Mostrar mensagens com a etiqueta PAIGC. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta PAIGC. Mostrar todas as mensagens

domingo, 12 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26383: Efemérides (448): Há 54 anos, em 31/12/1970, acabámos com o álcool no bar de Nema, para "dar de beber à dor" pela morte de camaradas nossos na véspera (Eduardo Estrela, ex-fur mill, CCAÇ 14, Cuntima e Farim, 1969/71)


1. Mensagem  do Eduardo Estrela (ex-fur mil at inf, CCAÇ 2592/CCAÇ 14, Cuntima e Farim, 1969/71; vive em Cacela Velha, Vila Real de Santo António; membro da Tabanca Grande desde 29/2/2012 (foto à direita)


Data - sexta, 27/12/2024, 21:50
Assunto - Memórias


Boa noite, Luís!


O post 26316 transporta-nos dolorosamente para a terrível emboscada na estrada Ponte Caium-Piche.(*)

Fui reler o P18551  (**) onde o Jorge Araújo relata a actividade do corpo de exército do PAIGC durante o final do ano de 1970, na zona dos corredores de Sitató e Lamel.

Como tenho comigo a história do BCAÇ 2879 onde a minha companhia estava integrada como unidade independente e de forma a ajudar o meu arquivo mental, fui também reler a mesma.

Já o disse no blogue que o PAIGC esteve muito ativo no período compreendido entre o início de dezembro de 1970 e meados de janeiro de 1971, na zona de Lamel (setor O2).

Tivemos nesse espaço de tempo 14 mortos e dezenas de feridos, a maior parte resultante de combates com os guerrilheiros e outros de acidente em atividade operacional na zona.

Em 14, para além do camarada João Bento Guilherme que faleceu, houve 4 feridos graves da Ccaç 2533.

Em 21 morreu em combate o camarada António da Fonseca Ambrósio que era alf mil da 2533 .

Em 30 , para além dos dois camaradas da Ccaç 14, morreram 2 camaradas do Pel Mil 281, 2 do Pel Mil 283 e 2 da Ccaç 2547.

Em 19 de Janeiro de 1971 um acidente com granada defensiva colocada num dilagrama provocou a morte de 3 camaradas da Ccaç 2681 e 2 dos Pelotões de Milícias, quando a coluna circulava na zona de Lamel.

Na emboscada de 30 de dezembro morreu o condutor da minha companhia José Rodrigues de Carvalho Lopes, o qual era habitualmente o rebenta-minas nas colunas onde estivesse integrado .

Nas colunas onde o comandante da escolta era eu, viajava sempre ao seu lado.  Nesse dia a escolta era feita pelo grupo de combate do António Bartolomeu, já que o meu grupo estava a reforçar a CCAÇ 2549 do à época capitão Vasco Lourenço.

Eram sensivelmente 16,30 quando em Nema/Farim começámos a ouvir os sons dos rebentamentos. Pelo rádio soubemos que já havia vários mortos e feridos. Saíram forças de Nema e de Jumbembem em socorro, mas quando chegámos ao local vislumbrámos um quadro horripilante.

O PAIGC imobilizou a coluna com o rebentamento dum fornilho. Apesar da pronta resposta da nossa malta,  o resultado da luta deixou-nos o coração esmagado. O Lopes era um moço fantástico. Era casado, tinha uma filhinha que nunca conheceu e era ele que nos cortava o cabelo.

Chorei a sua morte e a dos outros companheiros caídos.

No dia seguinte acabámos com o álcool no bar comum de sargentos e oficiais de Nema.
O "bioxene",  como diz o Valdemar,  era a muleta para o esquecimento e para suportar o inferno.

Abraço fraterno
 
Bom 2025 para ti e para todos os comparsas da fábula da loucura que ainda vão resistindo às intempéries 
da vida. (***)

Eduardo
_________________


quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26365 Notas de leitura (1762): "Amílcar Cabral e os cuidados de saúde durante a luta de libertação": apresentação do prof Joop de Song, Simpósio Internacional "Amílcar Cabral: Um Património Nacional e Universal", Praia, Cabo Verde, 9 de setembro de 2024


PAIGC > Foto nº 1 > Soldado com arma (LGFog RPG-7)



PAIGC > Foto nº 2 >  Guiné-Bissaiu, zona norte: evacuação com maca para o Senegal




PAIGC > Foto nº 3 > Exames médicos: uso do microscópico



PAIGC > Foto nº 4 > Intervenção cirúrgica ao ar livre, no mato: médicos cubanos, enfermeiro guineens



PAIGC > Foto nº 5 > Ambulância de Zinguichor, Senegal



PAIGC > Foto nº 6 >  O dr. Roel Coutinho usando a pistola de vacinação


PAIGC > Foto nº 7 > Loja do Povo, em Sara, na região do Oio



PAIGC > Foto nº 8 > Mulher, em escola para adultos


PAIGC > Foto nº 9 > Guerrilheiro, em escola para adultos



PAIGC > Foto nº 10 > Cabo Verde, ilha de Santiago, Praia>  Mural: o juramento de Amílcar Cabral (1969): "Eu jurei a mim mesmo que tenho que dar a minha vida, toda a minha energia, toda a minha coragem, toda a capacidade que posso ter como homem, até ao dia em que morrer, ao serviço do meu povo, na Guiné e em Cabo-Verde. Ao serviço da causa da humanidade, para dar a minha contribuição, na medida do possível, para a vida do homem se tornar melhor no mundo. Este é que é o meu trabalho".

As fotografias, com exceção da última, são do médico Roel Coutinho. Existe uma série para uso livre de fotografias do Dr. Coutinho no Wikimedia Commons .

https://commons.wikimedia.org/wiki/Commons:Guinea-Bissau_and_Senegal_1973-
1974_(Coutinho_Collection)



Roel Coutinho, 2016, foto de Patrick Sternfeld / capa 
da revista "Benjamin", junho 2016, ano 28, nº 104.
Com a devida vénia...


É hoje um prestigiado médico, epidemiologista e professor,jubilado, de epidemiologia e prevenção de doenças transmissíveis. Esteve no Senegal e na Guiné-Bissau, em missão sanitária que não excluia a simpatia política pelo PAIGC, entre março de 1973 e abril de 1974. (O seu álbum fotográfico, com cerca de 700 documentos, é o mais completo que conhecemos sobre o PAIGC na zona norte; tem 16 referências no nosso blogue.)

Tinha acabado de se licenciar em medicina (em 1972). Especializar-se-ia depois em microbiologia médica. Doutorou-se em 1984, em doenças sexualmente transmissíveis. É um especialista mundial em HIV/Sida, com mais de 600 artigos publicados em revistas científicas.

Roel Coutinho nasceu em 1946, nos Países Baixos, em Laren, perto de Amesterdão, província da Holanda do Norte. Tem ascendência luso-judaica, sefardita: os antepassados, marranos ou cristãos-novos, devem ter saído de Portugal para a Holanda no séc. XVII. Os portugueses, cristãos novos, e de novo reconvertidos ao judaísmo, constituíam uma comunidade prestigiada e influente, pela cultura, o dinheiro e o poder. Sempre usaram os seus apelidos portugueses até à II Guerra Mundial.

Prova da importância da comunidade luso-judaica de Amesterdão (onde nasceu o grande filósofo Espinosa, 1632-1677), é a "Esnoga", a monumental Sinagoga Portuguesa, inaugurada em 1675, e chegou a ter 3 a 4 mil fiéis. Hoje a comunidade está reduzida a umas escassas centenas de pessoas: espantosamente o edifício da "Esnoga Portuguesa", monumento nacional, escapou à destruição da II Guerra Mundial e à ocupação nazi; é visita obrigatória para os portugueses que forem a Amesterdão
. (LG)





Médico, doutorado, psiquiatra e psicoterapeuta: (i) professor emérito de Psiquiatria Cultural e Saúde Mental Global na Amsterdam University Medical Centre;  (ii) professor ajunto emérito de Psiquiatria na Escola de Medicina da Universidade de Boston e professor visitante emérito de Psicologia na Universidade de Rhodes, África do Sul; (iii) fundador e diretor da Organização Psicossocial Transcultural (TPO), que presta serviços de saúde mental e psicossociais, especialmente em áreas de pós-guerra e pós-desastre, em mais de 20 países em África, Ásia e Europa; (iv)  trabalhou  a meio tempo como psicoterapeuta e psiquiatra com imigrantes e refugiados na Holanda: (v)  tem integrado os contributos  da saúde mental pública e global, psicoterapia, psiquiatria, antropologia e epidemiologia em intervenções comunitárias; (vi)  e autor e coautor de 335 artigos, capítulos e livros.
 
