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sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24754: Facebook...ando (42): António Medina, um bravo nativo da ilha de Santo Antão, que foi fur mil na CART 527 (1963/65), trabalhou no BNU em Bissau (1967/74) e emigrou para os EUA, em 1980, fazendo hoje parte da grande diáspora lusófona - Parte V: Colunas e viaturas

 


Foto nº 1 > Militar em reconhecimento de uma árvore caída, obstruindo a estrada para dificultar o movimento da tropa. Era missão de alto risco devido as minas e armadilhas que regra geral eram usadas pelo inimigo.



Foto nº 2 > Outra viatura pesada de transporte de tropas conhecita por GMC (abreviatura da General Motors Corporation )


Foto nº 3  > Estrada Teixeira Pinto - Cacheu > Jipão dos tempos da Segunda Grande Guerra, blindado à nossa moda com chapas de bidões e madeira, sem parabrisas e de topo descoberto para facilitar a saída em caso de emboscada.


Foto nº 4 > Coluna com várias viaturas incluindo o Jeep Willis americano e o Unimog alemão da fábrica Mercedes. Alem disso, cada pelotão tinha duas autometralhadoras blindadas com lotacao para duas pessoas, um condutor e um atirador.



Foto nº 5 >  Distribuindo raçõs de combate â malta. Constava de uma lata pequena com sardinhas, um pacote de bolachas, uma embalagem pequena de marmelada, leite condensado e feijão brtanco com carne de porco enlatado. Ninguem apreciava o conteúdo mas a fome falava mais alto.



Foto nº 5A > Eu, por exemplo, não tocava no feijão frio,  cheio de gorduras,  que fazia mal ao nosso estômago,  contentando-me em especial com a marmelada, sardinhas , bolachas e um trago de aguardente Constantino,  do meu cantil que era cuidado meu mantê-lo sempre à mao.Um abraco.



Foto nº 6 > Detalhe de uma coluna


Foto nº 7  >  Chegada a Jolmete, em Unimog

Guiné  > Região do Cacheu >    CART 527 (  Teixeira Pinto, Bachile, Calequisse, Cacheu, Pelundo, Jolmete e Caió 1963/65), 1963/65)    >  

Fotos (e legendas): © António Medina (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Continuação da seleção de fotos do álbum do nosso camarada da diáspora lusófona, António Medina (estas fotos correm o risco de desaparecerem, um dia, com o encerramento da página do Facebook do autor) (*):

(i) ex-fur mil at inf, CART 527 (Teixeira Pinto, Bachile, Calequisse, Cacheu, Pelundo, Jolmete e Caió 1963/65), de resto o único representante desta subunidade, na Tabanca Grande;

(ii) a CART 527 estava adiada ao BCAÇ 507 (Bula, 1963/65), que era comandado pelo ten cor inf Hélio Felgas;

(iii) de seu nome completo, António Cândido da Silva Medina, nasceu em 26 de setembro de 1939, na ilha de Santo Antão, Cabo Verde (completou há semanas os 84 anos);

(iv) estudou no liceu Gil Eanes (Mindelo, São Vicente) (o único liceu então existente nas ilhas, criado pela República em 1917. como Liceu Nacional de Cabo Verde, 1917-1926, depois Liceu Central Infante Dom Henrique, 1926-1937, e, por fim, eaté à independência, Liceu Gil Eanes, 1937-1975);

(v) depois da passar à disponibilidade, viveu em Bissau, e entre 1967 e 1974, até à independência, sendo funcionário do BNU (Banco Nacional Ultramarino);

(vi) regressou a Portugal, onde ainda trabalhou no BNU;  vive desde 1980 nos EUA, em Medford, no estado de Massachusetts, onde também foi bancário;

(vii) tem página no Facebook (última postagem: 30 de outubro de 2022); est5eve bastante doente há uns anos; desejamo-lhe as suas melhoras.



EUA, 2011, António Medina

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Nota do editor:

quarta-feira, 21 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24420: Facebook...ando (29): A 38ª CCmds. integrada no BCmds da Guiné (1972/74), não só partilhou rações de combate como fez, com os camaradas comandos africanos, grandes operações como a "Galáxia Vermelha", no Cantanhez, que nos uniu até à medula (Amílcar Mendes)


Mesquita de Lisboa > 20 de fevereiro de 2015 > O último adeus ao Amadu Bailo Jaló  (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015)> > Da esquerda para a direita, (i) Jaquité (ex-fur cmd BCmd): (ii)  cor cmd  ref Raul Folques; (iii) Amílcar Mendes) ex-1º cabo cmd, 38ª CCmds): (iv) José António Pereira (também da 38ª CCmds); e (v) Virgínio Briote (editor do nosso blogue, ex-alf cmd do CTIG, 1965/67).

Foto (e legendagem): © José Colaço (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Mesquita de Lisboa > 20 de fevereiro de 2015 >  O último adeus ao Amadu Bailo Jaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015)  > Da esquerda para a direita, (i) cor Ferreira A A Silva, (ii) sobrinho e (iii) filho do Amadú  [que vive em Londres], (iv) José António A Pereira (da  38ª CCmds), (v) filho mais velho do Amadú [que vive em Lérida, Espanha], (vi) neta do Amadu, (vii) Saiegh (do BCCmds Africanos), (viii) Mário Dias, (ix) Virgínio Briote e (x) um outro guineense não identificado.

Foto (e legenda): © Giselda Pessoa (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Comentário do Amílcar Mendes, ex-1º cabo cmd, 38ª CCmds (Brá, 1972/74), na página do facebook da Tabanca Grande Luís Graça, com data de 19 do ocorrente,  20h41:

Referindo o período de 72/74, a minha 38ª CCmds estava integrada no Batalhão de Comandos da Guiné, após a sua formação em 72 (antes teve várias designações) cujo 1º Cmdt foi o Maj Cmd Almeida Bruno, mais tarde o Maj Cmd Raul Folques. 

O Batalhão era constituido por 4 Companhias, 3 Africanas e uma Europeia, a 38ª CCmds (a 35ª CCmds foi retirada da actividade operacional, em Março 73 e até ao fim da comissão em Nov73). 

A 38ª CCmds fez operações  a nivel de Batalhão, muitas horas de viagens conjuntas, quer em LDG, ou viaturas, ou saídas de Héli, com Cmds Africanos, dormimos muitas noites juntos, partilhámos muitas rações de combate, iguais para todos.

Acontecia trocarmos, com eles,  sumos, doces, queijos , chokoleite, e recebiamos os que eles não comiam. 

Com os Cmds Africanos, assimilámos hábitos e tradições, aprendemos a melhorar a performance e desempenho na mata, chorámos juntos a morte de camaradas, mas construímos enormes pontes de amizade, que se mantêm até hoje. 

Tive o privilégio de conhecer o Alf Cmd Amadu Jaló,  estive presente, com alguns  (poucos),  nas exéquias fúnebres, na Mesquita de Lisboa, acompanhando a família na sua dor. 

Sem soberba ou gabarolice, posso dizer que poucos combatentes conheceram por "dentro" o desempenho, o arrojo, a forma apaixonada como se orgulhavam de ser Portugueses e Comandos, como a 38ª CCmds conheceu.

A última grande operação que fizemos em conjunto, "Galáxia Vermelha" (**), 12 dias de Cantanhez, uniu-nos até à medula. Foram combates violentos, que infelizmente se saldaram por algumas baixas do nosso lado, mas pusemos todo o Sul a ferro e fogo. 

Continuo a dizer, as rações de combate adaptavam-se... 

