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segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25186: Efemérides (426): "Pipito Ka Muri": foi há dez anos, a 18/2/2014, que deixou a Terra da Alegria, mas com ele, o seu exemplo, a sua memória, renasce agora a nova AD - Acção para o Desenvolvimento


Lisboa, Campus da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade NOVA de Lisboa > 7 de setembro de 2007 >

Neste rosto luminoso e fraterno, havia carisma, afabilidade, determinação, coragem física e moral, visão estratégica  e capacidade de liderança,  seis qualidades pessoais que eu identificava e admirava no engº agrº Carlos Schwarz da Silva (1949-2014), mais conhecido por Pepito ("nickname" que vem dos tempos da meninice: segundo o irmão João, o Carlos tinha um herói, uma das figuras de banda desenhada do "Cavaleiro Andante", o Agapito, um nome com 4 sílabas, difíceis de pronunciar por uma criança, e que ele abreviava, chamando-lhe "Pepito").  Na sua terra, continua a ser o "Pipito", mesmo dez anos depois da sua morte (física)... "Pipito Ka Muri": foi a singela homegem que os seus famliares, amigos e antigos colaboraradores lhe acabaram de fazer no bairro do Quelelelé, em Bissau, sede da "nova" AD - Acção para o Desenvolvimento (a ONGD tem novos corpos sociais e está resconstruir a sua sede.)

O Pepito tem 250 referências no nosso blogue. O irmão João escreveu-lhe,em 18 de dezembro de 2023, uma notável fotobiografia, no seu blogue.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Programa da homenagem ao Pepito,  "nickname", do eng. Carlos Schwarz da Silva  (Bissau, 1949-Lisboa, 2014). 



1. Mensagem de Catarina Schwarz, filha do Pepito e da Ilsabel Levy Ribeio, e membro da nossaTabanca Grande, com data de hoje, 7h21,

Olá, Luís,

Espero que estejam todos bem!

Nós andamos por Bissau, naquela "rotina" tão nossa.

A AD vai assinalar amanhã os 10 anos da morte do meu pai. Apesar da distância, partilho contigo o programa.

É possível que a RDP África passe uma peça.

Beijinhos,

Catarina

2. Resposta do editor LG:

Catarina, fico muito feliz por saber de ti... e da "nossa" AD!,,, Pois é, já se passaram dez anos que o teu querido pai e nosso saudoso Pepito deixou, sem tempo de se despedir, a Terra da Alegria... Queremos associar-nos a essa homenagem... Vamos estar atentos também à RTP África.

Já fui ao Facebook da AD, vi e o programa e os vídeos de homenagem ao nosso Pepito...

Obrigado pelo teu alerta. (Não sou muito "facebook...eiro".)   Parabéns a todos, vamos ver se retomamos os nossos contactos (a Tabanca Grande tinha uma relação especial com a AD no tempo do teu pai)... 

Houve aqui um tremendo vazio de 10 anos, depois do "golpe de estado" que se seguiu à sua morte...Beijinhos para ti e o resto da família. Boa saúde, bom trabalho paara os cooperantes da AD. Luis.

___________

Nota do editor:

Últumo poste da série > 13 de janeiro de 2024 > Guiné 63/74 - P25065: Efemérides (425): O António Marques, meu companheiro de infortúnio, na CCAÇ 12, cujo relógio parou às 13h30 do dia 13 de janeiro de 1971: nunca se esquece de me telefonar todos os anos, neste dia e hora (Luís Graça)

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25150: Blogues da Nossa Blogosfera (187): "Des Gens Intéréssants", de João Schwarz da Silva (Bruxelas, nosso grão-tabanqueiro n.º 768, desde 30/3/2018) - II ( e última) Parte


Música Klezmer na casa de Clara Schwarz da Silva em São Martinho do Porto, por João Graça (violino). 7 de agosto de 2007. A mãe da Clara era russa, de Odessa, hoje Ucrânia. A Clara também formação musical superior, tocava violino. O João tocou o "Bulgar de Odessa", um tema "klezmer" clássico que a emocionou...(Tinha então 92 anos, morreria em 2016, com 101.) (LG)

Vídeo (1' 41'') / You Tube > Luís Graça 




I. Este e outros são alguns dos recursos, em suporte audiovisual, que estão disponíveis  no fabuloso blogue do nosso amigo João Schwarz da Silva (*), irmão do nosso Pepito (Bissau, 1949-Lisboa, 2012), filho de Clara Schwarz (Lisboa, 1915  - Oeiras, 2017) e de Artur Augusto Silva (Ilha Brava, 1912- Bissau, 1983.    

A sua antiga página sobre histórias de vida de gente "interessante" (seus familiares, uns mais próximos, outros mais afastados)  passou a ter um novo endereço:

https://des-gens-interessants.blogspot.com

Eis,  a seguir, mais  alguns vídeos (em geral, em português, alguns em francês), que podem interessar os nossos leitores. Recorde-se que, em vida do Pepito e da Clara Schwarz, havia um dia de agosto em que a casa do Facho, na Praia de São Martinho do Porto, se transformava em Tabanca de São Marinho do Porto...
 
Alguns de nós tivemos o privilégio de conhecer um pouco melhor o Pepito e a sua família, na inbtimidade,    a começar pela matriarca, a dra. Clara Schwarz da Silva (durante vários anos, até à sua morte, aos 101 anos, em 2016, foi a "decana da Tabanca Grande").

Estamoa falar da famosa "casa do Cruzeiro", em São Martinho do Porto, no sítio do Facho, uma casa que o pai da Clara (e avô do Pepito), o engenheiro de minas Samuel Schwarz (1880-1953), judeu de origem polaca, lhe comprara quando ainda solteira, antes da II Guerra Mundial...

Por seu turno, o pai do Pepito, Artur Augusto Silva (1912-1983) tinha sido advogado em Alcobaça e em Porto de Mós no pós-guerra. O casal viveu em Alcobaça entre 1945 e 1949, antes de partir para a Guiné (ele, em finais de 1948 e o resto da família em 1949). Foram amigos pessoais e visitas de casa do pintor Luciano Santos (Setúbal, 1911-Lisboa, 2006), que vivia então em Alcobaça. (**)
________________

  • Apresentação do livro “La Découverte des Marranes”, Musée d’Art et d'Histoire du Judaïsme de Paris, 18 de fevereiro de 2016 (em francês)

https://www.mahj.org/fr/media/quand-le-portugal-redecouvre-ses-marranes

  • Entrevista de Clara Schwarz, José Melo e Antonieta Garcia sobre a vida e obra de Samuel Schwarz. Filme realizado pela Comunidade Israelita de Lisboa em 2004

Entrevista de Clara Schwarz por Jose Melo e Antonieta Garcia

  • A comunidade marrana de Belmonte em Portugal, por João Schwarz (em francês):

https://www.youtube.com/watch?v=xCJWe8ZPjfM&t=1s

  • Entrevista de João Schwarz sobre a doação da familia ao Tikva Museu Judaico de Lisboa