(Nota curricular e foto, reproduzidos, com a devida vénia, de: World Association of Cultural Psychiatry)
 


Amílcar Cabral e os cuidados de saúde durante a luta de libertação

Por Prof. Joop de Jong


Texto enviado para publicação no nosso blogue, em 7 de setembro último,  pelo nosso leitor,  o Dr. Henk Eggens, de nacionalidade neerlandesa, especialista em saúde pública e medicina tropical, que vive em Portugal (Santa Comba Dão):

"Texto da apresentação que o meu amigo e colega Dr. Joop de Jong (neerlandês) fará na Praia, Cabo Verde, no simpósio Amílcar Cabral no dia 9 de setembro 2024. https://www.100amilcar.com/agenda/event-five-la65y-9xatt (Simpósio Internacional > Amílcar Cabral: Um Património Nacional e Universal | Cabo Verde e Guiné-Bissau, 9-12 de setembro de 2024).

"Trata-se de uma exposição sobre o  sistema de saúde desenvolvido pelo PAIGC na zona norte da Guiné durante a guerra."


__________

O Prof. Joop de Jong foi trabalhar como  jovem médico  nas zonas libertadas no Norte da Guiné en 1973. Voltou como psiquiatra para Bissau em 1981 para desenvolver a psiquiatria no país. Ajudou construir um hospital de psiquiatria no bairro de Brá, Bissau. Publicou sobre "Jangue na Guiné-Bissau: uma síndrome cultural entre as mulheres Balantas".

 De Jong é professor emérito de Psiquiatria Cultural e Saúde Mental Global.


Introdução

O desejo de independência é muitas vezes impulsionado pela indignação moral e pela falta de perspetiva social. Antes da luta pela independência e desde a fundação do PAIGC em 1956, Amílcar Cabral desenvolveu uma visão para reduzir as desigualdades em que os guineenses nascem, vivem e envelhecem. Ele tentou libertar a população guineense do seu atraso em quase todos os domínios da vida: desigualdade social, pobreza, desnutrição, falta de educação e cuidados de saúde. 

Para dar uma ideia dessa tarefa hercúlea: a mortalidade infantil na Guiné Portuguesa era de sessenta por cento em 1954, a doença do sono prevalecia em dois quintos das aldeias, e os hospitais ofereciam um mínimo de cuidados nas cidades (cf. Teixeira da Mota em Cabral 1961). Portugal gastava muito pouco dinheiro em cuidados de saúde em comparação com os países vizinhos (1). 

E os portugueses, ao contrário de outros colonizadores, não se consideravam racistas. Eles não tinham nada contra os asiáticos ou os negros, apenas contra os “nativos incivilizados” que tentavam elevar a assimilados. Nos anos 50 do século XX, 0,39% da população guineense estava registada como “assimilada” (2 ). (Foto nº 1: Soldado do PAIGC com arma. Roel Coutinho). 

A desigualdade social foi causada por uma diferença de poder e recursos. Quando Amílcar e um punhado de camaradas começaram a luta em 1963, eles não tinham poder, dinheiro ou
conhecimento. Como eles lidaram com isso?

Nesta apresentação, descrevemos as iniciativas do PAIGC para melhorar os cuidados de saúde da população e dos combatentes pela liberdade. Mostramos em linhas gerais que o PAIGC - muito antes da reunião da OMS em Alma Ata em 1976 - tentou combater a desigualdade social melhorando a agricultura, a educação e os cuidados de saúde. 

Isso aconteceu em parte como uma reação ao regime português que, ao longo da luta, tornou-se mais severo e aumentou a repressão da população local. E quando a luta pela libertação teve sucesso. De Spínola tentou igualar os sucessos do Partido com o seu programa “Guiné melhor”. Ele até falou sobre “realizar uma verdadeira revolução social para aumentar a autoestima e a dignidade da população” (O Século, 7 de agosto de 1970). 

A dinâmica entre libertador e opressor, entre cuidados curativos e preventivos e entre cultura indígena e moderna, determinou o desenvolvimento dos cuidados de saúde. Esboçamos esses desenvolvimentos desde o início da luta.

O início da guerra

Durante a primeira fase da luta, o objetivo era “cuidar dos feridos com os meios disponíveis”. “Meios disponíveis” como eufemismo para os quatro enfermeiros que se formaram em Bissau e se tornaram membros do Partido. Esses enfermeiros treinavam socorristas que eram selecionados entre os guerrilheiros (3). Uma dessas socorristas é a heroína nacional Titina Silá (4). 

Os socorristas eram integrados nas unidades de combate para salvar o máximo possível de soldados e outras vidas com alguns curativos, líquido desinfetante e soro antitetânico. Os gravemente feridos eram transportados em macas feitas de galhos até a fronteira. E,  de lá, evacuados a uma grande distância para as capitais dos países vizinhos, Conacri ou Dakar. (Foto nº 2: Evacuação com maca para Senegal. Roel Coutinho).

O auge da luta

Entre 1965 e 1970, o PAIGC conquistou cada vez mais áreas libertadas. Os portugueses responderam com "a cenoura e o pau”. Por um lado, deslocaram a população local para as
“aldeias protegidas”
["reordenamentos"].

Esta abordagem foi copiada dos franceses na Argélia e dos americanos no Vietname. O objetivo era “proteger” as guarnições militares contra-ataques dos “terroristas” com a ajuda de uma camada de habitantes locais. Por outro lado, o mato foi bombardeado com mais frequência. O PAIGC adaptou-se organizando o máximo possível de cuidados acessíveis nas zonas libertadas para militares e moradores das aldeias . Nesse período, foi criada uma rede de mais de cem postos de saúde (5) . 

Enfermeiros auxiliares formaram a espinha dorsal do serviço médico e ofereceram cuidados básicos. Os pacientes podiam ser internados temporariamente enquanto aguardavam a visita de um médico do hospital mais próximo. Casos de emergência eram transportados para lá em macas. (Foto nº 3 : exames médicos mo, com uso do microscópico. Roel Coutinho).

Num nível de atendimento superior, foi criada uma rede de hospitais setoriais e regionais (6) . Aqui, os pacientes encaminhados eram tratados e os enfermeiros auxiliares eram treinados.

Os hospitais foram construídos com materiais locais. Tudo era feito de ramos e palha e ficava bem escondido entre as árvores. Duas cabanas alongadas com vinte camas cada para
os doentes. Uma cabana como consultório, uma como sala de operações e algumas cabanas para o pessoal. Muito era feito ao ar livre. (Foto nº 4: Operação no ar livre. Médicos cubanos, enfermeiro guineense. Roel Coutinho).

Devido à construção simples, tudo podia ser facilmente deslocado. Quando os bombardeamentos  aumentaram, o PAIGC decidiu que cada hospital deveria ser deslocado anualmente (7) . Incluindo doentes e pessoal, isso levava cerca de três dias.

Cabral (1975, II: 216) percebeu a importância dos cuidados autónomos nas áreas libertadas. penas casos muito graves eram evacuados para um dos três hospitais nos países vizinhos (8) .

A liderança do Partido também percebeu que os cuidados eram muito curativos e distantes da população para fazer algo sobre a terrível condição de saúde dos moradores rurais (9). Essa péssima saúde estava relacionada à desnutrição, que por sua vez estava relacionada com a imposição colonial de cultivar culturas comerciais em detrimento das culturas alimentares. A má condição de saúde também era resultado da falta de higiene, baixa taxa de vacinação e alta taxa de analfabetismo. 

Duas iniciativas deveriam melhorar essa situação. Cada setor recebeu uma brigada de saúde composta por três assistentes. Eles tentaram ensinar aos aldeões os princípios de higiene, nutrição e cuidados materno-infantis. E encaminhavam os doentes para os postos de saúde. Com sucesso variável. Cabral lamentou que os “camaradas não prestassem atenção suficiente às brigadas de saúde” (Cabral 1971: 13) (10). 

A segunda iniciativa preventiva consistia em campanhas de vacinação e na prevenção da malária com redes mosquiteiras e profilaxia da malária. (Foto nº 5. Ambulância, Ziguinchor, Senegal.Roel Coutinho).

Vacinação

O médico holandês Roel Coutinho trabalhou em 1973 nas áreas libertadas. Ele descreve uma viagem pela floresta para ir fazer vacinação  num acampamento:

"Com a velha ambulância, dirigimo-nos de Ziguinchor, no Senegal, até a fronteira com a Guiné-Bissau.

"Em ritmo acelerado e em silêncio mortal, caminhámos por 1,5 horas por um caminho estreito através de uma floresta escura. Com uma 'canoa', atravessámos o rio. Esperámos na borda densamente arborizada da floresta ao longo do rio. Alguns soldados surgiram entre as árvores. Quando entrámos na floresta, vi que o acampamento estava ali. Espalhados entre as árvores estavam camas com redes mosquiteiras penduradas acima. Alguns soldados desapareceram entre as árvores para avisar que haveria vacinação e consulta. (Foto nº 6:  O Dr. Roel Coutinho vacinando com pistola de vacinação.  Roel Coutinho):

"Revezávamo-nos para vacinar com a pistola de vacinação. Quando a pistola de vacinação ficava bloqueada por poeira, os enfermeiros mudavam rotineiramente para seringas e agulhas. Durante as consultas, verificou-se que um dos pacientes estava em tão mau estado que teve de ser levado de maca e ambulância de volta para o hospital em Ziguinchor# (De Jong & Buijtenhuijs 1979).

