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quarta-feira, 12 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27412: Armamento do PAIGC (10): Pistola-metralhadora Samopal vz25, de origem checa, ou a M-25, ("Merengue", na gíria do IN, por influência cubana)




Pistola-metralhadora  M-25 ("Merengue"), de origem checa ("Samopal")


Guiné > Região de Tombali >  Ilha do Como > c. 1964 > Guerrilheiros do PAIGC, empunhando pistolas-metralhadoras M-25", cal 9 mm ("Merengue")  e PPSh", cal 7,62mm ("Pachanga", ou "costureirinha", na gíria das NT); do lado direito, distingue-se, em tronco nu,  João Bernardo  'Nino' Vieira, na ilha de Como, Frente Sul. Náo se sabe se a foto foi tirada antes, durante ou depois da Op Tridente. É mais provável  que seja do ano de 1963, pelo ar "desportivo" do grupo,  a fazer um crosse matinal, ou a posar para a fotografia, para o álbum do Amílcar Cabral ( será que o tratavam por senhor engenheiro ?)
 


1.  Através do Formulário de Contacto do Blogger, um nosso leitor pediu-nos que confirmassemos  se esta arma, cuja foto se publica acima, era usada na Guiné pelo PAIGC, no nosso tempo:

Data - sexta, 3/10/2025, 18:20

Segundo pesquisa na Net, que me deu "uma trabalheira",  a arma parece não constar das listagens habituais, trata-se de uma pistola metrelhadora Samopal, vz25.

Deixo o link da arma:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Sa_vz._23

 Sobre a arma:
  • o que me surpreendeu ao pesquisar a identificação dela foi a sua ausência das listagens consultadas na Net;
  •  no mesmo site encontra-se uma foto de 'Nino' Vieira com o seu grupo, curiosamente todos com a mesma arma, ou suas variantes

2. Comentário do editor LG:

2.1. Também sou de opinião que se trata de ums pistola-metralhadora checa, Sa vz25, "Samopal". Dispunha de  uma coronha de metal dobrável, disparava a munição 9×19mm Parabellum. Era em tudo é idêntica à Sa 23 (exceto da coronha, que era de madeira). e usando os mesmos carregadores de 24 e 40 tiros.

Gostava de ouvir a opinião do nosso especialista em armamento, o Luís Dias. Para já, recorri à minha assistente de IA / ChaGPT. Face às duas fotos que lhe mandei, não teve dúvidas em dar a sua opinião ponderada:

(..) Pela forma geral — receptor tubular curto, carregador recto montado à frente da empunhadura, coronha metálica dobrável para o lado e empunhadura/pega frontal dobrável — trata-se muito provavelmente de uma Samopal checoslovaca da família Sa vz.23 / Sa vz.25 (às vezes referido como CZ-23 / CZ-25, exportado como “Sa” ou “Samopal” nos catálogos da época).

Por que acho isto provável:

  • a posição do carregador (à frente da pega) e o aspecto geral lembram os desenhos da família vz.23/25, que foram amplamente exportados pela Checoslováquia na década de 1950–60;

  • a coronha metálica que dobra para o lado e a pega vertical rebatível são soluções técnicas presentes nesses modelos;

  • o PAIGC recebeu armamento do bloco de leste (inclu9indo a então  Checoslováquia) durante a guerra colonial, pelo que a captutra de um Sa vz.23/25 em 1964 é compatível com a proveniência e a cronologia.

Grau de certeza: provável, mas não definitivo. Existem variantes e cópias regionais/industriais e a família vz.23/25 teve pequenas diferenças entre versões de fábrica e exportação. Para confirmação absoluta, o ideal é verificar:

  • marcas e punções no receptor (normalmente código do fabricante e modelo);

  • formato exacto do carregador (capacidade e encaixe);

  • calibre estampado no cano/receptor (7,62×25 Tokarev foi comum em alguns modelos, mas havia variantes noutros calibres). (...)

(Pesquisa: LG / Assistente de IAS / ChatGPT)

(Condensação, revisão / fixaçãod e texto: LG)


2.2. Tudo indica que esta Sa vz25 seja a M-25 ("Merengue", na gíria do PAIGC, por influência cubana) que consta da relação a seguir:


Relação de material capturado  ao PAIGC  até 1964 >  (...) Pistolas-Metralhadoras: Modelo | País de oirgem

  • "M-23", cal 9 mm ("Rico") | Checoslováquia
  • "M-25", cal 9 mm ("Merengue") |  Checoslováquia
  • "PPSh", cal 7,62mm ("Pachanga", "Metra") | URSS
  •  "PPS SUDAYEF", cal 7,62mm | URSS, China
  • "THOMPSON", cal 1l,4mm ("Rico Thompson") | USA - China
  • "MP-40", cal 9mm | Alemanha Oriental
  • "SCHMEISSER" | Alemanha Oriental
  • "BERETA" | Itália
  • "UZI" | Israel 
  • "FBP" | Portugal

Fonte: Excertos de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014), pp. 290/291 (Com a devida vénia...).

segunda-feira, 3 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27382: Notas de leitura (1858): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Maço de 2025:

Queridos amigos,
O nosso confrade José Matos é de uma delicadeza extrema, mal foi publicado este seu último livro deu-me conhecimento do seu conteúdo, autorizando a revelá-lo, sob a forma de uma súmula, a todos os camaradas. Habituou-nos ao rigor das fontes e dos documentos, ilustra com textos pontos sugestivos da obra, igualmente recorre a ilustrações que facilitam a compreensão dos factos. Em termos de narrativa, contextualiza toda a guerra de África e desvela os principais acontecimentos de 1973 que aceleraram a sublevação militar; são igualmente mostradas as etapas da sublevação a partir da legislação que criava um Quadro Especial de Oficiais, e assim progredimos até aos preparativos da sublevação, depois do insucesso da revolta das Caldas os militares esboçaram uma estratégia que contemplou os três ramos das forças armadas e uma multiplicidade de unidades espalhadas pelo continente. Da operação em si e dos acontecimentos do 25 de Abril e subsequentes se fará referência no próximo texto.

Um abraço do
Mário



Atlas Histórico do 25 de Abril, por José Matos, um confrade que nos dá imensa companhia (1)

Mário Beja Santos

Acaba de ser dada à estampa pela editora Guerra e Paz o Atlas Histórico do 25 de Abril, a obra mais recente do nosso confrade José Matos, publicação muito sugestiva que nos permite recordar as etapas fundamentais do 25 de Abril, acompanharemos os alvores da revolução, chega-se à obra de Spínola Portugal e o Futuro e será esmiuçada a queda do regime e revisitada toda a operação que vitoriou o MFA; leitura tão mais sugestiva pela apresentação de imagens e quadros esclarecedores dessas diferentes etapas.