Entrevista de João Schwarz para o Museu Judaico de Lisboa

  • A cidade de Tomar, a sua sinagoga e a sua história, por Samuel e João Schwarz. Filme de Livia Parnes (em francês)

https://www.youtube.com/watch?v=UnqmXYvRiJk&t=7s

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25145: Blogues da Nossa Blogosfera (186): "Des Gens Intéréssants", de João Schwarz da Silva (Bruxelas, nosso grão-tabanqueiro n.º 768, desde 30/3/2018) - Parte I


João Schwarz da Silva
1. Mensagem do no amigo João Schwraz da Silvagrão-tabanqueiro, nº 768 (desde 39/3/2018); tem 17 referências no nosso blogue; vive presentemenente em Bruxelas: 

Data - 7 fev 2024 10:38
Assunto - O novo blogue "Des Gens Intéréssants"

Olá,  Luis

O meu site www.desgensinteressants.org acabou porque o software que eu usava (Sandvox) ja não é suportado,  o que significa que não é compatível com as últimas versões do
 IOS (pois ém  eu sou um utilizador de MAC). 
Tive portanto que efetuar uma migração para:

https://des-gens-interessants.blogspot.com

e aproveitei para alterar umas coisas e para acrescentar outras. 

De qualquer modo agradeço a dica sobre o Arquivo.pt. 


https://arquivo.pt/wayback/20230202034507/http://www.desgensinteressants.org/samuel-schwarz/index.html

Se tiveres comentários a fazer sobre esta nova página,  apita,  pois ainda estou a aprender a utilizar o Blogger.

Obrigado também pelo poste sobre as crianças austríacas (**) que,  se bem me lembro,  foram acolhidas em Portugal pela Caritas,  o que levou a abusos em série pois eles entregavam as crianças a pessoas que as exploravam. 

A minha mãe contava que em Alcobaça ela viu uma miúda loira que só falava alemão no stand de um vendedor de legumes. Ela queixava-se amargamente de maus tratos a tal ponto que a minha mãe a levou para casa onde pela primeira vez em Portugal tomou banho e conseguiu tirar a barriga de misérias. Tempos depois,  aparece lá em casa um padre enviado pela Caritas que acusou os meus pais de não terem capacidade para acolherem uma órfã. 

Nessa altura ja o meu pai tinha conta aberta na PIDE,  o que não correspondia aos critérios do Estado Novo. Moral da história, a miúda aos gritos teve que sair da nossa casa e a minha mãe ficou arrasada pois a miúda era muito gira e se sentia feliz em nossa casa.

Pouco tempo depois saímos de Alcobaça rumo à Guiné. Nota que há um filme sobre a história destas crianças, "Viagem ao Sol",  de Ansgar Schaefer e Susana de Sousa Dias. Ver o trailer aqui: 


2. Um blogue de histórias de vida de pessoas interessantes

Excerto do blogue do João Schwarz da Silva, agora alojado no Blogger (adaptado e traduzido do francês pelo nosso editor LG)

Segunda-feira, 8 de janeiro de 2024 > Porquê este blogue "Des Gens Intéressants?

(...) Há alguns anos, com a idade, quis reconstituir a vida e o contexto de vida de um certo número de pessoas da minha família que passaram por momentos difíceis ou emocionantes na sua exiostència Nenhum deles já está vivo. Um traço comum a todos elees, todos, é o facto de terem sido, em diferentes graus, vítimas das suas crenças, do seu posicionamento político ou simplesmente da sua sede de liberdade. Atravessaram o século e as guerras da época, e muitas vezes cruzaram continentes para p0oder encontrar um mundo melhor.
  • O meu bisavô Ysucher Szwarc  morreu em Zgierz durante a invasão nazi da Polónia em dezembro de 1939. 
  • O meu outro avô, Samuel Matusovitch Barbash, foi fuzilado  pelos bolcheviques durante a tomada de Odessa em 1920. Samuel teve dois filhos e duas filhas do seu casamento com Klara. 
  • Um de seus filhos,  Boris Barbash, foi para Xangai, na Chinba, onde morreu. 
  • O meu avô Samuel Schwarz foi alvo do forte anti-semitismo que reinava em Portugal (entre os anos 20 e 50)  e isso não o impediu de fazer descobertas sensacionais sobre a história e a herança judaica de Portugal. 
  • O meu pai,  Artur Augusto Silva  foi preso pelas suas ideias contrárias às do regime então vigente (o Estado Novo), cujos opositores que defendeu,  nomeadamente em Bissau, na antiga Guiné Portuguesa. Os membros da sua família, originários da Ilha da Madeira e expulsos para a Ilha Brava, Cabo Verde,  viveram numa época em que ter escravos ainda era normal. 
  • Seu irmão  Joao Augusto Silva foi um formidável fotógrafo, desenhador  e escritor. 
  • David Szwarc, filho de um irmão do meu avô Samuel, conseguiu escapar do gueto de Varsóvia enquanto a sua família permaneceu lá.
  • Um tio Alexandre Szwarc, irmão de Samuel, foi feito prisioneiro pelos russos em 1940,  e conseguiu escapar via Portugal e depois ir para o Canadá. 
  • Meu sogro, Jean Roger Chansel, que era piloto de correio aéreo, morreu num acidente no Monte Camarões, em 1953. 
  • Marek Szwarc, um dos irmãos do meu avô, judeu de nascimento, converteu-se ao catolicismo e tornou-se pintor e escultor da Escola de Paris. 
  • Tereska Torres, filha de Marek, teve que fugir de Paris na época da invasão e ocupação nazi da França em 1940 e foi uma das primeiras mulheres a juntar-se ao general De Gaule em Londres. 
  • O último (de outros que se hão de seguir) é o meu irmão Carlos ("Pepito") que, nascido em Bissau (em 1949) e aí tendo vivido toda a sua juventude, regressou à Guiné na época da independência para aí se fixar e contribuir para o novo mundo idealizado por  Amilcar Cabral.
À medida que eu tiver tempo para encontrar os documentos, fotos e outros pedaços de história,  outros personagens passarão a habitar este blogue. Para acompanhar este blog veja os seguintes links: Aqui ficam alguns vídeos realizados em momentos diferentes mas que têm como tema comum um dos membros da família ou um local (Belmonte ou Tomar) que se enquadra perfeitamente na vida de Samuel Schwarz (...)


(**) Vd. poste de 6 de fevereiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25140: Capas da Vida Mundial Ilustrada (1941-1946) - Parte III: 45 crianças, refugiadas (e provavelmente judias), polacas, alemãs, austríacas e uma russa, embarcam em agosto de 1941 no "Mousinho" a caminho da América

quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25108: O segredo de...(42): Patrício Ribeiro, "filho da escola", fuzileiro uma vez, fuzileiro para sempre... Numa canoa nhominca, em Varela, pelo mar dentro mar, com os útimos 10 portugueses e outros estrangeiros fugidos da guerra civil de 7 de junho de 1998


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Praia de Varela > Maio de 2021 > Praia sul >  A minha cana de pesca


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Praia de Varela > Maio de 2021 > Praia sul > Quilómetros de praia, que continua a ser bela e aprazível, apesar das alterações climáticas e da erosão.


