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terça-feira, 11 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26573: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (2): Partida para Nova Sintra - Chegada a Nova Sintra - Em Nova Sintra

CCAV 2483 / BCAV 2867 - CAVALEIROS DE NOVA SINTRA
GUINÉ, 1969/70


VIVÊNCIAS EM NOVA SINTRA

POR ANÍBAL JOSÉ DA SILVA


4 - PARTIDA PARA NOVA SINTRA
Paragem no Enxudé
Cais de Bolama
Desembarque em Lala

A 3 de Março de 1969 a minha companhia foi transportada em duas LDM (lancha dedesembarque média). Fizemos uma primeira escala no Enxudé e depois aportamos a Bolama onde dormimos duas noites. Na manhã do dia 5 retomamos a viagem e depois chegamos finalmente a Lala, onde desembarcamos. As LDM baixaram as empanadas sobre o tarrafo (arvoredo rasteiro) e ordeiramente fomos saindo. Iniciámos o primeiro trajeto por entre a mata verdejante. Às tantas ouviu-se um tiro. Foi o furriel Barriga, caçador nato, que não resistiu a atirar sobre uma gazela. O comandante do Batalhão, que nos acompanhava, queria aplicar-lhe uma sanção disciplinar (vulgo porrada) mas ficou-se pela advertência e um raspanete. Nova Sintra estava a seis quilómetros de distância


5 - CHEGADA A NOVA SINTRA
Vista aérea do quartel
Entrada em Nova Sintra
A messe de oficiais e secretaria

Finalmente chegamos e tive a primeira desilusão. Ao entrar dentro do arame farpado, parei e perguntei a mim mesmo: é aqui que vou viver durante seis meses? Na verdade, não foram seis, mas vinte. Os únicos edifícios à superfície, se lhes podia chamar assim, eram toscos e mal amanhados. Havia o abrigo dos oficiais, secretaria, cantina, depósito de géneros, transmissões e posto médico. Não havia camaratas mas sim abrigos subterrâneos, cobertos por troncos de palmeira com um metro de terra em cima e placas de zinco a fazer de telhado, tendo duas entradas nas extremidades, em zig-zag, para evitar eventual entrada de granadas. Estavam dispersos ao redor do quartel. Não havia refeitório único, pois cada abrigo tinha o seu, o que em termos de segurança era uma boa estratégia. Luz elétrica só havia à noite, fornecida por um gerador. Messe de sargentos também não havia e os furriéis estavam distribuídos pelos diversos abrigos. Quanto à latrina não digo nada, recuso-me. A pista de aviação era a descer e com muitos sulcos, principalmente na época das chuvas. As viaturas ficavam estacionadas na “garagem estrela “, a céu aberto. Também a céu aberto era a cozinha, tendo posteriormente arranjado uma solução melhor. A água era obtida numa fonte a dois quilómetros de distância. Enfim, um condomínio fechado, um resort, se quiserem, do tempo pré histórico.


6 - EM NOVA SINTRA
O meu abrigo/dormitório
A cozinha ao ar livre
Cantina/Depósito de géneros/material

A minha companhia foi destacada para Nova Sintra com a promessa de ao fim de seis meses ser feita uma rotação de companhias. Dizia o comando do Batalhão que era a mais bem preparada para enfrentar o primeiro impacto, liderada pelo capitão Bernardo, o mais jovem e mais bem capacitado relativamente aos outros dois capitães, da CCAV 2482 e CCAV 2484, destacadas em Fulacunda e Jabadá, respetivamente. Mas o azar bateu-nos à porta. No dia 11 de Julho de 1969, num trilho em direção a um acampamento IN, de madrugada, o capitão Bernardo pisou uma mina que lhe amputou uma perna e provocou ferimentos graves na outra. Foi o primeiro ferido e logo com tamanha gravidade. Ficamos sem capitão até Setembro de 1969. Nesse intervalo assumiu o comando o alferes Luís Martinho, dado ser o mais bem classificado entre os alferes. Esta perda ocasionou que ficássemos sem força para reivindicar a prometida rotação. Os outros capitães tudo fizeram para que assim fosse. Numa visita ao nosso aquartelamento, ouvi o capitão Morais, de Fulacunda os (BoinasNegras), onde estava o meu amigo e conterrâneo Fausto, dizer ao seu alferes Sousa e Silva, que o acompanhava, que iria fazer todos os possíveis para não levar os seus homens para aquele fim de mundo. O certo é que conseguiu, pois acabamos por ficar em Nova Sintra vinte meses. Depois tivemos mais dois capitães, desta vez, milicianos. Primeiro o capitão Loureiro e depois o capitão Gamado. O capitão Loureiro, natural de Cedofeita, no Porto, dizia que estava ali para ganhar dinheiro para poder terminar o curso de direito. Bom operacional, nas colunas e não só, ia sempre à frente junto dos picadores. As minas detetadas eram levantadas por ele e ainda foram algumas. O capitão Gamado estava descansado em casa, pois já tinha feito o tempo normal de tropa, mas foi mobilizado, dada a falta de oficiais do quadro.
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Nota do editor

Último post da série de 4 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26551: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (1) Formação do BCAV 2867 - Partida para a Guiné e Chegada a Bissau

1 comentário:

Anónimo disse...

O camarada furriel Barriga é meu amigo de infância. Estudou em Faro no liceu e eu na escola técnica. Ainda estive com ele em Bolama antes de 03 de Novembro de 1969,, data em que partimos para a zona operacional. Na companhia de Jabadá tinha um primo com o qual também estive em Bolama, no regresso que fizeram duma operação. O 1ocabo Emílio Piloto
Abraço e venham mais histórias.
Eduardo Estrela