Em 1973, ainda havia a ilusão de que a ditadura portuguesa teria condições para durar; mas nesse ano alterou-se profundamente o cenário internacional, mudou profundamente a situação dos teatros de operações da Guiné e também em Moçambique; chegar-se-á mesmo ao momento de questionar se a Guiné era defensável, foi tema abordado no Conselho Superior de Defesa Nacional, perto do final do ano, julgava-se que ainda havia uma janela de oportunidade, isto na altura em que Portugal começa a sofrer as consequências não só da crise petrolífera, o país é castigado pelo mundo árabe, a inflação torna-se galopante. O ministro da Defesa, Sá Viana Rebelo, procura uma solução para a falta de oficiais para a guerra, propõe um Quadro Especial de Oficiais, estala a indignação do corpo de oficiais do quadro permanente, vão começar as reuniões, a primeira na Herdade do Monte do Sobral no Alentejo.

Desenhado por Diniz de Almeida, o croqui com indicações para os militares chegarem ao Monte do Sobral (Arquivo Diniz de Almeida)

Marcello Caetano remodela o Governo, Silva Cunha passa para ministro da Defesa, os militares continuam a protestar como se verá na reunião de S. Pedro do Estoril. A política ultramarina do Estado Novo isolara Portugal, consumia cada vez mais recursos ao país. Mesmo os Aliados da NATO furtavam-se a apoiar Portugal e a compra de armamento era cada vez mais difícil. José Matos rememora os acontecimentos que envolvem tal política ultramarina, o aparecimento da luta armada a partir de 1961. Destaca o problema da Guiné. Refere uma carta do chefe do Gabinete Militar Arnaldo Schulz, Tenente-Coronel Castelo Branco, para o governador, então em Lisboa, dizendo que “o inimigo colocou-nos a mão no pescoço, como bom lutador de judo, e nós temos dificuldade em sair desta posição”. Toda a situação na Guiné é passada em revista, Spínola regressa da Guiné em agosto, não escondendo que a situação se tornou incomportável, não podia haver solução militar, impunham-se negociações. Marcello Caetano nomeia novo governador, ele escreverá nas vésperas do 25 de Abril que se chegara à exaustão dos meios. Nessa altura já Marcello Caetano procurara sigilosamente conversações com o PAIGC, que ocorreram em Londres, em março.
Os apartamentos de Dolphin Square em Londres (Arquivo José Matos), foi aqui que decorreram as conversações secretas entre o PAIGC e o cônsul português José Manuel Villas-Boas, toda esta operação fora urdida pelo embaixador britânico em Lisboa

Prosseguem as reuniões dos militares conspiradores, o autor descreve a atmosfera em que é publicado o livro de Spínola Portugal e o Futuro, a proposta de criar uma federação já não assentava na realidade, não só nenhum dos movimentos de guerrilha era a favor como Portugal perdera oportunidade de preparar o ambiente que permitiria a conjugação de todas estas vontades. Mas o livro foi o rastilho da revolução, como Marcello Caetano constatou após a leitura do livro, na noite de 22 de fevereiro de 1974. Caetano está já entre a espada e a parede, quer demitir-se mas Thomaz não consente, discursa na Assembleia Nacional, pede-lhe um voto favorável para a continuação da política ultramarina, recebe os oficiais generais, demite Costa Gomes e Spínola, enquanto discursa na Assembleia Nacional surge o manifesto dos capitães numa reunião que se realizou em Cascais, Melo Antunes lê aos presentes um documento por ele elaborado: o regime era incapaz de se autorreformar, a perpetuação da guerra não ia resolver um problema ultramarino; os povos africanos tinham direito à autodeterminação, embora devessem ser acautelados os interesses dos portugueses residentes no Ultramar; era necessário um novo poder político eleito democraticamente que fosse realmente representativo das aspirações e interesses do povo.

Com a demissão de Costa Gomes e Spínola, os militares já em estado de sublevação vão procurar, a partir das Caldas da Rainha, caminhar em direção a Lisboa, a operação não é sucedida, Caetano falará dela na sua última Conversa em Família. Pelas diferentes vias diplomáticas, tenta-se adquirir novas armas, suscetíveis de se equiparar com o armamento da guerrilha. Temendo o uso da Força Aérea por parte do PAIGC, é comprado o Crotale.

Originalmente desenvolvido para a África do Sul pela Thomson-CSF e pela Matra, o Crotale era um sistema de defesa antiaérea para alvos a baixa altitude. Uma bateria de Crotale era composta por dois a três veículos de disparo, cada um com o seu próprio radar de controlo de fogo e quatro mísseis prontos a disparar, e um veículo de vigilância/aquisição. Portugal assinou um acordo de compra com os franceses em Janeiro de 1974, mas este sistema já não seria entregue a tempo. A única bateria de Crotale chegaria em Setembro de 1974, após o fim da guerra, e com a ajuda de Thomson foi revendida à África do Sul em 1976.

Vamos ver agora os preparativos do golpe, estiveram a cargo de um estratega, Otelo Saraiva de Carvalho; ele teve o cuidado de envolver várias unidades militares espalhadas pelo país, era imperativo tomar a capital. Sede do Governo, aqui estavam a televisão e as mais importantes estações de rádio e o aeroporto. Todas as operações seriam comandadas a partir de um centro de comando do MOFA (mais tarde MFA), havia necessidade de um sistema de comunicações fiável, ficou a cargo do tenente-coronel Garcia dos Santos, foi ele o responsável por arranjar o material de comunicações para a revolta.

A fuga do tenente Castro Gil:

“No dia 31 de Janeiro de 1974, ao fim da tarde, os guerrilheiros abateram com um míssil terra ar um Fiat G.91 que prestava apoio de fogo ao aquartelamento de Canquelifá, que estava sob ataque do PAIGC. Este quartel na fronteira nordeste com o Senegal distava cerca de 200 km de Bissau e era uma zona flagelada com alguma frequência pela guerrilha. O piloto ejetou-se e aterrou em segurança, mas teve de fugir para não ser capturado pelo inimigo. Decidiu rumar a norte, para o Senegal, indo pelo mato rasteiro ainda com cinzas ardentes para que a aragem do ar apagasse o seu rasto. De manhã, regressou à Guiné e foi ter a uma aldeia. Aproximou-se e escondeu-se nuns arbustos, a observar o movimento dos naturais e a ver se via homens armados ou fardados como os guerrilheiros. Quando viu que era seguro, entrou na aldeia e pediu ajuda. Surgiu então um homem com uma bicicleta e mandou o tenente Gil instalar-se atrás, arrancando a pedalar em direção ao sul para o Quartel de Piche. No quartel, começou a grande festa da recuperação do jovem tenente, que, no dia seguinte, chegou à base aérea de Bissalanca, onde a receção foi apoteótica e onde a festa se prolongou até de madrugada. Bastante alcoolizado, o tenente acabou internado no hospital de Bissau amarrado a uma cama.”

Texto retirado da obra de José Matos.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 31 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27370: Notas de leitura (1857): "Ecos Coloniais", coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto; edição Tinta-da-China 2022 (4) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 28 de outubro de 2025

Guiné 61/74 - P27360: (Ex)citações (439): Ainda a propósito dos bravos de Contabane... "O maluco do Carlos Azeredo está a bombardear a Guiné-Conacry", dizia, em pânico, o QG... (Carlos Nery, ex-cap mil, CCAÇ 2382, 1968/70)





Carlos Nery, hoje um homem do teatro,
uma paixão antiga, como ator; a sua primeira
experiència como encenador foi na Guiné
É um dos fundadores da Companhia
Maior. E um exemplo maior, para todos nós, antigos combatentes, de como se pode e deve envelhecer de maneira ativa, proativa, com saúde, com autonomia e com qualidade de vida.