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Varela > Tabanca de Iale >  Maio de 2021 > A minha casa ao entardecer, às 6h30

Fotos (e legendas): © Patrício Ribeiro (2021). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Não é fácil arrancar "segredos" aos antigos combatentes que passaram pelo TO da Guiné entre 1961 e 1974. Esta série, "O segredo de..." (*), não pretende ser sensacionalista ou voyeurista. Tem apenas como objetivo facilitar a partilha de memórias, mais recalcadas, mais distantes ou já esquecidas, nalguns casos, ou mais difíceis de contar em público, com receio de censura social ou de grupo, noutros casos... Achamos, por outro lado, que devemos também dar visibilidade e  pu
blicidade a ações relevantes, praticadas por amigos e camaradas nossos, cuja modéstia os inibe de falar delas...

Um dos exemplos é o  Patrício Ribeiro que cultiva o "low profile", é discreto, vivendo há quatro décadas na Guiné-Bissau, onde é empresário e... estrangeiro. 

Na guerra civil de 1998/99 ele  estava lá. E teve um comportamento de grande coragem e nobreza, tendo socorrido e ajudado alguns compatriotas e outros estrangeiros, que lá viviam ou foram apanhados pelos acontecimentos.

Recorde-se que ele nasceu em Águeda, em 1947, foi levado pequeno para Angola, cresceu em Nova Lisboa (hoje Huambo). Aqui casou, viveu e trabalhou. Fez a tropa como fuzileiro (1969/72). 

Veio depois para Portugal na véspera da independência, na 23.ª hora (**); mas nunca gostou da sua condição de "retornado":  em 1984, decidiu ir viver e trabalhar, na Guiné-Bissau, primeiro como cooperante, e depois estabecendo-se como empresário: fundou uma empresa ligada à energia, a Impar Lda...  Agora, aos  76 anos, recusa-se a reformar-se, está cá e lá (sobretudo quando cá faz frio, e chuva, e é inverno). 

Vai dando, por outro lado, uma mãozinha ao filho que lhe sucedeu nos negócios, continua a gostar de viajar pelo interior da Guiné  (e nomeadamente de canoa nhominca, pelos Bijagós)... E, quando cá vem, dedica-se também à sua agricultura em Águeda.   

Membro da nossa Tabanca Grande desde 2/1/2006, é  autor da série "Bom dia desde Bissau" mostrando-nos pontos desconhecidos ou já esquecidos daquela terra verde-rubra...  

É nosso correspondente em Bissau, colaborador permanente da Tabanca Grande para as questões do ambiente, economia e geografia da Guiné-Bissau; tem já cerca de 150 referências no blogue...

Ainda não "abriu o livro todo" das memórias de Angola e da Guiné-Bissau. Mas já nos contou aqui um dos seus "segredos" (*). 

De um outro viemos a sabê-lo, há uns largos anos,  por intermédio de um amigo comum, infelizmente já falecido, o eng. agrónomo  Carlos Schwarz da Silva, mais conhecido por "Pepito"  (1949-2012).

Esse "segredo", em boa verdade já não o é, foi divulgado há anos no blogue (***), merece todavia figurar nesta série... para "memória futura"


O segredo de...(41): Patrício Ribeiro, "filho da escola", fuzileiro uma vez, fuzileiro para sempre... Numa canoa nhominca,  em Varela, pelo mar dentro, com os útimos 10 portugueses  e outros estrangeiros fugidos da guerra civil de 7 de junho de 1998, até ao NRP Vasco da Gama

Tenho aqui perto, em Varela, uma pequena palhota para passar alguns fins de semana (vd. fotos acima). Há 20 anos estava a mais de 250 metros do mar, agora o mar já está muito mais perto; dentro de algum tempo, já posso pescar com a cana, a partir da minha varanda…

Neste mesmo local, numa clareira, aterraram os helicópteros da fragata Vasco da Gama, para recolher os Portugueses que aqui estavam encurralados na guerra de 1998.  Foi num destes helis que o nosso saudoso Pepito, saiu.

Eu também aqui estava… Mas tinha por missão ajudar a sair outros Portugueses que se encontravam no interior, em Canchungo (antiga Teixeira Pinto) e Cacheu. Como não apareceram às horas combinadas, estive em S. Domingos e depois em Ingoré (sem combustível e em situação de guerra),  à procura deles… E de onde, a partir dos rádios da Missão Católica, comuniquei com a fragata a informar que estavam atrasados para a sua evacuação…

Ao fim do dia, também saí desta praia de Varela, numa canoa nhominca, acompanhando os últimos 10 portugueses que quiseram sair, assim como de outras nacionalidades, a quem a fragata autorizou o embarque… 

Como destino, “o pôr do sol”, o poente… Passados 18 milhas, mar adentro, lá encontramos a nossa frota com 3 navios dos “filhos da escola” que na parte final nos vierem cumprimentar nos botes e mandar subir pela escada de corda, para a fragata Vasco da Gama.

Já não foi possível os helis da fragata Vasco da Gama voltarem a aterrar na praia, havia quem os quisesse deitar abaixo… mas fomos acompanhados pelo ar, de onde recebíamos ordens, por vezes mandavam-nos, à nossa canoa, desviar de alguns obstáculos, que havia no mar …

Gosto de falar da minha praia de Varela de que adoro; dos banhos na água quente a 30º, das minhas pescarias diretamente para o grelhador, acompanhadas por umas bacias de ostras, etc…

O que escrevi,  num comentário, é um pequeno resumo dos diversos capítulos vividos naquela época, mas muitos deles ainda os considero 'classificados'.

Quando nos voluntariamos a ajudar os outros, quando pessoas a chorar nos pedem para não os deixar para trás..., a “formação militar não o permite", vem ao de cima...

E, por força das circunstâncias, passamos a ser o elo de ligação entre o resto do mundo e o interior de um país em guerra, de onde não é possível informar os familiares: onde estamos, que estamos vivos…  E, repara, não havia telefones e as fronteiras estavam fechadas, quer internamente, quer com os países vizinhos e estas últimas estavam a ser bombardeadas. Bissau ficava longe e não se sabia o que se passava no interior.

E quando do exterior… nos pedem a colaboração, através do nosso “bombolom”, para encontrar esta e aquela pessoa de quem não se tem notícias há muitas semanas, certamente qualquer um de nós ajudaria, se tivesse condições...

Os restantes capítulos vão saindo, quando alguém tocar na "ferida".

