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domingo, 6 de junho de 2010

Guiné 63/74 – P6546: Histórias do Eduardo Campos (14): Cantanhez: Do inferno ao Paraíso


1. O nosso camarada Eduardo Ferreira Campos, ex-1º Cabo Trms da CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74, enviou-nos a 3ª estória da sua ainda fresquinha viagem à Guiné:

CAÇ 4540 – 72/74 – SOMOS UM CASO SÉRIO

CANTANHEZ: DEPOIS DO INFERNO - ENCONTREI UM PARAÍSO
Tenho de o dizer, porque calar-me seria trair o que me vai na alma, que na realidade tu, Luís Graça, és um dos responsáveis pelo meu regresso à Guiné e pela montanha de novos companheiros que também por lá passaram nos anos de guerra e que tenho tido o grato prazer de vir a conhecer nos últimos tempos. Tudo isso devo ao Blogue que criaste e mais digo, que o presente poste pretende apenas ser uma singela e reconhecida homenagem pessoal.

Luís Graça, Carlos Vinhal, Magalhães Ribeiro e todos os 417 Amigos & Camaradas da Guiné seguidores do Blogue, para vós vai toda a minha gratidão, porque conseguiram em 4 anos fazer o que o SNS não fez em trinta e muitos anos e ainda me permitiu usufruir do raro privilégio de ficar isento do inerente pagamento das irritantes e injustas taxas moderadoras.

Dito isto, vamos à narração da viagem:

Ficamos instalados no Capé (arredores de Bafatá), para assim nos podermos deslocar para norte, leste e sul. Outra alternativa poderia ser o Saltinho, mas a opção de ficar no Capé foi acertada, quer pela qualidade das instalações, da boa gastronomia e da afabilidade e simpatia dos proprietários.

Dia 12 de Abril 2010 > Capé – Bafatá > Saímos bem cedo e iniciamos a viagem que me iria levar até Cadique, tendo passado por Bambadinca, Xitole, Saltinho, Buba, Aldeia Formosa, Guileje, Iemberem e finalmente a terra que me foi “prometida”, pela tropa, em 1972.

Depois de entrarmos na mata do Cantanhez, tornou-se patente a difícil exequidade da viagem, já que a mobilidade se tornou impraticável, diria mesmo impiedosa e, se não fosse a boa vontade de alguns companheiros de viagem, eu não teria chegado a Cadique porque, desanimado e desmotivado, quis desistir.

Quem por lá andou na construção da estrada que liga a Cadique, sabe o quanto nos custou, em sofrimento e morte, essa obra. A partir de Iemberem comecei a sentir e a pensar algo que jamais conseguirei decifrar, mas que posso tentar definir como um misto de emoções, desilusões, euforia, tristeza… por ali fora ia dizendo: “Aqui estive emboscado!”, “Ali morreu o A, o Bê, o Cê..”, “Foi aqui que o Capitão Pára-quedista Terras Marques levantou 4 minas.”, etc, etc.

Mil imagens me surgiram na mente, à velocidade da luz, podem pensar que é um exagero, mas não consigo transmitir-vos melhor ideia do que se passou, naqueles momentos, pelo cérebro deste vosso amigo.

No entanto, não me foi possível identificar exactamente os locais dos acontecimentos, até porque a “estrada” está quase irreconhecível e a “distância” de 38 anos, também não me ajudou.

Permitiu-me, isso sim, sentir uma enorme sensação de liberdade (estranha), matando mesmo a minhas velhas dúvidas de que fosse verdade, algum dia, efectuar aquele percurso sem ouvir um tiro.

Quando finalmente pisei o solo de Cadique, não consegui esconder a minha emoção e a Carminda deve ter sido das poucas pessoas, que se apercebeu do que eu tentei esconder as lágrimas (é que eu ainda sou daqueles que pensa que os homens não choram).

Felizmente, não foi necessário efectuar trabalhos de arqueologia, para descobrir vestígios da presença da minha companhia no local, já que não sendo muitos eram no entanto visíveis.

