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sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25151: (In)citações (264): Adjarama, Amadu Bailo Djaló, por essa lição de vida (Cherno Baldé).



Lisboa > 2009 > O Amadu Djaló no Cais do Sodré... A solidão de Lisboa, onde apesar de tudo teve camaradas que o ajudaram, a começar pela Associação de Comandos e o Virgínio Briote... No final do seu livro de memórias, publicado em 2010, escreveu: "Deixámos o passado para trás. Por quê o ódio? E a vingança? Qual é o destino da vingança? É a guerra! Qual o destino final da guerra? Estropiados, sangue, lágrimas, pobreza, suor, trabalho. Vai demorar muitos anos para acabar com a pobreza." (In: Amadu Bailo Djaló -  "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, il.,  pág., 286) .

Foto (e legenda): © Virgínio Briote  (2015). Todos os direitos reservados.
[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentários ao poste P25147 (*)

(i) Tabanca Grande Luís Graça:

O Amílcar Cabral e o seu partido e os seus comandantes, a começar pelo 'Nino', teriam ficado na História, se tivessem deposto as armas tal como os tugas o fizeram, feito as pazes com todos e lançado as bases da reconciliação e do futuro...

Tinham preparado o seu país para um sociedade democrática, pluralista, pluriétnica, pluripartidária, pacifista, e formado os quadros que não tinham, com apoio da antiga potência colonial (agora um país reconciliado com a sua tradição de sociedade democrática, aberta e plural) e dos novos amigos (a Suécia, etc.), durante um periodo transitório de dez anos...

Ao fim desses dez anos, fariam eleições livres... Mas não, não era essa infelizmente a sua matriz ideológica, baseada no pensamento único de um único homem... (que não conseguiu pòr os outros a pensar pela sua própria cabeça).

Era o modelo do partido único, o que estava "a dar" nos anos 60/70 em África e no resto do chamado Terceiro Mundo... E ainda o é, tragicamente, o que predomina, na maior parte do planeta,  em quse toda a Africa, na Chin, na  Rússia, no Irão, na Arãbia Saudita, e por aí fora...

O poder estava na ponta das espingardas, à esquerda e à direita., e o mundo bipolarizado.. E viu-se: os Cabrais, os 'Ninos', etc., foram um desastre a governar... e acabaram por se trucidar uns aos outros.

De que é que o PAIGC tinha medo ? Se calhar de si próprio... Não era dos fulas nem dos comandos (que podiam perfeitamente ser  integrados num futuro exército nacional)... Claro que era preciso dinheiro ("divisas") para alimentar o povo... O arroz não cai do céu...

(ii) Cherno Baldé:

(...) O PAIGC tinha medo,  sim, tinha medo dos fulas, mas não de todos,  e foi essa particularidade que salvou o nosso Amadu Bailo Djalo que, na verdade, arriscou muito ficando em Bafatá, mas também a desgraça e a morte estavam em todos os lados, muitos que tinham fugido, depois foram recambiados.

A meu ver, o PAIGC tinha medo dos régulos fulas que tinham recusado, na sua totalidade e sistematicamente, aderir às  ideias e à ideologia da luta da libertação nacional, dirigida por uma elite urbana de Cabo-verdianos e de Grumetes de Bissau com os quais não se identificavam e não tinham nenhuma confiança quanto ao futuro do território. 

Não sei e não posso dizer quem teria razão, mas a verdade é que os seus interesses e perspectivas eram divergentes e, logo após a independência, a primeira medida de segurança que tomaram foi decapitar os poderes tradicionais das comunidades (fulas e manjacos) que tinham tido um comportamento recalcitrante em relação a (senão mesmo contra)  a luta do partido libertador.

Sobre a foto da casa Gouveia, sou de opinião contrária (*).Esta foto deve ser dos finais da década de 1970 ou início de 80. Os sinais: não se vê nenhum veículo militar, não se vê nenhum branco, civil ou militar, a circular no largo do mercado, o que não seria normal no período anterior à independência. 

Os edifícios estão um pouco degradados e as paredes parecem sujas com falta de pintura, o parque ao lado tem sinais de degradaçãoo e não se vêm sinais de embelezamento e parece reinar uma certa apatia, abandono e tristeza ao redor. 

Além disso, o camião da marca "Bedford" não é da casa Gouveia,  cujas portas parecem fechadas e há uma aglomeração anormal à frente das portas, o que denota desordem e abandono. 

Não, Luís Graça, esta imagem é dos tempos novos e tristes que se abateram sobre Bafatá e a Guiné no período posterior que eu bem conheci porque acompanhei, entre 1975/79, como estudante do Liceu local.

O camião deve estar à espera de poder ser alugado para cargas ou passageiros assim como o Toyota Hylux noutra berma, adaptada para transporte de pessoas e de cargas porque já não havia colunas militares nem para as localidades próximas e/ou longínquas. Muitos dos antigos soldados condutores na situação de reformados tinham adquiridos meios de transporte como forma de continuar a trabahar e sustentar a família.

O Amadu Djalo diz, no seu texto, que 3 anos depois ofereceu ao Ansumane Injai, o homem que o tinha feito prisioneiro,  20 Escudos, mas na realidade deviam ser Pesos Guineenses (PG), porque em meados de 1978 já não circulavam os escudos do período colonial.

A morte por sufoco dos presos do Senegal em Farim (caso que também já denunciei aqui no Blogue) resultou de um acordo que o regime do Luís Cabral tinha assinado com o Presidente LS Senghor em contrapartida da pesca nas nossas águas territoriais.

 Aquela nota redigida por Luís Cabral a lamentar as mortes de pessoas recambiadas de forma indiscriminada pelas autoridades do Senegal,  não passava de lágrimas de crocodilo, pois dentro do PAIGC ninguém era inocente dos atropelos e crimes que eram cometidos, todos sabiam o que estava a acontecer e todos podem ser considerados cúmplices, porque existia uma espécie de consenso interno desde os tempos de A. Cabral, sobre o destino reservado aos traidores da pátria a que, apesar da ferocidade aparente, no entanto, alguns puderam fazer tábua rasa,  ajudando os seus conhecidos e/ou entes queridos. O Aladje Mané,  deputado da ANP na época colonial,  foi depois membro influente e dirigente do PAIGC, o Cadogo Junior e muitos outros não foram incomodados, estando a viver em grande e em Bissau.

Após a leitura, ontem, de um extrato muito interessante do livro de memórias do comandante Pedro Pires (antigo Presidente de Cabo Verde), descrevendo o seu período de travessia de deserto, quando foi obrigado a sair nas eleições que seguiram à abertura política de 1991,  e, ao ler, hoje, o desabafo do Amadu Djaló, antigo combatente 'comando', sobre o ser humano ("O  povo era falso, não podíamos ter confiança em ninguém. O povo não tem cor, nem medida, nem peso, é tudo falso.”)...

Hoje vou dormir muito tranquilo e sem nenhumas ilusões sobre o ser humano.
Adjarama, Amadu Bailo Djalo por essa lição de vida. (**)

domingo, 4 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25136: S(C)em Comentários (27): Amadu Djaló 'versus' Abdulai Jamanca ? Um, filho de pais "estrangeiros" (originários da Guiné-Conacri), seria "uma espécie de mercenário, a soldo do regime"; o outro, "era da nobreza fulacunda, cioso de defender o chão fula" (Cherno Baldé, Bissau, "dixit"


Guiné > Bissalanca > O 1º cabo 'cmd'  Abdulai Queta Jamanca a ser condecorado com a Cruz de Guerra pelo coronel Kruz Abecasis (Cmdt da BA 12) em 10 de Junho de 1967 (?). Foto do álbum  nosso editor jubilado Virgínio Briote. (Comentário de Vb: Luis Graça, a foto do Abdulai Djamanca a ser condecorado pelo, julgo, então Brigadeiro (ou General?) PilAv Krus Abecasis não é da minha autoria. Foi-me oferecida pelo Sargento Tudela do GrCmds Vampiros e penso que foi tirada em Junho de 1967 (?) em Bissau. De resto já a vi inúmeras vezes na Net.V Briote 4 de fevereiro de 2024 às 22:05,)



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > O 1º  cabo 'cmd' Amadu Bailo Djal´o, em Bafatá, sua terra natal, por volta de meados de 1966. (Foto reproduzida no seu livro, na pág. 149, "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, il.).

