designar a peça-da-Índia.
Escravo ou moleque lotado era aquele que, pela sua compleição física, podia fazer parte de um lote para efeito de venda.
Escravo barbado ou com ponta de barba correspondia ao adolescente com barba bem formada. Era já homem.
Escravo boçal era todo aquele que não se soubesse expressar em crioulo ou português, e não tivesse ainda sido submetido à catequese e batismo.
Escravo ladino era o escravo esperto que se fazia compreender facilmente em crioulo ou português, ou que tivesse alguma profissão ou ofício.
Escravo de grilhão era todo aquele que tivesse sido alguma vez castigado com a pena de prisão com grilhão nos pés.
Escravo mulato correspondia ao produto de mestiçagem de sangue entre homem branco e mulher preta ou mesmo de pais mestiços.
Escravo fujão era aquele que tivesse propensão para fugir ao trabalho ou à tutela do seu senhor.
Escravo mascavado era aquele que possuísse aleijão ou deformidade física.”


Carreira também nos dá uma lista de tipos de instrumentos de prisão, é uma lista horrível, inclui instrumentos de tortura, de prisão ou de humilhação, devem ter sido copiados e aperfeiçoados os modelos usados pela Inquisição. Esta lista de castigos corporais merece a Carreira bastante detalhe, custa ler tanta violência, tanta severidade e tanta desumanidade.

É vasta e muito útil a bibliografia que António Carreira anexa sobre o tráfico português de escravos. Obra pioneira pois, é justo relembrá-la pelo timbre de rigor e a abertura que deu a novas investigações.

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Nota do editor

Último poste da série de 8 DE MARÇO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24129: Historiografia da presença portuguesa em África (358): "Notas Sobre o Tráfico Português de Escravos", por António Carreira, 2.ª edição revista; Universidade Nova de Lisboa, 1983 (1) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23871: Notas de leitura (1531): Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 29 de Abril de 2020:

Queridos amigos,
O guevarismo e o seu foco insurrecional veio a revelar-se uma aplicação desastrosa da guerrilha na Américas do Sul e Central, era uma conceção desinserida de um processo histórico de alianças de classe e de forças ditas contestatárias que agiam taticamente, incapazes de pegar em armas - daí os falhanços na Colômbia, na Venezuela, no Uruguai, na Bolívia. Amílcar Cabral declarou um dia que encetara o processo revolucionário na Guiné só conhecendo uns rudimentos da maoismo, contudo, como está historicamente comprovado, instituiu uma teoria e uma prática revolucionárias ajustadas às aspirações de população que não se identificava com a potência colonial, cuja presença, aliás, era muito frágil. Cabral teve suficiente astúcia para nunca se confrontar com as teorias cubanas, Guevara e Fidel Castro admiravam-no e Cuba, como é de todos sabido, apoiou a luta armada na Guiné. Cabral também não se impressionou muito com o foco insurrecional, apostou na longa duração e numa possível boa simbiose entre a população e os guerrilheiros. Revelou-se um marxista flexível, embora intransigente na ditadura da direção política; jamais se pronunciou a favor de um futuro desenvolvimentista para a Guiné assente na ajuda humanitária, aspirava a uma agricultura próspera como matriz do desenvolvimento, queria que a Guiné não sobrevivesse à custa de dádivas, sem contestar que recebera apoio da cooperação. Foi um teórico que conduziu até às últimas consequências o processo de independência e estabeleceu balizas, sobretudo na fase inicial, desde o segundo semestre de 1962 até ao processo de consolidação de 1964, para os atos de terror e de intimidação, conhecia as etnias e as suas cumplicidades e nunca ignorou que o PAIGC não podia contar com os Fulas, conhecia muito bem as razões históricas da aliança entre os Fulas e os portugueses.

Um abraço do
Mário



Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (2)

Mário Beja Santos

É do senso comum que a luta armada desencadeada pelo PAIGC obedecia a uma estratégia de guerrilha. É um dado curioso como se aborda amiúde este fenómeno nacionalista sempre no enquadramento de descolonização, passando-se, de um modo geral, ao lado dos pontos concordantes e discordantes do pensamento de Cabral com outras estratégias de guerrilha.

Gérard Chaliand, porventura o principal historiador francófono dos movimentos revolucionários à escala mundial, e que acompanhou Cabral no interior da Guiné em 1966, escrevendo depois uma obra no ano seguinte, para além de artigos, releva os fatores históricos das guerras populares na época contemporânea: a crescente intervenção dos camponeses na luta armada (como força combatente ou infraestrutura política clandestina ou local de abastecimento); o facto de a luta passar a dispor de uma vanguarda ideológica mobilizadora orientada pela coesão, disciplina e espírito de sacrifício. Não se pode contestar a importância do pós-II Guerra Mundial, que operou ruturas de equilíbrio entre as grandes potências e que fez despertar nacionalismos, muitos deles em estado latente. Há que ter em conta o gradual desaparecimento dos impérios europeus, as elites nacionalistas iam amadurecendo as vias mais adequadas para chegar ao poder e gerar novas pátrias. Havia populações amadurecidas para a insurreição e houve diferentes modos de encarar a guerrilha. Como se observou no texto anterior, Che Guevara, após a tomada do poder em Havana, não escondia a sua inquietação quanto à necessidade de fazer a disseminação revolucionária do continente. Outro pensador revolucionário, Frantz Fanon, talvez dominado pela guerrilha de cariz sanguinário que se desenvolveu na Argélia, era apologista do ferro e fogo, a qualquer preço.