Atravessar o Cantanhez e chegar as margens do rio Cumbijã, é algo que jamais esquecerei e, meus caros amigos, garanto-vos que ainda há poucos anos atrás nem sequer queria falar, ou ouvir alguém falar, da Guiné. A vida, por vezes, prega-nos partidas destas.

Gostaria de ter ido a Cufar onde estive algum tempo no COP 4, e que teria sido fácil se houvessem os meios necessários, bastando para isso atravessar o rio, assim só se o tivesse feito a nado.

Depois de distribuir umas guloseimas pelos miúdos voltamos a atravessar o Cantanhez, porque a viagem iria ser longa até Bafatá.

Passamos por Guileje e tive uma agradável surpresa, quanto ao museu e à área envolvente do mesmo, que ganhou nova vida e aspecto.

Até breve.

Foto 1 > Capé > Bafatá > Acampamento!

Foto 2 > Imberem (Antiga Jemberem) > Memorial da 1ª Cart/Bart 6521

Foto 3 > Auto > Estrada muito movimentada

Foto 4 > Cadique > Depois de muitas horas... chegamos! Foto 5 > Cadique > Sonho tornado realidade, voltar a pisar de novo este solo
Foto 6 > Cadique > Antigo bar
Foto 7 > Cadique > Memorial da CCaç 4540
Foto 8 > Cadique > Mastro onde a bandeira portuguesa era hasteada
Foto 9 > Algures na mata do Cantanhez > Os dez magníficos que me acompanharam. Da esquerda para a direita: Henriques, Fernandino, Carminda (esposa do Cancela e uma grande Senhora), Cancela, Petiz, eu, Zé Rodrigues (homem que organizou tudo e só não tomou as vacinas por nós), Laguela, Zé Carvalho, Jaime e o Vilar.
Um abraço Amigo,
Eduardo Campos
1º Cabo Telegrafista da CCAÇ 4540

Fotos: © Eduardo Campos (2009). Direitos reservados.
___________
Notas de M.R.:
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24 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 – P6461: Histórias do Eduardo Campos (13): Língua Portuguesa na Guiné: Em Perigo?

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Guiné 63/74 – P6461: Histórias do Eduardo Campos (13): Língua Portuguesa na Guiné: Em Perigo?

1. O nosso camarada Eduardo Ferreira Campos, ex-1º Cabo Trms da CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74, enviou-nos a 2ª estória da sua ainda fresquinha viagem à Guiné:

CAÇ 4540 – 72/74 – SOMOS UM CASO SÉRIO
LÍNGUA PORTUGUESA NA GUINÉ: EM PERIGO?


Existe entre nós uma preocupação em ajudar os povos da Guiné e, felizmente, temos muita gente trabalhando intensamente nessa causa, na tentativa de atenuar a miséria que lastra naquele país.
Na minha recente curta estadia na Guiné, fiquei a ter uma nova preocupação (a ser verdade) e esta, para mim, é muito preocupante, já que mais uma vez vem demonstrar que os políticos deste País, ou andam a dormir, ou simplesmente não se interessam em inverter aquilo, que me parece, que com o decorrer do tempo estará irremediavelmente perdido.
Estou a falar da língua Portuguesa, ainda usada pela população, principalmente em Bissau onde, num determinado local, fiquei com a sensação que estava numa rua de uma qualquer cidade de França, já que só ouvi falar a língua daquele país.
Abordei então um grupo de cinco jovens, que me disseram, que dois deles eram da Guiné Conacri e os restantes da Guiné-Bissau.
Com o desenrolar da conversa, lá me foram dizendo que a presença da França, especialmente em Bissau, é muito forte em várias áreas, sobressaindo a cultural.
Ora com o Senegal acima e a Guiné Conacri abaixo, é natural que a língua Francesa se comece a impor à portuguesa.
Talvez com a minha expressão de surpreendido, aproveitaram para me dizerem: “O que é que queres, na área da cultura até parece que a França é que foi a potência colonizadora, já que investem muito mais nessa área do que Portugal.”
Fiquei perplexo, até admitia que na área dos investimentos financeiros a França possa ser mais forte do que a do nosso país, agora na cultura, não posso, nem quero acreditar.
Sinceramente, espero que me digam que estou enganado, que foi apenas “um incidente linguístico” e que um grupo de jovens quiseram brincar com um Tuga.
Seguem-se algumas fotos da minha visita à cidade de Bissau:
Um abraço Amigo,
Eduardo Campos
1º Cabo Telegrafista da CCAÇ 4540