Fotos (e legendas): Arquivo doBlogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2'024)


1. Excerto de um comentário do nosso colaborador permanente Cherno Baldé (*), que tem de ser apreciado com "pinças", dada a ambiguidade semântica e conceptual da expressão aqui usada ("uma espécie de mercenário").

Tanto o Cherno Baldé como o Amadu Djaló, infelizmente já falecido, são dois membros, muito queridos da nossa Tabanca Grande. Este comentário tem de ser contextualizado no âmbito da séri em que foi produzido, e cujpo título é, inequivocamente,  a melhor homenagem que podemos produzior a um amigo e camarada de armas: "Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano": 

(...) Relativamente aos episódios relatados por Amadu Bailo Djaló (*), pode-se concluir, simplesmente, que ambos os lados já estavam cansados da guerra. 

No entanto, penso que a postura do tennete Jamanca teria sido a mais adequada naquelas circunstâncias concretas, pois a guerrilha nunca cumpria suas promessas e sempre que acenavam com a paz, estariam a adormecer as atenções para poder montar uma cilada mortífera. 

Não podiam confiar e, demais a mais, os dois homens (Jamanca e Amadu Djaló) lutavam por objectivos diferentes conforme suas origens e interesses, o ten Jamanca era da nobreza fulacunda, ciosa de defender o Chão fula enquanto que o Amadu Djaló, filho de pais originários da Guiné-Conacri, seria uma espécie de mercenário a soldo do regime. 

Estas nuances étnico-tribais não eram do conhecimento dos chefes militares ou eram pouco consideradas. (...) (**)

1 de fevereiro de 2024 às 18:34 

_________________

Notas do editor:

Guiné 61/74 - P25134: A 23ª hora: Memórias do consulado do Gen Inf Bettencourt Rodrigues, Governador-geral e Com-chefe do CTIG (21 de setembro de 1973-26 de abril de 1974) - Parte II: A carestia do arroz em fins de 1973, e a intervenção do Governo, regulando o mercado e fixando o preço que passa de 5$50 para 7$00/kg

Gen de três estrelas, Bethencourt Rodrigues 

(Funchal, 1918 - Lisboa, 2011) (*)




Excerto de uma relação de artigos de víveres existentes à data de 17/6/1974 na CCS/BART 6523 (Nova Lamego, 1972/74), destaque para o caso do arroz, que tem dois preços: um, seguramente importado, a 14$50/Kg, e outro de produção local, a 87$00/Kg. (**)

Fonte: cortesia de José Saúde (2016). [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Uma "batata quente" que estalou nas mãos do novo Governador-geral e Com-chefe da Guiné, o Gen Bettencourt Rodrigues, foi a carestia de vida, provocada pelo aumento da generalidade dos bens essenciais para o abastecimento tanto da tropa como da população civil, na sequência do choque petrolífero e da crise económica de finais de 1973. Teve  consequências na economia, no aumento dos preços, na inflação que disparou, no aumemto das despesas  militares e da administração civil, nas acrescidas dificuldades de  transporte de tropas e material, no fornecimento de combustíveis, enfim, na logística, na alimentação e no moral da tropa, na ação psicossocial, etc. 1974 foi o "anus horribilis" de Marcello Caetano mas também o do governador-geral e com-chefe da Guiné.


Sobre a crise petrolífera de 1973, recorde-se que foi desencadeada por um protesto dos países árabes, com destaque para a Arábia Saudita, pelo apoio prestado pelos Estados Unidos a Israel durante a Guerra do Yom Kippur (de 6 a 23 de outubro de 1973), um conflito particularmente sangrento com milhares de baixas de um lado e do outro.

Como represália, os países árabes organizados na OPEP (criada em 1960 pela Arábia Saudita, Kuwait, Irão, Iraque e Venezuela) o preço do petróleo aumemntou em mais de 400%. Em março de 1974, os preços nominais tinham subido de 3 para 12 dólares por barril (a preços atuais, de 14 para 58).

O Canadá, o Japão, a Holanda, o Reino Unido e os Estados Unidos foram os principais alvos do embargo inicial que se estendeu depois a Portugal, a Rodésia e a África do Sul.  Os efeitos económicos e financeiros, a nível internacional, fizeram-se sentir de imediato. Por exemplo, em Portugal, o litro de gasolina super passa de 7,5 escudos para 11 escudos (o equivalente, a preços atuais, a 2,32 €). Esta crise, de 1973, ficou conhecida como o "primeiro choque petrolífero". Outro se seguiu em 1979. (Fonte: Wikipédia > Crise petrolífera de 1973).

No caso de Portugal, tiveram tremendas consequências económicas, financeiras e político-militares, que já não cabe aqui analisar, mas que vão desembocar, indiretamente, no golpe de Estado do 25 de Abril de 1974 e no fim da guerra colonial, numa altura em que a situação militar, no terreno (incluindo na Guiné) estava longe de ser desfavorável para o exército português.(**)

Anos depois, em 1977, o gen Bettencourt Rodrigues reduz esta crise apenas ao aumento do preço de arroz (que o Governo teve de contingentar e tabelar, passando de 5$50 para 7$00/Kg)... Limita-se a re4conhecer que a medida foi "impopular"... Claro que o general nunca foi ao mato ver os preços que se praticavam nas lojas dos Fernando Rendeiro e dos Jamil Heneni,,, nem nunca deve ter falado  com os vagomestres das subunidades. Seis meses depois, em junho de 1974 havia arroz, na CCS do batalhão de Nova Lamego a 14$50 / Kg...

Vejamos então como Bettencourt Rodrigues via o "problema do arroz" no tempo em que era o "homem grande de Bissau":

(...) "Problema que afetava toda a população da Guiné, era o do abastecimento de arroz base, primeira da sua alimentação.

"Reduzida a produção local a cerca de 50% das necessidades, por aumento do consumo e diminuição da produção, como consequência da guerra e dum certo afastamento do trabalho na terra por parte da população, em especial da mais jovem, desde fins de 71,  princípios de 72, a importação passou a encontrar dificuldades crescentes,  por forças da escassez de cereais dos mercados mundiais e da elevação de preços  quer do produto,  quer dos transportes.

"Assim, em fins de 1973 houve  necessidade de contingentar a distribuição e de elevar o preço tabeladom  de 5$50 para 7$00 escudos,  suportando, embora o Governo um encargo não inferior a 2$50 / kg.

"Estas medidas não foram naturalmente recebidas com grande pela população, apesar do arroz ser vendido nos territórios vizinhos a preços muito superiores ao praticado na Guiné (Senegal, 14$00, e República da Guiné. 22 a 26$00) e de ter havido um aumento do preço de aquisição ao produtor local de cerca de 25%.

"Para atenuar uma situação de abastecimento com tendência para se agravar, dada a progressiva retração do mercado mundial, independentemente de custos, várias ações foram empreendidas, como a diversificação da dieta alimentar tradicional, para o que se recorreu à importação de milho e feijão, a recuperação de bolanhas e uma intensificação do esforço para aumento da produção, pelo apoio à cooperativização dos agricultores, distribuição de sementes de arroz seleccionadas e de adubso e apoio técnico dos Serviços Provinciais de Agricultura, além do aumento dos preços de aquisição ao produtor." (...)

Fonte: excertos de Gen. Bethencourt Rodrigues, "Guiné", in Joaquim da Luz Cunha et al. "África: a vitória traída" (Lisboa, Editorial Intervenção, 1977), pp. 111/112.