Em 1974, portanto numa fase já muito amadurecida do quadro das independências em África e na Ásia, Régis Debray passou a escrito a sua análise sobre as lutas armadas da América Latina, fixou-se em grandes atores como Fidel Castro, Che Guevara e Salvador Allende, procedeu a um balanço crítico desses fenómenos revolucionários ou subversivos que ocorreram na Venezuela, em Cuba, na Bolívia ou no Chile. Nunca escondendo a sua admiração pelo guevarismo, preocupou-se em refletir sobre as razões que conduziam a uma revolução nacional vitoriosa, nunca esquecendo a China, o Vietname e Cuba. Dissecando as classes médias da América do Sul e Central, foi-lhes encontrando mais intenção do que determinação pela luta armada, com a agravante que os partidos comunistas, no período estalinista, eram única e exclusivamente incentivados a trabalhar para que se formassem governos de unidade nacional. É nesse contexto que Debray enuncia metodicamente as razões para o triunfo cubano, não desvaloriza a vanguarda constituída por elementos da classe média, mas que souberam doutrinar os agrupamentos da guerrilha e a boa comunicação que estabeleceram com os grupos camponeses.

Medindo cuidadosamente a estratégia desencadeada em Cuba, recorda que num quadro de desigualdade inicial nas relações de forças entre o exército regular e a guerrilha, havendo que incorporar progressivamente a população na luta, é fundamental preparar os militantes para um combate longo, para o tempo que for preciso, saber definir a retaguarda, atender rigorosamente à natureza do terreno, e no caso de Cuba perceber que era uma ilha, de onde não se punha qualquer eventualidade de atravessar fronteiras. Daí a importância do estabelecimento de bases, sem o caráter de fixação, de programar ações num contexto de descontinuidade operacional, nunca descurar a questões ideológica, adotando uma teoria de organização e estabelecer as regras de uma democracia revolucionária.

Não é para aqui chamada a narrativa do processo histórico que levou este movimento revolucionário cubano até à definição do Partido Comunista. O pano de fundo é tentar perceber o que distinguiu Amílcar Cabral dos outros teóricos. E não será pura casualidade que Gérard Chaliand na sua obra monumental Estratégias da Guerrilha, Payot, 1994, distinguir a intervenção de Cabral na Conferência Intercontinental de Havana, em 1966, como o contributo mais original, senão o único contributo original daquelas décadas sobre a estratégia revolucionária dos movimentos de libertação, e sobretudo o papel da pequena burguesia. Perante uma assembleia que aos poucos ficou boquiaberta, Cabral começou por dizer que a maneira mais eficaz de criticar o imperialismo é pelas armas, desde que a motivação ideológica se insira perfeitamente num povo que aceita fazer a causa libertadora de ter que pegar em armas para expulsar a potência colonial. Numa linguagem frontal, Cabral referiu nessa intervenção que passou à história com o título da arma da teoria de que um revolucionário deve saber lutar contra as suas próprias fraquezas, e uma delas poderá ser a falta total de ideologia de um movimento de libertação nacional. E por isso propõe-se contribuir para o debate sobre os fundamentos que os objetivos da libertação nacional em relação à estrutura social. Questiona o conceito de luta de classes e não esconde os equívocos que ele comporta, esquecendo povos que por razões históricas não evoluíram para quadros de industrialização. Não se pode iludir o papel da pequena burguesia, ela é fulcral tanto na situação colonial como pós-colonial. Há segmentos da pequena burguesia que aderem ao chamamento revolucionário enquanto outros se mantêm aliados, talvez com a ilusão de que estão a defender a sua situação social, ao colonialismo. E faz comentários proféticos, observando que a situação neocolonial, que exige a liquidação da pseudoburguesia autóctone para que se realize a libertação nacional, dá também à pequena burguesia a oportunidade de um desempenho decisivo na luta pela liquidação do domínio estrangeiro. Enfatiza o papel desta pequena burguesia na situação neocolonial, ou ela possui consciência revolucionária e a capacidade de interpretar fielmente as aspirações das massas nas sucessivas fases da luta, identificando-se cada vez mais com elas, ou aceita o aburguesamento. E diz abertamente que a pequena burguesia revolucionária deve ser capaz de se suicidar como classe ou então trair a revolução, tornando-se cúmplice de um qualquer processo neocolonialista, cada vez mais distante das profundas aspirações populares.