Luís, depois de ter saído na canoa nhominca, que, no regresso, na minha presença, carregou da fragata Vasco da Gama a primeira ajuda humanitária para a Guiné, destinada à Missão Católica de Suzana, eu voltei para Portugal. Não, não fiquei lá...

Mas, passados 2 meses regressei à Guiné, via Dakar e táxi aéreo para Bubaque, dali para Bissau em vedeta de guerra, que foi construída no Alfeite e que estava na mão dos militares senegaleses.

De Bissau por vezes saía para Varela, quando recebia um 'papelinho',  avisando que era melhor ir dar uma volta… Pegava na minha mochila com uma lata de atum, atravessava a pé as bolanhas e lá ia eu para banhos.

O aeroporto de Bissau esteve fechado quase um ano… Quando da morte do 'Nino', tinha ido passar o fim de semana à ilha de  Orango…

Na morte do Ansumane Mané, estava fora de Bissau... Ao reentrar em Bissau encontrei quase uma centena de milhares de pessoas, a saírem a pé. Algumas já iam para lá de Nhacra. Fiz um apelo na rádio RTP África, para mandarem transporte, a fim de apanharem as pessoas que estavam a dormir à beira da estrada, sem quaisquer condições.

Ao mínimo problema, a estrada principal era fechada a viaturas, em Safim.

Assim, como da morte dos restantes altos dirigentes do país..., estava fora, por Varela, Contuboel, etc.  

( Excertos  de vários textos e comentários, revisão / fixação de texto / negritos:  LG)


2. Comentário do nosso editor LG:
 
Patrício Ribeiro, português,
nascido em Águeda, em 1947,
criadoe casado em Angola,
com família no Huambo,
ex-fuzileiro em Angola de 1969
a 1972, a viver na Guiné-Bssau
desde 1984,
fundador, sócio-gerente
e director técnico
da firma Impar, Lda-


Patrício,  não é por acaso que eras conhecido em Bissau, ainda até há pouco tempo, como o "pai dos tugas"... Os jovens, cooperantes, rapazes e raparigas, tinham por ti um enorme respeito e admiração na altura em que o meu filho, João Graça, te conheceu em dezembro de 2009, em Bissau...

Esta história do resgaste de diversos portugueses e 
outros, em plena guerra civil (que começou com o golpe de  Estado de 7 de junho de 1998), perdidos em Varela, Canchungo  e Cacheu, devia merecer honras de título de caixa alta nos jornais da época e nas parangonas dos telejornais... Não me dei conta que isso tenha acontecido... Mas é uma verdadeira história de heroísmo que te honra e nos honra a todos nós, portugueses, teus amigos e camaradas!...

Deixa-me recordar, para os nossos leitores mais recentes, que na sequência daquele conflito, foi  montada pelo Governo Português uma operação de resgaste de cidadãos portugueses e de outras nacionalidades. 

Essa operação, com o nome de código Crocodilo, envolveu uma força conjunta dos três ramos das Forças Armadas. A componente naval foi  constituída pela fragata Vasco da Gama, com dois helicópteros Lynx Mk95 embarcados, pelas corvetas Honório Barreto e João Coutinho e o navio reabastecedor Bérrio

A atuação dos dois helicópteros foi fundamental para o êxito da missão. A força naval foi comandada pelo capitão-de-mar e guerra Melo Gomes. 

(Vd. P. Conceição Lopes, CFR: Operação Crocodilo. "Revista da Armada", julho de 2013, pág. 20).

A história do resgate, efectuado por tua conta e risco, em Varela, já a tinha ouvido contar, na tabanca de São Martinho do Porto, há uns largos anos atrás, talvez em 2012, da boca do nosso saudoso Pepito (1949-2012), um dos "encurralados", em junho de 1998, em Varela, onde também tinha casa de praia, já do tempo dos pais, e que era portanto teu vizinho.

Conseguiste metê-lo, a ele e à família, e a mais cidadãos, num dos helis da fragata Vasco da Gama, ancorada ao largo, a 18 milhas, fora das águas territoriais do país, com mais os dois ou três avios de apoio...

Eu já sabia, além disso, que, na impossibilidade de voltar o heli a Varela, tu já te havias metido na tua canoa nhominca, levando mais um grupo (10 pessoas, de nacionalidade portuguesa, e outros estrangerios...) ao fim da tarde, pelo mar fora, até à fragata salvadora!...

Camaradas e amigos, 18 milhas náuticas numa canoa nhominca (embarcação em que tu és perito e que muito admiras!), são mais do que 33 km pelo mar adentro... Não é para todos, é para quem aprendeu a amar e respeitar o mar, como tu, que foste "filho da escola" da Armada... Afinal, fuzileiro uma vez, fuzileiro para sempre!

Volto a escrever o que já repeti aqui: esta tua história incrível merece ser contada uma e outra vez. Sei que és um homem discreto e modesto, mas ainda espero ir ao 10 de junho, se não for longe, para te ver ser condecoradao por este feito de grande coragem, altruísmo e patriotismo!...

Patrício, se isto não é heroísmo, então eu nunca vi nenhum herói ao vivo e a cores!

Registo, para mais, este facto: durante o conflito político-militar, sangrento, de 1998/99, tu foste incapaz de estar longe da tua/nossa Guiné mais do que dois meses... Ao fim de dois meses, voltaste a entrar no país via Dacar, Senegal.


Carlos Schwarz da Silva, "Pepito",
 Lisboa, campus
da ENSP/NOVA. 6/9/2007.
Foto de Luís Graça
O Pepito e a família, cuja casa no bairro do Quelélé, em Bissau, foi pilhada e destruída pela 
soldadesca senegalesa, que apoiava o 'Nino' Vieira, estiveram refugiados em Cabo Verde, à volta de um ano (se bem me lembro)... 

O Pepito tinha nacionalidade guineense, e este foi um dos acontecimentos mais marcantes (e traumatizantes) da sua vida (segundo me confidenciou em São Martinho do Porto)... Voltou à Guiné, para recomeçar a sua vida, uma vida nova, nunca escondendo a sua gratidão para contigo. 

Tu, por sua vez, eras/és português, aliás o português mais guineense da Guiné-Bissau que eu conheço... e a Guiné-Bissau está-te grata pelo trabalho que lá tens feito, levando a energia elétrica a muitas tabancas mas também hotéis, escolas, hospitais....

És um homem que sabe muito da história recente da Guiné-Bissau, saberás até demais, pelos círculos em que te moves, o que te torna também um pessoa cautelosa, discreta, diplomática, sem deixares de ser fiável, afável, prestável, solidário e generoso.

Quem está há 40 anos na Guiné-Bissau, não se imaginando já capaz de viver e trabalhar noutro sítio do planeta, é um sobrevivente nato, capaz de enfrentar e resistir a tudo o que apoquenta, chateia e mata naquela terra (a sida, o paludismo, a cólera, as infecções nosocomiais, as canoas inhomincas, as armas, o tráfico de droga, a violência, a droga de vida, os golpes de Estado, a ausência de Estado, as picadas mal alcatroadas, o tempo seco, o tempo das chuvas, a pobreza, etc....).