 

2. Comentário de Cherno Baldé ao poste P25130 (*):

(...) Ainda antes do 25A74, o tal arroz de abastecimento do mercado local chegou, mas por algum motivo ligado a sua qualidade, a população dos centros urbanos que já estavam dependentes do arroz importado, deram-lhe o nome de "arroz Bettencourt",  talvez em forma de protesto pela qualidade inferior relativamente ao que estavam habituados durante o consulado do gen Spínola.

Este deve ser o primeiro sinal das mudanças ocasionadas pela partida do gen Spínola e o fim não anunciado da sua política "por uma Guiné melhor".

De salientar que, na altura, a dieta das populações do interior, especialmente do Leste, Norte e Nordeste, era a base do milho e folhas de vegetais (milheto, milho Brasil, cavalo, sorgo, entre outros) e um pouco do arroz de sequeiro e o produzido nas bolanhas. 

Hoje em dia o milho quase que desapareceu da dieta alimentar dos guineenses devido as más influências dos centros urbanos iniciadas na época do gen Spínola, pela facilidade de aquisição do arroz importado com a expansão da produção e venda do caju, transformado no principal produto de exportação e, também, pela diminuição global da produção do milho, devido a influência das mudanças climáticas que afectam, sobremaneira, as regiões dos trópicos. (...).

 
3 de fevereiro de 2024 às 10:24

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Notas do editor:


(***) Vd. poste de 16 de março de  2022 > Guiné 61/74 - P23083: Recortes de imprensa (121): Debate sobre a Guiné-Bissau na Assembleia Geral da ONU em plena crise petrolífera (Diário de Lisboa, 23 de outubro de 1973)

sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25087: S(C)em Comentários (26): Os últimos anos do Amadu Djaló foram de amargura e arrependimento? (António Graça de Abreu / Joaquim Luís Fernandes / Cherno Baldé / João Crisóstomo)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > O autor, em Bafatá, sua terra natal, por volta de meados de 1966. (Foto reproduzida no seu livro de memórias, na pág. 149).


1. Estamos quase a acabar a publicação das memórias do Amadu Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015)... Sem nos queremos antecipar ao que nos falta ler, e perceber melhor o fim da sua hstória de vida como militar e como homem, aqui ficam as últimas três ou quatro linhas com que encerra o livro, "
 Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada).

(...) "Deixámos o passado para trás. Por quê o ódio? E a vingança? Qual é o destino da vingança? É a guerra! Qual o destino final da guerra? Estropiados, sangue, lágrimas, pobreza, suor, trabalho.

Vai demorar muitos anos para acabar com a pobreza." (...)


Entretanto, fizemos uma seleção de comentários ao Poste P25009 (*), em que o Cherno Baldé escreveu: "os últimos anos do Amad Djaló (...) devem ter sido de uma grande amargura e de arrependimento", afirmação que deu origem a vários comentários, de que aqui vai uma seleção (**). Falta-nos o testemunho fundamental do seu editor literário, camarada e amigo, o nosso coeditor jubilado Virgínio Briote:

(i) António Gaça de Abreu:

Conheci o Amadu Djaló, aqui em Lisboa, pouco antes dele partir, na viagem definitiva, e não me pareceu ser uma pessoa marcada por grande amargura e arrependimento, coisas que também não transparecem nos seus textos que o Virginio Briote alinhou.

Não estará aqui o Cherno Baldé a dar uma no cravo e outra na ferradura?

Abraço | António Graça de Abreu | 28 de dezembro de 2023 às 22:38



(i) Joaquim Luis Fernandes:

Este comentário, do respeitável amigo Cherno Baldé, não é de fácil compreensão.

Que havia oficiais, alguns superiores, que deixavam muito a desejar, no seu caráter humanista e de militares exemplares, nada a dizer! Até eu, disso me apercebi, infelizmente.

Que os Soldados Comandos da Guiné eram homens destemidos, leais e valorosos, ao serviço do exército português na Guiné, com várias motivações para se alistarem no BCMD da Guiné, é um facto bem evidenciado.

Agora dizer, que ficariam melhor ao lado do PAIGC, por troca com os guerrilheiros do PAIGC, que atentaram contra a vida de Amílcar Cabral... não entendo!

O que tinham de comum, com o exército português, Inocêncio Kanie e os seus companheiros, que vindos da base naval no Mar Negro, da antiga União Soviética, e regressados a Conákri se encontraram com Momo Turé e outros seus camaradas, para se constituirem como grupo conspirador?

29 de dezembro de 2023 às 11:32



(iii) Cherno Baldé:

Caros amigos,

Vocês, na qualidade de antigos combatentes, veteranos, que sentiram no coração, na carne e no osso as agruras da guerra da Guiné, estão melhor colocados para ajuizar dos desabafos e sentimentos de um ex-colega embora esteja convencido que poucos pudessem estar na sua pele de ex-soldado 'comando', a quem podiam atirar em zonas quase desconhecidas e de perigo extremo como o aqui relatado caso da Caboiana onde até os bravos comandos não estiveram à altura de cumprir com o seu lema sagrado de " nunca deixar ninguém para trás". Muito triste.

Também, parece que a política de reformas no caso dos militares na Guiné contrasta com a portuguesa, pois o mais frequente é promoverem o candidato a um escalão superior de forma a atenuar as condições de vida, embora saibamos que não há termos de comparação entre os dois países, mas pelo menos o tratamento parece mais humano e aceitável.

Em 1998, durante a guerra civil em Bissau, desloquei-me à cidade fronteiriça de Kolda em visita familiar e, ao constatar as deploráveis condições sócio-económicas em que viviam, sem luz, sem água, eu disse-lhes: "Vocês têm todo interesse em se juntarem aos rebeldes da MDFC". 

No dia seguinte agradeceram-me educadamente e pediram-me para regressar ao meu país, o que fiz sem hesitar, mas sem quaisquer remorsos.

Cordialmente | Cherno Baldé | 29 de dezembro de 2023 às 12:16



(iv) Joaquim Luis Fernandes

Caro amigo Cherno, acredita que aceito e compreendo o teu desabafo! É um facto que nem sempre as chefias do exército português respeitaram e protegeram os seus soldados, e de forma mais evidente. os oriundos do território guineense.

Nem todos honraram a farda que envergavam e a bandeira que juraram defender. Tal como no PAIGC havia traidores à causa que defendiam, também os havia infiltrados nas Forças Armadas Portuguesas na Guiné. A forma como se abandonaram os seus soldados guineenses, diz muito dessa atitude de desrespeito e mesmo de traição.

Para ti, a tua família e os amigos da Guiné-Bissau, faço votos de um novo ano de 2024, com boa saúde, paz e prosperidade.

Abraços fraternos | JLFernandes | 30 de dezembro de 2023 às 22:47



(v) João Crisóstomo:

Nova iorque, às 04.58 da manhã do dia 17 de Janeiro de 2024.

Ler os comentários de posts é uma das coisas que gosto de fazer, pois eles de alguma maneira nos transmitem os sentimentos muito pessoais de quem os escreve.

Estes e outros comentários deixam-me triste pela amargura e sofrimento evidentes em muitos de nós ainda hoje existentes passados 50 anos.

Não sei o que dizer para tentar "suavizar" os corações e mentes de quem escreve estas palavras. É que também eu choro quando me lembro do muito que se sofreu , especialmente daqueles que dum lado ou outro acreditavam que deviam lutar, prontos a dar a sua vida por aquilo em que acreditavam, incluindo a amizade que unia muitos de nós. Dum modo especial os que o sofreram em circunstancias trágicas, fora e longe de momentos de luta armada , mas barbaramente mortos em momentos fora de combate, como sucedia por vezes durante os muitos anos que a luta durou, especialmente em situações de vinganças e represálias.

É com respeito e dor que vivo também estes momentos de dor e me associo a todos os que escrevendo e lembrando, como estou fazendo agora, estejam aida hoje à procura de paz.
"Estou convosco" é tudo que posso dizer.