Fotos: © Eduardo Campos (2009). Direitos reservados.
___________

Notas de M.R.:

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3 de Maio de 2010 >
Guiné 63/74 – P6308: Histórias do Eduardo Campos (12): CCAÇ 4540, 1972/74 - Sadjo Seidi – O homem do Jerrican

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Guiné 63/74 – P6308: Histórias do Eduardo Campos (12): CCAÇ 4540, 1972/74 - Sadjo Seidi – O homem do Jerrican

1. O nosso camarada Eduardo Ferreira Campos, ex-1º Cabo Trms da CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74, enviou-nos a 1ª estória da sua ainda fresquiha viagem à Guiné:

CCAÇ 4540 – 72/74
"SOMOS UM CASO SÉRIO"

SADJO SEIDI – O HOMEM DO JERRICAN
TESTEMUNHO VIVO
Regressei recentemente da Guiné, onde, na companhia de alguns camaradas, andei a visitar os locais onde estivemos instalados durante a guerra.

Confesso que apesar de o meu diário estar recheado de histórias bonitas e outras nem por isso, decidi ainda não enviar nada para publicar no blogue, pelo menos por agora.

No entanto um acontecimento surgido em Buba, quer pela sua originalidade, quer pela minha vontade férrea em encontrar alguém conhecido e, porque não dizê-lo, pelas emoções que me causou (algumas lágrimas nos cantos dos olhos), não poderia continuar a ocultá-lo.

O motorista de uma das viaturas que nos acompanhou durante a nossa estadia, parou junto a uma esquadra da polícia em Buba, dizendo-nos que iria falar com o Comandante (seu chefe) já que o mesmo também era policia.

Nós aproveitado a referida paragem para sairmos da viatura.

Sentados num banco estavam três polícias, um dos quais me pareceu ter uma cara familiar e, sem hesitações, logo lhe perguntei: “Por onde andaste durante a guerra?”.
Ao que ele me respondeu: “Bigene!”.
“E Cadique?” – perguntei-lhe eu.
Ele disse: “Nhacra!”.
Foi o percurso que a minha Companhia, a C CAÇ 4540, fez durante a sua permanência na Guiné, pelo que fiquei quase que paralisado.

Afinal tinha motivos para que aquela cara me fosse familiar e de novo ele “ataca”: “E tu és o Campos das transmissões.”
“Mas que brincadeira é esta?” – pensei eu.
E logo o José Carvalho me tocou nas costas e apontou-me um jerrican que estava atrás de mim com a seguinte inscrição: CCAÇ 4540.
Foi o sinal que eu precisava para lhe dizer: “E tu, és o menino da Companhia.”

Estava na presença do SADJO SEIDI, o miúdo que nos acompanhou durante os dois anos de permanência da companhia na Guiné e deixamos em Nhacra, no final da comissão, com 15 anos de idade.

Fui agora encontrá-lo em Buba, 36 anos depois, como polícia e com 51 anos de idade.

Dizia ele entusiasmado: “Eu sabia que um dia havia de encontrar alguém da Companhia. Ando há muitos anos com o jerrican atrás de mim, sempre com a esperança que isto viesse a acontecer.”
E aconteceu.
Ele disse ao meu cunhado (José Carvalho), que, inteligentemente, antes de ter a ideia do jerrican com a inscrição da CCAÇ 4540, tinha um bidon de 200 litros, mas como era difícil mudá-lo de local, para poder ser mais facilmente visível, optou então pelo jerrican.