Felizmente Águeda não está longe: tu também sabes que tens aqui uma retaguarda segura, à entrada da velha Europa, onde podes 'carregar baterias', revisitar família e amigos, fazer as teus exames de saúde, as tuas consultas médicas... É bom ter uma retaguarda segura, é bom ter uma Pátria, senão mesmo 
duas ou três... 

Tiro-te chapéu pela tua longevidade na Guiné, pela tua história de vida, pela tua sabedoria de verdadeiro africanista. 

Que Deus, Alá e os bons irãs te continuem a proteger  sempre!...
LG

PS1- Espero que no relatório da Op Crocodilo também apareça o teu nome e as tuas boas ações. Nunca chegarás a almirante, mas foste um bravo fuzileiro. 

PS2 - A RPT1, na"Sociedade Civil", ainda recentemente, dedicou a esta operação dois programas num total de cerca de 2 horas e meia. Os vídeos estão disponíves em RTP Play:

24 de julho de 2023 > Operação Crocodilo / Falcão (Parte 1) (1h 12m 08s)
25 de julho de 2023 > Operação Crocodilo / Falcão (Parte 2) (1h 20m 31s)

  

NRP Vasco da Gama (F330) na sua visita a Tallinn, capital da Estónia, entre 27 e 31 de março de 2008. Pormenor, imagem editada pelo nosso Blogue, da autoria de Ivo Kruusamägi da Wikipedia estoniana (2008) (Com a devia vénia ao autor e à Wikimedia Commons)
____________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 18 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25083: O segredo de... (41): António Rosinha (ex-fur mil, Angola, 1961/62; topógrafo da TECNIL, Bissau, 1987/1993): Luís Cabral, a camarada Milanka, eu e o 'mau agoiro' do meu patrão

(***) Vd. poste de 18 de março de 2022 > Guiné 61/74 - P23090: (In)citações (198): a atuação de Patrício Ribeiro, durante a guerra civil de 1998/99, e nomeadamente em Varela, em articulação com o NRP Vasco da Gama..."Se isto não é heroísmo, então eu nunca vi nenhum herói ao vivo e a cores" (Luís Graça)

Ver ainda postes de:

31 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3101: Histórias de vida (13): Desistir é perder, recomeçar é vencer (Carlos Schwarz, 'Pepito', para os amigos)




18 de março de 2022 > Guiné 61/74 - P23088: (In)citações (197): Mais recordações do conflito político-militar de 1998-1999, por parte de quem o viveu por perto, o Cherno Baldé e o Patrício Ribeiro

sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25037: E as nossas palmas vão para... (24): Nuno Rubim (1938-2023), autor do Diorama de Guileje, uma pequena obra-prima, que levou dois anos de trabalho, paixão, rigor... Foi oferecido, em 2008, ao Núcleo Museológico Memória de Guiledje





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Planta do quartel em 1966. Reconstituição de Nuno Rubim, coronel de artilharia, na reforma; realização plástica de Carlos Guedes, ex-fur mil. Um e outro fizeram parte da CCAÇ 726 (Guileje, 1964/66), o primeiro como comandante.

Foto ( e legenda): © Pepito / Acção para o Desenvolvimento (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 


Guiné > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008 >  Diorama do quartel (à data de 1996):  dois anos de trabalho... do Nuno Rubim  (1) e de um pequeno "grupo de combate" de gente valorosa e solidária, guineenses e portugueses (2), com destaque naturalmente para o Pepito e a sua esquipa da ONGD  AD - Acçãio Para o Desenvolvimento


Guiné-Bissau  > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008 > Diorama: planta
 
O Nuno Rubim a trabalhar no diorama, em casa (Seixal, Portugal) 

Fotos (e legendas) : © Nuno Rubim / Pepito / Acção para o Desenvolvimento (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > Um encontro inesperado: o nosso coeditor Virgínio Briote com o Teco e o Guedes... Estes dois últimos estiveram em Guileje, na CCAÇ 726 (Outubro de 1974 / junho de 1966), sob o comando do cap art Nuno Rubim... Voltaram agora a colaborar juntos no projecto Guileje (3)... Além de colaboradores, o Nuno Rubim tem neles dois grandes amigos. O Teco, que é natural de Angola, tem um fabuloso arquivo fotográfico desse tempo (mais de 500 fotos); o Guedes saiu da CCAÇ 726 para se oferecer, como voluntário, para os Comandos do CTIG, onde foi camarada do Briote... 


O saudoso cap José Neto (1929-2007), à esquerda, com o Pepito, foi um dos primeiros grandes entusiastas da Iniciativa de Guiledje... Eles e outros camaradas que passaram por Guileje e outros aquartelamentos do sul, na região de Tombali, contribuiram em muito para enriquecer o espólio documental da AD - Acção para o Desenvolvimento. Teria muito orgulho se fosse vivo, em "voltar a ver e a visitar o seu quartel e a sua tabanca", à escala de 1/72... 
   
Fotos (e legendas): © Luís Graça (2007). Todos os direitos reservados. [Edição:: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
  


Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guiledje (1 a 7 de Março de 2008) > O cor art ref Nuno Rubim, entre o cor cav ref Carlos Matos Gomes e o "Gringo de Guileje", o ex-fur mil Zé Carioca, da CCAÇ 3477 (Guileje, Nov 1971/Dez 1972), explicando pormenores da sua obra-prima que foi o diorama de Guileje...

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guiledje (1 a 7 de Março de 2008) > Dia 5 de Março de 2008 > Painel 3 >" O pós-Guiledje: efeitos, consequências e implicações político-militares do assalto ao aquartelamento". Moderador: Mamadú Djau (Director do INEP) > Comunicação de Nuno Rubim, português, cor art ef > 17h30 – 18h00 > "A batalha de Guiledje: uma tentativa de reconstituição histórica em dioramas"

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados. [Edição:: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Organização > Núcleo Museológico > Diorama  de Guileje

Adaptado da página oficial do Simpósio Internacional de Guiledje  (páginaa dcscontinuada, mas em parte disponível aqui: 

Desde 2006, o Nuno Rubim (que faleceu em 25 de dezembro de 2023)  pôs, apaixonadamente, voluntariamente, sem qualquer contrapartida, o melhor de si, a sua reconhecida competência, a sua visão histórica, o seu rigor de investigador, e o seu gosto pela bricolage, na concepção do Núcleo Museológico de Guiledje e, em especial, do diorama do quartel de Guiledje, uma obra ímpar que ele ofereceu à Guiné-Bissau, na pessoa do Pepito, Carlos Schwarz da Silva (Bissau, 1949 - Lisboa, 2012), engº agrónomo, cofundador e diretor da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, e "alma-mater" do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7  de março de 2008).