João Crisóstomo | 17 de janeiro de 2024 às 10:02

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Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 28 de dezembro de 2023 > Guiné 61/74 - P25009: S(C)em Comentários (24): Os últimos anos do Amadu Djaló (1940-2015) devem ter sido de uma grande amargura e de arrependimento (Cherno Baldé, Bissau)

(**) Último poste da série > 17 de janeiro de 2024 > Guné 61/74 - P25078: S(C)em Comentáios (25): Salvemos a nossa correspondência de guerra, e nomeadamente os aerogramas que escrevemos (amarelos) e que recebemos (azuis)

quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P25009: S(C)em Comentários (24): Os últimos anos do Amadu Djaló (1940-2015) devem ter sido de uma grande amargura e de arrependimento (Cherno Baldé, Bissau)


Lisboa > 2009 > O Amadu Djaló
(1940-2015)
no Cais do Sodré. 

1. Comentário do Cherno Baldé (*),  nosso "correspondente em Bissau", colaborador permanente com o pelouro das questões etno-limguísticas:


 (...) O mais que triste depoimento do soldado  'comando' Amadu Bailo Djaló sobre as desrespeitosas palavras e indecentes propostas do tenente coronel do Batalhão de Gabu, apetece-me dizer que havia soldados guineenses que lutavam do lado do exército português que, por muitas e variadas razões, deveriam lutar d'outro lado e, talvez, muitos que se encontravam d'outro lado, deveriam lutar do lado português, pelo menos aqueles que conspiraram para matar o seu líder, Amílcar Cabral. 

Os últimos anos do Amadu Djaló devem ter sido de uma grande amargura e de arrependimento. Mas, a verdade seja dita, quem é que o não está de entre os antigos combatentes que levante os braços?! (...)

23 de dezembro de 2023 às 14:54 (**)
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Notas do editor:

sábado, 2 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24908: As nossas geografias emocionais (18): Boma ou a fonte de Bafatá do meu tempo da Mocidade Portuguesa (em 1973) e depois de estudante liceal (1975) (Cherno Baldé, Bissau)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 2010> A antiga fonte de Bafatá. "(...) em 1968/69 estava num grau de conservação normal, quando fui lá em 2010 o terreno, por força das chuvas, tinha subido mais de um metro subterrando o tanque. Também em 2010 já tinha desaparecido a placa com a data da construção." (...)

Foto (e legenda): © Fernando Gouveia (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Bafatá > Bafatá > "Fonte Pública de Bafatá, 1918". Na foto, o Manuel Mata, que vive no Crato,  ex-1º cabo apontador de Carros de Combate M 47 do Esq Rec Fox 2640. Esta belíssima fonte, na zona da "Mãe de Água", também conhecida na época colonial como "Sintra de Bafatá", é portanto do início do desenvolvimento urbano de Batafá, ainda no tempo da República. Ainda chegou aos tempos do Cherno Baldé, quando, depois da independência, ele foi para Bafatá estudar.

Foto (e legenda): © Manuel Mata (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona leste > Fajonquito > 10 de junho de 1971 >  "O meu irmão Carlos (2 anos mais velho, hoje Farmacêutico, formado pela Faculdade de Farmácia da Universidade Técnica de Lisboa), durante a alocução por ocasião do dia 10 de Junho de 1971, Dia de Portugal e de Camões, na escola primária de Fajonquito. Na imagem estão dois oficiais da companhia do cap Figueiredo (CART 2742), um dos quais, o alferes Félix encontrou a morte no mesmo dia que o seu capitão."

Foto (e legenda): © Cherno Baldé (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário de Cherno Baldé ao poste P24805 (*):


Cherno Baldé, quadro superior
com formação em  economia e gestão,
vive e trabalha em Bissau;
colaborador permanente do nosso blogue:
 integra a Tabanca Grande
desde 19/6/2009; tem cerca de 290
referências no blogue.

Caros amigos,

A fonte (nascente) de Bafatá que conheci desde a minha primeira viagem a esta cidade na qualidade de "infante" da Mocidade Portuguesa ou mocidade "treco" (ou "tareco"), como nos apelidaram os colegas de Bafatá em 1973, praticamente serviu-nos de residência durante alguns dias, pois vindos do interior não conhecíamos ninguém na cidade, mas só durante o dia, porque à noite, por força do arvoredo, da escuridão e isolamento, o pequeno vale se transfigurava num local sinistro de que poucos se atreviam a atravessar. 

As pessoas que vinham ou saíam do Hospital para o Bairro de Ponte-Nova seguiam pelo trajecto que levava ao quartel da cavalaria (?), passando à frente da sua porta d'armas, antes de descer para o Bairro junto da entrada do Cemitério local.

Um ano depois, em 1975, já na qualidade de estudante do primeiro ciclo, voltaria a serviu-nos de local aprazível para estudos e passatempo, sempre no período diurno, pois ainda prevalecia o medo do local e durante a noite predominava a escuridão e o silêncio, nesse período, entre a malta jovem já era mais conhecido por Boma.

Em alguma parte das minhas memórias, falando da guerra de Bissau (junho de 1998-maio de 1999) nossa fuga de Bissau para Fajonquito, faço referência a minha passagem por Bafatá e ao Boma (fonte Bafatá) nosso local predilecto de estudos e brincadeiras.

Um abraço amigo,
Cherno Baldé (Bissau) (**)

(Seleção, revisão e fixação de texto, negritos: LG)
__________

Notas do editor:

(*) V.d poste de 29 de outubro de  2023 > Guiné 61/74 - P24805: As nossas geografias emocionais (12): A fonte pública de Bafatá, construída em 1918, na zona conhecida como a "Mãe de Água" ou "Sintra de Bafatá", local aprazível e romântico onde chegou a haver almoços dançantes ao tempo do Esq Rec Fox 2640 (1969/71)

(**) Último poste da série > 25 de novembro e 2023 > Guiné 6mbro de 1/74 - P24885: As nossas geografias emocionais (17): Empada: a Fonte Frondosa (1946): uma foto tirada à minha mulher, no dia 25 de dezembro de 1969, dia de Natal (Eduardo Moutinho Santos, ex-cap mil grad, cmdt, CCAÇ 2381, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70)

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

Guiné 61/74 - P24838: S(c)em Comentários (14): Os fulas, que se alistaram nas forças armadas portuguesas, valorizavam o dinheiro, mas nunca perdiam de vista o mais importante que eram objectivos políticos a longo prazo (Cherno Baldé, Bissau)


Guiné > Região de Bafatá > Fá Mandinga  (?) > c. 1970/72 > O tenente graduado 'comando'  João Bacar Djaló,  rodeado de pessoal da 1ª CCmds Africanos. Entre outros, é possível identificar o furriel “Dico” Andrade, o 1º da esquerda, o furriel Orlando da Silva, ajoelhado, no meio e o 1º da direita, em cima, o soldado Francisco Gomes Nanque, que esteve preso na Libéria após a operação a Conacri. 

Foto de Amadu Bailo Djaló, publicado na pág. 190 do seu livro, " "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974", Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada. 
 


Cherno Baldé, quadro superior
com formação em  economia e gestão,
vive e trabalha em Bissau;
colaborador permanente do nosso blogue:
 integra a Tabanca Grande
desde 19/6/2009;
1. Comentário de Cherno Baldé ao poste P24832 (*):


"Amadu, vais ser oficial. E a questão do vencimento vai resolver-se (...)".

O Amadu Djaló, com 32 anos de idade, dos quais 8 como soldado, estava cansado da guerra e do corre-corre da vida militar, sobretudo, dos comandos onde servia desde 1964.

Mas, no entendimento do seu Comandante [major inf 'cmd' A
lmeida Bruno], o problema era, antes de mais, financeiro, o dinheiro. E o Amadu, se acreditarmos no que está escrito no texto, não dá quaisquer sinais de discordar desta análise do seu superior.