“Manga de esperto nos cabeça!” - digo eu, claro.

Comentando com os meus companheiros de “aventura”, com a tal lágrima no canto do olho, dizia eu repetidamente que já tinha ganho a viagem.

Eu, entretanto, continuei a ser surpreendido pela memória do Sadjo, perguntando-me por elementos da companhia e, mais me perguntava, se ainda sei como se chamava em termos de código Cufar e Cadique, ao que eu naturalmente respondi que não.

Para ele não foi qualquer problema: “Ébano e Cação.” – respondeu-me.

Como perguntou também pelo Vasco Ferreira, de imediato lhe liguei para Portugal passando-lhe o telefone, para que o Sadjo falasse com ele (mais uma lágrima).

Os deuses estiveram comigo nesse dia e não nos queríamos separar. Falamos, falamos… e não é que uma das viaturas que nos transportava avariou, permitindo-nos ficar mais umas horas na conversa.

O miúdo que ficou em Nhacra não teve vida fácil depois da NT entregarem as instalações ao PAIGC, esteve inclusivamente preso e só a idade dele e o bom senso do Comandante, o livraram de… aquilo que todos sabemos que aconteceu aos que “colaboraram” connosco.

Mas, finalmente, tivemos que nos separar, comum “até sempre”, que durou apenas uns dias porque o Sadjo me telefonou a perguntar se eu tinha chegado bem.

Acreditem, já sinto saudades do SADJO SEIDI.

Um abraço Amigo,
Eduardo Campos
1º Cabo Telegrafista da CCAÇ 4540

Fotos: © Eduardo Campos (2009). Direitos reservados.
___________
Notas de M.R.:

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26 de Fevereiro de 2010 >
Guiné 63/74 – P5886: Histórias do Eduardo Campos (11): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 11): Nhacra 6/Final

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 – P5886: Histórias do Eduardo Campos (11): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 11): Nhacra 6/Final



1. O nosso camarada Eduardo Ferreira Campos, ex-1º Cabo Trms da CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74, dando continuidade às suas memórias da Companhia em Nhacra, iniciadas nos postes P5711, P5729, P5796, P5812 e P5869:enviou-nos a 11ª fracção e mais alguns documentos históricos do seu arquivo pessoal:


CCAÇ 4540 – 72/74

"SOMOS UM CASO SÉRIO"

NHACRA 6

Os dias passavam e, com as noticias que chegavam de Lisboa, a ansiedade do regresso cada vez se acentuada mais. Afinal a guerra tinha mesmo acabado e continuava a sentir-se uma certa anarquia entre as forças militares. Os meus presságios não eram os melhores, mas acabou por ser só “fumaça” minha, como disse mais tarde o Almirante.

Um torneio de futebol de salão surgiu então em boa altura, criando nova diversão e distracção, que passava pela discussão clubista, as críticas sobre as arbitragens, os golos marcados e sofridos, os “frangos” dos guarda-redes, etc., servindo, em parte, para que nos abstraíssemos durante alguns dias, do total “deserto” de acção e movimentação, que agora nos rodeava.

EQUIPA STORNOS CAMPEÕES. De pé, esquerda para a direita: Sequeira, Mendes e Barros. Em baixo, da esquerda para a direita: Silva, Eu e Saraiva

O “Jornal” continuava a trazer problemas, com saneamentos e demissões à mistura, seria a aprendizagem da democracia a funcionar?

A 16 de Agosto de 1974, fomos substituídos pela C CAÇ 4945/73, ficando nós, a partir dessa data, a aguardar transporte para o regresso a casa.

O pessoal da Companhia, começava a não disfarçar o que lhe ia na alma e, houve até quem quisesse ir para Bissau, criando alguns distúrbios, fruto de vários boatos e rumores, de que estariam a embarcar de regresso à Metrópole, tropas com menos tempo de permanência de Guiné, que nós.