1. No passado dia 15 de outubro, pedi ao Carlos Nery, ex-cap mil, cmdt da CCA2382 (Buba, 1968/70), que nos respondesse a algumas questões relacionadas com o ataque a Contabane, de 22 de junho de 1968:

Carlos: acho que podes esclarecer aqui algumas dúvidas...

(i) os militares da tua CCAÇ 2382 que foram galardoados com a cruz de guerra, por louvor teu, foram-no na sequência da sua atuação na noite de 22 de junho de 1968, essencialmente: confirmas ?

(ii) por que razão não é mencionado explicitamente o topónimo Contabane no teor do louvor ?

(iii) não houve mortos, apenas feridos (alguns graves), no ataque, civis e militares;

(iv) onde estava instalada exatamente a força atacante: a norte/nordeste da tabanca ?

(v) tens mais fotos de Contabane ?

(vi) o reordenamento de Sinchã Sambel, na margem esquerda do rio Corubal, frente ao quartel do Saltinho (que ficava na margem direita), já não é do teu tempo mas do tempo do Paulo Santiago e da CCAÇ 2701 (1970/72).

Para já é tudo. Dou conhecimento das fotos da Ivone Reis à suas e nossas camaradas Arminda, Rosa, Aura e Giselda, nossas tabanqueiras.

Um alfabravo. Luis
Carlos Azeredo 
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Capa do livro de Carlos de Azeredo - Trabalhos e Dias de Um Soldado do Império. Porto, Livraria Civilização Editora, 2004,
496 pp.



No CTIG, Carlos de Azeredo (Marco de Canaveses, 1930- Porto, 2021) foi comandante de:

  •  CCav 1616 / BCAV 1897 (Mansoa e Olossato, 1966 / 1968);
  • Comando Operacional do Sector de Aldeia Formosa / COP 1 (1968/69);
  • Centro de Instrução Militar de Bolama (1969).

2. Resposta do Carlos Nery com data de 20/10/2025, 20:03:


Caro Luís,
 
Durante a minha estada em Bissau, vindo de Buba, ocupei o meu tempo a redigir a história da minha companhia socorrendo-me dos relatórios das diversas situações vividas. 

Vim a saber, mais tarde, pelo então major Carlos Azeredo, que cópias desse relatório tinham sido distribuídas por algumas unidades como material de estudo.

Pedi também aos alferes da minha companhia a sua opinião acerca dos militares por eles comandados para louvá-los apontando para eventuais condecorações. 

Desloquei-me várias vezes à Secção de Justiça do QG para me informar como deveria redigir os louvores. 

Conheci, então, o alferes Barbot (hoje escritor Mário Cláudio). Lembro-me de ter pedido desculpa por andar lá a incomodá-los mas ouvi a seguinte resposta, "sabe, capitão, aqui o nosso trabalho tem que ver sobre infrações, desvios de dinheiro, problemas de indisciplina, etc. É com gosto que vemos aparecer alguém que pretende premiar os homens que comandou."

Sobre as questões que me pões e no que respeita a Contabane, direi que a decisão de retirar a população e abandonar a tabanca estava tomada antes do ataque do PAIGC comandado por 'Nino' Vieira. 

Spínola não concordava com unidades instaladas perto da fronteira e a decisão de abandonar Contabane fora-me comunicada por Carlos Azeredo nas vésperas do ataque. 

O PAIGC perdera a paciência com os Fulas. Contabane e Mampatá, por exemplo, tinham aceitado receber armas das nossas tropas e o régulo de Contabane, recebidas essas armas, decidiu atravessar a fronteira para meter na ordem tabancas que pertenciam ao seu regulado. 

Não sei o que se passou nessa incursão mas ponho a hipótese que o ataque tentasse punir esse atrevimento. Azeredo decidiu deslocar o comando da companhia e um dos dois grupos de combate que estavam em Mampatá, para Contabane, por forma a poder executar com segurança a saída de toda a população e o posterior abandono da tabanca. 

Lembro-me de que,  na véspera do ataque, houve alguns civis que durante a noite tentaram sair e atravessar a fronteira. Atento a tudo o que se passava, o régulo, perseguiu-os e capturou-os apresentando-mos debaixo de prisão. 

Confesso que, com a minha pouca experiência na altura, não liguei muito ao que acontecera. Hoje estou convicto de que se tratavam de informadores da guerrilha, sabedores do ataque que se preparava e que pretendiam avisar de que Contabane estava agora defendida por um efectivo considerável e simultaneamente saírem para uma zona mais segura.

A pressão do PAIGC sobre toda a zona iria continuar depois do ataque a Contabane. Aldeia Formosa foi flagelada por diversas vezes com a consequente destruição de casas da população e perdas de vidas. 

Perante a dificuldade em defender uma população que ocupava uma área considerável, Azeredo não hesitou. Apontou os obuzes 14 ali existentes a povoações da República da Guiné. Por cada granada que atingisse a tabanca imediatamente era enviada uma de obus 14 para lá da fronteira. 

Foi remédio santo, nunca mais Aldeia foi flagelada. Para Bissau, Azeredo comunicou somente: "enviadas três granadas 14 para o objectivo ..." e dava as coordenadas de um objectivo no território de Guiné-Conacri. 

No quartel general foi o pânico:  "o maluco do Azeredo está a bombardear a Giné-Conacri!"

Spínola mete-se num avião e desce em Aldeia, furioso com Azeredo. Este imita-se a pedir que viesse com ele à tabanca. Perante a destruição de casas e vidas, Spínola despede-se e diz a Azeredo: "continue".

Meu amigo, acabei por falar em tudo, menos a responder às tuas perguntas.

Terás que esperar... Estou assoberbado com ensaios, tenho que arranjar uma aberta. (**)

Abração,  CNery

3. De imediato, respondi-lhe e agradeci-lhe. Perguntei-lhe se podia publicar. Como é um homem assoberbado, que continua apaixonado aos noventas pelo teatro e a sua Companhia Maior, não me respondei mas eu entendi o seu silèncio como luz verde. 

Data - 20/10/2025, 20:32  

Brilhante, meu capitão. Posso publicar estes esclarecimentos adicionais ? São pequenos afluentes do rio da Grande História. 

Bom ensaio, e sempre em frente até aos c(s)em. Diz-me qual a próxima peça. Para a gente ir ver. Um alfabravo. Luís

segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Guiné 61/74 - P27355: O início da guerra (Armando Fonseca, ex-sold cond, Pel Rec Fox 42, mai 62 / jul 64) - Parte V: Depois de Ganturé, Sangonhá (maio / junho de 1964)

 

 Guiné > Região de Tombali > Sangonhá  > CCAÇ 1477 (1965/67) > O José Parente Dacosta, 1º cabo cripto, CCAÇ 1477 (Sangonha e Guileje, 1965/67), junto ao monumento da CART 640 ("Quartel ocupado e construído pela CART 640, desde 21/5/1964. [CART] 640 / RAP2".