É algo "que nos enche de orgulho, a todos quantos se abalançaram a esta iniciativa", disse na altura o Pepito. As fotografias que permitiram a feitura do diorama foram cedidas, na sua grande maioria, por Teco (Alberto Pires), ex-fur mil da CCAÇ 726, o qual foi incansável na sua pesquisa. Outras foram enviadas por Carlos Guedes, também da mesma Companhia (mais tarde, Comando). (O Carlos Guedes é membro da nossa Tabanca Grande; o Teco ainda não, por lapso nosso: será o primeiro do ano de  2024.

Ambos também forneceram informações preciosas sobre vários aspectos importantes da configuração do quartel. Foram também aproveitadas várias fotografias do saudoso cap SGE  José Afonso da Silva Neto, da CART 1613 (Junho de 1967/maio de 1968) (Na altura, 2.º sargento, sendo o comandante o cap Eurico Corvacho).

Foi igualmente importante a colaboração de vários membros do nosso blogue, que forneceram informação relevante ao autor do diorama. Muitos colaboradores, guineenses e portugueses, contribuiram para este resultado, que também deve muito ao entusiasmo e energia do Pepito e da sua equipa de gente magnífica.

Seria injusto, por exemplo, não mencionar aqui a importância que teve, para a conceção do diorama, o levantamento topográfico efectuado em Guileje em 2005, por Fidel Midana Sambú, colaborador da AD- Acção para o Desenvolvimento.

2. A título meramente exemplificativo apresentamos aqui uma seleção de algumas miniaturas que compõem o diorama do quartel de Guileje. Os nossos parabéns ao autor da obra, que vai ficar no Núcleo Museológico Memória de Guiledje (sic), com muito orgulho (e uma pontinha de inveja) dos... tugas.
 

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Posto de transmissões (miniatura)
 
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Edifício dos oficiais e comando (miniatura)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Posto de primeiros socorros, centro cripto e cantina (miniatura)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Caserna do Pelotão de milícias da Companhia de Milícias n.º 12 (miniatura)
 
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Cozinha e refeitório das praças (miniatura)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Outro pormenor da cozinha (miniatura)
 
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Um abrigo (miniatura)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008>Uma palhota (miniatura)
 
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Uma viatura Daimler (miniatura)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008>Uma vaitura GMC (miniatura)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Um jipe (ou jeep) (miniatura)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008>Uma vitura White (miniatura)
 
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico de Guiledje (em preparação) > 2008> Uma avioneta DO 27 (miniatura) 
 
Fotos (e legendas) : © Nuno Rubim / Pepito / Acção para o Desenvolvimento (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Concepção do Diorama 

(i) A povoação de Guileje  (lê-se: Guiledje)  teve ali instalada unidades militares portuguesas desde fevereiro de 1964 até 22 de maio de 1973, altuar em que foi abandonada e ocupada, momentaneamente, três dias depois, pelo PAIGC. 

(ii) Assumida a decisão de ser feito um diorama, foi necessário determinar a data que o mesmo iria representar, dado que ali estiveram instaladas 11 Companhias, além de outras unidades menores (Pelotões de cavalaria, de artilharia, de caçadores nativos, de mílicias...) 

No decurso desse período e sobretudo a partir de 1969, o aquartelamento sofreu alterações significativas (por exemplo, contrução de abrigos pela Engenharia Militar). 

  • CCAÇ 495 (Fev 1964/jan 1965) 
  • CCAÇ 726 (Out 1964/jul 1966) (contactos: Teco e Nuno Rubim) 
  • CCAÇ 1424 (Jan 1966/dez 1966) (contacto: Nuno Rubim ) 
  • CAÇ 1477 (Dez 1966/jul 1967) (contacto: cap Rino) 
  • CART 1613 (Jun 1967/mai 1968) (contacto: cap Neto) [infelizmente já desaparecio, José Neto, 1929-2007] 
  • CCAÇ 2316 (Mai 1968/jun 1969) (contacto: cap Vasconcelos) 
  • CART 2410 (Jun 1969/mar 1970) (contacto: Armindo Batata) 
  • CCAÇ 2617 (Mar 1970/fev 1971) > Os Magriços (contacto: Abílio Pimentel) 
  • CCAÇ 3325 (Jan 1971/dez 1971) (contacto:cap  Jorge Parracho); 
  • CCAÇ 3477 (Nov 1971 /dez 1972) > Os Gringos de Guileje (contacto: Amaro Munhoz Samúdio); 
  • CCAV 8350 (Dez 1972/Mai 1973) > Os Piratas de Guileje (contacto: José Casimiro Carvalho ) 

(iii) Foi decidido escolher a data de 1965-66 pela seguinte razão: foi nessa altura que aí esteve sediada a unidade que ali permaneceu mais tempo, a CCAÇ 726 que, com a unidade que se lhe seguiu, a CCAÇ 1424, foi também a Companhia que efectuou mais operações no sector e sofreu mais baixas em combate.

(iv) O Diorama, ou maqueta, pretende pois representar o aquartelamento e a tabanca nesse período. 

(v) A escala escolhida foi a de 1/72, pois isso permitiria adaptar modelos em miniatura comercializados. 

(vi) Após aturado trabalho de estudo, e da recolha e análise de fotografias e declarações de ex-militares que ali estiveram no período em causa, foi possível desenhar um plano à escala para aí serem inseridas as localizações de edifícios, cubatas, abrigos e outros detalhes.

(vii) Estes, depois de também serem desenhados à escala, foram construídos utilizando plástico, madeira, metal e resina, e depois pintados de forma a representá-los tão exactamente quanto possível. 

(viii) No diorama poderão ser pois observados, além das infraestruturas, modelos de viaturas (GMC, Fox, Daimler, White...), depósitos, diversos utensílios etc…

(ix) E também um DO-27, a aeronave que proporcionava talvez o único momento de alegria para as tropas, pois era quem trazia e levava o correio e alguns frescos...

As nossas palmas vão para o nosso saudoso Nuno Rubim (1938-2023) (4)
____________ 

Notas do editor L.G.: 


(...) "Comandei em Guileje, sucessivamente (de castigo !..., eu qualquer dia conto esta estória) as CCAÇ 726 e 1424, depois de ter também comandado a CART 644 em Mansabá e a CCmds em Brá. O que foi a minha vivência em Guileje, fazem os amigos ideia... Foram de facto perto de 10 meses infernais, com mortos, feridos, estropiados, de ambos os lados, enfim o triste rosário de uma guerra que Portugal nunca devia ter travado. Tinha também um Grupo de Combate em Mejo, de que pouco tenho ouvido falar. Quando terá sido desactivado esse pequeno aquartelamento ? E ainda voltei à Guiné em 1972-74, mas isso é outra história..., que meteu o início da conspiração que levou ao 25 de Abril, entre outras coisas" (...).