Cabral, como veremos no próximo e último texto, deliberou, a partir de 1959, que o PAIGC entrava num processo de clandestinidade, com subversão interna conducente à preparação de quadros militares, com uma direção no exterior apta a dar formação, a acolher os novos quadros militares e a consciencializá-los para a natureza da luta armada que se avizinhava, a obter apoios internacionais, e gradualmente instalar a subversão em zonas do território extremamente ásperas para a mobilidade das tropas regulares. O que veio a acontecer, como Gérard Chaliand comprovou no terreno, em 1966.

(continua)

Amílcar Cabral, Maria Helena Rodrigues e a sua filha Ana Luísa Cabral, 1964
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Nota do editor

Poste anterior de 5 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23848: Notas de leitura (1528): Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 9 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23859: Notas de leitura (1530): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (7) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23848: Notas de leitura (1528): Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 28 de Abril de 2020:

Queridos amigos,
O assunto não é de sua menos importância, as estratégias de guerrilha, ao tempo em que foram desencadeadas pelos nacionalistas das colónias portuguesas, tinham como referência o Vietname, a Argélia, Cuba; havia o contexto ideológico, podemos falar nos fatores históricos destas lutas pela independência, o papel dos camponeses e agricultores sem terra, a organização da vanguarda ideológica mobilizadora e o imperativo da sua coesão, a ligação do guerrilheiro às populações. Quem conduzia essas lutas armadas tinha consciência de que o fim da II Guerra Mundial trouxera a rutura de equilíbrios, que houvera guerrilha na própria Europa, caso da Jugoslávia e da Albânia, e os impérios coloniais europeus estavam em desagregação. Havia que saber conduzir a guerra revolucionária, Guevara tornou-se uma referência, tal como Frantz Fanon. Acontece que Amílcar Cabral tinha uma tipologia sobre a condução da luta, a organização da guerrilha e as finalidades da luta de libertação um tanto distintas do que Guevara e Fanon propuseram. É a contextualização dessas concordâncias e divergências que aqui se ponderam para se avaliar como o pensamento revolucionário de Cabral se ajustou à realidade da luta que conduziu.

Um abraço do
Mário



Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (1)

Mário Beja Santos

Para se situar o conceito de guerrilha preconizado por Guevara, e mais adiante pô-lo em confronto com a estratégia de Amílcar Cabral aplicada à Guiné, e tentar medir a distância que separou os modos de aplicação preconizados pelos dois revolucionários, é indispensável procurar enquadrar as condições de lugar em que ocorreu a revolução cubana e um pouco mais adiante se forjou a luta armada na Guiné colonial. O território cubano parecia adverso à guerrilha, o tempo era-lhe favorável, mudara a relação de forças à escala mundial no então designado “campo socialista”. Quando os EUA bloquearam Cuba, subtraindo-lhe energia, matérias-primas, peças de substituição para os tratores, trigo e sabão, a URSS estava em condições, mesmo que estivesse posto numa linha vermelha da chamada coexistência pacífica, de apoiar Cuba. Como escreveu Régis Debray, um acérrimo defensor da doutrina guevarista, e que a impulsionou com o conceito de foco, vivia-se um período fasto para o socialismo. A doutrina estalinista fora posta no sótão, não era imperioso a defesa do “socialismo num só país”, análise que bloqueara a generalidade dos partidos comunistas das Américas do Sul e Central. Nikita Kruschev abraçou as causas do Terceiro Mundo, estamos num período de afundamento dos sistemas coloniais, é o tempo de vitórias na Indochina e na Argélia, há ainda repercussões das conferências de Bandung e de Belgrado, o Sputnik e Gagarin eram vedetas – foi assim o período entre 1956 e 1962, a cisão entre a China e a URSS ainda não provocou mossas monumentais, o socialismo parece estar na ofensiva no mundo ocidental; Kennedy e o desastre da Baía dos Porcos não estavam esquecidos, este quadro idílico só se alterará com a crise dos mísseis, que custará a prazo o afastamento de Kruschev, mas a linha dita de apoio ao movimento revolucionário, a partir de Moscovo, a que se juntava o apoio do apoio incondicional de Pequim ao fim do colonialismo na Ásia e na África manter-se-á.

Guevara deixou um apreciável número de escritos, logo as recordações da guerra revolucionária, tinha a sua própria interpretação do que tinha sido a guerrilha em Cuba, desde o falhanço de Moncada, analisa toda a progressão da guerrilha de 1957 até à entrada em Havana em janeiro de 1959. E tece comentários que podem ser úteis para as concordâncias e divergências com a atuação de Amílcar Cabral. Ele cola a palavra guerrilheiro à luta cubana, a palavra guerrilheiro era símbolo de um desejo de liberdade, e apreciava a revolução cubana pela sua ação libertadora, propulsora da reforma agrária. O exército de guerrilha, exército popular por excelência, era constituído por indivíduos virtuosos, disciplinados, ágeis, física e mentalmente. O guerrilheiro deve procurar esgotar o inimigo, desmotivá-lo, fazê-lo perder a tranquilidade. Para que a tática resulte, o conhecimento do terreno deve ser perfeito, ter um conhecimento rigoroso da aproximação e da retirada, do esquema ofensivo e defensivo do inimigo. O guerrilheiro é um reformador social, pega nas armas contra a opressão, reclama uma pátria e a mudança de regime social e económico, é um intérprete das aspirações da grande massa camponesa.