Na minha opinião, esta deve ter sido a atitude prevalecente entre os soldados nativos e sobretudo dos comandos e que fazia pensar que estes soldados não lutavam por qualquer outra causa que não fosse pelo dinheiro.

Provávelmente, seria o caso para muitos que estavam a combater do lado português, mas a verdade é que, para uma grande maioria, sobretudo da etnia fula (fulacundas), e em especial as autoridades "gentílicas", a escolha entre os dois lados era óbvio, pois a sua aliança com as autoridades portuguesas tinha motivações de sobrevivência do seu poder (tribal) sobre os outros grupos rivais no mesmo território e que tinha sido duramente conquistado havia poucos anos antes do domínio europeu em África.

Estes,  sim, valorizavam o dinheiro, mas nunca perdiam de vista o mais importante que eram objectivos políticos a longo prazo que, inclusive, poderiam se transformar em conflitos com o poder colonial.

Cordialmente, Cherno Baldé  | 9 de novembro de 2023 às 00:12
____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 8 de novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24832: S(c)em comentários (13): Éramos todos iguais mas uns mais do que outros... (Amadu Djaló dixit, mas por outras palavras)

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24806: As nossas geografias emocionais (13): A fonte da Colina de Madina, 1945 (Manuel Coelho / Cherno Baldé / António Murta)

Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4

Guiné > Região de Gabu > Madina do Boé > CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894, "Os Tufas" (Bissau, Fá Mandinga, Nova Lamego, Beli e Madina do Boé, 1966-68) > 1967 > A "Fonte da Colina de Madina", construída em 1945. ao tempo do governador Sarmento Rordrigues. Fotos do álbum do Manuel Coelho, um dos nossos grandes fotógrafos.



Manuel Coelho, um dos bravos
 de Madina do Boé (1966/68)


1. Quatro  grandes fotos do Manuel Coelho (fotos nºs 1, 2, 3 e 4), um dos bravos de Madina do Boé, ex-fur mil trms, da CCAÇ 1580 (1966/68) (natural de Reguengos de Monsaraz, vive em Paço d'Arcos, Oeiras; tem 45 referências no nosso blogue, ingressou na Tabanca Grande em 12 de julho de 2011).


(i) Excerto de mensagem do Manuel Coelho,  com data de 23 de julho de 2018 às 19h45 (*):

(...) Parabéns pelo esforço (conseguido) de mostrar uma região tão importante para nós como para o PAIGC. Quem sobreviveu aqui a este conflito não esquece, fica marcado no nosso pensamento e, mesmo após 50 anos. ainda dói!

Quem dera ter a veia poética do Luís ou de outros camaradas para explicar em verso o calvário de meses de isolamento, com falta de reabastecimento, ataques diários, etc...

Para comparar envio mais algumas fotos [inéditas,] do meu álbum, começando pela da célebre "Fonte da Colina de Madina" [que ainda lá estava em 1998]...

Em relação a esta fonte, ela servia não só para fornecer os bidões para banho como para as lavadeiras fazerem o seu trabalho. Para beber tinha de se ferver ou desinfectar devidamente. (...)



Guiné-Bissau> Região de  Gabu > Boé > Madina do Boé > 1998 > A famosa fonte da Colina de Madina, com ornamentação de azulejo português, pintado à mão, de 1945. Parece(ia) haver vestígios de impacto de balas de armas automáticas (?), ou então os azulejos foram picados ou ainda (outra hipótese) estão deteriorados por ação do uso e das intempéries.


Guiné-Bissau> Região de Ganu > Boé > Madina do Boé > 1998 > A famosa fonte da Colina de Madina é um sítio onde se concentra(va) alguma população civil da escassa que há (havia)  nesta região semidesértica, e a única da Guiné que é acidentada (com cotas que sejam quase aos 300 metros). Fotos do álbum do nosso querido amigo e camarada  Xico Allen (1950-2022), que aqui esteve em 1998. As fotos chegaram-nos às mãos em 2006, por intermédio do Albano Costa (**).

Fotos (e legendas): © Francisco Allen / Albano M. Costa (2006). Todos os direitos reservados [Edição e çegendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. Dois comentários de:  (i)  nosso colabor permanente Cherno Baldé, que vive em Bissau, e tem 285 referências no nosso blogue;  e (ii)  António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), autor da notável série "Caderno de Memórias de A. Murta"; membro da Tabanca Grande desde 12/11/2014, tem mais de 100 referências no nosso blogue; vive na Figueira da Foz.

2.1. Cherno Baldé:

(...) Falando sobre as fontes ou nascentes de água em locais estrategicamente situadas junto de pequenas elevações de terreno, como tenho visto um pouco por todo o território, no Norte, Sul, Este e Oeste, fico sempre maravilhado com a  vista e na presenca deste apurado conhecimento do terreno e da noção do que pode ser um desenvolvimento durável e autossustentado stricto sensu

O que mostra, claramente, que os "colonialistas" que nos governaram nos anos 30 e 40 (aqui certamente no tempo de Sarmento Rodrigues), tinham uma visão de longo prazo e uma noção clara sobre o que era o desenvolvimento autossustentado, centrado nos recursos e bens disponíveis localmente e na sua utilização racional e equilibrada a bem da comunidade.

O Manuel Coelho diz que a água precisava ser fervida antes do seu consumo, mas a verdade é que ela é servida assim mesmo e muitas vezes é do melhor que ha (Iagu Sabi) e, pessoalmente, já a bebi muitas vezes, diretamente da fonte, em Bafatá, Quinhamel, Canchungo e, comparada com a água das nossas bolanhas do leste, era uma maravilha d'água e ainda hoje é. (**)

(...) É o que tenho estado a dizer aos mais novos, sempre que vejo esses maravilhosos locais com as suas fontes quase centenárias, mas que ainda continuam vivas e a jorrar água limpa e da melhor que há disponivel ao beneficio das populações locais e com nomes proprios que as populações lhes deram.

Encontrei-as em Bafatá (Boma), Bissau, Quinhamel (Hoilan), Canchungo, Catiá, Bambadinca, Madina de Boé e sei que existem e estão espalhadas por todo o território nacional.

Já não podemos dizer o mesmo dos furos e bombas manuais que os novos projectos de desenvolvimento, fruto da coooperação e das ajudas internacionais,  espalharam nas zonas rurais em anos recentes, mas que normalmente duram pouco, nãp sabendo ao certo se não teriam, também, um aplicativo de obsolescência programada, como se diz atualmente sobre todos os produtos do capitalismo moderno que nos calhou em escala. (...) | 25 de julho de 2018 às 13:27


2.2. António Murta:

As fotografias 3 e 4 da Fonte da Colina de Madina, que parece ser já um memorial, são muito bonitas e tecnicamente quase perfeitas: pelo enquadramento, pela gama de cinzentos, pela textura, e pelos reflexos que nos dão a sensação de vida daqueles instantes. 

Sei que não é isso que está em discussão e desculpem o arrazoado, mas é porque fiquei que tempos a olhar para elas. Não desmereciam o ilustre Ansel Adams (1902-1984), um especialista do preto e branco, sem contudo carregarem a rigidez técnica obsessiva que tiravam sensibilidade às fotografias dele. 

Parabéns ao Manuel Coelho.(...) | .26 de julho de 2018 às 00:56 
____________

Notas do editor:

(**) Vd. poste de 10 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11822: Álbum fotográfico do Xico Allen: região do Boé, 1998: trágicos vestígios 'arqueológicos' da guerra colonial, entretanto já destruídos ou desaparecidos...

segunda-feira, 16 de outubro de 2023

Guiné 61/74 – P24761: Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços (11): A primeira visão aterradora de uma aeronave, um Alouette II ou III, aos 4 ou 5 anos (Cherno Baldé, Fajonquito)

Guiné > Região de Tombali > Catió >  CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66) > Alouette II > "O meu batismo em heli". 