Há poucas fotos de Sangonhá, Cacoca, Cameconde, quartéis que ficavam na linha fronteiriça e que irão ser abandonados, em 1968.

Foto (e legendas): © José Parente Dacosta (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Zona Sul > Região de Tombali > Carta de Cacoca (1960) (Escala 1/ 50 mil) > Posição relativa de Gadamael, Ganturé, Sangonhá, Cacoca, rio Cacine, fronteira com a Guiné-Conacri, parte do Quitafine/Cacine e do Cantanhez  

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2025


O início da guerra (Armando Fonseca, ex-sold cond, Pel Rec Fox 42, mai 62 / jul 64)

Parte V - Depois de Ganturé, Sangonhá (mai/junho  64)


Depois de, em Ganturé, existirem as condições mínimas de sobrevivência para a instalação das tropas que aí permaneciam, o Pel Rec Fox 42 juntamente com tropas recém chegadas à Guiné   [CART 640 ] e com um Pelotão de Milícias rumou até Sangonhá a 21 de maio de 1964 [e não março, como por lapso indica o autor ].

Petromax a petróleo
marca Hipólito, modelo 
350
Como de costume segue-se a capinagem, a vedação de arame farpado em volta da tabanca, que seria agora um quartel, a colocação de cavaletes para instalação dos candeeiros a petróleo (petromaxes), a que alguns “valentes” iam dar pressão de ar durante a noite, sempre que necessário.

Também era norma que,  quando chegávamos a um novo local, não se consumia água da que ali existia sem ser certificado de que ela estava em boas condições de utilização, assim, recorria-se sempre ao aquartelamento mais próximo para nos abastecermos desse precioso líquido.

Então no dia 23 de maio de 1964, pela tarde lá vamos nós a Guileje encher os reservatórios de água regressando já ao lusco-fusco, âquela hora em que já não se vê muito bem mas também ainda não é preciso acender faróis.

Assim o IN que decerto nos vigiava não deu pela chegada dos carros da Cavalaria e entenderam ser muito fácil um ataque às tropas recem instaladas para mais que a maior parte tinha as pernas muito brancas,  o que indiciava pouca experiência naquelas andanças e que se tornaria uma tomada do local com a maior das simplicidades.

E, então pelo meio da noite de 23 para 24, qual não é o espanto do sentinela que se encontrava do lado da estrada que ligava a Guiné à Guiné-Conacri, quando vê aparecer um grupo de guerrilheiros pela estrada acima, descontraidamente a aproximar-se da entrada trazendo uma metralhadora e outros armamentos,  parecendo que passeavam. 

Essa sentinela chegou a estar confundido sem saber se devia atacar ou esperar julgando que eles se vinham entregar às nossas forças.

Entretanto quando eles se encontravam a cerca de vinte metros do arame, a sentinela que se encontrava dentro do granadeiro,  reagiu e fez uma rajada que despoletou um ataque feroz, à volta da aquartelamento. 


Parece ser uma metralhadora pesada,
 de calibre 12.7
de origem soviética,
a Degtyarev (DShK) m/938,
com tripé
Havia mais duas metralhadoras iguais à que aquele grupo transportava, cuja foto envio, e várias outras armas mais ligeiras, aquelas "costureirinhas" que quase todos conhecemos.

As nossas tropas reagiram e o tal grupo procurou uma elevação no terreno e instalaram-se para fazer fogo sobre nós, mas como os nossos carros tinham um grande poder de fogo, depressa o anulámos, isto com a ajuda do comandante da milícia, visto que a certa altura devido à proximidade do IN não se sabia muito bem de quem eram os tiros,  se das nossas tropas se do IN. 

Depois de anulado esse grupo cuja maioria ficou lá assim com o respectivo armamento, que se encontra no museu militar, todo o ataque foi sendo anulado e o IN retirou em debandada.

Ao raiar da aurora fomos então fazer o reconhecimento, e do grupo que fora avistado estavam seis mortos, a metralhadora, pistolas-metralhadoras e pistolas e um rolo de corda. 

Depois de examinados os outros locais de onde vieram os piores ataques, restavam montes de invólucros e os vestígios das metralhadoras terem sido arrastadas no final do ataque, pelo que se deduziu que o cordão encontrado seria exactamente para atar ao suporte da metralhadora para que um dos intervenientes recuasse para local seguro e puxasse a metralhadora no final do ataque, caso este corresse mal como foi o caso, só que neste caso não houve tempo para a execução dessa operação.

Passada esta primeira confusão, permanecemos em Sangonhá até 23 de junho  [de 1964 ], continuando a manter as devidas precauções e a segurança das tropas aí instaladas, até que eles atingissem a maturidade para se defenderem a si próprios.

Depois de Sangonhá, seguiu-se Cacoca (...) (**)

(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)

2. Comentário do editor LG:

Há uma divergència de datas entre o texto acima reproduzido e a versão da CECA.  O Armando Fonseca queria dizer "maio" e não "março", aliás de acordo com o final  do poste anterior: "Permanecemos em Ganturé até 20 de maio. No dia seguinte fomos para Sangonhá (...) (**).

Excerto do livro da CECA (2014, pág. 250);

(...) Em 10Mai, forças das CArt 494 e 495 e Pel Rec Fox 42, com auxiliares Fulas, na região de Bomane, avistaram um grupo ln que e deslocava em direcção à fronteira. Montada uma emboscada e aberto fogo quando os guerrilheiros estavam a 5 metros, as nossas tropas provocaram 4 mortos ao ln e capturaram 1 prisioneiro e material diversificado.

No dia 21, conforme planeamento para controlar a fronteira sul, realizou-se a operação "Jacaré" com vista á ocupação de Sangonhá, em zona de intensa actividade inimiga.

Em 24, um grupo ln atacou, de todas as direcções, o estacionamento da CArt 494    [ou CART 640 ?, a CART 494, comandada pelo cap art Coutinho e Lima, estava em Gadamael, mas participou na Op Jacaré em Sangonhá, causando dois feridos; a reacção pronta das NT causou 5 mortos, 1 prisioneiro e ainda baixas não estimadas; capturada 1 metralhadora pesada e levantada 1 mina A/C "TM-46" na estrada para Gadamael Porto, além de numeroso material de guerra. (...)

Fonte:  Excerto de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014),  pág. 250.

Observ -  Sabemos, pela ficha de unidade, que a CART 640:

(i) chegou a Bissau em 3 de março de 1964;

(ii) após um curto período de permanência em Bissau,  onde fez a IAO, destacou dois pelotões
para a realização de operações na região de Cuntima, a partir de 24Mar64, em
reforço do BCaç 512;

(iii) em 08Abr64, foi deslocada para Farim para actuação em operações nas regiões de
Jumbembém, Cuntima e Jabicó, em reforço temporário do BCaç 512 e depois do
BCav 490; 

(iv) em 11Mai64, foi substituída pela CCav 487 e recolheu a Bissau até 20Mai64;

(v) em 21Mai64, um pelotão tomou parte na Op Jacaré para ocupação e instalação em Sangonhá, para onde a subunidade se deslocou, por fracções, entre 25Mai e 22Jun64, tendo repelido um forte ataque desencadeado em 24Mai64 e causado pesadas baixas ao inimigo;

(vi)  em 25Jun64, na sequência da Op Veloz, ocupou também com dois pelotões, a localidade de Cacoca, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCaç 513 e depois do BCaç 1861.