Guevara pronuncia-se igualmente sobre o método guerrilheiro, lembra a diversidade de aplicações na Ásia, na África e nas Américas, discreteia se o método da guerrilha é a única fórmula para a tomada do poder em toda a América e põe uma questão muito dura se a revolução cubana poderá sobreviver se o movimento revolucionário não se expandir pelas Américas. Na esteira de outras correntes revolucionárias, refere a necessidade da classe operária, observa que a América vivia num estado de equilíbrio instável entre a ditadura das oligarquias e a pressão popular. Tanto ele como Régis Debray não esconderão a sua profunda desilusão com o comportamento seguidor do estalinismo da generalidade dos partidos comunistas das Américas. Vaticina uma luta longa e sangrenta no continente americano, haverá numerosas frentes, custará muitas vidas. Está plenamente convicto da vitória, as burguesias nacionais estavam mancomunadas com o imperialismo. Em dado passo, Guevara dá o parecer que o crescimento do mercado comum europeu iria acarretar o desenvolvimento de contradições fundamentais, acentuar mesmo a eclosão da luta americana, e refere que há já indícios seguros na Venezuela, Guatemala, Colômbia, Peru e Equador. Curiosamente, não fala na Bolívia, em cuja guerrilha se inseriu, em 1965, e onde foi assassinado, dois anos depois.

Guevara sentia-se na obrigação de procurar sistematizar a experiência cubana e o processo revolucionário cubano, definindo o cânon do guerrilheiro e a estratégia de guerrilha. Em tudo quanto escrevia deixava claro que a revolução cubana era o simples prelúdio da onda revolucionária que iria varrer todo o continente latino-americano. Dava como certo e seguro que as forças seculares podiam ganhar uma guerra de guerrilhas contra um exército institucional; que nem sempre se podem esperar todas as condições para a revolução, poderá ser imperativo criar um foco insurrecional e o terreno da luta armada deve ser fundamentalmente o campo. Nunca perde de vista a crítica à inoperância dos partidos comunistas e depois detalha o princípio, o desenvolvimento e o fim da guerra de guerrilhas: “No início há um grupo mais ou menos armado, mais ou menos homogéneo, que se dedica quase exclusivamente a esconder-se nos lugares mais agrestes, mantendo raros contatos com os camponeses, esse núcleo de guerrilheiros pode viver isolado, embrenhado na mata, mas a luta não pode avançar sem o apoio dos camponeses, daí o papel determinante do trabalho político”. E enfatiza de novo o guerrilheiro como um reformador social. Nos seus escritos, Guevara não ignora a existência de contradições na massa dos agricultores e camponeses, a propriedade da terra, a existência de oligarcas possuidores de grandes propriedades, o que gera aproximações interclassistas e interdependências que podem fazer hesitar a massa de agricultores e camponeses em aderir à guerrilha.

Também os seus escritos fazem uma clara apologia ao internacionalismo, e observa que o imperialismo é um sistema mundial, a última etapa do capitalismo, por isso é preciso derrotá-lo numa grande confrontação mundial. Todos os estudiosos do guevarismo não iludem que Che tinha plena consciência que a revolução cubana não poderia permanecer isolada. O seu confronto com os partidos comunistas latino-americanos foi extremamente duro. Ainda preponderava a sombra de Estaline que dava como seguro que os países latino-americanos pelo seu atraso precisavam de modelos de governação de unidade nacional, Guevara achava-os cristalizados, totalmente incapazes de detonar focos insurrecionais, por estrita obediência a um princípio estalinista que já estava no caixote do lixo da História. Guevara também não iludia o princípio marxista do proletariado, respondendo que o camponês era o verdadeiro agente revolucionário, o que contrariava o que Marx dissera, que o camponês constituía uma “massa de produtores não envolvidos diretamente na luta entre capital e trabalho”. Guevara reconhecia as diferenças existentes sobretudo naqueles países com grandes centros urbanos, como era o caso do Brasil, da Argentina, Chile e Uruguai. Mas Guevara não aceitava a necessidade de haver guerras de guerrilha diferenciadas, postulava que a influência ideológica dos centros urbanos inibe a luta guerrilheira e incentiva as lutas de massas organizadas pacificamente, isto para regressar à ideia de que se devia contar com uma guerrilha de camponeses.

Como é evidente, Guevara cometeu inúmeros erros de apreciação da realidade socioeconómica e cultural dos países latino-americanos, esteve no Congo a procurar estimular focos insurrecionais, foi um fracasso total, encontrou-se em Conacri com Amílcar Cabral, não há documentação de Cabral sobre tudo o que se passou nesse encontro, mas que teve resultados promissores. Primeiro, Guevara considerou Cabral o único dirigente revolucionário com consistência e linha organizativa bem delineada. Cabral pediu apoio a Cuba e recebeu. Em 1966, em janeiro, na cidade de Havana, Amílcar Cabral exporá as linhas norteadoras do movimento revolucionário que dirige, incomodará muita gente quanto ao conceito de luta de classes e ao significado do proletariado. Fidel Castro admirou a ousadia da exposição de Cabral. Passeiam-se por Cuba, garante-lhe mais apoio. Será em Cuba que se irão formar os cabo-verdianos que era suposto promoverem a luta armada no arquipélago. Tal não aconteceu, mas esse grupo cabo-verdiano irá ser determinante em território guineense.