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 17 de maio de 2023 > Guiné 61/74 - P24321: Facebook...ando (28): Convívio anual da CART 2479 / CART 11 (Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paunca, 1969/70) em que apareceu, pela primeira vez, o Pechincha, que já não via desde 1969 (Abílio Duarte)

(**)  Operação "Galáxia Vermelha" - 21Dez72 a 01Jan73

A uma força composta pelo BCmds, DFE 4, 12 e 22, TG 9 (10 lanchas da Marinha), 1 Destacamento de Cooperação Aero-Táctico composto por 7 aeronaves da Força Aérea, 1º Pel Art (14 cm) e 5º Pel Art 10,5 cm), foi dada a missão de patrulhar, nomadizar e bater a região Darsalame-Cachambas-Madina do Cantanhez-Boche Falace, S4.

No dia 23, forças do BCmds causaram ao ln 3 mortos e apreenderam 1 espingarda automática "Kalashnikov" em Faro Modi Mutaro. As NT sofreram 3 feridos ligeiros. 

No mesmo dia, na região de Cacine, capturaram 1 espingarda "Mosin-Nagant" e 9 granadas de canhão s/r.

No dia 24, forças do BCmds, apreenderam 1 espingarda automática "Simonov" e detiveram 6 elementos da população.

No dia 25, forças do BCmds, na região de Cacine, foram flageladas e infligiram
na reacção ao ln 4 mortos e sofreram 3 feridos graves e 4 ligeiros.

No dia 26, forças do BCmds, no ataque a uma base inimiga, sofreram 2 mortos, 4 feridos graves e 10 ligeiros.

Nos dias 26 e 27, forças do DFE 22, estabeleceram contacto com o ln na região de Cachambas e apreenderam 1 espingarda automática "Simonov".

No dia 31, forças do DFE 22 tiveram um contacto com o ln, causaram-lhe 1 morto e localizaram 1 arrecadação donde recolheram:

53 granadas de LGFog "RPG-2" e "7";
18 cargas de LGFog "RPG-2";
e 28 de "RPG-7";
e 33 detonadores de LGFog  "RPG-2". 

O DFE 22 sofreu 1 morto e 4 feridos ligeiros.
 
Fonte: Excertos de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro III; 1.ª Edição; Lisboa (2015), pp. 352-353 (Com a devida vénia...)

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22690: A nossa guerra em números (2): Alimentação, ração de combate, "comes & bebes"... "Diziam as mulheres na minha aldeia que os homens se conquistavam pela boca. Digo eu: As guerras também" (Joaquim Costa, minhoto, dixit)

1. Em bora hora, o Joaquim Costa trouxe à baila o tema da "ração de combate" e os seus deliciosos segredos... 

Diz ele que no seu tempo apareceram umas rações com "umas  latas de chispe e feijoada/tripas que era como fazer uma refeição num restaurante com estrela Michelin" (*). 

E depois acrescenta este apontamento que vale um poema: 

"Depois de 'deitar abaixo' a respetiva ração, chegava o momento mais esperado e importante do dia, o momento do cimbalino (não confundir com o momento coca-cola!)."...

Cimbalino ?!.. Isso mesmo:

"Fechava os olhos e transportava-me para uma esplanada de praia do picadeiro da Póvoa de Varzim, a contemplar o mar... e saboreava, com estilo, o melhor da ração – o comprimido de café."

Confesso que foram momentos que eu perdi no meu tempo (1969/71)... É que sempre detestei a ração de combate nº 20 (só conheci esta)... Mas o português sabe dar a volta ao texto e, fazer entrada para o inferno, uma caminho de volta ao paraíso. Arremata o nosso "Tigre do Cumbijã":

 "Depois, era o clímax com as fumaças do cigarro oferecido por (quase roubado a) o Machado ou o Gouveia. Se fosse numa emboscada noturna, o ritual das fumaças contemplava o retirar do tapa-chamas da G3 com a introdução do cigarro no cano para um gajo não se tornar um alvo fácil de 'tiro ao boneco', por parte do IN."

Ficou tão "viciado" na cafeina, ou no seu substituto (, o tal "comprimidinho"), que hoje ainda confessa: 

"Luís, sem café fico insuportável. Sou capaz de fazer quilómetros para ir aonde servem bom café e fico possesso quando vou a um restaurante caro e me servem uma zurrapa de café." (*).

O poste já deu origem a mais de duas dezenas de comentários. E, se calhar, ainda ficou muito coisa por dizer ou confessar. Vamos recuperar comentários relativos à nossa querida "ração de combate", complementados por   alguns números para a nossa nova série "A nossa guerra em números" (**)... e para a nossa "incultura geral". 

(Mas, afinal, para que é que serve esta m... de informação ?", perguntarão alguns doutores. Utilizo o termo m..., com a sua licença, que é o que alguns dos meus mais próximos, a começar pela mimha cara-metade,  usam quando dizem: "Lá estás tu a chafurdar na m...")


2. Na realidade, houve malta que gramou mais as rações de combate do que outros: um exemplo é a CCAV 8351, Os Tigres do Cumbijã, que andaram muito tempo "abivacados" como os ciganos (please, sem conotação racista)... 

Diz o Joaquim Costa:

"A nossa relação com as rações de combate era muito forte. Não só levávamos com elas nas saídas para o mato, bem como no próprio destacamento que construímos do zero. Pois só tivemos direito a frigorífico a petróleo e a cozinha,  passados uns meses depois de aí [, no Cumbijã, ]nos instalarmos. 

Quem não gostou desta mudança foi o vagomestre Ferreira que abalou do hotel de 5 estrelas de Aldeia Formosa para o parque de campismo selvagem do Cumbijã juntamente com a cozinha."...

Houve, pois,  desgraçados que não souberam, durante alguns períodos da comissão, o que era uma "refeição quente", mesmo que fosse só o caldo com pouca batata e algumas verduras, liofilizadas.., para além do indispensável casqueiro. (E quando não havia farinha, recorria-se á ração de bolacha!...).

3. O Valdemar Queiroz c0nta-nos, com o seu  habitual sentido de humor, como eram as andanças de uma companhia africana (a CART 11), em que as praças, por serem muçulmanas e por lhes fazer mais jeito o patacão, eram "desarranchadas:

(...) As nossas rações de combate de 1969/70 tinha uma lata de leite com chocolate que era uma delicia. Como os nossos soldados fulas eram muçulmanos, e os senhores do 'grande rancho geral' queriam lá saber disso, mal abríamos as caixas havia trocas das latas de carne e a bisnaga de queijo (?), que diziam ser de leite de porca, connosco três furriéis, três cabos e de início o alferes, mais o homem das transmissões, pelas latas de sardinhas.

Normalmente era uma ração de combate de uma refeição, para uma operação de intervenção / segurança com regresso para jantar ou saída após almoço para segurança / emboscada noturna e regresso de manhã para o pequeno almoço. 

Quando era mais de um dia havia rações duplas, mas o normal era levar duas e dois cantis de água, que estupidamente nas primeiras saídas o cabo Rochinha levou um cantil com vinho e ia morrendo de sede. 

Nunca fizemos fogueira para aquecer a lata de carne, que ficaria mais apetitosa e inclusive evitávamos fumar para não sermos detetados à distância. Tínhamos toda a atenção para nunca deixar latas vazias no local da refeição.

Por acaso o nosso vagomestre também se chamava Ferreira e era um tripeiro chapado, que cumpria menos mal as suas funções. Com alguns problemas por, normalmente, só haver um pelotão, os homens especialistas e o capitão no quartel que lhe dava para se "prendar" e ficava descalço com as contas. O 1º. sargento que andava sempre à guerra com ele sabe-se lá porquê, dizia-lhe 'com estas contas qualquer dia o melhor é atirar-se ao Geba'.