(vii) pelo armamento e munições capturadas e baixas causadas ao inimigo, destaca-
-se a Op Gira  na região de Bantael Silá e um golpe de mão efectuado à tabanca de Mareia em 24Ju165, entre outras;

(viii) em 08 e 14Jan66, foi rendida no subsector de Sangonhá, por troca, pela CCaç 1477 (...)

____________

Notas do editor LG:


(*) Vd. poste de 22 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18125: Tabanca Grande (455): José Parente Dacosta, ou 'José Jacinto', ex-1º cabo cripto, CCAÇ 1477 (Sangonha e Guileje, 1965/67)... Natural da Covilhã, vive em Dijon, França... Passa a ser o nosso grã-tabanqueiro nº 764.


domingo, 5 de outubro de 2025

Guiné 61/74 - P27286: Efemérides (468): Faz agora 54 anos: em 1 de outubro de 1971, a CCS/BCAÇ 2912 e a CCAÇ 2700 sofrem uma emboscada, num patrulhanento auto noturno a aldeias em A/D, na picada Duas Fontes-Bangacia, de que resultaram 8 mortos (5 no local, 3 no HM 241). Mais uma vez a CECA não reportou este revés das NT, no livro sobre a atividade operacional de 1971.



Foto do álbum do Américo Estanqueiro, com a devida vénia ao autor e à editora, a Fundação Mário Soares (*). 

 Na foto, alinham-se os caixões que hão-de levar os restos mortais das vítimas...Cinco, na sequência da emboscada, e mais três, dos evacuados para  o HM 241, em Bissau, com ferimentos graves (e que acabaram por morrer, uns dias a seguir). 

Mais uma vez a CECA não reportou este revés das NT,  no livro  sobre a  atividade operacional (neste caso do ano de 1971).

Fonte: Américo Estanqueiro (2007) / Fundação Mário Soares


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá, Sector L5 > Galomaro > CCS / BCAÇ 2912 (Galomaro, 1970/72) e CCAÇ 2700 (Dulombi, 19670/72) >

Em 1 de outubro de 1971, por volta das 20h30, duas secções da CCS / BCAÇ 2912, reforçadas por uma secção da CCAÇ 2700, em coluna auto, sofreram uma violenta emboscada, na estrada Galomaro-Duas Fontes (Bangacia), de que resultaram de imediato 5 mortos e vários feridos graves, da CCS / BCAÇ 2912, do CCAÇ 2700 e do Pel Mil 288.

Bangacia (ou Duas Fontes) ficava a meio caminho entre Galomaro e Dulombi, a sul de Bafatá, a sudeste de Bambadinca, a oeste do Xitole, a sudoeste do Saltinho. Com a retirada de Madina do Boé, em 6/2/1969, o sector L5 tornou-se mais vulnerável a incursões do PAIGC.
 





1. Foi há 54 anos. Não há registo desta trágica ocorrência no livro da CECA sobre a atividade operacional no ano de 1971. Apenas no livro dos mortos.  

No passado dia 1 de outubro, às 20:06, na sua página do Facebook,  o nosso grão-tabanqueiro António Tavarese que vive no Porto veio lembrar,  oportunamente, esta efeméride:

"Emboscada em Duas Fontes/Bangacia

Pelas 20h30 do dia 01 de outubro de 1971 (há 54 anos) uma coluna de Patrulhamento Auto por todas as Autodefesas da CCS/BCaç 2912 foi emboscada em Duas Fontes/Bangacia.

No local faleceram cinco militares continentais e houve quatro feridos graves.
Passadas poucas horas a rádio da 'Maria Turra' anunciou a morte de seis militares na emboscada. Errou.

Dos evacuados para o HMR 241, em Bissau, faleceram posteriormente mais três militares. (...) Descansem em paz."


Antóno Tavares 
ex-fur mil SAM, 
CCS/BCAÇ 2912, 

2. Foram 8 os militares (incluindo 1 milícia) mortos nesta emboscada (5 no local,  e posteriormente, mais 3  no HM 241, em resultado dos ferimentos em combate). 


(i) 2 militares da CCAÇ 2700, Dulombi
  •  sold at inf, José Guedes Monteiro, solteiro, natural de São João da Folhada, Marco de Canaveses (foi inumado no cemitério da sua terra);
  • 1º cabo at inf, Rogério António Soares, casado, natural de Canas de Senhorim,  Nelas (inumado no cemitério paroquial de Oliveira do Conde - Carregal do Sal).

(ii) 5 militares da CCS / BCAÇ 2912, Galomaro (dos quais dois já no HM 241, Bissau, dias depois)

  • 1º cabo bate-chapas , Alfredo Tomás Laranjinha, solteiro, natural de Lumiar, Lisboa (inumado no cemitério paroquial de Pombais, Odivelas);
  • sold mecânico auto Leonel José da Conceição Barreto, solteiro, natural de Guia, Albufeira (inumado no cemitério da sua terra natal);
  • sold trms, José Peralta de Oliveira, solteiro, natural de Souto da Casa, Fundão (inumado no cemitério da Covilhã);
  • sold apontador de metralhadora, Luís Vasco Fernandes, solteiro, natural de São João da Pesqueira (inumado no cemitério Paroquial de Pereiros; ferido em 1 de outubro de 1971, vindo a morrer a 5, no HM 241, Bissau);
  • sold sapador, José Ferreira, casado, natural de Longos, Guimarães (inumado no cemitério da sua terra natal; ferido em 1 de outubro de 1971, vindo a morrer,a 6, no HM 241, Bissau).
(iii) 1 milícia, do Pel Mil 288 / CMil 30, Dulombi
  • sold milícia, Iderissa Candé, casado, natural de  Jemjelém,  Galomaro, Bafatá (inumado em Galomaro: falecido a 20 de outubro).
  •  
Repare-se que dos 8 mortos acima listados, só três são atiradores ou operacionais p.d, sendo os restantes (i) um bate-chapas, (ii)  um mecânico auto, (iii) um operador de transmissões, (iv) um sapador e (v) um milícia.

 Voltaremos, oportunamente, a falar desta emboscada que afetou profundamente, na altura, o moral do pessoal da CCS/BCAÇ 2912. 

Terá havido erros no planeamento e execução deste patrulhamento auto, à noite. Um atividade de rotina, ao que parece, mas feita em parte por pessoal "atiruense", sem desprimor para ninguém.  A coluna, de duas viaturas (1 Unimog 404 e 1 Unimog 411), levava 1 secção da CCAÇ 2700 e 2 secções da CCS/BCAÇ 2912.   


2. Comunicado do PAIGC de 7/10/1971 assinado por Constantino dos Santos Teixeira (Tchutchu) sobre a emboscada de 1/10/1971
 


O Constantino dos Santos Teixeira (nome de guerra, "Tchutchu"), um dos históricos "comandantes" do PAIGC, formados na Academia Militar de Nanquim, China: distinguiu-se na Frente Sul; em finais de 1971 liderava a Frente Bafatá / Gabu Sul. 