(continua)

Che Guevara no Congo
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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23840: Notas de leitura (1527): "Uma longa viagem com Vasco Pulido Valente", de João Céu e Silva (Lisboa, Contraponto, 2021, 296 pp) - O Estado Novo, a guerra colonial, o Exército e o 25 de Abril (Luís Graça) - Parte VI: 25 de Abril ? 25 de Novembro ? E descolonização ? Acho que consigo compreender tudo no caso português. Isto parece uma gabarolice, mas não é. A mim, não há nenhum acontecimento que me cause perplexidade" (VPV)

quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22450: Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo (António Graça de Abreu) - Parte XIV: Havana, Cuba, 2018



Foto nº1 


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4


Foto nº 5


Foto nº 6

Cuba > Havana > 2018 >

Texto e fotos recebidos em 31/7/2021


1. Continuação da série "Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo" (*), da autoria de António Graca de Abreu [, ex-alf mil, CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74.

Escritor e docente universitário, sinólogo (especialista em língua, literatura e história da China); natural do Porto, vive em Cascais; é autor de mais de 20 títulos, entre eles, "Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura" (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp); "globetrotter", viajante compulsivo com duas voltas em mundo, em cruzeiros. É membro da nossa Tabanca Grande desde 2007, tem mais de 280 referências no blogue.


Havana, Cuba, 2018


Chego a Cuba, cento e cinquenta anos depois de Eça de Queirós [ Foto nº 6 ]. O nosso romancista foi cônsul em Havana em 1872, por aqui defendeu, como pôde, os direitos dos culies, trabalhadores vindos da China através de Macau com documentos portugueses, quase reduzidos a escravos, impiedosamente explorados por fazendeiros cubanos nas plantações de cana-do-açúcar.

Estamos agora em 2018 , tenho apenas onze dias para me embeber nos fascínios da ilha caribenha [ Foto nº 4 ]. Nos Jardines de la Tropical, pétalas humedecidas por lágrimas de orvalho. Na Plaza de la Revolucion, memórias difusas de recuados tempos, Che Guevara [ Foto nº 1 ], Fidel, o vazio e espinhos à solta.

Foi lindo, trágico, heróico o início da revolução, mas hoje, passados tantos anos, vejo o povo cubano abúlico e entristecido. Ah, mas haverá um fogo lento, cadeias a rebentar, Cuba Libre, a pátria e a liberdade. Hasta la victoria, siempre|


Julián Moreno, meu motorista de táxi -- um carro apanhado ao acaso na rua [ Foto nº 2 ].--, não pára de falar, de me contar histórias. A sua esposa, psicóloga, ganha 25 euros por mês, o cunhado, médico enviado para o Brasil, deve entregar grande parte do salário pago pelos brasileiros ao Estado socialista cubano, ele próprio -- Julián a quem foi distribuído este táxi, um Lada com dez anos, made in Polónia --, quanto a receitas, necessita de fazer balanços diárias e semanais com o organismo estatal dos táxis, o que acontece falsificando dados, para seu proveito e proveito de todos.

Com o acenar dos dólares obtidos com os turistas, alguns dinheiros deslizam também, de forma subreptícia, para os bolsos dos funcionários estatais que controlam o seu trabalho de taxista. Na conversa, o rapaz não é assim tão explícito, mas as meias palavras explicam tudo. Ai, o socialismo, ai o velho Marx!

Julián Moreno leva-me à casa de Ernest Hemingway [ Foto nº 5 ] , a Finca La Vigia, num alto sobranceiro a Havana, com vista sobre a cidade, comprada pelo escritor norte-americano em 1939. Hemingway aqui viveu, intermitentemente, até 1959 e adorava Cuba. Nesta casa escreveu O Velho e o Mar. Todos os espaços, os quartos, a biblioteca, a cozinha estão bem conservados e consegue-se adivinhar, pairando no ar, a imponente figura de Hemingway. Gostava de ter tido a sorte de o encontrar, mas o escritor partiu em 1961, suicidando-se com um tiro na cabeça, desgostoso com a vida e com o mundo.

[ Imagem à esquerda, capa de  O velho e o mar / Ernest Hemingway ; trad. e pref. Jorge de Sena ; il. Bernardo Marques ; rev. Arnaldo de Carvalho. - Carnaxide : Livros do Brasil, 2013. - 108 p. ; 21 cm. - Tít. orig.: The old man and the sea. - ISBN 978-989-711-003-0].  [ Fonte: Porbase, com a devida vénia]. 