Mas como era rancho geral para todos, desde o capitão ao soldado básico, os soldados fulas eram desarranchados, as contas sempre se normalizavam e havia comidinha variada e bem confecionada.

Também havia problemas quando saímos para emboscada noturna com regresso a meio da tarde, como tal levávamos uma ração dupla, chegávamos em cima da hora do almoço e não havia nem rancho nem a ração que já tinha marchado. Em Nova Lamego resolvíamos esse problema com uma saída de visita ao restaurante local. (...)

4. No supracitado livro do ten cor Pedro Marquês de Sousa, "Os números da Guerra de África" (Lisboa, Guerra & Paz Editores, 2021, 379 pp.), há informação interessante sobre a  alimentação, os produtos alimantares, e o seu custo, incluindo as rações de combate (RC 20) e as rações de substituição (RS 30) (vd. pp.286 e ss.).

A ração de combate propriamente dita (RC nº 20) era a que se usava em operações, fora do aquartelamento. A ração de substituição (RS nº 30) tinha mais produtos e podia ser consumida no aquartelamento, "quando não era confeccionada refeição quente" (pág. 290).

Havia havia ainda a Ração de Bolacha (140 gramas, por dia e por homem): substituia o pão quando este não era distribuido com a RC nº 20 ou a RS nº 30.

Cada ração estava pensada, para um homem, para as 24h / três refeições. 

Mas o António. J. Pereira da Costa ainda é do tempo da "ração coletiva" (!)...

(...) Recordo-me das rações colectivas para 5 homens que eram extremamente incómodas porque obrigavam a que todos comessem ao mesmo tempo e as embalagens era maiores do que as 'individuais'. Estas mais flexíveis tinham o inconveniente de serem monótonas. Assim, quem tivesse de fazer uma operação de vários dias comia o mesmo (ou quase) durante esse tempo. 

Os comprimidos de café destinavam-se a criar um sabor idêntico ao que deixava o café (de saco). Os soldados muçulmanos não comiam tudo o fosse e pudesse ser de porco (especialmente chouriço). Creio que o pessoal da Manutenção Militar e os "planeadores" e financeiros nunca se preocuparam com a monotonia da alimentação durante as operações e daí vem o nosso ódio às rações. Se alguma vez as tivessem experimentado duranma te dois ou três dias, podia ser que  as tornassem mais atraentes e variadas. Falta referir que as rações traziam uma folhinha de algo parecido com papel higiénico e que também podia ser usado como guardanapo" (...) (*)

5. Com a crise petrolífera do final do ano de 1973 / início de 1974 (, que nos lixou a todos!), os géneros alimentares escassearam no mercado e/ou subiram de preço. 

Isso teve naturalmente reflexos nos custos do Exército, que além disso viu os custos de transporte acrescidos. E teve implicações no moral da tropa... Houve produtos cujos preços dispararam brutalmente, de 1973 para 1974. Veja-se alguns exemplos de preços de produtos de venda ao público em Lisboa:

Produto / Preço de 1973  (kg, litro ou embalagem) / Subida em 1974 (%)

Arroz / 8$90 / 20%
Azeite / 35$00 / 50%
Batatas / 2$50 / 80%
Bacalhau / 44$00 / 113%
Chouriço / 45$00 / 66%
Frango / 26$00 / 46%

No quadro da pág.290, o autor, Pedro Marquês de Sousa,  certamente, por lapso, não indicou a unidade de medida dos produtos a seguir ao arroz. Para o azeite, por exemplo, deve ser o litro. Quanto ao bacalhau, sabemos que era "liofilizado",  deveria vir em caixas, tal como chouriço... O que importa a destacar é o valor (preço) considerado, pelo exército, nas contas da guerra do ultramar em 1974 (, de acordo com a célebre lista publicada no nosso blogue) (***).

Por exemplo:

Arroz:7$00;
Azeite: 48$00;
Batata: 8$20;
Bacalhau; 167$20;
Chouriço: 64$80;
Frango; 41$80...

Não admira que a malta para o fim da guerra tivesse que se agarrar à RC nº 20 ou RS nº 30 ou à Ração de Bolacha...

De qualquer modo, com a crise petrolífera e a crise económica de finais de 1973/ princípios de 1974, os preços dispararam, tornando-se cada vez complicado alimentar  "o ventre da guerra". Por outro lado, o sabemos o preço por unidade das rações em 18/7/74, em Nova Lamego (CCS/ BART 6523, 1973/74):

Ração de combate nº 20: 43$00 por unidade; havia 680 em stock;
Ração de substituição nº 30: 14$54 por unidade; havia em stock: 250 em stock.

Não há referência à Ração de bolachas... Mas ainda havia farinha (mais de um tonelada) e fermento...

Por norma e por razões de segurança, na Guiné tinha de haver uma reserva de 72 mil Rações de Bolacha, 50 mil da RC nº 20 e 20 mil da RS nº 30... (Cito o Pedro Marquês de Sousa, "Os números da guerra de África", pág.292).

6. No fim é  caso para perguntar: "Ó Joaquim, como é que uma tropa, como a nossa, que passava a vida a queixar-se do tacho e do vagomestre e das rações de combate, podia ganhar a guerra ?! Não podia, está visto"...

Ao que o Joaquim, minhoto (e maroto), respondeu, muito sabiamente:

"Diziam as mulheres na minha aldeia que os homens se conquistavam pela boca. Digo eu: As guerras também!!!" (*)


(***) Vd. poste de  6 de fevereiro de  2020 > Guiné 61/74 - P20626: (Ex)citações (362): O ventre e o patacão da guerra, segundo duas preciosas listas de junho de 1974, guardadas pelo Zé Saúde... Cada um de nós tinha direito a um "per diem" de 24$50 para comer, o equivalente na época a um dúzia de ovos da Intendência (, a preços de hoje, 4,10 euros)

terça-feira, 2 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22682: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XVIII: A ração de combate


Foto nº 2


Foto nº 1 > 
Ração de combate tipo E n.º 20. (Na parte de baixo lê-se: "Não deite fora o saco exterior. Servir-lhe-á para guardar os alimentos ainda não utilizados").

Foto nº 2 >  A ração de combate tipo E nº 20 continha; 1 tubo de leite condensado, 1 lata de atum, 1 lata de sardinhas, 2 latas de carne/carne com feijão /tripas, 1 lata pequena de compota, 1 lata de fruta em calda / sumo de fruta, 1 torrão nougat (amendoim). 1 pastilha de sal, uma saqueta de café instantãneo / comprimido e duas bolachas.

Fotos (e legendas): © Joaquim Costa (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Foto nº 3 >  Ração individual de combate ( Individual comba ration / Ration individuelle de combat... NATO approved.  Era utilizada pelas nossas Forças Armadas em 2011. Foto de José Marcelino Martins (2011), com a devida vénia (*)




O ex- furriel mil Joaquim Costa: natural de V. N. Famalicão,
vive hoje em Fânzeres, Gondomar, perto da Tabanca dos Melros.
É engenheiro técnico reformado.
Tem quase pronto o seu livro de memórias (, a sua história de vida), 
de que estamos a editar alguns excertos, por cortesia sua.


Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) (**)

Parte XVIII - A Ração de  Combate


A maior parte das nossas refeições,  ao longo dos quase dois anos de Guiné,  foram Ração de Combate.