Foto; John Sheppard & Granada TV, in Liberation of Guinea, Basil Davidson. Acedido em: A Brief History of PAIGC (com a devida vénia...).

Recorde-se que o "Tchutchu" frequentou, em 1960, o 1º Curso de Sargentos Milicianos, juntamente com o Domingos Ramos e outros futuros combatentes do PAIGC, e ainda  com o nosso Mário Dias. Deve ter desertado já como 1º cabo miliciano, tal como Domingos Ramos.

 Depois da independência da Guiné-Bissau, Teixeira desempenhou várias funções governamentais: (i) foi ministro do Interior, no tempo de Luís Cabral; e (ii) após a morte de Francisco Mendes (que era Primeiro-Ministro) a 7 de julho de 1978, Teixeira assumiu temporariamente o cargo de Primeiro-Ministro: por pouco tempo, de 7 de julho até 28 de setembro de 1978, quando João Bernardo Vieira foi nomeado Primeiro-Ministro.

Após o golpe de Estado de 14 de novembro de 1980, o "Tchutchu", uma figura prestigiada do PAIGC,  também caiu em desgraça, como outros elementos próximos de Luís Cabral, tendo ficado em prisão domiciliária em Bolama; morreu em 1988 ("apareceu morto dentro do carro em Bissau", diz o Mário Dias, que foi seu colega de recruta).



Fonte: (1971), "Comunicado de guerra [Frente Leste]", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_40550 (2025-10-4)


Guiné > PAIGC > Comando da Frente Bafatá > Gabu Sul > 1971 > Comunicado, assinado por Constantino dos Santos Teixeira ("Tchutchu"), sobre os resultados da emboscada montada pela guerrilha a forças do BCAÇ 2912 (CCS e CCAÇ 2700) na estrada Galomaro - Bangacia (ou Duas Fontes, em 1 de outubro de 1971.

O documento original é do Arquivo de Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares, reproduzido, na página 67, no catálogo da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro (*).

É um notável documento, objectivo, seco, brutal, sucinto, escrito em português (quase perfeito), e revelador dos valores, da organização e da disciplina (revolucionária) dos combatentes do PAIGC... O resultado do "saque" (despojos dos mortos foi devidamente, burocraticamente, discriminado e reportado a Conacri, onde estava estado-maior do Partido).


Reprodução do documento (LG);

Comando Frente Bafatá. Gabu Sul, 7/10/71

Comunicado

Dia 10/1/71, os nossos combatentes numa emboscada
feita na estrada Galomaro-Bangacia,
conseguiram destruir dois camiões militar[es], 
maioria dos ocupantes liquidados; 
deixaram no terreno 6 mortos confirmado[s] pelo nosso c/ [camarada],
e apanharam 5 espingardas G-3
e alguns carregadores da mesma arma,
e apanharam 2 relógios, 
(302$50) trezentos e dois escudos e cinquenta centavos
 e nove (9) vacas
onde mandaram 5 para Quembera [ou Kambera] **, e ficaram com 4 no interior do país.

O c/ [comarada] Paulo Maló mandou-me dizer para pedir à direcção do Partido, 
para que o c/ [camarada], M’ Font Tchuda (?) N’ Lona estava sem relógio[;], 
resolveram deixá-lo com um dos dois relógios apanhados durante a acção. 
Também trouxeram um prisioneiro, ele encontra-se con[n]osco.

Durante a operação tivemos dois feridos não grave[s], 
são eles Canseira Sambu, N’ Dankena (?) N’Hada.

Segue[m] com o portador as 5 espingradas G-3 apanhadas ao inimigo, 
e os outros objectos.

Saudações combativa[s].

Constantino dos Santos Teixeira (Tchutchu)



3.. Ficaram ecos desta terrível emboscada na memória dos vindouros. Leia-se por exemplo este excerto de um poste do nosso camarada Juvenal Amado (CCS/BCAÇ 3873, Galomaro, 1972/74)

"Duas Fontes: local onde abastecíamos de água perto de Bangacia. Era um local que inspirava confiança, mas não podemos esquecer que essa mesma confiança custou a vida a seis camaradas do Batalhão antigo [,BCAÇ 2912, 1970/72,] que ali foram emboscados.

Bangacia foi também destruída por um ataque durante a nossa comissão. Nós reconstruímos a povoação com ordenamento tipo Baixa Pombalina, com escola, posto médico e o PAIGC nunca mais atacou. Deve ter considerado que era uma coisa boa a manter para quando a paz chegasse. E tinham toda a razão".

quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Guiné 61/74 - P27273: S(C)em Comentários (78): Na Guerra (tal como na Política) Não Vale Tudo... (António Rosinha / Cherno Baldé / Luís Graça)

Duke Djassi, nome de guerra
 de Leopoldo Alfama (1945-2025),
à esquerda.
Cortesia: Casa Comum /
Arquivo Amílcar Cabar


São comentários ao poste P27267 (*)

(i) Antº Rosinha


Só entre a jangada de João Landim e Bula, encontram-se naquelas redondezas treze pontas, e provavelmente a maioria seriam de cabo-verdianos.

E até se poderá dizer que pelo resto da Guiné seria assim já desde Honório Barreto, até Amilcar Cabral e o herdeiro da Ponta Alfama terem as suas ideias da União/Junção/Anexação Guiné-Cabo Verde.

O mapa de Bula onde vemos essas pontas, é de 1953, ora nessa data já a pacificação da Guiné e das outras colónias portuguesas viviam numa paz e numa calma que até iludiu os estudantes do império que era facílimo governar aquilo mais e melhor por eles do que pelos atrasados dos portugueses.

E de facto o ex-guerrilheiro Alfama ainda chegou a governante, na Guiné, mas só até 1980, pois deve ter acompanhado Luís Cabral que também "desistiu" em 1980.

Mas talvez tenham sido eles
que ajudaram a garantir que aquele arquipélago, Cabo Verde,  iria figurar como país com fronteiras e bandeira própria.

terça-feira, 30 de setembro de 2025 às 00:28:00 WEST


(ii) Tabanca Grande Luís Graça
.

Rosinha, acabei de escrever noutro poste, o do Armando Fonseca, sobre o "início da guerra"... Deixa-me completar o teu oportuno comentário...

A CECA (Comissão de Estudo para as Campanhas de África) tal como a historiografia (ou "hagiografia"...) do PAIGC têm a mesma narrativa: o início da guerra na Guiné foi em Tite, em 23 de janeiro de1963. Ponto final parágrafo.

Nós, no blogue, achamos que não. A avaliar pelos textos que se têm publicado ao longo destes anos todos... Antes dos primeiros tiros contra os quartéis e os militares. há toda uma violência (já armada), sob a forma de terror (e contraterror), que incendeia o "capim da Guiné"...

Basta olhar para as cartas da Guiné, anteriores à 1963: inúmeras tabancas e "pontas" desapareceram, a partir do início da "subversão" (para as NT) ou da "libertação" (para o PAIGC)...