A 23 de Agosto, já era difícil segurar os militares no quartel e foi que então que saímos do Cumeré, acompanhados de militares de outras unidades e marchamos sobre Bissau, sendo barrados por um cordão de segurança humano em Safim.

Alguém do Comando Chefe se deslocou a Safim, e, nas negociações efectuadas ali, no local, foi-nos prometido que o Uíge, que nesse momento se encontrava no cais de Pijiguiti, em Bissau, a carregar material de guerra, passados dois dias permitiria que embarcássemos nós também.

Às primeiras horas do dia 25 de Agosto/74, finalmente deu-se o nosso regresso, a bordo do Uíge, tendo o mesmo chegado a Lisboa em 30 de Agosto.

A poucos dias de completar 24 Meses de Guiné, e em pleno mar alto, assisti a algo que jamais poderia imaginar ver algum dia, depois de tudo o que tinha passado na Guiné.

Não sei porque razão, mas fiz a viagem toda numa cabine do navio, enquanto os meus companheiros o fizeram no porão.

Por curiosidade, um dia desloquei-me ao porão e que os meus olhos viram e o nariz sentiu, jamais me abandonou até aos dias de hoje. As condições de transporte daqueles camaradas era simplesmente, inumana, indigna e até incoerente com o tempo da nossa era, em que tanto se apregoava a civilização.

O pessoal (praças), que vinha no barco já tinham algumas bases de aprendizagem sobre o que era ser “revolucionário”, e, vai daí, como não tinham acesso ao bar de oficias e sargentos toca a ocupá-lo.

O Comandante do Uíge, que os devia ter no sítio, ordenou que se a malta não abandonasse de imediato o bar desviaria o navio para Cabo Verde. Só assim foi reposta a legalidade hierárquica “copofónica” de imediato.

Se a memória não me atraiçoa o navio passou pelo Funchal, onde desembarcou uma Companhia de Madeirenses, retomando de novo a via marítima para Lisboa.

Já em pleno rio Tejo, os militares receberam instruções que teriam de ir à Amadora entregar o fardamento. Não gostando do que ouviram, alguns começaram a deitar os sacos ao rio. Foi-nos pedido para “aguentar”, e, mais tarde, as novas ordens foram para que deixássemos tudo a bordo.

Terão os SUV nascido na Guiné?

Anexo a seguir alguns documentos com história, que estavam guardados no meu baú das recordações, entre os quais um pequeno livro que nos foi distribuído pelo Estado Maior do Exército, intitulado Missão na Guiné. Recordam-se?




Livro que nos foi distribuído pelo Estado Maior do Exército, intitulado Missão na Guiné.





















Um abraço Amigo,
Eduardo Campos
1º Cabo Telegrafista da CCAÇ 4540

Fotos e documentos: © Eduardo Campos (2009). Direitos reservados.
___________
Notas de M.R.:

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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 – P5869: Histórias do Eduardo Campos (10): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 10): Nhacra 5


1. O nosso camarada Eduardo Ferreira Campos, ex-1º Cabo Trms da CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74, dando continuidade às suas memórias da Companhia em Nhacra, iniciadas nos postes P5711, P5729, P5796 e P5812 enviou-nos a 10ª fracção e mais 3 documentos históricos do seu vasto arquivo pessoal:

CCAÇ 4540 – 72/74

"SOMOS UM CASO SÉRIO"

NHACRA/5

Só o cansaço e saturação de muitos meses de tensão sob os efeitos da guerra e das esgotantes e desgastantes das notícias dos mortos e dos feridos diários, dos combates, das multi privações, etc., é que podem justificar o comportamento dos seus intervenientes, imediatamente após o golpe de 25 de Abril de 1974.

Ainda as notícias que até nós chegavam, eram insuficientes e conclusivas, para saber qual o curso da revolução, e, em especial, em relação à política que ia ser seguida para a descolonização, e já eu via envolvido em abraços e confraternizações as NT com o IN do dia 24, que passaram a “amigos do dia 26”.

