sábado, 25 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26422: S(C)em Comentários (57): os fulas e o gado bovino como extensão da própria família e da comunidade (Cherno Baldé, Bissau)

Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Fajonquito > c. 1972 > A equipa juvenil da "Ferrugem", futebol de cinco, orientada pelo 1º cabo Sérgio Rodrigues ("Gasolinas"). De pé: Adama Suntu e Saido ("Barbosa"); ajoelhados: Amadi, Cherno Balde ("Francisco" ou "Chico") e um colega que não consigo identificar ainda.

Legenda do Cherno Baldé. Foto (adaptada) na página do Facebook de Sérgio Rodrigues, publicada na sua página do Facebook, em 28/10/2019, 21:28 (com a devida vénia...)


O ex-1º cabo mecânico Sérgio Rodrigues pertencia à CCAÇ 3549, "Deixós Poisar" (Fajonquito, 1972/74).

Dr. Cherno Baldé, Bissau,
foto atual
(...) É verdade que os camponeses fulas não gostavam de vender o seu gado 
e a razão é muito simples, era e continua a ser a única riqueza que têm e com a qual podem contar para se socorrer em casos de necessidade da família e da comunidade ou ainda em casos de calamidades naturais ligadas as suas atividades de sobrevivência.

Só quem (sobre)vive da terra, da agricultura,  
percebe as dificuldades e incertezas com  que se deparam e num país onde não existem nem subsídios, 
nem financiamentos ao agricultor.

Para nós, na tabanca, tirar uma galinha já representa um grande sacrifício. E de mais a mais, as manadas representam uma propriedade coletiva onde crianças, mulheres e homens adultos, cada um tem a sua vaquinha para seu sustento (ordenha do leite) e a sua poupança para o futuro a titulo individual e coletivo.(...)


(ii) Poste P22232 (**)

(**) Vd. poste de 29 de maio de 2021 > Guiné 61/74 - P22232: Antologia (78): Estereótipos coloniais: os fulas, "maus criadores de gado e piores agricultores"... (excerto de Geografia Económica de Portugal: Guiné / coordenado por Dragomir Knapic. Lisboa: Instituto Comercial de Lisboa, 1966, 44 pp)

4 comentários:

Anónimo disse...

Já são mais de 10horas e estou na cama a ler estas deliciosas histórias e contos da nossa Guiné. Nem sei porque andamos à batatada tantos anos e tanta vida perdida!
Praticamente ninguém sabia nada sobre a Guiné além do que aprendemos na escola primária. Quando fomos mobilizados, pelo menos deveria haver um conhecimento básico daquilo que iríamos encontrar. A guerra foi nos impingida, mas não renego as minhas raízes e razões de fazer parte disto tudo. Fiquei mais rico apesar de tudo.
Lamento mas tenho que realçar o que de positivo nos trouxe esta passagem da vida. Falo assim porque fisicamente regressei inteiro,mas não na Psico, fica para sempre esta passagem única e irrepetível..
Desculpe me aqueles que com toda a razão podem não pensar assim, em especial os mutilado e os mortos que já não falam. Incluo aqui e pela primeira vez os então nossos inimigos e que ALA os proteja onde quer que estejam.
Se não fosse esta maldita guerra não estaria agora a escrever sobre isto. Tem os seus custos que nada pode pagar.
Mas é a vida.
Conhecemos agora um filho de Portugal que nasceu sob a nossa bandeira quer se queira ou não.
O Cherno Baldė que com a sua imensa sabedoria e cultura nos ajuda a conhecer melhor onde é que andamos e as culturas deste pedaço de terra que era tão desconhecido dos então então goververnantes portugueses brancos.
Um grande abraço ao nosso grande professor.
Virgílio Teixeira

Eduardo Estrela disse...

Acima de tudo respeitar os outros. A sua cultura, os seus costumes e a sua forma de ver as coisas da vida. Tenho a certeza que muitos aprenderam em África a ver o mundo com outros olhos e a perceber o lamaçal para onde foram lançados. Outros porém nada quiseram aprender, por razões várias.
Obrigado Cherno ! É um privilégio poder ler o que escreves e aprender contigo.
Abraço fraterno
Eduardo Estrela

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Temos de ter sempre algum cuidado, por causa do "melindre" , quando falamos do passado (e do presente), em saber distinguir os povos e os seus dirigentes,elites, regimes políticos: eu, por exemplo, embora tenha sido obrigado a fazer a guerra colonial na Guiné (deram-me uma G3, um camuflado, pagaram-me um salário...), nunca me identifiquei com (nem fiz a apologia de) aquela guerra...

Mas "objetivamente" estive lá, formei, enquadrei e comandei soldados do recrutamento local (fulas), que também estavam sujeitos ao serviço militar obrigatório como eu. Mas, por favor, não ponham todos no mesmo saco!... Houve arbitrariedades, atrocidades, etc., do lado do PAIGC e das NT, houve miúdos arrebanhados à força nas suas tabancas, por um lado e outro (podendo variar o tipo de "violência"), houve tabancas queimas, destruídas, etc.

Houve antepassados meus/nossos esclavagistas e colonialistas ? Sim, dizem os historiadores... Mas recuso terminantemente o princípio jurídico (monstruoso) da responsalidade coletiva... A minha/nossa geração fez a guerra e a paz...Que o regime de Salazar / Caetano tenha desprezado totalmente o nosso sacrifício e recusado toda e qualquer solução política para aquele conflito, é outra coisa, é outra história...

Eu não confundo nem misturo os povos e os seus governantes...Russos, cubanos, chinesees, guineenses, cabo-verdianos, angolanos, moçambicanos, timorenses, norte-americanos, brasileiros, alemães, ingleses, holandes, judeus, árabes, coreanios, vietnamitas, fulas, balantas, mandingas, biafadas, ameríndios, etc., estão acima (ou deviam estar) das contingências da História...

Já nos bastou o anátema da "Torre de Babel"... Agora temos que aprender com os erros uns dos outros, e saber viver e sobreviver na nossa "casa comum"... Não está fácil, reconheço. Mantenhas. Luís

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Obrigado, Cherno, percebe-se agora melhor por que é que tínhamos que ir comprar vacas a Sonaco (ou até roubá-las ao IN e no Senegal, como aqui já contou o nosso saudoso A. Marques Lopes)...