Os "libertadores" começaram por usar a cenoura e o chicote para mobilizar (ou "arregimentar") os chefes tradicionais e as suas populações. Não temos, ainda hoje, uma noção exata da dimensão da violência, de um lado e do outro...

A "desertificação" do interior da Guiné, que data do início da década de 1960, começa com:

 (i) campanhas de aliciamento;
 (ii) ações de intimidação;
 (iii) assassinatos seletivos;
 (iv) destruição de infraestruturas (linhas telefónicas, pontões, corte de árvores nas estradas, etc.); 
(v) desmantelamento da administração (administradores, chefes de posto, cipaios) e da economia (pontas, casas comerciais, etc.).

A guerra é a violência armada e organizada: e quando se começa não há semáforos, a não ser "verdes" (levando à escalada da violência)...Não há semáforos vermelhos nem amarelos...

Os cabo-verdianos, ou guineenses de origem cabo-verdiana, donos de muitas pontas, mas também de casas comerciais (a par dos libaneses, dos portugueses europeus, que os cabo-verdianos também eram portugueses...) acabaram por ser vítimas da violência do PAIGC: os Semedos, os Brandões, os Alfama, etc. não tiveram pejo em inviabilizar as explorações agrícolas dos pais (ou as casas comerciais)...

No sector L1 (Bambadinca), que eu conheci melhor, havia também bastantes pontas (uma ou outra eu frequentei, em Contuboel, em Bambadinca, a Ponta Brandão, por exemplo)...  (Na carta de Bambadinca, que é de 1955, contei 8 pontas, ao longo do rio Geba Estreito.)

Está por fazer a história das pontas e do seu trágico destino... Bem como das casas comerciais (a do Rodrigo Rendeiro e de tantos outros...).

Pior ainda: está por fazer a histórias das tabancas que foram, logo muito cedo, vítimas da violência do PAIGC e nas NT, no tempo em que se praticou a política de terra queimada.

terça-feira, 30 de setembro de 2025 às 10:52:00 WEST

(iv) Tabanca Grande Luís Graça

Todos sabemos que a violência gera violência... A História está infelizmente cheia de exemplos desses.

A exploração e os maus tratos contra os balantas e outras populações na Guiné Portuguesa foram também o capim a que o PAIGC deitou fogo... Temos exemplos concretos das formas de exploração dos comerciantes locais (cabo-verdianos, brancos, libaneses...) e dos abusos da administração colonial de que foram vítimas os balantas e outros...

Os balantas vão ser depois a "carne para canhão" do PAIGC. Juntamente com os biafadas terão sido os mais "fáceis" de mobilizar (a bem ou a mal) para a "luta de libertação"... a par dos grumetes de Bissau, acrescenta o Cherno Baldé.

À maior parte de nós, militares, metidos nos seus quartéis e destacamentos, ou empenhados em desgastantes operações no mato, escapavam estas práticas de "violência" dos comerciantes, dos chefes de posto, dos cipaios... Por outro lado, já estivemos na Guiné, com o António Spínola, que durante o seu "consulado (meados de 1968/ meados de 1973) procurou "moralizar" e "reprimir" muitas das práticas coloniais que serviram de "rastilho" para o PAIGC incendiar o capim...

Tarde e a más horas, a política " Por uma Guiné  Melhor" ? É verdade. Mas fica para História: as Forças Armadas Portuguesas também tiveram uma palavra a dizer...

terça-feira, 30 de setembro de 2025 às 11:14:00 WEST


(iv) Tabanca Grande Luís Graça .

O Duke Djassi já morreu, há dias, em Portugal, num hospital do nosso SNS... Paz à sua alma (mesmo que eu não seja crente)... Respeito os mortos, a sua memória, seja quem for, mas temos que reconhecer que o "comandante Duke Djassi" ficou mal na fotografia...

Na guerra não vale tudo. Como na política. 

A sua mensagem de 1/8/1971 chamar-se-ia hoje "fake news", um notícia falsa...Os cinco mortos "tugas", na mina montada pelo "camarada" Raul Nhaga, na estrada de São Domingos para a fronteira, são deliberadamente uma mentira... Ninguém contou os mortos (5) nem muito menos os feridos (12)...

É pena que o Amílcar Cabral nunca tivesse combatido a mentira compulsiva dos seus comandantes e comissários políticos... Como é que eles depois poderiam falar olhos nos olhos ao "povo" ? 

"A verdade queima, camarada"...

terça-feira, 30 de setembro de 2025 às 14:36:00 WEST



(v) Cherno Baldé


O Antº Rosinha devia escrever um livro para a posteridade, pois, para mim e muitos leitores/seguidores do Blogue, as suas palavras sobre a realidade dos povos das colónias e, sobretudo, o inicio da luta nestes territórios, ajudaram e entender melhor sobre as origens, protagonistas e motivações iniciais das guerras de subversão.

Na Guiné, as elites cabo-verdianas ou de origem cabo-verdiana, mais ligadas ao regime colonial e melhor esclarecidas, aproveitando os ventos da história, quiseram desmantelar o regime, correr com os portugueses e dominar o resto da população.

Os chefes fulas, desconfiados por natureza, nunca se deixaram enganar e pagaram por isso, mais tarde; entretanto, os grumetes, guineenses,  estavam à espreita e o 14 de Novembro de 1980 que seria uma espécie de continuação da conspiração de Conacri (20 de Janeiro 1973) serviu, por sua vez, para se livrarem dos cabo-verdianos que, de facto, lideravam o PAIGC.


(Seleção, revisão / fixação de texto, título: LG) (**)

______________________

Notas do editor LG:

(*) Vd, poste de 29 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27267: PAIGC: quem foi quem ? (15): Leopoldo Alfama (Duke Djassi) (1945-2025), comissário político em 1974, governador da região do Cacheu até 1980; o pai era era o dono da Ponta Alfama, perto de Bula

(**) Último poste da série > 20 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27233: S(C)em Comentários (77): "E para que queres tu a independência se nem medicamentos tens para uma dor de barriga ?"

terça-feira, 30 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27269: O início da guerra (Armando Fonseca, ex-sold cond, Pel Rec Fox 42, mai 62 / jul 64) - Parte I: aquele terrível mês de setembro de 1963



Portugal > s/l> s/d >  "Soldados prontos para o embarque... mas não para a guerra"...


Guiné > s/l > s/d > Pel Rec Fox 42 (196264) > O  "Alenquer" é o primeiro da esquerda... Comendo uma "bucha", no mato...


Guiné > s/l > s/d > Pel Rec Fox 42 (196264) > O  "Alenquer" é o primeiro da direita. Uma pausa junto à Fox para comer...



Armando Fonseca, ex-sold cond cav, Pel Rec Fox 42, Bissau, Mansoa, Porto Gole, Buba, Bedanda, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64; também conhecido como o "Alenquer", integra a nossa Tabanca Grande desde 22 de setembro de 2010; tem cerca de 20 referências no nosso blogue. Julgamos que nasceu em 1941. Natural de Alenquer, vive na Amadora desde 1965, depois do regresso à "peluda". É autor da série "O Alenquer retoma o contacto" (de que se publicaram 7 postes, em 2012).
 