Convenhamos que eram mais saborosas e nutritivas do que o arroz com estilhaços (arroz com minúsculos bocados de carne), à moda do vago mestre Ferreira.


O arroz com estilhaços, à moda do Furriel Vago Mestre Ferreira, fez-me lembrar as noites passadas na mítica tasca em Famalicão (Vai ou Racha) cujo proprietário era um benfiquista doente, pai do extraordinário jogador de futebol dos lampiões, Vítor Paneira.

Nesta tasca entre as muitas especialidades destacavam-se os bolinhos de bacalhau preparados pela sua simpática e esmerada esposa. Uma certa noite, já bem bebidos, ao comer um dos bolinhos de bacalhau, viro-me para o Vai ou Racha (,era assim como o tratávamos) e digo-lhe: 
− Ó Sr. Vai ou Racha! Este bolinho de bacalhau está cheio de espinhas! 

Resposta pronta do homem: 

− Como assim,  se estes só levaram batatas?!

Assim nos respondia o Vago Mestre Ferreira quando reclamavamos que a carne era pouca: 
−Como assim  −  retorquia  ele  − se  só coloquei arroz na panela?!

As rações de combate,  tipo E (Fotos nº 1 e 2), tinham várias nuances, diferindo de remessa para remessa. A remessa que me ficou na memória era composta por:

  • uma lata de conserva (geralmente sardinha/cavala?);
  • uma lata com carne;
  • uma lata de leite;
  • um sumo;
  • uma pequena lata de queijo e/ou marmelada;
  • uma bisnaga (espécie de pasta de dentes) de leite condensado;
  • um pacote de bolachas;
  • e, imaginem!, um comprimido de café para desfazer na boca.

Eu, como era alérgico ao leite (por alguma razão o querem tirar da roda dos alimentos), cedia ou trocava com outro camarada por um  sumo e despachava o leite condensado que me sabia ao óleo fígado de bacalhau que me deram na escola primária (a disputa pela minha bisnaga era dura e compreendia quase todo o pelotão). Metia-me impressão a forma como “mamavam” aquela coisa.

Mais tarde surgem umas latas de chispe e feijoada/tripas que era como fazer uma refeição num restaurante com estrela Michelin.

Sempre que aparecia o chispe e a feijoada, tinhamos problemas com o furriel enfermeiro porque lhe gastávamos todo o algodão e álcool para aquecer a iguaria.

Depois de “deitar abaixo” a respetiva ração, chegava o momento mais esperado e importante do dia, o momento do cimbalino (não confundir com o momento coca-cola!).

Fechava os olhos e transportava-me para uma esplanada de praia do picadeiro da Póvoa de Varzim, a contemplar o mar... e saboreava, com estilo, o melhor da ração – o comprimido de café.

Depois, era o clímax com as fumaças do cigarro oferecido (quase roubado) pelo Machado ou pelo Gouveia. Se fosse numa emboscada noturna, o ritual das fumaças contemplava o retirar do tapa chamas da G3 com a introdução do cigarro no cano para um gajo se tornar  um alvo fácil  de "tiro ao boneco”, por parte do IN.

Por uma questão de curiosidade,  fiz uma pesquisa sobre as rações de combate utilizadas hoje nas nossa forças armadas e fiquei com água na boca (Foto nº 3):

Pois, as rações com certificação NATO e utilizadas hoje (pelo m,enos, em 2011) pelas nossas forças armadas, incluiam as seguintes iguarias:
  • Pequeno almoço: Cacau com açúcar, 18 gramas; leite em pó, 15 gramas; bolacha doce, 125 gramas; geleia de fruta, 2 embalagens de 20 gramas cada;
  • Almoço: Jardineira de feijão, 145 gramas; paté de fígado, 65 gramas; doce de maçã, 50 gramas;
  • Jantar: Massa Bolonhesa, 400 gramas; sardinhas em óleo, 115 gramas;
  • Complementos alimentares: Bolachas de água e sal, 2 embalagens de 120 gramas; sumo de fruta em pó, 2 carteiras de 20 gramas; açúcar, 2 pacotes de 10 gramas; sal, pacotes de um grama; chocolate, 2 barras de 25 gramas; chiclete, 2 unidades; caramelos, 4 rebuçados;
  • Complementos não alimentares: Comprimidos purificadores de água, 4 unidades; pastilhas inflamáveis, 6 unidades; dispositivo de aquecimento, uma chapa moldável; carteira de fósforos; talheres de plástico; saco para lixo.
Mesmo assim, reconhecendo as significativas melhorias, não trocava estas nutritivas rações de combate pelas do meu tempo. A esta ração “modernaça” falta-lhe o essencial: O cimbalino!…

(Continua )
_________


(**) Último poste da série > 11  de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22621: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XVII: a minha "bigodaça”... que tanto incomodou os senhores da guerra

terça-feira, 30 de março de 2021

Guiné 63/74 – P22052: Estórias avulsas (104): O melhor brunch da minha vida, numa longa viagem de 21 horas de comboio, entre Leandro e Tavira, já lá vão 50 anos (Joaquim Ascenção, ex-fur mil arm pes inf, CCAÇ 3460, Cacheu, 1971/73)

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Ascenção (ex-Fur Mil de Armas Pesadas de Infantaria da CCAÇ 3460/BCAÇ 3863, Cacheu, 1971/73), com data de 27 de Março de 2021, trazendo uma estória que bem caracteriza as dificuldades que sentíamos quando tínhamos de atravessar Portugal de lés-a-lés nas deslocações entre quartéis.


O melhor brunch

No início de Janeiro de 1971 (já lá vão 50 anos),  fiz a minha primeira grande viagem.

Fui colocado para a segunda fase da minha formação militar no CISMI em Tavira. Munido das respectivas guias de marcha iniciei a viagem no apeadeiro de Leandro na linha do Minho cerca das 22 horas e cheguei a Tavira cerca das 19 horas do dia seguinte.

As etapas foram:

Leandro - Campanhã (comboio)
Campanhã - Santa Apolónia (comboio)
Santa Apolónia - Terreiro do Paço, a pé
Terreiro do Paço - Barreiro (de barco)
Barreiro - Tavira (comboio)

A ração de combate (caseira) resumia-se a 2 pães e 1 ou 2 ovos cozidos e um pouco de chouriça.

Ao fim da manhã já não tinha nada para comer nem onde comprar, o comboio a que a guia dava acesso eram comboios que paravam em todas as estações e apeadeiros e não dispunham dessas mordomias.

Ao início da tarde a fome apertava, entretanto uma senhora que viajava no mesmo compartimento que tinha entrado,  já eu tinha para aí uma hora de viagem, abriu um baú e um pequeno garrafão de vinho e começou a comer pão e presunto, acompanhado  com um copinho de vinho... e eu a ver e a salivar... 

A té que a senhora olha para mim e pergunta:
 - Oh menino, tens fome? Serve-te, come e bebe que chega para os dois.

Eu assim fiz, comi e bebi e matei a fome. No fim agradeci.

Recordo este gesto para toda a minha vida. Que Deus tenha reservado um lugar no céu para ela.

Mais tarde, já em África, passei por momentos semelhantes mas sem ter quem me socorresse.

A tantos sacrifícios fomos submetidos, tanto desgaste físico e psicológico ao longo de tantos meses, e para quê?

Uma pergunta que fica e ficará sempre sem resposta.