Foto (e legenda): © João Sacôto (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Angola > BCP 21 (1970/72) > Leste > Chiume > Dezembro de 1971 > No Leste de Angola, Chiume (Cú de Judas), heli AL III  no apoio ao 3º pelotão,  1ª CCP /  BCP 21.


Foto (e legenda) © Jaime Bonifácio Marques da Silva (2022). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


A primeira visão aterradora 

de um helicóptero aos 4 ou 5 anos 

por Cherno Baldé (*)


Uma valiosa c0ntribuição guineense para a série "Coisas & loisas do nosso tempo de menino e moço" (**) 



O Cherno Baldé, em 1987,
na Moldávia, na antiga URSS
Foi naquela época que, na idade de 4 ou 5 anos, aconteceu a minha primeira visão de uma máquina voadora, que terá sido, provavelmente em meados de 1964, precisamente na altura em que estávamos em Samagaia, pouco tempo antes do ataque à zona que nos obrigaria a deixar a aldeia para nos refugiarmos em Cambajú, onde o meu pai já se encontrava a trabalhar alguns anos antes.

Estava com o meu irmão mais velho, Ibraima, a pastar as vacas nas imediações da aldeia, quando de repente ouvimos um ruído potente que vinha de cima, 

Quando nos virámos para ver, o avião já estava em cima das nossas cabeças, não dava para fugir, instintivamente, meti-me por baixo de umas raízes enormes de um poilão que estava por ali perto. Escondi-me o melhor que pude mas, foi por pouco tempo. 

Como o meu irmão estava a espreitar o avião e não lhe acontecia nada, sai também para ver. Na altura, os meus olhos viam com bastante nitidez e o avião voava a baixa altitude o que me permitiu ver, após uma breve inclinação deste, as pessoas sentadas, dois à frente e um na abertura lateral com as mãos apoiadas no que parecia ser uma metralhadora.

Esta visão ficou para sempre gravada na minha memória

Estranhamente, era também a visão da guerra que  alastrava pouco a pouco e que mudaria o cenário da vida, aparentemente pacífica, que levávamos até aí e mudaria, de forma inesperada, o caminho dos nossos destinos, criando, mais tarde, a incompatibilidade e a confusão entre o futuro que tínhamos vislumbrado na infância e ao qual queríamos dar continuidade e a nova realidade para onde nos tinha empurrado um destino diferente, passando pela escola portuguesa e enfrentando, assim, um futuro incerto e completamente desconhecido que nos levaria primeiro para Bafatá e mais tarde à capital, Bissau, onde funcionava o único liceu, na altura, e mais tarde para terras distantes e desconhecidas, no estrangeiro.

Uma vida feita de aventuras interessantes e também de sofrimentos, de conquistas e derrotas, de descobertas e imposições, de solidariedade e mercantilismo, sempre em ambientes de opressão cultural permanente e de recuo impossível, fruto da rápida transformação e globalização a que fomos sujeitos pela máquina de dominação Europeia e Ocidental.


Cherno Abdulai Baldé, Chico

Natural de Fajonquito, Sector de Contuboel, Região de Bafatá | Pertence à Tabanca Grande desde 18/6/2009, e tem cerca de 285 (!) referências no nosso blogue. É nosso colaborador permanente, especialista em questões etno-longuísticas. É autor de, pelo menos, três notáveis séries de conteúdo autobi0gráfico:
  • "Memórias do Chico, menino e moço";
  • "Memórias do Chico no Império dos Sovietes";
  • "Memórias do Chico: Refugiado na sua própria terra durante a guerra civil de 1998/99: 200 km e oito dias de aflição, entre Bissau e Fajonquito".
Vive em Bissau, onde é quadro superior numa organização estrangeira.
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 19 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4553: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (1): A primeira visão, aterradora, de um helicanhão

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24586: Fotos à procura de... uma legenda (177): Foto do Abílio Duarte, tirada talvez pelo Cândido Cunha, em Fasse, Paunca: (i) "Furriel com um bebé ao colo"; (ii) "O capitão pode ser o chefão disto tudo, mas é o furriel que me dá a pica cá no sitio"; (iii) "Os furríeis podem ser os mais garbosos, mas quem me trazia as sobras eram os da ferrugem", etc. (Valdemar Queiroz / Chernmo Baldé / Carlos Vinhal / Eduardo Estrela / Luís Graça)


Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Paunca > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > "Eu, dentro do possível, fazendo psico"...


Fotos (e legendas): © Abílio Duarte (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Seleção de comentários a propósito da foto acima, inserida no poste P24579 (*). Oportunidade para os nossos leitores acrescentarem algo mais â(s) legenda(s) possível(eis) (**):


(i) Valdemar Queiroz:

Como lisboetas, eu nem tanto, mas nem se notava os vincos da escorregadela na tábua, e o Duarte andávamos muitas vezes juntos, e grande parte das fotografias a ele próprio são tiradas por mim. Julgo que a da messe é uma delas.

Há muito poucas fotos tiradas em operações, ninguém se lembraria de levar ou nem sequer haver máquina.

Lembro-me daquela foto tirada no mato, o meu Pelotão também foi naquela Operação e eu estou numa imagem na distribuição de rações de combate.

Havia a moda dos slides com belas fotografias que ficaram por ser reveladas para papel. O Duarte tinha um slide extraordinário dum fim de tarde quente e poeirento em Canquelifá, ao vê-lo só falta ouvir algumas palavras em panjadinca que com este calor de agora até isso estamos a sentir.

Uma rectificação, uma das máquinas de fotografias existentes era do 1º. Cabo Pais de transmissões, já falecido, e não fur mil Pais de Sousa, mecânico.

Na bela fotografia do Duarte com uma criança ao colo, parece ser una menina (brincos e roncos) nas nossas acções de psico 'por uma Guiné melhor', talvez na pequena tabanca de Fasse (Paunca).

Esta menina devia ter sido uma bonita bajuda e agora mais de cinquenta anos deve ser uma bela avó que está numa fotografia ao colo de um tuga nos tempos da guerra.

Saúde da boa (,,,)

23 de agosto de 2023 às 14:50


(ii) Cherno Baldé:

Se algum dia tivesse que falar ou escrever sobre uma determinada tipologia ou classe do soldado português que nós admirávamos, essa seria a dos Furrieis, não porque os tivesse conhecido ou convivido de perto, mas porque, no ambiente que conhecemos, na altura, no seio de uma companhia de quadrícula, eles se destacavam por certas características (juventude, empatia, boa disposição, garbo militar, sobriedade, entre outros) que os faziam parecer distintos e, certamente, mais simpáticos que o resto da Malta, era como se tivessem sido especialmente escolhidos a dedo.

É verdade que não se pode generalizar, mas era a impressão com que, na altura, nós ficávamos e, assim como no futebol todos queriam ser o Eusébio e do Benfica, também o Furriel era o nosso modelo preferencial nos momentos das brincadeiras a imitar os adultos.

Em contrapartida, ninguém queria fazer o papel do velho e "rabugento" Sargento da companhia, cuja figura se situava nas antípodas dos Furríeis. Se calhar era o resultado dos conflitos próprios inerentes às suas funções no seio das corporações que fazia com que não fosse muito apreciado dos restantes soldados da companhia.

No entanto, ainda me lembro da parte de uma canção que as bajudas da minha terra, mais discretas e criativas, inventaram para fazer eco destas imagens recriadas a partir das observações sobre os soldados metropolitanos, mostrando o quão a nossa comunidade apreciava os nossos jovens e irrequietos soldados portugueses durante a guerra na Guiné (traduzido da língua fula):

"O Capitão bem que pode ser o chefão cá do sítio, mas é o Furriel que me dá a picadela (injecção) no sitio".

Confesso que, ainda hoje, não consigo vislumbrar o significado desta estrofe da canção, mas nunca mais desapareceram do meu espírito as vozes ritmadas das meninas a cantar nas nascentes e lagoas, enquanto batiam com toda a sua força os pesados camuflados nas pedras de lavar a roupa, tendo como fundo o espaço verde e límpido da nossa bolanha no rio Suncujuma, em Fajonquito.