Vd. ainda o poste de 18 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2554: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (21): Chegou o Nuno Rubim, em Mejo o Capitão Fula (Pepito)

(2) Vd. postes de:



10 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLV: Projecto Guileje (7): recuperação do quartel














(4) Último poste da série > 30 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24269: E as nossas palmas vão para ... (23): Inês Allen, hoje nossa tabanqueira nº 875: Devolveu a Empada, em fevereiro de 2023, a efígie de "Os Metralhas", divisa da CCAÇ 3566 (1972/74), e nome do clube de futebol local, dando cumprimento à última vontade do pai, Xico Allen (1950-2022)

domingo, 6 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24536: Recortes de Imprensa (130): "Nós tínhamos um padre, Antonio Grillo, que foi preso acusado de defender os rebeldes e os guerrilheiros que lutavam pela independência (...). Quando Paulo VI se tornou papa, o governo português perguntou o que ele queria de presente: 'Quero a libertação do padre Antonio Grillo'. Dito e feito. Paulo VI era maravilhoso" (...). (Dom Pedro Carlos Zilli, missionário brasileiro do PIME, bispo de Bafatá, em entrevista à Gazeta do Povo, 1/10/2019)


Foto nº 1


Foto nº 2

Guiné-Bissau > Regíão de Tombali > Guileje > 20 de Janeiro de 2010 > Núcleo Museológico Memória de Guiledje (*) > Cerimónia de inauguraçáo da capela > Na 1ª foto, a nossa amiga Júlia Neto, viúva do cap José Neto (1929-2007), ao lado do bispo de Bafatá, Dom Carlos Pedro Zilli.

Na nº 2, a "foto de família": ao centro o Bispo de Bafatá, ladeado pela Júlia (à sua esquerda) e pelo Pepito (à sua direita).

Ao fundo, o crucifixo levado de Portugal, pela Júla Neto, oferta do Paulo Santiago. Presentes também, entre outras individualides, os embaixadores da União Europeia, da Finlândia, de Cuba e de Portugal, bem como a então presidente da ONG AD - Acçáo para o Desenvolvimento, Isabel Miranda, o Domingos Fonseca /o arqueólogo de Guileje(, bem como a Isabel Levy Ribeiro (hoje viúva do Pepito, 1949-2014).

Fotos (e legenda): © Pepito (2010). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné ]


1. Excertos da entrevista a Dom Pedro Carlos Zilli, missionário do Pontifício Instituto das Missões Exteriores (PIME); não ascido em Santa Cruz do Rio Pardo (São Paulo, Brasil), trabalha na Guiné-Bissau, na África Ocidental, desde 1985; em 2001, foi nomeado Bispo de Bafatá, uma das duas dioceses do país.


Gazeta do Povo, Curitiba, Paraná, Brasil | 01/10/2019 08:28 | Por Felipe Koller

(...) Você acompanha a história da Guiné-Bissau há mais de trinta anos – e me parece que seja uma história bem conflituosa. Como você enxerga a missão da igreja nesse contexto?

É bem conflituosa, sim. Houve a Guerra da Independência entre 1963 e 1974 e a Guerra Civil entre 1998 e 1999. A Igreja sempre esteve presente em meio aos conflitos.

A Igreja é vista como uma autoridade e o povo espera que os bispos transmitam alguma mensagem nesses períodos. Fazemos isso com uma certa frequência – não fazemos mais para não perder o efeito.

Já fizemos duas mensagens conclamando a paz que foram assinadas por católicos, evangélicos e muçulmanos. Em uma ocasião, o então presidente, um muçulmano, nos chamou em meio a um conflito e a audiência durou só cinco minutos: apenas nos pediu para rezarmos pela paz, pelo diálogo e pela reconciliação. É muito bonito esse reconhecimento da Igreja por parte das autoridades.

(...) A missão da Igreja brasileira na Guiné-Bissau tem o nome de Paulo VI, que foi canonizado no ano passado. O que o senhor diria sobre a importância da canonização de Paulo VI?

Foi ele quem levou à frente o Concílio Vaticano II. João XXIII teve a ousadia e a graça de convocar um concílio, mas acho que nem ele pensava que daria nisso tudo.

Paulo VI deu continuidade ao concílio após a sua morte. Foi o papa que deu início ao hábito das visitas papais a diversos lugares do mundo. Em 1969, foi o primeiro papa a ir para a África, conclamando a Igreja do continente para ser missionária.

Também recebeu em audiência Amílcar Cabral, Agostinho Neto e Marcelino dos Santos, líderes que lutavam pela independência dos países africanos de língua portuguesa. Muita gente morreu pela independência e pela liberdade. Mas a conquista da independência se atribui também, em parte, a Paulo VI, por ter recebido esses líderes.

Nós tínhamos um padre, Antonio Grillo, que foi preso acusado de defender os rebeldes e os guerrilheiros que lutavam pela independência contra o regime português.

Quando Paulo VI se tornou papa, o governo português perguntou o que ele queria de presente: “Quero a libertação do padre Antonio Grillo”. Dito e feito. Paulo VI era maravilhoso. (...)

Leia mais em: https://www.semprefamilia.com.br/blogs/acreditamosnoamor/tive-que-aprender-a-fazer-poesia-a-partir-da-realidade/


2. Comentário do editor LG:

A história do PAIGC está cheia de "lendas & narrativas", como de resto acontece com outros movimentos e partidos revolucionários, à esquerda e â direita, incluindo naturalmente a Igreja Católica enquanto organização e instituição...

Uma dessas "lendas" é o da famosa audiència, em 1 de julho de 1970, do Papa Paulo VI aos très dirigentes nacionalistas das colómias portugugueses que lutavam pela independència dos seus países (MPLA, PAIGC e FRELIMO), e que ao tempo (e ainda hoje) é hoje objeto de leituras divergentes.(**)

Vale a pena ler os seguintes excertos de um artigo mais vasto que o historiador João Miguel Almeida publicou, há 3 anos no jornal digutal 7Margens. 

Vd. 7Margens > A audiência inédita de Paulo VI que abalou o Estado Novo
João Miguel Almeida | 1 Jul 20

(...) Facto inédito até então, que assim permaneceria vários anos: um Papa – Paulo VI – quebrava vários interditos e recebia em audiência os líderes dos movimentos independentistas de três das então colónias portuguesas em África. Foi há 50 anos, 1 de Julho de 1970, e também era quarta-feira.

Um dos momentos de maior tensão entre o regime do Estado Novo e o Vaticano, que o regime ditatorial português tentou esvaziar antes que a censura permitisse que a notícia fosse dada. A convite do 7MARGENS, o historiador João Miguel Almeida reconstitui aqui o acontecimento.



Excertos do artigo de João Miguel Almeida (que é autor de A Oposição Católica ao Estado Novo, ed. Nelson de Matos, 2008) (com a devida vénia ao autor e ao editor):

(...) O acontecimento reabriu feridas nas relações diplomáticas entre Portugal e a Santa Sé. A gestão da crise e a minimização dos estragos causados na imagem de um regime político que se afirmava como defensor da Igreja Católica não foram suficientes para apagar a perceção de que a estratégia e a doutrina da Santa Sé em relação a África divergiam da política colonial portuguesa.