O Partido investiu muito tempo na melhoria e diversificação da agricultura e na criação de lojas comunitárias onde os agricultores podiam trocar seus produtos por itens de primeira
necessidade. (Foto nº 7: Loja do Povo, Sara. Roel Coutinho).

E o Partido incentivava o que hoje chamamos de atividades geradoras de rendimento.

Outra prioridade foi a emancipação das mulheres, por exemplo, através da educação. (Foto nº 8: Escola para adultos, mulher; foto nº 9: Escola para adultos, guerrilheiros).

Cultura

E o PAIGC descobriu, através de tentativa e erro, que a cultura era uma espada de dois gumes.

A atitude de Cabral em relação à cultura pode ser melhor descrita nestes termos: “se não pode vencê-los, junte-se a eles”. Assim, os curandeiros guineenses, como em inúmeras outras culturas da África Subsaariana, oferecem proteção contra balas e, naturalmente, contra a feitiçaria e bruxaria. 

Cabral sabia que alguns combatentes se sentiam invulneráveis por causa disso. Por isso, ele às vezes enviava um ajudante para evitar que um comandante se levantasse e avançasse no meio de uma chuva de balas (11). 

A cultura e os modelos de explicação cultural também desempenham um papel nas consultas médicas, tanto no tratamento individual quanto nas iniciativas de saúde pública.

É difícil aceitar que pacientes com tuberculose interrompam seu tratamento médico assim que a tosse com sangue pára. Curandeiros respondem a esse enigma após uma longa série de entrevistas: 

“Claro que sabemos que vamos morrer se tossirmos sangue e, por isso, vamos ao hospital com seus medicamentos poderosos. Mas o que vocês não entendem é que a hemorragia é causada por uma flecha ou bala invisível para vocês, de uma arma de feitiçaria que atinge o peito por dentro. E o curandeiro ou curandeira é o único que pode curar essa ferida. Por isso, os pacientes vêm até nós o mais rápido possível após suas injeções e pílulas para uma verdadeira cura”.

Mas Cabral e a liderança do Partido também testemunharam as terríveis consequências do poder da cultura durante o primeiro congresso do Partido em Cassaca em 1964. Um grupo
de mulheres Balantas nómadas fez acusações de feitiçaria. As mulheres diziam que as bruxas eram responsáveis pela morte de aldeões, enviando aviões e helicópteros portugueses para
atacá-los. 

Os anais do Partido não são claros sobre esse período, mas provavelmente algumas centenas de bruxas foram torturadas e mortas por comandantes do PAIGC. Esses comandantes tiveram que responder durante o congresso do Partido e cerca de uma dezena deles foram condenados à morte (De Jong, 1987; De Jong & Reis, 2010: 313; 2013). 

Vinte e cinco anos depois, os Balantas foram tomados por um culto de possessão em massa, o Ki-yang-yang. O culto de cura emancipa a posição das mulheres entre os Balantas, bem como
a posição dos Balantas dentro do Estado guineense.

 O culto também ajuda os Balantas a lidar com o trauma da luta pela libertação (De Jong & Reis, 2010; 2013). Os seguidores estão convencidos de que os líderes um dia tirarão uma motocicleta do chão para todos. A semente dessa esperança mítica foi plantada por Amílcar, que prometeu prosperidade material à população após a independência.

Discussão

Um sistema de saúde é composto por todos os atores que tentam melhorar a saúde e os cuidados. O sistema é construído sobre serviços, trabalhadores da saúde, medicamentos essenciais, financiamento, liderança e sistemas de informação. Vimos que esses componentes estavam ausentes no início da luta pela independência e que o PAIGC operava num vácuo.

O movimento de libertação construiu, num período de aproximadamente 15 anos, um sistema de saúde simples. O sistema de saúde fornecia cuidados curativos consistindo em diferentes escalões de postos e hospitais nas áreas libertadas e nos países vizinhos. Com o objetivo de organizar cuidados acessíveis, próximos e acessíveis para os combatentes e a população local. Numa fase posterior, o Partido focou-se na descentralização e na prevenção.

Quanto à escassez de trabalhadores da saúde, o Partido organizou uma cascata de níveis de formação e treino. Médicos estrangeiros e médicos guineenses que retornaram do exterior, 
treinavam e supervisionavam várias categorias de trabalhadores da saúde locais. 

É uma forma de educação continuada que gradualmente resulta em competência crescente. Mas, na independência, o nível dos enfermeiros era insuficiente, tanto do lado do PAIGC quanto do lado colonial. Isso também se aplicava aos médicos que estudaram na Universidade Lumumba em Moscovo.

O Partido também estabeleceu um sistema de distribuição de medicamentos. A maioria desses medicamentos foi doada por países comunistas e comitês de solidariedade. (Foto nº: Praia, Cabo Verde, mural: Retrato e juramento de Cabral).

Cabral conheceu bem o país e as pessoas durante o Recenseamento Agrícola de 1953, anos antes da fundação do PAIGC. Ele percebeu a importância do que hoje chamamos de desenvolvimento intersetorial. Agricultura, economia, desenvolvimento rural, educação, saúde e emancipação das mulheres estão interligados. E a sinergia só pode ser alcançada através da colaboração com outros domínios e setores.

A Organização Mundial da Saúde afirmou em 2008 que a saúde da população mundial só pode melhorar trabalhando nos determinantes sociais da saúde. 

Algumas décadas antes, o PAIGC e Amílcar Cabral já se concentravam em fatores que reduzem a desigualdade social entre as pessoas. Dentro das suas possibilidades limitadas, fizeram tudo o que podiam para melhorar as condições precárias em que os guineenses nasciam, cresciam e envelheciam.

___________

Notas do autor:

(1) Em 1959, per capita, 1,1 US$. Libéria 1,6. Mauritânia 4,2. Serra Leoa 19,1 (Rudebeck 1974:39; De Jong & Buijtenhuijs 1979: 115).

(2) Para obter mais ou menos os direitos de um cidadão português, o assimilado tinha que cumprir requisitos como: ter mais de 18 anos, falar bem português, sustentar-se, ter um modo de vida civilizado e não ser recusador de serviço ou desertor (Rudebeck 1974: 22).

(3) E que muitas vezes perderam um membro na luta ou sofrem de uma doença grave como a lepra.

(4) Em 1963, ela foi escolhida para ir à União Soviética para uma formação em guerra de guerrilha, junto com Teodora Inácia Gomes. Após o seu regresso, ela treinou outros guerrilheiros. Em 1964, ela fez um curso de primeiros socorros na União Soviética. Em 30 de janeiro de 1973, ela foi morta em uma emboscada pelo exército português. Ela se afogou no rio Farim, a caminho do funeral de Amílcar Cabral, que foi assassinado uma semana antes.

(5) 117 postos de saúde. Na frente sul, 42; na frente norte, 64; e na frente leste, 11 (De Jong &; Buijtenhuijs, 1979).

(6) No total, 13. Em 1973, havia sete hospitais setoriais (3 no Norte, 3 no Sul e 1 no Leste) e seis hospitais regionais (2 no Norte, 3 no Sul e 1 no Leste). Os hospitais regionais começaram a ser estabelecidos a partir de 1966 e eram dirigidos por um cirurgião, e os hospitais setoriais a partir de 1971, sob a direção de um assistente médico.

(7) Assim, o hospital de Sara foi deslocado dezassete vezes em um ano devido a bombardeamentos e ataques por tropas transportadas por helicópteros. Ninguém ficou ferido. Desde então, os hospitais eram regularmente deslocados.

(8) Para três hospitais no exterior. O bem equipado Hospital de Solidariedade, em Boké, com 123 leitos, onde os feridos evacuados da frente sul foram tratados. Em 1972, 136 feridos de guerra, 72 fraturas e 9 amputações foram realizadas aqui. Isso explica por que Cabral disse a um jornalista que "temos tão poucos feridos que mal vale a pena mencionar#".  Os doentes e feridos da frente leste também iamj para a Guiné Conacri, ou seja, para o hospital em Kundara, com 50 leitos. E os da frente norte para o hospital em Ziguinchor, também com 50
leitos. Havia laboratórios simples e dois dos três hospitais tinham uma sala de operações e uma seção de raios-X.

(9) As doenças mais comuns em 1975 foram: infeção por ancilostomíase (66%); desnutrição proteica e energética (48%); tracoma (42%); anemia (34%); malária (34%); hérnia abdominal (27%); filariose (21%); infeções respiratórias (15%); vermes intestinais (10%); infeções cutâneas (%); ceratite (9%); bócio (8%); catarata (5%). 64% precisavam de cuidados odontológicos (A Saúde em Oio 1975: 49-53).

(10) Na frente norte, as brigadas nunca foram realmente ativas. Alguns comissários políticos, como Carmen Pereira, incentivaram as brigadas. E, ao contrário dos cuidados básicos de saúde na China, o Partido exerceu pouca pressão, como também é evidente no diário de Roel Coutinho (2022).
 