Cumprimentos
Joaquim Ascenção

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Nota do editor

Último poste da série de 9 de março de 2021 > Guiné 63/74 – P21987: Estórias avulsas (103): Enfermeiro por uma noite (Joaquim Ascenção, ex-Fur Mil Armas Pesadas de Infantaria)

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20626: (Ex)citações (362): O ventre e o patacão da guerra, segundo duas preciosas listas de junho de 1974, guardadas pelo Zé Saúde... Cada um de nós tinha direito a um "per diem" de 24$50 para comer, o equivalente na época a um dúzia de ovos da Intendência (, a preços de hoje, 4,10 euros)



Lista nº 1 > CCS/BART 6523 [, Nova Lamego, 1973/74] > Relação dos víveres existentes no dia 17/6/1974

é

Lista nº 2 > CCS/BART 6523 [, Nova Lamego, 1973/74] > Relação dos artigos de  víveres existentes no dia 18/6/1974

Fonte: cortesia de José Saúde (2016). [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Excerto do poste P16177:

(...) Mantenho ainda comigo uma cópia de um relatório literalmente especificado de uma passagem de bens alimentícios em armazém entre dois furriéis da minha companhia - CCS / BART 6523 [, Nova Lamego, 1973/74[ - que entretanto assumiram a presunçosa função de vagomestre.

Curioso, por que é justo que o citamos, é que ambos foram “atirados” para uma incumbência completamente à parte daquela a que tinham sido submetidos durante o período em que foram mancebos de uma outra especialidade mas que ditou, ao arrepio da verdade, o seu subsequente futuro por terras da Guiné. Um que assumia o cargo desde a nossa chegada a Gabu; o outro a quem foi proposta a possibilidade de substituir o primeiro durante o seu período de férias, 30 dias.

Ainda assim, fica a textura de um documento que descrimina todo o conteúdo do material armazenado e os custos que cada um deles tinham à época. No balanço geral feito à narrativa exposta, oferece-me viajar nas fileiras da ventosidade do tempo e relembrar o “montão de patacão” que os homens que lidavam com os valores sob a sua “divina” proteção mantinham no interior de um quartel onde existiam inevitáveis privações.

Revejo as quantidades, os preços por unidade e o seu subsequente total, assim como os bens nutritivos que por ora eram então averiguados no momento da transição dos artigos de viveres que ambos os furriéis assumiam. Um entregava e outro recebia.

Da listagem observada, existe a certeza que,  se de um lado estavam os bens depositados,  do outro os ditos frescos. Ou seja, tudo o que fosse arroz, açúcar, azeite, batata, banha, feijão, grão, massas, vinho, óleo, vinagre, etc, etc, etc, pertencia a um lote, sendo que os frescos eram constituídos pelo frango congelado, peixes e fruta da época, entre outros, mas devidamente faturados.

O distinto documento era completado com as rações de combate, farinha, sal, café e outros bens necessários. Não há registos das compras espontâneas que se articulavam com o quotidiano, isto é, das vacas, dos leitões, dos porcos, dos cabritos, das galinhas, e outros, que concluíam a ementa.

Reportando-me aos números, refiro que a relação dos artigos em escudos era o seguinte: viveres existentes e frescos transportavam 319 986$20; outros viveres 88 587$10.


Creio que poucos, ou quase nenhuns, dos soldados depositados num quartel onde as “fissuras” de

uma peleja teimavam em ceifar vidas de jovens em plena idade de puro crescimento, desconheciam o conteúdo real de bens alimentícios que a companhia detinha.

Relembro ainda as famosas patuscadas organizadas pela malta que entretanto comprara um leitão, ou um cabrito, e que depois da sua trivial passagem pelo forno, servia de repasto fino para uma rapaziada que se orgulhava com o distinto acolhimento de um prato bem composto. A acompanhar lá estavam as cervejolas bem fresquinhas.

Relíquias de um tempo sem tempo numa Guiné que despejou em nós um cosmos de emoções. (...)



2. Comentário do editor Luís Graça:

O Zé Saúde, em boa hora, reproduziu este poste (**) e os respetivos documentos no seu livro "Um ranger na guerra colonial: Guiné.Bissau (1973-74). Lisboa: Colibri, 2019", pp. 163-166.

São preciosas informações sobre a "economia de guerra": por exemplo, em 17 de junho de 19974, a escassos 3 três meses, da retirada dos "últimos soldados do Império", o "stock" de mantimentos (víveres)  da CCS/ BART 6523, sediada em Nova Lamego (hoje, Gabu) importava em cerca de 320 contos, o que hoje, em euros, representaria qualquer coisa como 53.563,53 €.

O item com maior peso, na relação, era o vinho: 3.320 litos de vinho, a 11$60 o litro, importavam em 38.512$00 (, valor que, a preços de hoje, equivaleria a 6.446,65 €).

Um escudo em 1974 era equivalente hoje a 0,17 €. Mas é preciso ter em conta que o "escudo guineense" (o "peso") só valia, no mercado cambial, 0,90 escudos metropolitanos..

Seguia-se o arroz (, de produção local, da "bolanha") de que havia um "stock" de cerca de 5 toneladas e meia. A  7$00 escudos o quilo,  somava 38.416$00, o que daria hoje qualquer coisa como 6.430,58 €... Havia ainda 2 toneladas de arroz, importado, da metrópole, a 14$50 o quilo,o dobro do preço do arroz guineense.

O item mais caro, desta relação, era o bacalhau liofilizado: havia pouco mais de 40 kg, a 167$20 o quilo (o equivalente hoje a 27,99 €).

Ficamos a saber que o frango (congelado) custava, em 1974, para a manutenção militar, 7 € o quilo...

Da relação do dia 18/6/1974 (Lista nº 2), vai o nosso destaque para a ração de combate nº 20 de que havia em "stock" 680 unidades, a 43$00 cada (7,20 €, hoje).

Outro item essencial para a alimentação da tropa era a farinha (e o fermento): da lista nº 2 constavam quase 5 toneladas de farinha (4.350 de farinha de 1ª, mais 450 kg de farinha americana)... O preço por quilo da farinha de 1ª (portuguesa ?) era então de 6$00 (, o equivalente hoje a 1 euro)... Em "stock" havia 285 (quilos ou embalagens ?) de fermento leverina, a 35$50 por quilo (ou unidade), equivalente hoje a  5,94 €.

Um item que era um luxo era o ovo, fazendo parte tal como os "congelados" dos víveres "frescos", que eram  transportados de Bissau por via aérea: o "stock" era de 60 dúzias de ovos, a 24$30 a dúzia. Como não havia produção local, os ovos eram importados da metrópole...

Recorde-se que cada militar tinha direito a um "per diem" de  24$50  (=4,10 €), o equivalente a uma dúzia de ovos...

Por outro lado, a proporção de "frescos" (hortaliças, legumes, peixe, carne, leite, ovos...) era pequena em relação ao resto...Na lista nº 1, os frescos não ultrapassam os 400 kg, cabendo um 1/3 ao "frango congelado"... Não sabemos como é que o frango (congelado) chegava a Nova Lamego e em que condições, de higiene e salubridade ... O mesmo se pode dizer da pescada (congelada), que não ia além de 85 kg, no inventário do dia 17/6/1974 (Lista nº 1)...

A capacidade de frio, nos nossos quartéis, era muito limitada: não havia eletricidade todo o dia, os geradores eram ligados à noite, pelo que os frigoríficos e arcas frigoríficas tinham que funcionar também... a petróleo!

Em contrapartida, veja-se o peso das "massas" (1.225 kg) e das "salsichas" (meia tonelada), bem como da "marmelada" (mais de meia tonelada), das "conservas de peixe" (330 kg.)... Havia mais de 2,3 toneladas de feijão, na maior parte "seco" (1,9 toneladas)... Em relação ao  "feijão verde" (400 kg.) não sabemos a sua proveniência...