Depois a Habana Vieja, delapidada pela passagem de tempos atribulados. Fantástica cidade, com um extraordinário recheio de edifícios antigos, igrejas, teatros, palácios, alguns restaurados, outros degradados, a cair. As gentes afáveis e simpáticas inventando mil artifícios para ganhar alguns dólares e sobreviver, teatro de rua, saltimbancos e palhaços, pinturas naif e artesanato, a Bodeguita del Medio para beber um mojito, os coloridos carros antigos, presos por arames, atilhos e cordéis, os Buicks, os Dodges, os Studbakers, os Chevrolets, os Pontiacs dos anos cinquenta do século passado para passear ao ritmo da salsa cubana.

Não muito interessante o Malecon, ainda por cima à chuva. Uma longa marginal atlântica sem graça, a cidade maltratada junto ao mar, com imensos edifícios abandonados há décadas, tudo a precisar de reconstrução, reordenamento urbano, de mais cor e alegria.

No meu terceiro dia em Havana, Julián, o rapaz do táxi, leva-me para a praia de Santa Maria del Mar [ Foto nº 4 ], numa viagem curta, uns trinta quilómetros desde a capital. Vou ao banho nas águas quentes dos mares cubanos. Depois, tosto-me ao sol, de papo para o ar. 

Aparece uma mulher jovem, de curvas ondulantes, bonita, anicha-se na areia, senta-se ao meu lado. Pergunta-me: Como te llamas? Respondo em português: Meu nome é ninguém. Adios, Señora! 

Dama de pouca virtude, a mulher descruza as pernas, alteia ainda os seios avantajados num biquíni reduzido, sorri e continua a sua caminhada. Adeus, princesa cubana!

No vazio da tarde, vou com a espuma do mar e o voo dos pássaros.
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Nota do editor:

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19224: (D)o outro lado do combate (38): Carta de Lourenço Gomes, datada de Samine, 3 de março de 1965, dirigida a Luís Cabral, expondo a dramática situação da farmácia do PAIGC (Jorge Araújo)



Citação: (1960-1961), "Osvaldo Vieira, Constantino Teixeira, Lourenço Gomes e Armando Ramos em Conakry", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43591 (2018-10-26), com a devida vénia. [Há um quinto elemento, na ponta direita, que está por identificar]


Fonte: CasaComum, Fundação Mário Soares. Pasta: 05222.000.084. Título: Osvaldo Vieira, Constantino Teixeira, Lourenço Gomes e Armando Ramos em Conakry. Assunto: Osvaldo Vieira, Constantino Teixeira, Lourenço Gomes e Armando Ramos junto ao Secretariado Geral do PAIGC [A Direcção geral do PAIGC instalou-se em Conakry no mês de Maio de 1960]. Data: 1960-1961. Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Fotografias.



Jorge Alves Araújo, ex-Furriel Mil. Op. Esp./RANGER, 
CART 3494 (Xime-Mansambo, 1972/1974); coeditor do blogue



GUINÉ: (D)O OUTRO LADO DO COMBATE > 

OS PROBLEMAS DO PAIGC NA LOGÍSTICA DE SAÚDE EM 1965 > ENTRE A LUCIDEZ E O DESESPERO DE LOURENÇO GOMES, RESPONSÁVEL PELA ÁREA DA SAÚDE NA FRENTE NORTE


1. INTRODUÇÃO

Porque a curiosidade se mantém, definida como interesse pessoal no aprofundamento da temática em título, volto de novo ao fórum para partilhar convosco mais uma pequena investigação concluída a partir das últimas narrativas tendo por questão de partida a «Logística nas evacuações dos feridos do PAIGC na Frente Norte». 

A primeira abordou o modo como se organizava o transporte dos guerrilheiros feridos no trajecto desde o interior do território [Região do Oio] até ao hospital de Ziguinchor, no Senegal – P18848, e a segunda descreveu o "protocolo" utilizado (o possível em função dos recursos) nas intervenções cirúrgicas na base do Sará – P19129.

Em ambos os casos, as narrativas foram reforçadas com imagens obtidas pela câmera do médico holandês Roel Coutinho, clínico que durante os anos de 1973/1974 cooperou com a estrutura militar do PAIGC em diferentes bases da região Norte, quer no apoio aos combatentes quer na ajuda humanitária às populações sob o seu controlo.

Recuando na fita do tempo até Março de 1965, dois anos após a guerrilha ter iniciado a luta armada em Tite (Janeiro de 1963), os dirigentes do PAIGC batiam-se com grandes dificuldades logísticas em todos as frentes, com destaque para a área da saúde. Para além da inexistência de estrutura clínica adequada, e qualificada, onde não era possível garantir qualquer consulta, prescrição ou tratamento em tempo útil a cada paciente, conceitos que fazem parte dos actos médicos, a falta de medicamentos necessários para cada uma das enfermidades era gerida com "pinças", por serem escassos e incertos. A forma mais comum de os obter era através do recurso ao endividamento, com compras a crédito (requisições), particularmente no circuito comercial (farmácias) existente nos locais mais próximos dos hospitais do PAIGC situados em Ziguinchor (Senegal), Koundara e Boké (Guiné-Conacri). [Vd. mapa a seguir.]