(...) Os sinais provenientes do Vaticano durante e logo após o Concílio Vaticano II tinham sido captados com incómodo e crispação pelo governo de Salazar. A encíclica Pacem in Terris, de João XXIII, fora publicada em Portugal com a referência ao direito de autodeterminação dos povos cortado. A ida de Paulo VI à ONU fora considerada um acontecimento “horrível” por Salazar e a deslocação do Papa à Índia, fora qualificada por Franco Nogueira como um “agravo”, por causa da anexação de Goa pelo Estado indiano.

No entanto, a hábil diplomacia portuguesa conseguira varrer as sombras da imagem das relações entre Portugal e o Vaticano, explorando a visita de Paulo VI a Fátima em 1967. A chegada de Marcello Caetano ao poder pareceu anunciar uma melhoria nas relações entre o Estado Novo e a Santa Sé, como fim do exílio de dez anos do bispo do Porto, em 1969. (..:)

(..) Entre 27 e 29 de junho decorreu em Roma a Conferência de Solidariedade com os Povos das Colónias Portuguesas, organizada formalmente pelas três confederações sindicais italianas, embora na prática ela tenha resultado do empenho de quadros do PCI (Partido Comunista Italiano) e da CGIL, a central de orientação comunista.

Esta iniciativa, em que o PAIGC (...) MPLA (...) e Frelimo (...) marcaram presença, contou com a participação de 171 organizações nacionais e internacionais, de 64 países. (...)

(...) A preparação da audiência

(...) O encontro entre Amílcar Cabral, Agostinho Neto e Marcelino dos Santos com Paulo VI, foi meticulosa e secretamente preparada, para iludir a vigilância da polícia política portuguesa. A principal organizadora do encontro foi Marcella Glisenti, presidente da Associação Italiana dos Amigos da Présence Africaine, existente desde 1962 e que integrava personalidades como Enrico Berlinguer (futuro secretário-geral do PCI) e Giorgio La Pira (presidente da câmara de Florença e representante da ala esquerda da Democracia Cristã italiana).

No Vaticano, a jornalista italiana era também conhecida por ser casada com Giuseppe Glisenti, filiado no Partido Democrata Cristão, antigo resistente antifascista e diretor do Instituto para a Reconstrução Industrial (IRI).

Marcella Glisenti relacionava-se com os movimentos de libertação na África portuguesa, principalmente com Amílcar Cabral, que conhecera em 1968, em Paris, por intermédio do intelectual católico de origem senegalesa Alioune Diop, fundador da revista Présence Africaine e de uma livraria do mesmo nome em Paris (cfr. “A Amiga Italiana de Cabral”, Expresso, 22/02/1997).

Marcella Glisente pediu uma audiência a Paulo VI, em nome dos três líderes dos movimentos de libertação, numa carta dirigida a monsenhor Frana, secretário do cardeal Benelli, o número dois do governo do Vaticano.

A carta traçava um perfil dos três homens indicando não só o seu trajeto político, mas também a sua formação religiosa (dois católicos e um metodista).

O pedido de audiência foi reforçado por uma carta do arcebispo de Conacri, Raymond Marie Tchidimbo, dirigida a Benelli, em que classifica o encontro como uma “ocasião única” para o reconhecimento pela Igreja Católica “dos justos direitos à dignidade e à autodeterminação dos povos africanos”.

A autorização para o encontro chega por escrito, a 30 de junho, avisando os três líderes africanos que serão recebidos no dia seguinte pelo Papa, em audiência privada, na Sala dos Paramentos, onde eram recebidos os embaixadores estrangeiros, pelas 12h15. (...)


(...) A difícil gestão de um incidente diplomático


O embaixador junto da Santa Sé [Eduardo Brazão] fica chocado com a notícia. O Governo português não se limita a apresentar uma nota de protesto ao secretário do Estado do Vaticano – chama a Lisboa o seu embaixador, um gesto diplomático de forte desagrado, que geralmente antecede o corte de relações diplomáticas.

O protesto é também apresentado em pessoa e verbalmente ao equivalente ao cargo de primeiro-ministro no Vaticano, o cardeal Villot, que se mostra surpreendido e consternado. Na interpretação de Eduardo Brazão, o cardeal francês desconhecia as manobras de política internacional “manejada pelos seus subordinados italianos”. (...)

(...) Assim que é informado da chamada do embaixador português a Lisboa, o Vaticano faz publicar no Osservatore Romano uma versão dos acontecimentos que visa esvaziar a crispação com o governo português: a receção teve um carácter exclusivamente religioso, nada teve de especial, e nela o Papa limitou-se a saudar os interlocutores e exortá-los a serem fiéis aos princípios cristãos.

À frente da embaixada no Vaticano fica Quartin Graça, acreditado como encarregado de negócios. Era um diplomata hábil e experiente que, no contexto do conflito, consegue dar ao Governo português uma oportunidade de apresentar ao público uma versão dos acontecimentos em que “salva a face”: obtém da Santa Sé um documento assinado pelo cardeal Villot em que o significado do encontro de Paulo VI com os três líderes dos movimentos de libertação é minimizado, sendo negado que se tenha tratado de uma audiência “no sentido próprio do termo”.

O acontecimento é descrito como um dos muitos encontros que o Papa, na qualidade de pastor universal, tem com muitos grupos de católicos e não católicos. Paulo VI teria recebido os três dirigentes africanos não como políticos, mas apenas como cristãos.

Após três dias de rigorosa censura da audiência de Paulo VI, de 1 a 4 de julho, Marcello Caetano usa a versão da Santa Sé na sua comunicação televisiva ao país numa “conversa em família” a 7 de julho. Interpretando a nota vaticana do modo mais conveniente para o Governo, Marcello cita-a para declarar que a audiência “não teve qualquer significado político”, dando o incidente diplomático como esclarecido.

As versões mais convenientes para a continuidade das boas relações diplomáticas entre Portugal e o Vaticano são, no entanto, desmentidas por Agostinho Neto, numa conferência de imprensa na Dinamarca. O presidente do MPLA garante que os três homens tinham sido recebidos como políticos, que o Papa se mostrara solidário com a causa da independência das colónias portuguesas e que afirmara que rezaria pelos seus interlocutores. (...)

A 28 de julho, Eduardo Brazão regressa a Roma e retoma as suas funções. O incidente diplomático estava encerrado, mas as clivagens que revelara continuariam a marcar a relação da Igreja Católica com a dimensão colonial do Estado Português.

Entre 1960 e 1970 uma onda descolonizadora varrera África. Para os bispos e missionários católicos em África era cada vez mais difícil conciliar a fidelidade a Roma com uma visão providencialista do papel missionário de Portugal em África. (...)