Mas, colocando à parte o imaginário infantil que nos habitava, na altura, os meus verdadeiros amigos eram os condutores e mecânicos auto entre os quais fiz amizades que perduraram no tempo. Infelizmente, pela lei da vida, estão a partir pouco a pouco para a outra dimensão. No ano passado partiu o Elsa (Oliveira) que, pela primeira vez na vida me entregou o volante do seu Unimog para uma experiência única inesquecível.

Assim, também, apetece dizer que "os Furríeis podem ser os mais garbosos, mas quem me trazia as sobras eram os da Ferrugem".

23 de agosto de 2023 às 20:24


(iii) Carlos Vinhal:

Caro amigo Cherno, o "furriel" Vinhal agradece a tua apreciação sobre a sua classe.

Dizes muito bem, os nossos homens da "ferrugem" eram diferentes para melhor. Lembro-me de o pequeno Salifo, cuja mãe tinha sido morta num golpe de mão a uma tabanca "inimiga", ter sido trazido para o quartel e ficar ao cuidado dos nossos mecânicos. 

Dormia nas suas instalações e eram eles que também lhe proporcionavam roupa e comida, além de lhe ensinarem português em troca de ele ensinar crioulo. Era muito pequenino, teria uns 5 anos.

Às vezes era nosso convidado na messe, onde lhe dávamos-lhe lições de "etiqueta", ensinando-o a comer com talheres, o que para ele era muito difícil. De vez em quando, fazíamos de conta, olhávamos para o lado para ele comer como lhe dava mais jeito, com as suas mãozitas.

Um dia o avô, que vivia na tabanca, exigiu o menino de volta,  o que foi para nós um desgosto. Mas compreendemos.

Pessoalmente, não convivi muito com a população de Mansabá, apesar dos 22 meses de quadrícula: primeiro por me sentir um "invasor" e me achar porventura mal recebido; segundo porque tinha muito trabalho no quartel, além da actividade operacional;  e terceiro ser pouco sociável, fruto talvez do facto de ser filho único e estar habituado a estar só e a não sentir necessidade de conversar.

No entanto, nos momentos de contacto social, fui sempre cortês e respeitador para com aquelas pessoas que eram diferentes de mim porque eram diferentes os seus usos e costumes. Não sendo os africanos, nem mais nem menos do que nós europeus, porque carga de água haviam de ser "convertidos" ao cristianismo? (...)

23 de agosto de 2023 às 22:13

(iv) Valdemar Queiroz:

Tens razão, Cherno Baldé, os Furriéis milicianos eram uns bacanas. Poderia haver um ou outro palerma mais a maioria eram uns gajos porreiros.

Repara como o ex-Furriel miliciano Abílio Duarte pega ao colo a criança-bebé, repara no seu braço esquerdo que a envolve, a segura com todo o cuidado para não cair e aconchegando ao mesmo tempo para não chorar com um "chiu" sorridente para não a assustar.

Esta fotografia é uma obra d'arte, repare-se no braço que segura a menina.
Como não sabemos a patente do militar fotografado,  podemos catalogá-la : "Furriel com um bebé ao colo".

Julgo que a fotografia foi tirada pelo furriel mil Càndido Cunha que era do Pelotão do Abílio Duarte.

Saúde da boa (...)
 
23 de agosto de 2023 às 23:56

(v) Eduardo Estrela:

Subscrevo por inteiro os vossos comentários mas retenho o do Carlos que diz...." Aquelas pessoas que eram diferentes de mim por serem diferentes os seus usos e costumes ".

Em suma, a sua cultura que era tão ou mais valiosa do que a nossa.

Os furriéis milicianos tinham que gramar com os seus superiores e ouvir e conciliar os seus subordinados.

Para além de que, duma forma menos direta, contribuíram para que o 25
de Abril fosse em 1974 e não em data posterior.

Abraço fraterno. (...)

24 de agosto de 2023 às 13:16

(vi) Luís Graça:

Querem história mais linda do que a do nosso camarada e amigo Manuel Joaquim, ex-fur mil armas pesadas inf da CCAÇ 1419 (Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67), hoje professor do ensino básico reformado, que trouxe para a sua casa e educou, como padrinho, o "nosso minino Adilan", o Zé Manel, o José Manuel Sarrico Cunté...

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2015/12/guine-6374-p15500-decaras-26-os-homens.html

Mais do que ser furriel, sargento, alferes ou capitão, miliciano ou do quadro, é(era) a formação humana e moral de cada um de nós que conta(va)... no trato com a população da Guiné... E, claro, a liderança, a orientação superior, o exemplo que vem de cima...

Eu posso dizer que, no geral, tive orgulho nos camaradas que me couberam em sorte (praças, graduados, especialistas, europeus e africanos). Claro, como em todos os rebanhos, há sempre uma "ovelha ranhosa"...

24 de agosto de 2023 às 15:15

__________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 23 de agosto de 2023 > Guiné 61/74 - P24579: Por onde andam os nossos fotógrafos ? - Parte IIB: Abílio Duarte, ex-fur mil art, CART 2479 / CART 11, “Os Lacraus” (Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paunca, 1969/70)

quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24556: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (127): A "Rainha de Catió" foi a minha adorada mãe e tinha lugar na primeira fila nas cerimónias oficiais, tanto no tempo do gen Schulz como do gen Spínola (Souleimane Silá, Luxemburgo)


Rainha de Catió" (c. 1964/66) . 

Foto do álbum do João Gabriel Sacôto Martins Fernandes, de seu nome completo, ex-alf mil da CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66) e depois piloto da aviação civil onde chegou a comandante da TAP, reformado desde 1998. Conviveu com a população, fula e balanta, de Catió e arredores, incluindo Príame (a tabanca do cap 'comando' graduado João Bacar Jaló, 1929-1971). (*)

Foto (e legenda): © João Sacôto (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


"Rainha de Catió" (c. 1972)

Guiné > Região de Tombali > Catió > BCAÇ 2930 (Catió, 1970-72) >  O então maj inf Mário Arada Pinheiro, 2.º cmdt do BCAÇ 2930, com a "rainha de Catió", sua lavadeira,  e algumas das suas filhas (presume-se)... Em chão nalu, ela era fula.  (*)

Foto (e legenda): © Mário Arada Pinheiro (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso leitor Souleimane Silá, natural de Catió, com página no Facebo0k, comentário ao poste P24546 (**):


Data - domingo, 13/08/2023, 23:41
Assunto - Sobre vossa publicação de 9 de agosto de 023 - Álbum de major Pinheiro

Saudações, camaradas do Blogue dos Amigos e camaradas de Guiné. 

Sobre essa foto da madame identificada como rainha de Catió não é equívoco. Pelo contrário. Ela, residente no bairro de Catió-fula (para quem vai para a granja, Cumebú e Ganjola), devido ao seu desempenho de lavadeira de oficiais e de demais tropas do quartel, passou a ser convidada nas cerimónias oficiais da então Vila de Catió aonde sediavam os restantes postos administrativos da região.

Coincidentemente, marido dessa madame, de verdadeiro nome Abibatu Djopo, não foi nada mais nada menos que o motorista da administração do concelho (de Catió), Aliu Silá (Aliu Chauffeur), família da mulher do Administrador Amadeu Nogueira (...).

Cerimónias se repetiam com visitas e substituições oficiais, administrativos e militares ao alto nível da então Província da Guiné Portuguesa, a designada Rainha de Catió sempre esteve presente.

Nunca me esquecerei das delegações como as do Governador Arnaldo Schulz, General Spínola, Secretário Pinto Bull e tantas altas figuras que ela, a Rainha de Catió, foi convidada para tomar parte na primeira fila, com muitas vezes uso de palavra em nome da comunidade.

Digno-me de deixar esse registo porque sou vivo testemunho dessa soberba mulher que é minha adorada Mãe.