Nestas condições, era complicado para o vagomestre (que, além disso,  não era nutricionista, ou teria pouca formação em nutrição tal como os médicos da época...) fazer dietas equilibradas e saudáveis (, veja-se aqui, no sítio da Direção Geral de Saúde, a "roda dos alimentos", um instrumento de educação alimentar largamente reconhecido pela população portuguesa pela sua utilização desde 1977 na campanha 'Saber comer é saber viver').... 

Não sabemos qual era o recurso, no Gabu, a produtos frescos locais, provenientes do mercado local e da horta da tropa: refiro-me, por ex., às alfaces, as cenouras, às couves, às frutas tropicais, à carne (vaca, porco,cabrito) eao peixe...Comia-se mal, em quantidade e qualidade... abusando-se do "casqueiro", das massas, do arroz, dos  legumes secos, da banha,  e das conservas (chouriço, cavala, atum...).

A título exemplificativo, aqui vão outros itens a preços de hoje, por quilo (ou por litro, no caso do azeite e do vinho):

Azeite: 8,03 €

Batata: 1,37 €
Café: 1,87 €
Cavala (conserva): 11,94 €
Chouriço: 10,85 €
Feijão frade: 2,56 €
Grão (de bico):2,90 €
Margarina: 2,90 €
Massa: 2,03 €
Pescada-marmota: 3,36 €
Sal: 0,17 €
Sardinha (conserva): 8,97 €
Vinho: 1,94 €


Quanto às conservas (sardinhas, cavalas...),  tal como o chouriço, partimos do princípio que vinham em embalagens (latas) de quilo. Convertidos em euros (a preços de hoje),. os valores obtidos não nos parecem divergir muito do que se pratica hoje em relação a 1974...

Constatamos, por fim, que na "despensa" da CCS/BART 6523, havia tambêm, em existência, mercadorias que pertenciam a outras subunidades: CCAÇ 11, 1ª CART / BART 6523, 3ª CART / BART 6523...
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quarta-feira, 4 de julho de 2018

Guiné 61/74 - P18812: (Ex)citações (340): Histórias de vida, a propósito do "ventre da guerra" (Luís Graça / António Ramalho)




Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > 2006 > "Laranjada Convento / Mafra / Marca registada"... Restos arqueológicos de uma guerra... e que hoje figuram no Núcleo Museológico Memória de Guiledje, carinhosamente criado pelo nosso saudoso amigo Pepito (1949-2012). Na imagem pode ler-se: "Composição: Sumo - Popa e óleo de laranja - Açúcar granulado - Água esterelizada / Corado artificialmente / Fabricado por Francisco Alves & Filho Lda / Venda do Pinheiro"... 

Houve muita gente, na Metrópole, a ganhar dinheiro com a guerra, a começar pelos industriais do sector agroalimentar... Ainda conheci o sr. Evaristo Alves e um dos filhos, Mário, descendentes do fundador da empresa Francisco Alves & Filhos Lda, quando trabalhei na administração fiscal em Mafra, em 1973... Constava que o sucesso do Francisco Alves, no negócio dos refrigerante, tinha começado no tempo da guerra civil de Espanha (1936-1939)...

Na Guiné (como de  resto nos outros Teatros Operacionais), o "ventre da guerra" obrigava, por seu teu turno, a uma tremenda logística... Quantos camaradas nossos não terão morrido ou sofrido para que esta garrafa de laranjada Convento chegasse a Guileje ?

Fotos (e legenda): © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018). Todos os direitos reservados

1. Mensagem de António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), alentejano de Vila de Fernando, Elvas:

Data: 28 de junho de 2018 às 19:09

Caro Luís Graça, boa tarde.

Agradecido pela publicação das fotos e memórias da nossa guerra por terras de África.(*)

Achei interessante a réplica ao texto sobre as sobras das nossas refeições, para nós não eram "restos"!

Pela parte que nos toca,  achámos sempre uma acção interessante até porque os nossos cozinheiros ensinaram aos miúdos algumas tarefas na cozinha, além de começarem a habituar-se a comer com colher, faca e garfo.

Há uma pequena imprecisão no texto sobre a laranjada Convento (**), se algum camarada da Venda do Pinheiro o ler verá que o  jantar foi com o senhor Evaristo Alves (filho de Francisco Alves, o fundador da empresa ) e seu filho Mário, este felizmente ainda vivo, fará 84 anos em Julho (, neto portanto do fundador).

Foi dia de festa quando nos anos 80 foi adquirido o primeiro semi-reboque para transporte da Laranjina C, esteve em exposição na fábrica, uma autêntica romaria!...

Vivi dez anos na Venda do Pinheiro, naquele tempo era um lugar da freguesia do Milharado, cocnelho de Mafra, e hoje é freguesia.

Foi uma família que me acolheu assim como a maioria dos habitantes duma forma extraordinária, ainda hoje mantenho essa amizade e convívios.

Era um lugar lindíssimo com pinhais recheados de vivendas com habitantes dos mais variados extractos sociais, culturais, artísticos e empresariais

Logo ao lado tínhamos a Malveira onde às 5ª feiras degustávamos um belo cozido à portuguesa, além de outras "iguarias"!

Tudo isto nada tem a ver com o nosso blogue, é só para te situar e sustentar aquela pequena imprecisão.

Aguardo com toda a ansiedade um almocinho para esta zona, oxalá a minha agenda o permita e tu possas estar presente, ou ou o blogue pára  nas férias?

Um grande abraço,

António Ramalho

2. Resposta do editor LG:

Obrigado, António, pelo esclarecimento e pela autorização para publicar... Sim,  Evaristo e não Francisco Alves, OK, tomei  boa nota... O Francisco foi o fundador da empresa, o Evaristo o filho e o Mário o neto...

Troquei os nomes ao escrever:

"Ainda conheci o Sr. Francisco Alves e um dos seus filhos, quando trabalhei na administração fiscal em Mafra, em dezembro de 1973, num 'jantar de Natal' que ele ofereceu ao 'pessoal das Finanças', como era da tradição: foi na fábrica, em Venda o Pinheiro, tudo muito bem 'regado', eu, que era 'novato' no ofício e na repartição, não me lembro de ter bebido 'produtos da casa'... Constava que o seu sucesso, nos negócios, tinha começado no tempo da guerra de Espanha (1936-1939)... Uma das marcas famosas da firma era a Laranjinha C, cuja história, ao que parece, remontava já a 1926, ano da fundação da empresa Francisco Alves e Filhos, na Venda do Pinheiro, e em que o empresário Francisco Alves começou a produzir pirolitos, a par de outros refrigerantes".

Possivelmente, em 1973, o fundador da empresa, Francisco Alves,  já não seria vivo, e portanto o jantar foi-nos oferecido pelo sr. Evaristo Alves e o seu sucessor, o Mário Alves... Devo acrescentar que, depois desse jantar de Natal, nunca mais os vi, mas eram uma família hospitaleira e simpática... Nunca lhes fiz favores nem recebi benesses ... Liquidava-lhes o imposto de circulação, que já era uma pipa de massa... Eu estive uns meses em Mafra, de resto apanhei lá o 25 de abril...Trabalhava no "convento", na Repartição de Finanças... Aliás, estive 15 anos no Ministério das Finanças, 10 anos em Lisboa, acabei a minha carreira como técnico superior do elitista Centro de Estudos Fiscais, a "nata" dos fiscalistas... Depois acabei por enveredar por outra carreira, o ensino superior... numa instituição que só passou a integrar a universidade, a NOVA, em 1994... 