(11) Nino Vieira, que mais tarde liderou o golpe contra Luís Cabral, é um exemplo do que os companheiros de luta consideravam um caso de invencibilidade ou invulnerabilidade.

Bibliografia:

A. Cabral (1961) Report to the United Nations.

A. Cabral (1971) Sobre alguns problemas práticos da nossa vida e da nossa luta.

A. Cabral (1975) Unité et lutte I et II. François Maspéro. Paris.

Roel Coutinho (2022) De vrijheidsstrijd van Guinee-Bissau door de ogen van een jonge
dokter. Afrika Studie Centrum. Leiden.

Joop de Jong & Rob Buijtenhuijs (1979) Een bevrijdingsbeweging aan de macht [A liberation
movement in power]. De Uitbuyt. Wageningen.

Jong de, J.T.V.M. (1987) A descent into African psychiatry. Royal Tropical Institute.
Amsterdam. ISBN 90 6832 018 1.

Jong de, J.T.V.M. (1987) Jangue in Guinee Bissau: een cultuurgebonden syndroom onder
Balanta vrouwen [Jangue in Guinea Bissau: a culture bound syndrome among Balanta
women]. Ned Tijdschrift v Psychiatrie 2, 5886.

Joop T. de Jong & Ria Reis (2010) Kiyang-yang, a West-African post-war idiom of distress.
Culture, Medicine and Psychiatry, 34, 2, 301-321.

De Jong, J.T.V.M., Reis, R. (2013) Collective trauma píprocessing: Dissociation as a way of
processing postwar traumatic stress in Guinea Bissau. Transcultural Psychiatry, 50 (5) 644-
661.

Rudebeck, L. (1974) Guinea Bissau: A Study of Political Mobilization. The Scandinavian
Institute of African Studies. Uppsala.

Saúde em Oio (1975). Minsas. Bissau.

(Revisão / fixação de texto, para efeitos de publicação neste blogue: HE / LG)

_________________

Nota do editor LG:

sábado, 28 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26320: Operação Grande Empresa, a reocupação do Cantanhez e a criação do COP 4, a partir de 12 de dezembro de 1972 - Parte V: Um ano depois, pelo Natal de 73, dá-se iníco à Op Estrela Telúrica: "Tudo menos paz na terra aos homens de boa vontade" (António Graça de Abreu, CAOP1, Cufar, 22, 25 e 26 de dezembro de 1973).



Foto nº 1




Foto nº 2


Guiné > Região de Tombali > Cufar > CAOP1 > c. 1973/74 > Em cima, o António Graça de Abreu, em Cufar, no rio Cumbijã (foto nº 1); na foto seguinte (nº 2), posando de camuflado, no aeroporto de Cufar, em janeiro de 1974, com Miguel Champalimaud.

Fotos (e legendas): © António Graça de Abreu (2007). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Um ano depois do início da Op Grande Empresa (*), o Cantanhez continua a "ferro e fogo"... É o que se deduz da leitura do incontornável diário do  António Graça de Abreu, de que já publicamos,  em tempos,  extensos excertos, com a devida autorização do autor. 

Estamos a falar do  "Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura" (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp)

Recorde-se que o nosso António Graça de Abreu:

(i)  chegou a Bissau a 24/6/1972, vindo de DC-6, de Lisboa;

(ii) foi colocado no CAOP1 - Comando de Agrupamento Operacional nº 1, sediado em Canchungo (Teixeira Pinto);

(iii) era alferes miliciano, com a especialidade de atirador de infantaria, reclassificado por incapacidade parcial em "Secretariado, Serviço de Pessoal";

(iv)  chegou a Canchungo, de helicóptero, a 26, de manhã;

(v) nunca identifica, no livro,  o seu primeiro comandante, coronel paraquedista [ Raul Durão, durão de apelido e durão no exercício da autoridade];

(vi) tinha um diário, onde escrevia quase todos os dias (ou, em alternativa, cartas e aerogramas que mandava à sua mulher, num total de 347, até ao fim da comissão, em  17/4/1974);

(vii)  teve os seus primeiros "trinta e cinco dias de férias em Portugal" de 7 de novembro a 17 de dezembro de 1972 (período em que não tem quaisquer notas no seu Diário); (uns dias antes, a 12, começara a Op Grande Empresa, no sul da Guiné);

(viii)   passou depois por Mansoa (Parte II do Diário) para acabar a sua comissão, sempre no CAOP1, em Cufar, no sul da Guiné (Parte III).

É desta III parte do seu diário, que transcrevemos as suas entradas relativas aos dias 22, 24 e 26 de dezembro de 1973. É já com-chefe e governador da Guiné o gen Bettencourt Rodrigues. 

É em Cufar que o António Graça de Abreu passa o seu Natal de 1973, o seu segundo Natal na Guiné, numa época claramente de escalada da guerra no sul... 

Estava em curso mais uma grande operação no Cantanhez, a Op Estrela Telúrica, na sequência  da Op Grande Empresa (reconquista e reocupação do Cantanhez, península do Cubucaré, dezembro de 1972-junho de 1973). 

Como ele escreveu ironicamente, "Natal, sul da Guiné, ano de 1973, operação 'Estrela Telúrica.' Tudo menos paz na terra aos homens de boa vontade". 



2. Excertos do Diário da Guiné:


(...) Cufar, 22 de dezembro de 1973 

Deixei a cidade [de Bissau], deixei o frenesim das gentes, os motores, a poluição, a confusão e regressei ao bucolismo do campo, à nada pacata aldeia africana, aos rebentamentos de granadas, foguetões e bombas, às cabeças alteradas pela guerra, ao desamor e aos medos.

Ao descer do Nordatlas na pista da Cufar, deparei-me logo com a nossa ambulância à espera, pronta para as evacuações para Bissau. Mais um morto e oito feridos, fuzileiros estacionados no Chugué,  atacados no rio Cumbijã,  mesmo em frente a Cufar.

Preparam-se grandes operações na zona. Os comandos africanos vêm cá para baixo fazer mortos, ter mortos. Ontem – isto é muito animador! – deslocaram-se para Cufar mais dois médicos (um cirurgião e um anestesista) mais uns tantos enfermeiros. Trouxeram uns quilos largos de aparelhagem médica e cirúrgica, e materiais para primeiros socorros, enfim temos um aparato clínico capaz de assustar o menos medroso.


Os pobres vão morrer com a certeza de que morrerão bem acompanhados e assistidos.

Por estes dias, chegarão mais quinhentos homens, três companhias de comandos africanos, mais a minha conhecida 38ª de Comandos e ainda talvez paraquedistas. Estes homens vão tentar a “limpeza” do Cantanhez. Em Bissau, encontrei alguns alferes amigos da 38ª que me puseram a par do que se espera com esta operação. Os rapazes também estão receosos, o moral não é elevado.


Entretanto, os Fiats continuam a bombardear aqui à nossa volta, com poucos resultados, parece que os guerrilheiros já possuem abrigos à prova da nossa aviação.

Cufar, 24 de dezembro de 1973 


Tempo de Natal. Paz na terra aos homens de boa vontade, na Guiné em guerra.

Fui a Cadique com o meu coronel, de sintex, dez quilómetros descendo o rio Cumbijã.  

Os pobres de Cadique,  a 1ª C/BCAÇ 4514/72  , que tiveram dois mortos na terça-feira passada, estão a entrar na engrenagem da loucura. Já houve soldados que se recusaram a sair para o mato. Outros, ou os mesmos, na confusão de uma flagelação, atiraram com uma granada de mão ao tenente-coronel,  comandante do batalhão que não o atingiu por pura sorte. 

O tenente-coronel não tem culpa do sofrimento e da morte dos seus homens, limita-se a cumprir ordens, não pode pegar no batalhão e marchar sobre Bissau, ou sobre Lisboa. De resto, entre os muitos oficiais do QP que tenho conhecido, este tenente-coronel é um dos homens mais humanos e sensíveis ao sofrimento dos seus subordinados.

A zona de Cadique é terrível, os guerrilheiros deixaram construir a estrada para Jemberém e agora passam o tempo a dinamitá-la e a emboscar as NT. Sabotaram os sete pontões do trajecto, abriram enormes brechas no asfalto, em vários sítios. 

Para arranjar a estrada, a tropa de Cadique avança com camionetas carregadas de terra e troncos de árvore. Depois dos primeiros dois quilómetros, começam a ser flagelados. Quem quer caminhar para a morte?

Os dias estão tão bonitos! Frescos, serenos, com pouca humidade, manhãs de sol que abrem os braços para os homens, o fumo a sair das tabancas e a espalhar-se sobre os campos, como em Portugal. A natureza não tem culpa da insensatez, do desvario da espécie humana.


Cufar, 26 de dezembro de 1973

Graças ao Natal, umas tantas iguarias rechearam as paredes dos nossos estômagos. Houve bacalhau do bom, frango assado, peru para toda a gente e presunto, bolo-rei, whisky e espumante à discrição, só para oficiais. 