Fotos (e legendas): © Armando Fonseca (2012). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


I. O Armando Fonseca (conhecido como o "Alenquer"), ex-soldado cond cav,  Pel Rec Fox 42 (1962/64), foi dos primeiros militares de cavalaria a chegar à Guiné, quando  "oficialmente" ainda não havia guerra, diz a CECA...

 As suas impressões desses primeiros tempos (que vão de maio de 1962 a julho de 1964) são um testemunho precioso.  São anos que ainda não estão bem documentados no nosso blogue (e nos livros da CECA)... 

Com a sua Fox, ele  percorreu boa parte do CTIG, funcionando como uma espécie de 112, as ordens do Comando Milita,  em Bissau.. 

Vamos recuperar e reconstituir, por ordem cronológica, parte dos seus apontamentos já publicados.


 O início da guerra  (Armando Fonseca,  ex-sold cond, Pel Rec Fox 42,  mai 62 / jul 64) 

Parte I:  aquele terrível  mês de setembro de 1963



1. Chegado a Bissau a 28 de maio de 1962 no N/M António Carlos, não cito aqui os arrepios da partida visto que todos nós vivemos esse suplício, o navio fundeou ao largo e fui transportado para terra numa lancha, onde nos esperavam GMC para transporte até ao Quartel General onde fiquei instalado.

As camas e as respectivas roupas ainda não tinham sido desembarcadas. Dormi as primeiras noites numa cama de campanha apenas com uma manta para me defender dos mosquitos mas com o calor intenso que se fazia sentir, ou se morria de calor ou se era comido pelos mosquitos.

No terceiro dia lá apareceu a cama e a roupa, e a promessa de mosquiteiro que nunca chegou a aparecer, se quis evitar de ser comido pelos bichos tive que ir comprar tecido e mandar fazer um mosquiteiro num alfaiate da cidade.


2. O Pel Rec Fox 42  levava como missão reforçar a defesa da cidade, incluindo o aeroporto, e então o meu primeiro serviço foi exactamente piquete ao aeroporto. Fazia 24 horas de serviço dia sim dia não, garantindo a segurança das partidas e chegadas dos aviões, quer fossem civis ou militares.

Antes das aterragens ou dos levantamentos lá ia passar revista a toda a pista observando se havia algo de anormal e só depois os aviões entravam na pista.

Às vezes no dia aparecia outro biscate para fazer,  inclusive atender a algumas escaramuças que apareciam na cidade, visto que, àquela data,  o comando do PAIGC era nos arredores da cidade, no Pilão, que se situava entre esta e o Quartel General (em Santa Luzia).

Permaneci assim,ais de um ano,  até aos finais de agosto de 1963, altura em que fui sorteado para ser deslocado com a guarnição do meu carro para Mansoa, porque o BCAÇ  512 que aí se encontrava e tinha distribuídas companhias em Mansabá e em Bissorã, as quais tinha que abastecer: já estava com graves problemas nas deslocações das suas colunas e então pediu o reforço de um carro de cavalaria para acompanhar essas colunas.


3. Cheguei então a Mansoa em 28 de agosto e comecei de imediato a fazer escoltas: quase todos os dias saía para Mansabá ou Bissorã, e quando assim não era, havia que escoltar pessoal que se deslocava para a capinagem das bermas das estradas  ao longo desses percursos.

Na madrugada do dia 3 de setembro chegou ao quartel a notícia de que Porto Gole tinha sido atacado e lá fomos pelas seis da manhã escoltar um pelotão da CCAÇ  413 para ver o que se tinha passado.

 Ao chegarmos encontrámos um cenário desolador, haviam:

  • cinco moranças totalmente queimadas,
  • dois cipaios mortos, 
  • tendo os guerrilheiros levado preso o chefe de posto e um colono branco (**)

Já não regressámos a Mansoa e no dia seguinte começou a ser erigido ali um aquartelamento visto que tinha deixado de haver a segurança, até aí feita pelo chefe de posto e pelos cipaios, e aquele era um ponto crucial para apoio aos barcos que pelo Geba se deslocavam de Bissau para o interior (Xime, Bambadinca, Bafatá)

Permaneci ali até haver condições para as tropas de caçadores terem um mínimo de segurança. Durante esse período a alimentação baseou-se quase sempre em bolachas e conservas, até haver condições para começar a matar uns carneiros e umas galinhas que por lá havia.


4. No dia 9 regressei a Mansoa, sendo retomada a rotina de escoltas e agora também a Porto Gole porque ninguém dava um passo sem que a autometralhadora não fosse à frente da coluna.

No dia 13 um pouco antes do almoço ouviu-se ao longe um rebentamento e passado algum tempo apareceram dois homens a informar que o rebentamento tinha sido na tabanca de Cutia e que havia lá feridos.

Seguimos para lá e deparámos com dois feridos graves:
  • um tinha um buraco na cabeça;
  • e o outro tinha uma perna e as duas mãos cortadas;
  • o primeiro foi levado para o hospital;
  • e o segundo, a família não deixou que o levassem, porque quiseram que ele morresse junto deles.

Em 22 fomos chamados para socorrer uma viatura civil e uma ambulância de transporte colectivo que estava a ser atacada entre Mansoa e Mansabá. Fomos lá e quando chegámos,  já o IN tinha abandonado o local levando todo o dinheiro e os géneros que seguiam nas viaturas.

A partir desta data, além das deslocações militares que chegavam a ser duas por dia, apareceram também as colunas civis que já não se deslocavam sem escolta militar.

No dia 24 saímos de Mansoa pelas cinco da manhã para ir tirar umas árvores que o IN tinha colocado na estrada que ligava Porto Gole a Enxalé e a deixara intransitável.  Ás oito horas com 44 árvores cortadas e retiradas, encontrámos uma companhia que vinha de Enxalé ao nosso encontro e que a cerca de um quilómetro tinha sofrido uma emboscada.  

Havia um pelotão com vários feridos ligeiros e um furriel com uma perna cortada, o qual, ao fim de cinco horas, sem o socorro que a situação exigia, veio a falecer.(***)

Além dos feridos havia ainda um "granadeiro",  atascado na bolanha que nos deu muito trabalho a retirar.

Quando regressámos a Porto Gole,  era já noite e apenas com o pequeno almoço das quatro da manhã no estômago; depois de comermos alguma coisa, regressámos a Mansoa que distava cerca de 27 quilómetros.

 (Continua)


(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos, títulos: LG)
__________

(*) Vd. poste de 22 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7023: Tabanca Grande (245): Armando Fonseca, ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42 (Guiné, 1962/64)


(**)  Este episódio, grave, não é referido pelo livro da CECA,  respeitante á  atividade operacional no CTIG no período de 1963/1966.


(***) Fur mil at inf José Inácio da Ascensão da Costa Pinheiro, CCAÇ 412, mobilizado pelo BCAÇ 10, Chaves; natural de Sousel:  morreu em 25 de setembro de 1963, em Porto Gole, na sequência de ferimentos em combate; está sepultado no cemitério da sua terra natal.