Devo confessar que não gostei nada dessas confraternizações e fiquei sempre á margem do regozijo comum. Só em Junho desse mesmo ano, numa coluna em que eu seguia para o Olossato e em plena picada, quando surgiu um grupo de guerrilheiros do PAIGC - bem armados -, obrigando a coluna a parar e aí sim, fui “forçado” aos abraços da praxe.

Pessoalmente, nada tinha contra aqueles homens, mas, para mim, era difícil comemorar com os mesmos, fosse o que fosse, não me conseguia "libertar" das imagens dos meus camaradas mortos no Cantanhez e de todos os outros, que até aí tinham tombado por toda a Guiné.

Talvez por falta de serenidade ou egoísmo, para avaliar a situação, tomei essa atitude na altura, já que eles (o IN) também tiveram os seus mortos, mas isso eu pensava que era um problema deles e atribuía o facto ao curso normal da guerra.

Hoje, após muito meditar nisso, gostaria de estar a contar outra reacção minha diferente, mas não posso, porque a verdade foi esta.

Já tinha 19 meses de Guiné, quando o 25 de Abril aconteceu, e, hoje, tenho por hábito dizer que até neste pormenor tive sorte, por ter vivido o antes e depois, porque tive o privilégio de assistir ao regozijo daquele povo, porque eles almejavam com a sua luta: A Independência.

Naturalmente, que também assisti e, porque não dizê-lo, participei em coisas menos agradáveis, já que a indisciplina começou a surgir entre as NT com alguma frequência, dentro e fora do aquartelamento.

A política tinha entrado no quartel e as divisões, entre nós, começaram a surgir. Uns eram tomados como fascistas, enquanto outros eram classificados revolucionários, consoante o sua definição de alinhamento.

A organização de um torneio de futebol de salão, foi o pretexto para o lançamento de um “jornal” a nível interno, no qual eu, modestamente, também colaborei.

Sentia-se o perfume da liberdade.

O 1º Exemplar saiu com o título de "Simplesmente Desporto", com data de 20 de Maio de 1974, mas pouco tempo depois, iria chamar-se "1º de Maio Desportivo" e a confusão entre camaradas estava para durar.

Outro exemplar saiu em Edição Especial, com data de 20 de Maio de 1974

As fotos são de uma operação stop efectuada no entroncamento Bissau-Cuméré-Mansoa, para “apanhar” Agentes da PIDE/DGS (depois do 25 de Abril como é óbvio).

Um abraço Amigo,
Eduardo Campos
1º Cabo Telegrafista da CCAÇ 4540

Fotos: © Eduardo Campos (2009). Direitos reservados.
___________
Notas de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 – P5812: Histórias do Eduardo Campos (9): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 9): Nhacra 4


1. O nosso camarada Eduardo Ferreira Campos, ex-1º Cabo Trms da CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74, dando continuidade às suas histórias da Companhia em Nhacra, iniciadas nos postes P5711, P5729 e P5796, enviou-nos a 9ª fracção e mais 3 documentos históricos do seu vasto arquivo pessoal:

CCAÇ 4540 – 72/74

"SOMOS UM CASO SÉRIO"

PARTE 9

NHACRA 4

Pela segunda vez iria passar o Natal na Guiné e nesta quadra em particular, estar longe da família significava ficar mais triste do que habitual.

No entanto como éramos jovens, tínhamos a força necessário para ultrapassar todos os obstáculos e, por muito sentimentais que fossemos, ainda tínhamos a arte e engenho para requisitar o pai natal a estar presente nessa noite.

O Natal de 1973

O calendário parecia ter parado no tempo. Se eu estivesse mais ocupado, talvez fosse diferente o meu estado de espírito, assim sendo, mentalizei-me que não podia ter tudo de bom. Afinal eu até estava de “férias” em Nhacra.