Fez-se festa, fados, anedotas, bebedeiras a enganar a miséria do nosso dia a dia.

Hoje, 26 de Dezembro, acabou o Natal e, ao almoço, regressámos às cavalas congeladas com batata cozida e, ao jantar, ao fiambre com arroz.

Isto não tem importância, importante é a ofensiva contra os guerrilheiros do PAIGC desencadeada na nossa região com o bonito nome de “Estrela Telúrica”. Acho que nunca ouvi tanta porrada, tantos rebentamentos, nunca vi tantos mortos e feridos num tão curto espaço de tempo. E a tragédia vai continuar, a “Estrela Telúrica” prolongar-se-á por mais uma semana.

Tudo começou em grande, com três companhias de Comandos Africanos, mais os meus amigos da 38ª CCmds, fuzileiros e a tropa de Cadique a avançarem sobre o Cantanhez. O pessoal de Cadique começou logo a levar porrada, um morto, cinco feridos, um deles alferes, com certa gravidade. 

Ontem de manhã, dia de Natal, foi a 38ª de Comandos a “embrulhar”, seis feridos graves entre eles os meus amigos alferes Domingos e Almeida, hoje foram os Comandos Africanos comandados pelo meu conhecido alferes Marcelino da Mata,[1] com dois mortos e quinze feridos. Chegaram com um aspecto deplorável, exaustos, enlameados, cobertos de suor e sangue. Amanhã os mortos e feridos serão talvez os fuzileiros… No dia seguinte, outra vez Comandos ou quaisquer outros homens lançados para as labaredas da guerra. 

O IN, confirmados pelas NT, só contou seis mortos, mas é possível que tenha morrido muito mais gente, os Fiats a bombardear e os helicanhões a metralhar não têm tido descanso.

Na pista de Cufar regista-se um movimento de causar calafrios. Hoje temos cá dez helicópteros, dois pequenos bombardeiros T-6, três DO, dois Nordatlas e o Dakota. A aviação está a voar quase como nos velhos tempos. 

Os helis saem daqui numa formação de oito aparelhos, cada um com um grupo constituído por cinco ou seis homens, largam a tropa especial directamente no mato, se necessário os helicanhões dão a protecção necessária disparando sobre as florestas onde se escondem os guerrilheiros, depois regressam a Cufar e ficam aqui à espera que a operação se desenrole. 

Se há contacto com o IN e se existem feridos, os helicópteros voltam para as evacuações e ao entardecer vão buscar os grupos de combate novamente ao mato. Ontem, alguns guerrilheiros tentaram alvejar um heli com morteiros, à distância, o que nunca costuma dar resultado.

Sem a aviação, este tipo de operações era impossível. Durante estes dias os pilotos dormem em Cufar e andam relativamente confiantes, há muito tempo que não têm amargos de boca. Os mísseis terra-ar do IN devem estar gripados porque senão, apesar dos cuidados com que se continua a voar, seria muito fácil acertar numa aeronave, com tanto movimento de aviões e hélis pelos céus do sul da Guiné.

Cufar fica a uns quinze, vinte quilómetros da zona onde as operações se desenrolam. Todos os dias, às vezes durante horas seguidas, ouvimos os rebentamentos e os tiros dos “embrulhanços”, das flagelações. É impressionante o potencial de fogo, de parte a parte. Os guerrilheiros montam também emboscadas nos trilhos à entrada das matas onde se situam as suas aldeias. Aí as NT começam a levar e a dar porrada, e não têm conseguido entrar nas povoações controladas pelo IN.

Natal, sul da Guiné, ano de 1973, operação “Estrela Telúrica.” Tudo menos paz na terra aos homens de boa vontade.

_____________

Nota do autor:

 [1] Sobre o acidentado percurso do alferes Marcelino da Mata, ver a narração pessoal da sua participação nesta guerra em Rui Rodrigues, (coord.), Os Últimos Guerreiros do Império, Editora Erasmos, Amadora,1995, pp. 195-213.

(Revisão / fixação de texto, para publicação no blogue: LG)

________________

quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26278: Por onde andam os nossos fotógrafos ? (31): Jorge Pinto (ex-alf mil, 3.ª C / BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74) - Parte I



Foto nº 1


Foto nº 1A


Foto nº 1B


Foto nº 2A


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª C/BART 6520/72, 1972/74)  >  1974 > As NT em patrulhamento  (junho)  e  uma visita de um bigrupo do PAIGC (julho)


Fotos: © Jorge Pinto (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar_ Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]



1. O Jorge Pinto [ex-alf mil, 3.ª CART/BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74; natural de Turquel, Alcobaça; professor do ensino secundário, reformado; membro da Tabanca Grande desde 17/4/2012 (*), com 57 referências no blogue ] tem um excelente álbum fotográfico do seu tempo de Guiné, e em especial de Fulacunda, região de Quínara. Merece uma revisita, com reedição das suas melhores fotos (**).


Nesta parte I,  publicamos 4 fotos. As duas últimas (nºs 3 e 4) retratam um patrulhamento das NT, feito ainda em junho de 1974, antes da primeira visita dos militares do PAIGC a Fulacunda, já em julho de 1974. 

As fotos nºs 1 e 2 têm a ver com essa visita, em que os guerrilheiros do PAIGC  contactaram com a NT, as autoriades civis e a populção local, de maioria biafada (a ver na Parte II). A digura de proa desse bigrupo era o comandante Bunca Dabó, que atacou várias vezes o aquartelamento e a tabanca de Fulacunda, durante os dois anos em eu que lá estive.

A seu pedido expresso, quiseram conhecer o porto de Fulacunda, por onde era feito o nosso reabastecimento [porto fluvial, no rio Fulacunda, vd, poste P12368].

As fotos evidenciam que a "confiança", por parte deles, ainda estava para nascer!!! ....(Já estávamos em Julho de 1974...)  Também ficou por explicar a utilidade desta visita, pois não fomos fazer nada nem ver nada de novo.

A minha companhia, 3ª C/Bart 6520/72, partiu do RAL 5 em 26.06.72 e regressou a 21.08.74. Teve como comandante o capitão mil inf José João Mousinho Serrote.

Jorge Pinto (fot0 atual à direita)

PS - "A 3. a Comp seguiu em 29lul72 para Fulacunda, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CArt 2772. Em 20ag073, assumiu a responsabilidade do respectivo subsector, ficando integrada no dispositivo e manobra do seu batalhão e depois do COP 7 e novamente do seu batalhão, sendo especialmente orientada para a contrapenetração
no corredor de Guebambol."

Fonte: Fonte: Excerto de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 240.
 
2. Comentário do editor LG:

Jorge, tu tens as melhores fotos de Fulacunda mas também fizeste uma reportagem completa e surpreendente  sobre a visita do  comandante do bigrupo, Bunca Dabó (ou  D'Abó, como tu o apelidaste)...  

É natural que houvesse, ainda, de parte a parte, alguma desconfiança. Afinal, o Acordo de Argel só seria assinado em 25 de agosto de 1974... Mas também era verdade que nenhuma das partes queria retomar as hostilidades...

O que salta à vista, nestas fotos históricas,  é a tua descontração (desarmado e em farda nº 2, fazendo as "honras à casa") em contraste com   o bigrupo do Bunca Dabó que vem "armado até aos dentes" (não faltam RPG e granadas, além das Kalash)... 

Convenhamos que, para uma visita de "cortesia e paz"  aos "Serrotes", a ti, aos teus camaradas e aos teus fregueses de Fulacunda, parece ser armamento a mais...  

Mas sobre esta visita conversaremos melhor  na II Parte.

Boas festas, feliz Natal, uma entrada suave, com paz e saúde, no Novo Ano de 2025. Luís

____________________

Notas do editor:  

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26259: Operação Grande Empresa, a reocupação do Cantanhez e a criação do COP 4, a partir de 12 de dezembro de 1972 - Parte IV: Um dos santuários do PAIGC (1966-1972)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Parque Nacional do Cantanhez > Madina do Cantanhez, perto da "barraca" (acampamento) Osvaldo Vieira (que eu visitei em 2 de março de 2008) > 10 de Dezembro de 2009 > 7h32 >  A silhueta de um "dari" (chimpanzé) descendo uma árvore ... 

Este grande símio (o mais aparentado, do ponto de vista genético, ao ser humano) é muito difícil de observar e fotografar... Contrariamente a outros primatas que existem no Parque, ainda com relativa abundância como o macaco fidalgo ("fatango", em crioulo). O Cantanhez ainda era, em 2009, uma das últimas florestas primárias do planeta. É imperioso que os guineenses e todos nós as saibamos proteger e salvar. O João Graça que esteve cinco dias como médico, voluntário,  em Iemberém (a nossa antiga "Jemberém"), teve o privilégio de observar "in loco"  um chimpanzé do Cantanhez (depois de se levantar muito cedo e caminhar um bom par de horas, com um guia). Outro habitat do "dari é o Boé (agora ameaçado com a prospeção e eventual exploração da bauxite, entregue a uma empresa chinesa).