António, todos temos uma "história de vida", para uns mais curta, para outros mais comprida. Somos uma geração que andou em bolandas e apanhou todas as mudanças e todas as crises (políticas, militares, demográficas, sociais, económicas, culturais, mentais...) a começar pela maldita guerra (, que me tirou, sem exagero, dez anos de vida, no mínimo, aliás, nos tirou a todos...). Mas isso são contas de outro rosário... Não nos vitimizemos. Ninguém escolhe a data e o local de nascimento e muito menos os progenitores... E eu não gosto de me vitimizar nem de ver os nossos camaradas a armarem-se em coitadinhos... É uma pecha nacional. (***)

Fica bem, um abraço, Luís


3. Resposta do António Ranalho, com data de 28 de junho p.p.:

Caro Luís,  boa noite.

Se assim o entenderes publica, a tua vontade é soberana.

A minha passagem pela DGCI  [, Direção-Greal das Contribuições e Impostos,] em 67/68 também foi interessante mas efémera! Iniciei o meu percurso na Covilhã com cerca de 250 fábricas de lanifícios, em todo o concelho, era obra, processos de Contribuição  Industrial à mão!

Fui para a Direcção de Finanças da Guarda, um paraíso,  com a Direcção Escolar ao lado! Terminei na Mealhada por causa de uma marotice que até hoje não consigo entender: vim a Lisboa ao Liceu Camões prestar provas, entreguei-a 15/20 minutos antes do tempo e regressei à Mealhada. Sai a lista no "Diário do Governo" e o meu nome não constava, o meu Chefe entra em pânico e liga para Aveiro, Aveiro liga para Lisboa,  e sabes qual foi a resposta?

A prova extraviou-se, venha no próximo concurso! 

Tinha direito a férias, voltei-lhe as costas, até hoje, e assim perderam um "distinto" elemento!

Mais tarde vim encontrar alguns ex-colegas espalhados em diversas repartições, um deles foi Director em Lisboa, é a vida!

Caro Luís, somos a geração que somos, foram experiências que também nos enriqueceram, amadureceram-nos, ainda estávamos na árvore, contudo devemos pôr-nos sempre do lado positivo da vida! (***)

Uma boa noite. Um forte abraço.

António Fernando Rouqueiro Ramalho

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Notas do editor;

(*) Vd. poste de 25 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18779: O segredo de... (31): António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71)... O senhor alferes que estava mesmo a pedir... uns abatises, à hora do almoço, no cruzamento da estrada Bula / Binar / Pete

(**) Vd. poste de 25 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18777: Fotos à procura de...uma legenda (106): "As sobras do rancho da tropa"... e as latas de conservas, "made in Portugal", que as crianças levavam à cabeça (Valdemar Queiroz / Museu de Portimão / Virgílio Teixeira)

(***) Último poste da série > 3 de julho de 2018 > Guiné 61/74 - P18805: (Ex)citações (339): "Hoje sentimo-nos bem connosco, por termos ajudado a minorar o sofrimento dos feridos e doentes, que nos foram confiados. Em nós ficou o sentimento de um dever cumprido" (Maria Arminda Santos, capitão, enfermeira paraquedista, ref)

segunda-feira, 25 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18777: Fotos à procura de...uma legenda (106): "As sobras do rancho da tropa"... e as latas de conservas, "made in Portugal", que as crianças levavam à cabeça (Valdemar Queiroz / Museu de Portimão / Virgílio Teixeira)


Foto nº 1 A


Foto nº 1

Guiné > Região de Cacheu > São Domingos > CCS/BCAÇ 1933 > 1968 > "As sobras do rancho da tropa"... [as crianças da vizinhança que vinham, de lata, à cabeça, recolher as sobras dos ranchos e das messes dos nossos aquartelamentos; na foto, pelo menos três delas trazem latas, amarelas, de vários tamanhos,  de conservas de peixe, da marca (branca) "Manos" ou "[Her]manos", da empresa conserveira de Portimão La Rose - Feu Hermanos, fundada em 1902]


Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Mensagem, com data de 22 do corrente,  do Valdemar Queiroz [ex-fur mil, CART 2479 /CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]:

Assunto: Esclarecimento de uma curiosidade

Boa tarde Luís Graça.

Antes de mais os meus cumprimentos e bom regresso de férias.

A interessante fotografia 'rancho dos pobres' [foto nº 1], do Virgílio Teixeira (*), dá pano para mangas. Eu, que sempre fui bom observador, descobri o... 'MANOS' na lata amarela à cabeça do rapaz ao lado da rapariga de vestido branco [vd. foto nº 1A].

Depois lembrei-me do Museu de Portimão, quase todo ele inserido na antiga Fábrica de Conservas Feu Hermanos.

Depois contactei com o Museu para esclarecimento da minha curiosidade.

Parece muito provável que o djubi tenha à cabeça uma peça de museu.

Luis, se achares interessante publica esta minha troca de emails, com o Museu de Portimão, para esclarecimento da minha curiosidade.

Um grande abraço
Valdemar Queiroz


2. Mensagem de 21 do corrente, enviada pelo Valdemar Queiroz ao Museu de Portimão:

Assunto: Esclarecimento de uma curiosidade

Exmos. Senhores

Boa tarde.

Antes de mais quero enaltecer o extraordinário desempenho para a Cultura a actividade do Museu de Portimão.

Assisti há dias, na RTP2, ao programa 'Visita Guiada' no Museu de Portimão e fiquei encantado.

Agora e por razões de frequentador/comentador no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, cujo principal conteúdo é o convívio/recordações dos tempos passados na guerra colonial, na Guiné, e não só, surgiu uma curiosidade sobre a extraordinário fotografia 'o rancho dos pobres', de autoria do ex-alferes miliciano Virgílio Teixeira (*).

A fotografia, do ano de 1968, é uma chapa do que habitualmente acontecia: crianças de lata na mão à espera das sobras do rancho da tropa.

Esta fotografia, embora comovente, não representa aparência real e apenas tem um ar sério por se tratar de 'vamos a estar quietos para todos ficarem na foto', bem pelo contrário do que, agora, acontece com as crianças engaioladas nos EUA.

Mas a fotografia levantou-me a curiosidade de me parecer que o rapaz mais crescido, que está ao lado da rapariga de vestido branco, ter à cabeça uma lata amarela de conservas Feu Hermanos. Será?

É esta curiosidade que eu gostava ficar esclarecido e ter um motivo, não só para enaltecer o Museu de Portimão, mas também dar a conhecer que na fotografia aparece um rapaz com uma peça de museu á cabeça.

Agradeço a Vossa melhor atenção.

Os meus respeitosos cumprimentos.

Valdemar Queiroz da Silva


Foto da página inicial do sítio Museu de Portimão (que está instalado na antiga fábrica de conservas La Rose - Feu Hermanos. fundada em 1902). Foto reproduzida com a devida vénia...

[É um dos museus portugueses mais premiados, a nível nacional e internacional, tendo-lhe sido atribuídos, desde a sua abertura em 2008, tendo ganho nomeadamente o Prémio “Museu Conselho da Europa 2010”, atribuído pelo Conselho da Europa, o Prémio “DASA – Mundo do Trabalho 2011”, primeira edição deste prémio atribuído na cidade de Dortmund, na Alemanha.]