Para finalizar, dou um grande abraço ao Comandante Pinheiro que tive privilégio de conhecer de perto em Catió, voltamos a ver-nos no QG Bissau e finalmente em Carcavelos em 2004.

Abraços extensivos ao meu mano mais velho, Sr Benito Neves, que cumpriu vida militar naquela Vila de Catió e que conheceu meus queridos pais (pena que um outro colega dele e amigo já tenha falecido, o Vitor Condeço de quem guardo um riquissimo álbum da época)

Mantenhas a todos.
Agradecimentos de
Souleimane SILA




Guiné > Região de Tombali > Carta de Catió (1956) (Escala 1/50 mil) > > Pormenor: Vila de Catió e arredores. (Príame fica já na carta de Bedanda, na estrada para Cufar.)

Infografias: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2023)


2. Mensagem de Hélder Sousa, nosso colaborador permanente, com data de ontem, às 15h41, comentando a mensagem do Souleimane Silá:

Olá Luís, "mantenhas e saudinha da boa".

Como vês aproveitei logo para juntar duas expressões muito usadas nas trocas de mensagens do Blogue e que acho ficam muito bem.

Olha, antes de ir propriamente referir-me ao miolo deste comentário recebido, quero dizer duas ou três coisas:

A primeira, é que espero muito sinceramente que estejas a recuperar bem e com confiança suficiente.

Depois, para justificar a quase ausência de comentários meus pois, finalmente, ao fim de 6 anos, acabei de ter duas semanas de férias (viva o luxo!) e em boa parte desse tempo estive sem internet.

Então, em relação a este comentário do Souleimane, só posso dizer que fico, cada vez mais, com a sensação que o Blogue é efectivamente seguido por muita e boa gente.

Alguns, às vezes, acabam por se manifestar e esses quando o fazem são, na generalidade, positivos. Outros há (e alguns são nossos conhecidos ou até mesmo "velhos conhecidos") que intervêm para criticar depreciativamente ou provocatoriamente mas como o saldo continua a ser positivo, pode-se e deve-se concluir que, quer se queira, não se queira, ou mesmo não se tenha consciência profunda disso, que este fenómeno chamado "Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné" é realmente, considerando a larga maioria de artigos, fotos, reportagens, etc., um caso sério de seriedade, de depositário de memórias, de afetos, de (re)encontros, incontornável e que servirá (como tem servido) para muitos estudos e observações (cada vez mais distanciadas) de situações e de episódios passados durante a "guerra na Guiné".

Abraços, Hélder Sousa


3. Comentário do cor inf ref Mário Arada Pinheiro, com data de ontem, às 16h22:

Muito obrigado aos meus amigos, prof. Graça e Souleimane Silá que já não vejo desde 2004, e que tinha, como já antes referi, uns pais muito queridos de quem me recordo com frequência e de cuja Mãe escrevi recentemente como uma excelente pessoa. Espero vê-lo em breve, Souleimane, um abraço.


4. Mensagem do Benito Neves, ex-fur mil cav, CCAV 1484 (Nhacra e Catió, 1965/67), às 18h25 de ontem:

Meu caro Luís

O Souleimane Silá é meu amigo no Facebook desde há bastante tempo, em consequência de troca de mensagens sobre Catió. A forma como desde sempre se referiu a mim, como “o meu mano mais velho”, revela um tratamento carinhoso que lhe é peculiar.

Ao tempo – e já lá vão mais de 50 anos – o Souleimane era um daqueles miúdos que deambulava pelas ruas de Catió e convivia connosco. Entretanto veio para Lisboa, constituiu família e emigrou para o Luxemburgo onde os seus descendentes já têm o seu futuro garantido.

Mas… a história do Souleimane deverá ser ele a contá-la.

Desconhecia completamente (ele nunca tal me referiu) que era filho da rainha de Catió.

É com enorme satisfação que o poderei ver integrar o blogue para, à sombra do poilão, nos contar as suas histórias.

Forte abraço
Benito Neves


5. Comentário do editor LG:

Caros camaradas e amigos: apareceu agora um filho da "rainha de Catió". É caso para dizer que o Mundo é Pequeno e o nosso Blogue... é Grande! (**).

É uma feliz coincidência. O Souleimane Silá, de acordo com a sua página no Facebook, vive no Luxemburgo, em Marnach, desde 2020. Nasceu em Catió em 8 de março de 1958, portanto há 65 anos. Estudou na ENA-Bissau (Escola Nacional de Administração, ex Cenfa).

É amigo do Facebook dos nossos camaradas Benito Neves e João Sacoto e privou também com o nosso saudoso Victor Condeço (1943-2010). Conheceu, aos 14 anos, o então major inf. Mário Arada Pinheiro, 2.º comandante do BCAÇ 2930 (de rendição individual, esteve em Catió, de set71 a ago72, ou seja, no 2.º ano da comissão do batalhão).

Ele vem confirmar o que o cor inf ref Arada Pinheiro nos informara há dias, em conversa pessoal na Praia da Areia Branca, Lourinhá, onde tem casa:

(i) conheceu a senhora como sendo a "rainha de Catió", título que não era honorífico nem gentílico, mas sim atribuído popularmente, pela nobreza do seu porte (usava sempre o vestido comprido, branco, que mostram as duas fotos, tanto a de 1964/66, como a de 1972);

(ii) era sua lavadeira, e "boa lavadeira";

(iii) tinha vários filhos, o marido era o motorista do administrador de Catió;

(iv) ao filho mais novo, em 1972, fez questão de chamar-lhe "Major João Pinheiro" (sic) (homenagem ao major Mário Arada e ao seu filho João);

(v) depois de ele ser colocado no QG, na Amura, em Bissau, a "rainha de Catió" apareceu-lhe um dia lá em casa (ele vivia com a família numa vivenda em Santa Luzia), queria visitar uma filha que estava hospitalizada no HM 241, com uma perna esfacelada por um estilhaço de foguetão 122 mm (num dos ataques a Catió).

O João Sacôto, com quem falei ao telemóvel, não se lembra dela como "lavadeira", mas sim como "mulher grande", de "altivo porte", respeitada na comnunidade, não tendo nenhum parentesco ou relação com o João Bacar Jaló; não tem a certeza de ela ser fula, de resto não vivia em Príame (na estrada Catió-Cufar), mas numa tabanca a norte.

O Cherno Baldé também acrescentou, em comentário, que entre os fulas não havia rainhas.

Aproveito, por fim, para convidar o Souleimane Silá (a quem agradeço estas carinhosas confidências sobre a senhora sua mãe) para se juntar a este blogue que é dos camaradas e dos amigos da Guiné... 

Mantenhas. 
Luís Graça
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 10 de agosto de 2023 > Guiné 61/74 - P24546: Fotos à procura de... uma legenda (176): A "rainha de Catió", fotografada em 1964/66 (pelo João Sacôto) e em 1972 (pelo Mário Arada Pinheiro)

(**) Vd. poste de 9 de agosto de 2023 > Guiné 61/74 - P24540: Fotos do álbum do cor inf ref Mário Arada Pinheiro, antigo 2º cmd do BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72) e cmdt do Comando Geral de Milícias (Bissau, 1972/73)

Vd. também poste de 28 de março de 2019 : Guiné 61/74 - P19628: Álbum fotográfico de João Sacôto, ex-alf mil, CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como, Cachil, 1964/66) e cmdt da TAP, reformado - Parte VII: Catió e arredores: contactos com a população civil

(***) Último poste da série > 2 de setembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23580: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (126): Leitor brasileiro, Edson de Lima Lucas, identifica o navio inglês Narkunda, da P&O Lines, em foto de 29/9/1942 (presumivelmente "Foto Melo") , tirada ao largo do Porto Grande, Mindelo, ilha de São Vicente, Cabo Verde... Dois meses depois seria atacado e afundado pela aviação alemã, na campanha dos Aliados no Norte de África.