Foto (e legenda): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Parque Nacional do Cantanhez > Farim do Cantanhez > 9 de Dezembro de 2009 > 17h06 >  Resto de mangas de um ou mais "daris"...

Com mais de 100 mil hectares (mil quilómetros quadrados), este parque é muito importante, segundo o IBAP - Instituto da Biodiversidade e das Areas Protegidas, com sede em Bissau:

"Grande diversidade da fauna e da flora com a existência de várias florestas húmidas onde se destacam sobretudo as essências raras e únicas, tais como: copaifera, salicaunda, 'pau' miseria, mampataz, 'pau' de veludo, tagarra, faroba de 'lala' e outras. Ainda alberga diferentes espécies de fauna (elefante, búfalo, baca branco, sim-sim, chimpanzé, macaco fidalgo, porco de mato), entre outros: é reconhecido por WCMC como um dos 9 sitios importantes do ponto do vista da bioiversidade. Cantanhez é igualmente uma das 200 eco-regiões mais importantes do mundo identificadas pela WWF."

Fotos (e legendas): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Tombali > Península de Cubucaré / Cantanhez > Carta de Cacine (1960) (Escala 1/50 mil)  > Durante 6 anos, de 1966 a finais de 1972, o Cantanhez foi um "santuário" do PAIGC. O único destacamento das NT era Cabedu (parte do setor S3, Catió) (e Cacine, na margem esquerda do Rio Cacine). Depois da Op Grande Empresa (dez 72 / jun 73), vão ser instalados aquartelamentos das NT em Jemberém, Cafine, Cafal, Cadique, e outros (que este excerto do mapa não mostra, como Caboxanque, Chugué e Combumba)  (*)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)


1. Antes da Op Grande Empresa (*), houve outras operações de envergadura, com tropas terrestres, marinha e força aérea... Mas a verdade é que o PAIGC encontrou na península de Cubucaré condições ideais para construir um dos seus santuários, no interior da Guiné... 

Sabemos que a reivindiação de 2/3 de áreas libertadas foi sempre "show-off" do Amílcar Cabral para impressionar os seus financiadores externos e fornecedores de armas, bem como reforçar a "moral" da sua tropa, militantes e simpatizantes... Nunca correspondeu à verdade... Não havia recanto da Guiné onde a tropa portuguesa não pudesse chegar, com maior ou menor dificuldade... 

Isso não nos impede de reconhecer, também por mor da verdade, que  o Cantanhez , o Oio e o Boé foram três santuários do PAIGC: o primeiro , de 1966 a 1972, o segundo, durante toda a guerra, o terceiro. depois do abandono de Béli,  Madina do Boé e Cheche, em 6 de fevereiro de 1969... 

Mas a população que lá podia viver no Cantanhez era, afinal,relativamente  escassa: no final da Op Grande Empresa, as NT  conseguiram recuperar não mais do que 3,5 mil habitantes, sobretudo  mulheres, velhos e crianças, que foram "reordenadas"...

No ReI Ac Psic n° 4/72 (citado, pela CECA, 2015, pág. 186), e no que diz respeioto à "População", escreve-se:

(...) "O aspeto mais significativo no período foi a recuperação de cerca de 3.500 elementos da população balanta em Caboxanque e Cadique que após a implantação das NT naqueles locais, franca e abertamente, se acolheram à nossa proteção, colaborando na construção dos aldeamentos locais imediatamente iniciados.

"Esta atitude, manifestada por uma população há anos sob controlo IN, para além de revelar um fraco índice de contaminação subversiva, confirma o quadro de desequilíbrio psicológico a nosso favor vindo há muito manifestar-se pela generalidade da população controlada pelo inimigo em consequência dum cansaço de guerra, pesadas exigências do Partido e precárias condições da vida no 'mato'. " (...)

Onde estavam, afinal,  os  trezentos e tal mil habitantes  da Guiné, que o PAIGC controlaria nos tais 2/3 do "território libertado" ? 

Na altura,em 1970,  a Guiné tinha c. de 595 mil   habitantes; na melhor das hipóteses, o PAIGC controlava, direta ou indiretamente,  dentro e fora do território, 15% a 20% da população, incluindo a população refugiada dos dois países vizinhos, o Senegal e a Guiné-Conacri.

Recorde-se aqui os números apurados pelo jornalista do "Diário de Lisboa", Avelino Rodrigues,  em meados de 1972, aquando da sua visita à Guiné em missão de reportagem, a convite pessoal de Spinola:

(i) "Bissau afirma controlar 487 448 habitantes (foram os que se deixaram recensear em 1970)",

(ii)  "mantendo-se outros 27 174 em 'zonas de duplo controle' ".

(iii) "no Senegal vivem 60 000 refugiados, e na Guiné (Conacri) 20 000, segundo informa o Comando-Chefe, apoiando-se em  dados da Comissão de Refugiados da ONU";

(iv) "a ser assim, 89,5 por cento dos guinéus viveriam no interior do TO (teatro de operações) e 82 por cento do total estariam sob controle português."

(v) "numa população que em 1970 era de 594 622 habitantes";

(vi) "os dois mil combatentes que (...) actuam dentro das fronteiras, manobram a partir das 'zonas sob duplo controle' (...), situadas ao longo do corredor florestal e particularmente nas proximidades de Bissorã / Mansabá / Canjambari, confluência do Geba/Corubal, e sobretudo na zona ao sul do rio Buba, à volta de Catió".

(vii) "outra zona 'quente' situa-se perto do Cacheu, junto ao rio do mesmo nome, alastrando pelas florestas ao norte do Bachile e do Pelundo";

(viii) "calculam-.se em 7 000 os combatentes do PAIGC atuando a partir de 25 bases da fronteira senegalesa e de 8 da República da Guiné, incluindo aqueles que se encontram dentro do TO" (**)


2.Reveja-se, aqui, em síntese, o que foi, no sector Sul 3 (S3), a Op Safari, em 3 e 4 de janeiro de 1966:
 
(...) "Teve como finalidade, aniquilar e destruir os grupos inimigos e as suas instalações localizadas nas regiões do Cantanhez, entre os rios Ualche e Macobum, particularmente as de Calaque, Cafine e Cafal. 

"Executaram a operação forças da CCaç 728, 763(-), 1423, 1424 e 1427(-), CPara, 4 DFE, 5° e 6° Pel / BAC (4 obuses), com apoio aéreo e apoio naval.

"As NT atacaram a 'Base Central', a sul do cruzamento de Cafal, tendo-a destruído.

Em Missida Jauiá foi assaltado um acampamento; o lN sofreu 1 morto e 1 prisioneiro, tendo-lhe sido apreendidas I metralhadora pesada e outra ligeira, 1 espingarda, 1 carabina e 1 pistola metralhadora, além de outras baixas não confirmadas. Foi apreendida documentação diversa. Foram destruídas grandes quantidades de arroz e de gado.

"As NT sofreram 4 mortos e 14 feridos."

 Comentário à Op Safira (Fonte: Relatório de Comando do CTIG n'º 1/66, pp. 109-110):.

(...) "Ressalta no período, pela sua importância, quanto a efetivos empenhados, meios de apoio de fogos, apoio aéreo e naval, pela duração e pelo prazo e, especialmente, pelo valor atribuído ao lN na zona de ação escolhida, a operação 'Safari'.

O Cantanhez é uma área de densa arborização e difícil acesso às NT, onde o lN mantém uma liberdade de ação quase absoluta, sofrendo apenas esporádicas ações de flagelações da FA, Artilharia e de curtas incursões por elementos combatentes.

"A Op Safari teve o condão de levar a essa área importantes efectivos das NT, que percorreram distâncias apreciáveis, causando ao lN baixas e danos materiais que não estão, ainda hoje, avaliados. As NT permaneceram na zona de ação durante a noite de 4/5 de janeiro, período que era considerado crítico, sem que o lN tivesse comprometido a sua segurança. 

"Desta operação colheram-se bons ensinamentos para futuras ações na mesma área e verificou-se a viabilidade de ali se levarem a efeito ações de desgaste do lN. "(...)

Fonte: Excertos de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014), pp.  387/388 (Negritos nossos) (Com a devida vénia...).


3. Da leitura do livro da CECA,  6.º Volume (Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro II; 1.ª Edição; Lisboa, 2015), abrangendo o período de 1967 a 1970, vai-se percebendo que para o então Com-Chefe, gen Schulz, o Cantanhez é um osso duro de roer e não há condições para uma grande contra-ofensiva das NT... Vem o Spínola, em meados de 1968, e só quatro anos e meio depois (!), é que é possível planear e executar a Op Grande Empresa.

Temos de recuar no tempo, ao princípio da luta armada  (ou início da subversão, como diziam as autoridades portuguesas) para perceber por que razão só muito tardiamente as NT conseguiram pôr algumas bandeirinhas no mapa do Cantanhez: Jemberém, Cafine,Cafal,Cadique, Caboxanque, Chugué e Cobumba...