3. Resposta do Museu de Portimão:

Boa tarde,  Valdemar Silva,

De facto parece ser uma das latas produzidas pela Feu Hermanos, só é pena que o braço do jovem não permite mais leitura, mas tendo em conta que a política de exportação para África era mais "marca branca" do que enviar outras marcas prestigiadas como era o caso da "La Rose", é bastante provável. E obrigado pelos elogios que nos coloca!

Votos de um bom fim-de-semana.

Com os melhores cumprimentos,

Pedro Branco
Museu de Portimão
Rua D. Carlos I – Zona Ribeirinha
8500-607 Portimão

Portugal

Tel: +351 282 405 232 | Fax: +351 282 405 277
museu@cm-portimao.pt
www.cm-portimao.pt


4. Comentário do editor:

Parabéns, Valdemar, és um grande observador, ou não fosses um "comercial", batido, treinado e experimentado... Pois claro que vamos publicar... Ampliando a foto, não há dúvida que a lata, amarela, que o miúdo (o "djubi", à esquerda da miúda de branco) leva à cabeça, ostenta as letras da marca "MANOS" (ou "[HER]MANOS"... Inclino-me mais para a primeira hipótese, "MANOS", e de se tratar de um lata de atum, talvez de um quilo... A lata que a "bajudinha" leva à cabeça, embora também de cor amarela, parece ser de outra marca, e de outro produto...

A indústria conserveira portuguesa sempre ganhou com as guerras... Muito conserva de peixe (atum, cavala e sardinha...) se consumiu nos nossos "ranchos", de todas as maneiras e feitios, acompanhadas com feijão, arroz, massa, esparguete,  etc. Hoje adoro conservas de peixe ("portuguesas", que são as melhores do mundo, e um autêntico produto "gourmet"...), mas durante anos não suportava sequer o seu cheiro... O que chegava à Guiné, no tempo da guerra,  devia ser o que não se exportava... 

Já mandei ao Virgílio Teixeira, em primeira mão, para ele poder comentar. Ab, Luis


5. Comentário do Virgílio Teixeira, com data de 23 do corrente:



Olá, Luís.

Obrigado pela prioridade. Realmente esta foto não vai ficar por aqui.

Acho que o Valdemar Silva tem olho clínico, para mim isto é mais uma das 1000 fotos que estavam no baú das recordações que iriam para o lixo um dia, quando passasse para o lado daqueles "que da lei da morte se foram libertando"...

Sucintamente, já não tenho duvidas de que se trata dessa peça de museu, já vi na página do Museu de Portimão, caixas muito parecidas e a cor amarela e o tipo de letra não deixa margem para dúvidas. Mas vou mais longe, acho que estão lá mais 3 latas dessas, só que não se percebe o nome, mas o estilo é o mesmo.

Como foram lá parar à tropa conservas de tanta qualidade? Não sei. Eu nunca vi, mas eram latas grandes para servir nas messes e cantinas, não era uso individual. Posso adiantar,  por exemplo, que poderão ter vindo da África do Sul, país de onde vinha tanta coisa que não havia em Portugal, as águas Perrier, a Coca Cola, todas as bebidas e tabaco do mais caro na altura no mundo, bem como, tanta lata de conservas de frutas, ananás, pêssego, pêra,  tudo em calda, isso lembro-me bem, comia muita fruta dessa.

Se não era da Africa do Sul, poderia ser de outro país europeu para onde a marca exportava, e porque eram latas de qualidade, pela amostra que vemos, ali na foto estão 4 dessas espécies.

Vamos explorar mais este assunto, e podes á vontade publicar no Blogue, podem vir mais comentários para chegarmos lá, e ainda vamos mandar para o Museu de Portimão a foto representativa daquilo que agora vou chamar de «As sobras do rancho da tropa na Guiné" (**).
Vou mandar cópias disto para a minha nora, pois ela é especialista em Museus etc.... Pode ser que ela nos dê uma ajuda, e assim o nosso trabalho nunca será esquecido. 

Ab, Virgílio





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > 2006 > "Laranjada Convento / Mafra / Marca registada"... Restos arqueológicos de uma guerra... e que hoje figuram no Núcleo Museológico Memória de Guiledje. Foram-nos enviadas pelo nosso saudoso amigo e grã-trabanqueiro Pepito, o o engº Carlos Schwarz da Silva (1949-2012), na altura diretor executivo da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau.

Na imagem pode ler-se: "Composição: Sumo - Popa e óleo de laranja - Açúcar granulado - Água esterelizada / Corado artificialmente / Fabricado por Francisco Alves & Filho Lda / Venda do Pinheiro"...

Houve muita gente, na Metrópole, a ganhar dinheiro com a guerra, a começar pelos industriais do sector agroalimentar ... Ainda conheci o Sr. Francisco Alves e um dos seus filhos, quando trabalhei na administração fiscal em Mafra, em dezembro de 1973, num "jantar de Natal" que ele ofereceu ao "pessoal das Finanças", como era da tradição: foi na fábrica, em Venda o Pinheiro, tudo muito bem "regado", eu, que era "novato" no ofício e na repartição, não me membro de ter bebido "produtos da casa"... Constava que o seu sucesso, nos negócios, tinha começado no tempo da guerra de Espanha (1936-1939)...

Uma das marcas famosas da firma era a Laranjinha C, cuja história, ao que parece, remontava  já  a 1926, "ano da fundação da empresa Francisco Alves e Filhos, na Venda do Pinheiro", e "em que o empresário Francisco Alves começou a produzir pirolitos, para além de outros refrigerantes".

(...) "As garrafas da empresa ostentavam a forma da mole granítica de Mafra e a designação de Convento, mas apesar da fama conquistada, só ocasionalmente, a distribuição das bebidas ultrapassava os limites do concelho de Mafra. Com o final da 2ª Guerra Mundial, a empresa dá o grande passo e lança no mercado a Laranjina C, com a sua garrafa original e distribuição a nível nacional. A marca Larangina C, teve um período de ouro, com publicidade constante na televisão, um grande prémio de ciclismo, e chegou a patrocionar a equipa de ciclismo do Sporting.  No ano de 1970, através de um acordo com a multinacional Gesfor, é introduzida em Portugal a marca TriNaranjus, um produto natural, SEM BORBULHAS e com verdadeiro sumo de fruta. Nesta altura, a família Alves vê-se forçada a optar por uma das marcas produzidas. Em 1990, a empresa da família Alves, foi adquirida pelo grupo Cadbury-Schweppes Portugal, SA." (...)

Na Guiné (como de resto nos outros Teatros Operacionais), o "ventre da guerra" obrigava, por seu turno, a uma tremenda logística... Quantos camaradas nossos não terão morrido ou sofrido para que esta garrafa de laranjada "Convento de Mafra" chegasse a Guileje, no sul da Guiné ? Ou as latas de conservas da marca "[Her]Manos" chegasse a São Domingos, no norte ?

5. Comentário de LG:

Virgílio, já descobrimos outras marcas de produtos portugueses, usados pelas NT... Por exemplo, a laranjinha C e outros refrigerantes, em garrafas que ficaram enterradas sob as ruínas do quartel de Guileje,  arrasado pela nossa aviação... Deves lembra-te de mais marcas, de fornecedores das NT, até pelas tuas funções, para além das que já mencionaste, oriundas da África do Sul (a Coca-Cola, a Fanta, etc.).

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 19 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18758: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXVI: História e imagens de São Domingos: fotos de 1 a 8

(***) Último poste da série > 21 de junho de 2018 Guiné 61/74 - P18762: Fotos à procura de...uma legenda (105): O 'rancho dos pobres'... (Virgílio Teixeira / Luís Graça / Cherno Baldé / Valdemar Queiroz)