Porque esta situação se agravava/degradava diariamente, por efeito do crescente aumento do número de baixas - feridos e mortos - resultantes das actividades operacionais contra as NT, foram lançados diversos apelos a "Comités de Solidariedade" internacionais, incluindo as organizações da Cruz Vermelha, solicitando apoios urgentes nesta área, como provam os exemplos identificados no ponto 4.

2. ANTECEDENTES


Já em Julho de 1964, em documento elaborado por Lourenço Gomes, a quem tinha sido atribuída a incumbência de supervisionar as actividades do PAIGC na Frente Norte, enviado a Amílcar Cabral, aquele dava conta da estatística relacionada com os feridos e doentes existentes naquela zona sob a sua responsabilidade (ver quadro abaixo). 









Citação: (1964), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_35644 (2018-10-26), com a devida vénia.
Fonte: CasaComum, Fundação Mário Soares. Pasta: 07071.123.063. Assunto: Medicamentos. Enfermaria. Entrevista com Senghor. Prisão de Seco Camará. Em anexo: número de feridos e doentes em Casamansa e comunicado de guerra, assinado por Lourenço Gomes, referente ao dia 2 de Julho de 1964. Remetente: Lourenço Gomes, Samine [Frente Norte]. Destinatário Amílcar Cabral, Secretário-Geral do PAIGC. Data: Domingo, 12 de Julho [Agosto?] de 1964. Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios IV 1963-1965. Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral.




Anexo 1 - Relação de doentes



Anexo 2 - Comunicado de guerra de  2/7/9164[, em vez do esperado extrato conta-corrente do mês de junho de 1964]


3.  CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO EM MARÇO DE 1965


Em função das responsabilidades que lhe estavam atribuídas e perante as dificuldades em encontrar soluções para os diferentes problemas que lhe iam surgindo no âmbito das suas múltiplas actividades, tomou a iniciativa de caracterizar a situação em missiva enviada a Luís Cabral [Bissau; 1923 – Torres Vedras, 2011].

Eis o conteúdo da carta enviada de Samine (Senegal) por Lourenço Gomes, em 3 de Março de 1965 [conforme original reproduzido abaixo].

"Caro camarada Luís Cabral. Saudações combativas.

Esta carta é para lhe explicar as dificuldades que passo aqui na fronteira [Norte].

Se eu fosse uma pessoa que sofresse do coração, decerto já teria morrido; não só pelas dificuldades que se me apresentam, mas sim, e mais ainda, por presenciar todo o sofrimento que o nosso Povo passa nos Hospitais do Senegal, sem ter meios com que os possa valer, pois desde Dezembro do ano passado [1964] até à presente data, não tenho em mão a minha situação financeira, pois sempre o dinheiro para ocorrer às despesas, chega tarde e incompleto.

Bem sei que temos de lutar com dificuldades e admiro mesmo como a Direcção do nosso Partido, tem-nas conseguido superar até aqui. Reconheço isso tudo, mas o que me entristece é receber, em vez de palavras de encorajamento, recriminações desanimadoras.

O camarada Aristides [Pereira; Cabo Verde; 1923 – Coimbra; 2011], numa das últimas cartas que me escreveu, dizia-me que para um responsável não pode haver impossíveis. Devem levar em consideração que na fronteira Sul há um responsável em Koundara, um em Gaoual e ainda outro em Boké, ao passo que para esta fronteira toda sou eu o único responsável.

Os encargos são muitos, os trabalhos e canseiras sempre maiores cada dia que passa e os impossíveis têm de surgir, pois mesmo o carro não poderá trabalhar sem gasolina e esse só se consegue com dinheiro ou tendo as contas sempre em dia.

Na carta que escrevi ao camarada Aristides, pedia-lhe que me arranjasse um outro responsável, para qual o impossível não exista, para me substituir, porque confesso com toda a franqueza, que já estou cansado. Informei-lhe sobre as dívidas que temos a liquidar, principalmente na Farmácia, mas nem sequer obtive resposta sobre o assunto.

Estou sujeito a ser preso dum momento para o outro, pois o proprietário da Farmácia, constantemente me manda cobrar.

A minha situação é semelhante a de um náufrago, que já cansado de nadar e com as forças esgotadas se deixa morrer. Assim também, não será de admirar e até será muito possível o ter de qualquer dia abandonar o meu lugar, sem esperar ordens superiores, não significando isso falta de respeito ou disciplina, mas sim, só saturação e canseira até ao esgotamento.

Recebi pelo camarada Bicho, todos os recados de que lhe incumbiu, mas peço veja bem que sem possibilidades, talvez não poderei satisfazer os seus desejos, muito embora contra a minha vontade. O dinheiro que por ele recebi tive de o despender no pagamento de dívidas muito urgentes, não sabendo agora, como poderei mandar dez pessoas para Dakar, se não tenho sequer em meu poder dinheiro suficiente para adquirir gasolina para mandar o carro. Até à presente data, não recebi a importância completa correspondente ao mês de Fevereiro passado.

Bem sei que a si não lhe cabem culpas do que se passa, mas julgo do meu dever dar-lhe conhecimento, como membro que é da Direcção do Partido.

Amanhã mesmo, tenho de seguir para a fronteira de Kolda, possivelmente até perto de Cuntima, porque fui chamado com urgência de Salquenhé, para cumprir uma missão indispensável, em virtude do camarada Yaia Koté estar a estragar o trabalho do Partido naquela fronteira.

Desde sábado que mandei um portador com carta para o Osvaldo [Vieira; Bissau; 1938 - Koundara; 1974], mas até à presente data não regressou. Não sei se me poderei deslocar a Dakar em virtude da missão que vou cumprir, mas o camarada Bicho fica aqui a aguardar o portador e seguirá logo que o mesmo regresse de Morés".

Um abraço do camarada muito amigo.
Lourenço Gomes.

De acordo com o acima exposto (e independentemente do subtítulo dado a esta narrativa), será que estamos perante mais um exemplo de como pode ser explicado o provérbio «casa [ou organização] onde não há pão [recursos], todos ralham [ou se queixam] e ninguém tem razão»? Ou seja, onde falta o dinheiro e, por esse facto a vida se degrada por ausência das condições básicas que permitam um mínimo de dignidade às pessoas, então ninguém se entende porque, provavelmente, são todos culpados dessa situação. Foi isso o que aconteceu naquele contexto…?

Eis o original da carta enviada por Lourenço Gomes, desconhecendo-se a origem [ou a autoria] dos sublinhados [, possivelmente do destinatáriio, que mantivemos, não deixam de ser interessantes...].







Recorda-se, a este propósito, que três meses depois do envio desta carta por parte de Lourenço Gomes, o navio cubano Uvero desembarcava em Conacri, em 11 de Maio de 1965, a primeira (grande) ajuda de Cuba ao PAIGC, constituída por cento e trinta e sete caixas de medicamentos, entre outros apoios.


4. OS PEDIDOS DE APOIO EM MEDICAMENTOS CONTINUARAM…


Durante os treze anos da guerra colonial ou de libertação, os dirigentes do PAIGC nunca deixaram de fazer apelo a apoios internacionais, nomeadamente em equipamento militar e medicamentos.
Eis um exemplo do pedido de apoio de medicamentos elaborado dois anos depois da chegada da primeira ajuda remetida por Cuba [tradução do francês da nossa responsabilidade].
TELEGRAMAS ENVIADOS EM 11 DE ABRIL PARA:





COM O SEGUINTE CONTEÚDO… IGUAL PARA TODOS

Face situação muito grave motivo falta total medicamentos pondo em perigo vida diversos combatentes feridos e elementos população vítimas bombardeamentos lançamos apelo solicitando envio urgente todas quantidades possíveis medicamentos especialmente faixas - álcool - mercurocromo - curativos - algodão - antibióticos - antipalúdicos - antidiarreico - soro - leite (stop) Confiante vossa solidariedade aguardamos confirmação para endereço PAIGC BP 298 Conacri (stop) Fraternais agradecimentos.
Amílcar Cabral
Secretário-Geral PAIGC
Guiné dita portuguesa
Caixa Postal 298 Conacri, 11 Abril 1967





Citação: (1967), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34964 (2018-10-26), com a devida vénia.
Fonte: CasaComum, Fundação Mário Soares. Pasta: 07073.131.125. Assunto: Solicita o envio com urgência da maior quantidade de medicamentos. Situação grave por motivos de falta de medicamentos que põe em perigo de vida os combatentes feridos e elementos da população. Remetente: Amílcar Cabral, Secretário-Geral do PAIGC. Destinatário: Comité de Solidariedade Afro-asiático. Data: Terça, 11 de Abril de 1967. Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Telegramas. Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Correspondência.



Citação: (1963-1973), "Enfermeira Nené Mendonça num hospital de campanha", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43675 (2018-10-26), com a devida vénia.
Fonte: CasaComum, Fundação Mário Soares. Pasta: 05222.000.157. Título: Enfermeira Nené Mendonça num hospital de campanha. Assunto: Nené Mendonça, enfermeira do PAIGC num hospital de campanha [Hospital Carlos Sequeira], interior da Guiné. Data: 1963-1973. Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Fotografias.

Na imagem supra pode ver-se algumas caixas [de medicamentos?]. Na que aparece em primeiro plano está gravada a sua origem – Alemanha.

Oito anos depois da elaboração da carta de Lourenço Gomes agora divulgada, eis uma imagem da farmácia do hospital do PAIGC de Ziguinchor, seleccionada, com a devida vénia, da colecção do médico holandês Roel Coutinho.


ASC Leiden - Coutinho Collection - 22 20 - Ziguinchor Pharmacy head, Senegal - 1973. [Responsável da farmácia do hospital do PAIGC em Ziguinchor, enfermeiro Ramiro].

Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
29OUT2018.

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Nota do editor:

Último poste da série > 23 de iutubro de 2018  Guiné 61/74 - P19129: (D)o outro lado do combate (37): A logística nas evacuações dos feridos do PAIGC na Frente Norte: As intervenções cirúrgicas na base do Sará: fotos do médico holandês Roel Coutinho (Jorge Araújo)