Vídeo nº 1  (4' 52 ''): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados. 

Alojado em: You Tube >Nhabijoes



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira, nas proximidades de Madina do Cantanhez, na picada entre Iemberém e Cabedu > Simpósio Internacional de Guiledje > Domingo, de manhã, 2 de março de 2008 > Visita guiada e animada por antigos guerrilheiros e população local, ao Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira (*) > 


Neste vídeo (nº 1), um dos homens grandes da região conta como foram "os primórdios da luta"...  Era de etnia nalu, a  "dona  do chão". Chamava-se 
Mussá Camará  (e irá morrer uns meses mais tarde).

Entrou no mato, como ele diz, logo em 1962. Ou seja: passou à clandestinidade, depois de aderir ao PAIGC. 

Estava convencido que a designação deste acampamento ("Osvaldo Vieira") não tinha nada a ver com a verdade fática, histórica, que seria apenas uma homenagem, póstuma, a um dos heróis (não de todo consensual...) do PAIGC, cujos restos mortais repousam na Amura, a antiga fortaleza colonial de Bissau transformada em panteão nacional.. Mas não, o  Osvaldo Vieira atuou no Oio (Frente norte), mas também ao que parece no Cantanhez (Frente sul). 

Abramos aqui um parênteses, para dizer que já em 2008 eu tinha dúvidas (eu e outros participantes portugueses no Simpósio) sobre o seu papel no complô contra Amílcar Cabral de que resultara o seu miserável assassinato em 20 de janeiro de 1973.  Osvaldo Vieira e o executante do crime, o Inocência Cani,  eram próximos e críticos do líder histórico e da tese da unidade Guiné-Cabo Verde. Mesmo assim foi dado o seu nome ao Aeroporto Internacional de Bissau. Também tinha relações de parentesco com 'Nino' Vieira. De qualquer modo, repousam lado a lado no panteão nacional, ele e o Cabral, o " pai da Pátria".

Mas voltando ao vídeo (nº 1): o antigo guerrilheiro  fala num crioulo difícil. O Pepito vai traduzindo. Vê-se que nem sempre percebe o antigo guerrilheiro...

"Éramos só sete nessa altura. O comandante do grupo era o José Condição. Ficámos no mato de Caboxanque, aqui perto. Numa barraca, parecida com esta"... 

E a narrativa continua: Até que chegou à região de Tombali o Capitão Curto.  Esse Cap Curto ficou com a fama de mandar cortar cabeças. .. No filme-documentário "As Duas Faces da Guerra", de Flora Gomes e Diana Andringa, um dos entrevistados, antigo combatente do PAIGC, também evoca esse  Cap Curto... A crer no depoimento do antigo guerrilheiro, o Cap Curto cortava as cabeça dos seus prisioneiros e, depois ia apresentá-las às mães das vítimas, nas suas tabancas... (o que nos parece macabro e fantasioso demais).

Enfim, não tive, no Cantanhez, oportunidade de confirmar esta história nem saber mais pormenores sobre eventuais métodos de trabalho sujo, resultantes da colaboração entre Exército, PIDE, polícia administrativa, etc., nos "anos de chumbo" que antecederam a guerra... 

Também não achei apropriado o momento, que era de festa e de reconciliação, para falar deste e de doutros homens que, a ser verdade o que deles se contava,  não podem ser tomados como representativos do exército português, e muito menos dos militares portugueses que fizeram a guerra, entre 1963 e 1974... Mas é importante ouvir as diferentes narrativas da guerra, que ajudam a compor o "puzzle" das histórias de um lado e do outro...

Na mesma altura apareceu o 'Nino' Vieira. O tal Cap Curto cercou Darsalame, entrou aos tiros na tabanca, mandou toda a gente pôr as mãos na cabeça… (Esta história já parece bater certo com outras que temos ouvido da atução do cap José Curto, cmdt da  CCAÇ 153, e carrasco do comandante do PAIGC, Vitorino Costa, formada na academia chinesa de Nanquim.) 

Das cinco da tarde às cinco da manhã, a aldeia esteve cercada e as pessoas foram interrogadas… O 'Nino' ficou muito preocupado e quis saber o que se passava. Reuniu os camaradas, entre eles o "Mão de Ferro", com a missão de ir a Darsalame saber o que se estava a passar e tentar ajudar o povo. Não deixou ir o José Condição. Foi também nessa altura que o grupo, que tinha aumentado, já não cabia em Caboxanque. 

“Este mato é pequeno. Não vamos ficar aqui, disse eu… E foi então que fomos para o mato de Cantomboi” (um dos catorze atuais matos do Canhanez)…


 

Vídeo nº 2 (0' 55''): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados. Alojado em: You Tube >Nhabijões


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira, nas proximidades de Madina do Cantanhez, na picada entre Iemberém e Cabedu > Simpósio Internacional de Guiledje > Domingo, de manhã, 2 de março de 2008 > Visita guiada e animada por antigos guerrilheiros e população local, ao Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira (*) 


"Cabral fala sábi"...A memória de Cabral (que, dizem, conheceu bem a região de Tombali, como engenheiro agrónomo, antes de se ter tornado o fundador e o líder histórico do PAIGC) bem como as marcas da luta de guerrilha estão ainda bem vivas entre as mulheres e os homens do Cantanhez... Uma das mulheres, presentes nesta visita, canta uma das canções revolucionárias da época, dando vivas à Guiné e ao... Partido (vídeo nº 2).

 Mas será que alguma vez  elas o viram ao vivo  a a cores por estas paragens  durante a "guerra de libertação" ?  Duvido.  

Contrariamente ao ' Nino', o Cabral nunca foi um comandante no terreno, não era um "cabra-matcho"  como os guineenses gostavam. Era um bom teórico, estratega, político, diplomata ( e poderia ter sido um grande estadista, ou não ?)... Mas nunca foi um com-chefe, um general,  como o Spinola,  próximo dos seus homens no mato, na guerra.  


Foto nº 1 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira, nas proximidades de Madina do Cantanhez, na picada entre Iemberém e Cabedu > Simpósio Internacional de Guileje > Domingo, de manhã, 2 de março de 2008 > Visita guiada e animada por antigos guerrilheiros e população local, ao Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira (***) 

"A unidade foi a melhor arma nos momentos difíceis dos camaradas" - pode ler-se num pequeno monumento, tosco, de cimento, encimado pela estrela negra, erguido na antiga barraca da guerrilha, o acampamento "Osvaldo Vieira" (agora reconstituído)... 

Testemunho do passado, recado para o presente, pensa a Alice que, como muitos portugueses e portuguesas, não fazia a mínima ideia das reais condições do terreno (e do clima) onde se operava a guerrilha e a contra-guerrilha na Guiné.... São florestas-galeria onde mal entra o sol...

Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

O que pensarão estes miúdos ? Quais são os seus sonhos ? Para onde estão a olhar ? O que serão daqui a 15/20 anos ? O que sabem da luta pela independência, levada a cabo pelos seus avós ? Quem serão hoje os seus ídolos, os seus heróis ? E estas mulheres grandes ? Que recordações têm da luta armada ? E da dor, do sofrimento e da tragédia que foi toda aquela guerra estúpida e inútil ? Qual é a sua situação hoje, do ponto de vista social, económico e sanitário ? O que poderão ainda esperar do futuro ?

Foto nº 3 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje> Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Sabotagem ? Provocação ?... Não, é apenas uma camisola do craque do Manchester United e da Selecção Nacional de Futebol de Portugal, Cristiano Ronaldo, um "herói' do mundo global e mediatizado de hoje... 


Foto nº 4 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

À esquerda, o prof  Luís Moita  (1939-2023) e o Paulo Santiago seguem com atenção, desvelo e carinho, o inédito espectáculo de representação teatral que nos ofereceram, a todos, os antigos guerrilheiros e a população local do Cantanhez...

Foto nº 5 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)


Um dos antigos "combatentes da liberdade da pátria", um antigo comandante,  explica, em crioulo (com tradução para português, feita pelo Pepito) como é que os guerrilheiros do PAIGC se apoiavam em (e articulavam com) a população local...

Com um brilhozinho nos olhos, fala das 3 fases da organização político-militar do PAIGG...  (Á esquerda, sentados, e de máquina fotográfica em punho, o Paulo Santiago e o Silvério Lobo.)


Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

... Tem um papel, sabe ler...  Insiste em afirmar, perante os convidados estrangeiros, que aqui nunca se lutou com o povo português, mas sim contra o colonialismo de Salazar e de Caetano de acordo com a retórica do Partido.

Fotos nº 7 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Um verdadeira lição, ao vivo, de história, de antropologia, de ciência política, de arte da guerra, de gestão, de humor, de humanidade, de sobrevivência, de dignidade, de amizade, de esperança no futuro... 

Fotos nº 8 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Osvaldo Vieira, de origem cabo-verdiana,  foi dos que morreu justamente na reta final, a um mês do fim das hostilidades...   Os antigos guerrilheiros do Cantanhez também quiseram dar a esta 'barraca'  (acampamento temporário) o seu nome... 