Comecei a pensar, vir passar as minhas férias, mas a abundância de “pesos” não era muita e, como tal, não seria com o auxílio destes que eu conseguiria chegar á Metrópole.

Foi então que resolvi solicitar, através de um requerimento, uma “boleia” nos aviões militares, o que me foi concedido.

Em Março de 73, durante 21 dias lá saí Nhacra e apanhei um North Atlas, até á Ilha do Sal, e só dois dias depois é que consegui continuar a viagem para Lisboa, dessa vez num DC 6.

Mas o barato sai caro e, apenas uma semana depois de ter chegado, recebia eu um telegrama dos Adidos de Lisboa, a comunicar-me que eu teria de regressar à Guiné nessa altura, caso contrário não teria direito a nova “boleia”.

A pressa de voltar a Nhacra, não era nenhuma, e, pensando no tempo que ainda tinha por gozar, tive que comprar o bilhete na TAP, tendo-me desenrascado a arranjar os escudos necessários.

Durante a minha permanência por estas bandas, surgiu em 11 de Março, a “intentona” das Caldas da Rainha, e, creio eu, regressei a Bissau no dia 25 desse mesmo mês, altura em que colocaram as bombas no Quartel General.

Quando cheguei a Nhacra, estava o pessoal das transmissões finalmente a trabalhar a sério, construindo um posto de rádio subterrâneo, em betão maciço, já que havia informações que o PAIGC, tinha aviões “MIGS” na Republica da Guiné Conakri, prontos para bombardear na Guiné.

Eu trocava as noites de serviço com os meus camaradas, com muita frequência, porque adorava trabalhar de noite e, assim, aproveitava para ouvir a BBC e outras rádios, o que começou a despertar-me alguma consciência para a vida política.

Por causa de trabalhar de noite, e como é óbvio dormir de dia, num dia dei origem a que a Companhia estivesse na parada, numa formatura geral, aguardando que eu lá chegasse.

Porquê esperarem por mim, pois se eu tinha o meu direito ao descanso matinal? Esta é uma história ainda mal contada, pelo nosso Camarada bloguista, Vasco Ferreira (ex-Alf Mil At Inf da minha companhia), que nesse dia estava de Oficial de Dia, tendo-me obrigado a sair da cama para a tal formatura, mais cedo do que devia. É claro que não me levantei logo, dando muita resistência para abrir os olhos e sair da cama. Ainda hoje continuo a pensar que o nosso amigo ”Vasquinho” me “roeu a corda” nesse dia.

Entretanto fomos surpreendidos com o 25 de Abril, de que me recordo que algumas mensagens recebidas nesse dia, chegaram ao COP 8 com um conteúdo que não fazia sentido nenhum. Será que a referida falta de sentido, estaria relacionada com instruções e código estabelecidos pela malta envolvida no Movimento Revolucionário?

Nunca o saberei!

DOCUMENTOS DE COLECÇÃO COM HISTÓRIA

O pessoal convivendo no Natal de 1973

O pessoal a festejar a passagem de ano 1973/1974

Boletim PRESSE, do serviço noticioso para as Forças Armadas da Guiné do dia, com notícias captadas na radiodifusão pelas transmissões, no dia 25 de Abril de 1974





Boletim PRESSE, do serviço noticioso para as Forças Armadas da Guiné do dia, com notícias captadas na radiodifusão pelas transmissões, no dia 26 de Abril de 1974


Aproveito também para enviar a primeira página da EDIÇÃO ESPECIAL, do jornal vespertino da Guiné - VOZ DA GUINÉ -, publicado no dia 25 de Abril de 1974, noticiando “Junta de Salvação Nacional Assume Governo do País…”

Um abraço Amigo,

Eduardo Campos

1º Cabo Telegrafista da CCAÇ 4540

Fotos: © Eduardo Campos (2009). Direitos reservados.

___________

Notas de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

10 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5796: Histórias do Eduardo Campos (8): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 8): Nhacra 3