Segundo me dirá o Manecas Santos outro lendário combatente do PAIGC, o homem dos Strela,  o Osvaldo nunca terá andado muito pelo sul... Fico na dúvida se o nosso homem esteve realmente aqui, neste sítio... Mas, para o caso, também não interessa. Os seus antigos camaradas tentaram, de maneira didática, simples, autêntica, reconstruir as condições em que se vivia e lutava durante os difíceis tempos da luta de libertação... (E tiveram que limpar aquele mato!)

Não sei se alguma vez foi identificado, atacado e destruído pelas NT este acampamento... Sabe-se que, desde 1966 até finais de 1972  as NT não ousaram penetrar, a pé, no coração do Cantanhez, com o claro objetivo da sua reocupação. No final do consulado de Spínola, aí sim, vai haver uma grande contra-ofensiva contra este santuário do PAIGC, a Op Grande Empresa.

O Pepito garantiu-me,  uns meses mais tarde, desfazendo as minhas dúvidas,, que  "o Osvaldo foi um combatente que viveu naquela 'barraca' (acampamento) e fez dela ponto de partida para numerosas acções de guerrilha".

Além disso, "as estórias dele naquele local são mais do que muitas, algumas até divertidas: quando lhe dava a sede, mandava um dos seus guerrilheiros comprar vinho no Quartel de Cacine. Uma vez o mesmo saboreado e estalada a língua de satisfação, recostava-se e dizia: ' 
Um dia ainda vamos chorar a partida dos portugueses, nunca mais beberemos bom vinho'  "… (Se calhar dizia "água de Lisboa", como os meus soldados, que não bebiam...)

Foto nº 9 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Um grupo de antigos guerrilheiros encenaram a sua atuação no tempo da guerra... Ei-los aqui vestidos de caqui e gorro, e empenhando imitações de madeira da famigerada Kalashnikov... Pertenciam ao Exército, já na 3ª fase da luta...

Foto nº 10 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Nalguns casos recorreu-se mesmo a restos de armas que ficaram por ali, como por exemplo o cano do temível LGFog RGP-7....


Foto nº 11 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

O grande terror dos guerrilheiros e da população do Cantanhez não eram os paraquedistas, ou o helicanhão, mas sim os Fiat, os aviões a jacto da Força Aérea Portuguesa... O aparecimento dos mísseis terra-ar Strela vieram dar outra confiança e ânimo aos homens do PAIGC...

Foto nº  12 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

 O papel das mulheres na guerrilha foi aqui ilustrado, exemplificado, exaltado...

Foto nº  13 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

As mulheres do Cantanhez exemplificaram como cozinhavam no mato, sem fazer fumo, iludindo a observação aérea das NT... Os combatentes tinham apenas direito a uma refeição por dia... Ainda hoje será difícil comparar a sua à nossa fome... Nas unidades de quadrícula ou nas operações no mato, o tuga sonhava com comida e sobretudo com bebida... Muita, fresca.

Foto nº  14 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Um grupo de mulheres, camufladas com folhas de arbustos, mostrando como se deviam agachar e esconder quando no céu se ouvia o baralho de aeronaves...

Foto nº 15 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Atores, figurantes, assistência... Nos bastidores ou no palco.... As mulheres são parte fundamental da luta do povo da Guiné, ontem como hoje: pela paz, pela liberdade, pela democracia, pelo desenvolvimento, pelo direito à história....

Os tempos hoje são outros... As populações do Cantanhez, e nomeadamente as que apoiaram abertamente a luta de libertação (os nalus e os balantas), parecem assumir o seu passado, com orgulho, com dignidade, sem arrogância, sem ódio....

Claro que a narrativa é heróica... Em dia de festa, e para mais à frente de estrangeiros (e alguns antigos inimigos) não houve ocasião para se lembrar a violência que também se abateu do lado dos " libertadores", sobre a população mais vulneráveis, as crianças, as bajudas, os adolescentes, as mulheres, os idosos...que tinham de alimentar a guerrilha, garantir grande parte da logística, cultivar as bolanhas, sofrer as prepotências dos comandantes e comissários políticos, etc. 

Foto nº 16 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Uma guerra de libertação (ou subversiva, como diziam as nossas chefias militares...) não se faz sem as mulheres, como a antiga enfermeira do PAIGC, Francisca Quessangue, que participou na batalha de Guileje....

Francisca, uma mulher doce e tranquila... E no entanto  tinha todas as razões para ter ódio no seu coração: o pai foi morto, com três tiros, friamente, por tropas africanas, por se recusar a denunciar os camaradas da guerrilha do PAIGC... Uma tia dela que estava grávida e que assistiu, aterrorizada, a esta cena, escondida por detrás de uma árvore, teve um aborto espontâneo. 

O pai da Francisca era papel, da região de Bissau. Viveu no mato, onde ela cresceu. Tinha responsabilidades políticas, não era combatente. A Francisca estudou enfermagem na ex-União Soviética. Estava num hospital de retaguarda, na fronteira, aquando do ataque a Guileje. Hoje é enfermeira no Hospital Regional do Gabu. 

Foi uma das oradoras do Simpósio. Fez uma comunicação sobre os aspectos sanitário-logísticos do PAIGC no assalto ao quartel de Guileje, no dia 6 de março. (...)

Foto nº 17 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Um antigo comandante da guerrilha conduziu-nos, a mim, ao cor art ref Nuno Rubim, o "capitão-fula",  e a esposa, ao longo de uma das linhas de fuga que partiam do centro do acampamento, em plena floresta do Cantanhez, até ao tarrafo... Fortemente apoiados pelos nalus e pelos balantas, o PAIGC movia-se como peixe dentro de água nesta floresta-galeria, um emaralhado de lianas e vegetação perene, com árvores de alto porte, centenárias, uma amostra ainda riquíssima do que resta das florestas primárias do planeta...

Foto nº 18 >  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Paisagem de tarrafo...na maré vazia.


Foto nº 19 > 
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

De acordo com as coordenadas do GPS do N  caor art ref Nuno Rubim (1938-2023), tiradas no centro da clareira onde decorreu a cerimónia, este sítio fica a 11º 12' 46" N - 15º 03' 10" W, ou seja, à esquerda da picada que vai de Iemberém (antiga Jemberém) para Cadique (a oeste) e Cabedu (a sudoeste), nas proximidades de Madina do Cantanhez, entre Iemberém e Cachamba Sosso (vd. infografia, ao alto do poste)... 

Uma das linhas de fuga do acampamento, que ficava numa pequena elevação, ia dar diretamente ao Rio Bomane, afluente do Rio Chaquebante, este por sua vez afluente do Rio Cacine, desaguando justamente frente a Cacine, perto de Cananime (onde iríamos almoçar nesse domingo).

Foto nº 20 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...) 

À entrada para o acampamento Osvaldo Vieira, junto a poucos quilómetros de Imberém, a sul... Na foto, a Alice Carneiro com o antigo guerrilheiro Dauda Cassamá, sob o olhar do catalão Josep Sánchez Cervelló, professor universitário em Tarragona, especialista em história sobre o 25 de Abril e a descolonização portuguesa...


Foto nº 21 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

Um grupo de jovens, rapazes e raparigas, que cantaram o Hino da Guiné-Bissau no início da cerimónia ... O que será feito deles, hoje (2024) ?

Foto nº 22 > Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez > Acampamento ("Barraca") Osvaldo Vieira > Simpósio Internacional de Guileje > Visita guiada > 2 de março de 2008 (...)

O Pepito, nosso anfitrião (infelizmente iria desaparecer 4 anos depois, deixando órfão a sua ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, e fazendo falta a este povo e que ele tanto adorava) ,  aqui servindo de tradutor (do crioulo para o português)... Foi o génio organizativo e a alma deste Simpósio Internacional, que juntou os "inimigos de ontem" (faltaram apenas os cabo-verdianos, que ainda tinham um ódio de estimação ao 'Nino' Vieira e vice-versa)...

Concentraram-se, neste antigo acampamento do exército do PAIGC, naquela manhã de domingo, dia 2 de março, algumas centenas de pessoas, entre comitiva (participantes do Simpósio Internacional de Guileje, nacionais e estrangeiros) e população local...


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados. [Edição:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 __________________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > d7 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26242: Operação Grande Empresa, a reocupação do Cantanhez e a criação do COP 4, a partir de 12 de dezembro de 1972 - Parte III: Dois amargos Natais, em Caboxanque (1972) e Cadique (1973) (Rui Pedro Silva, ex-cap mil, CCAV 8352, Caboxanque, 1972/74), 14 de março de 2024

(**) Vd. poste de 3 de maio de 2022 > Guiné 61/74 - P23224: A nossa guerra em números (16): A "força africana" em 1972: mais de 20 mil homens em armas, segundo o enviado especial do "Diário de Lisboa" ao CTIG
 
(***) Vd. postes de: