sábado, 16 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12306: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (25): O Honório e a minha cabeçada no painel de instrumentos, no T6, que fazia a proteção à coluna logística que ia para Beli... (Vítor Oliveira, ex-1º cabo melec, BA 12, Bissalanca, 1967/69)

1. Mais uma história da dupla Vitor & Honório, 
que fazia, em 1968, no T6, a proteção às colunas logísticas que iam de Nova Lamego, via Cheche, até Beli (destacamento, entretanto, abandonado pelas NT em meados de 1968):

[Foto à direita: Victor Oliveira, 1º cabo, melec, BA 12, Bissalanca, 1967/68; mora atulamente em Caneças, Odivelas]

Aqui vai mais uma do meu grande amigo Honório.

Estávamos a fazer num T6 protecção a uma coluna que levava mantimentos para Béli [, na região do Boé, sudeste da Guiné]. A meio do caminho, entre o Cheche e Béli, havia uma zona onde existia arvoredo e, antes da coluna passar, mandava-se umas bombas de 15 kg.

Eis que o meu amigo Honório, sabendo que eu não tinha os cintos apertados. porque, como andávamos para cima de 2 horas a sobrevoar a coluna, desapertávamos os cintos, não me avisou que ia largar as bombas e faz, zás!", o passe...

Escusado será dizer que fiquei com a cabeça encostada ao painel... Ele ria-se que nem um perdido e, com uma grande lata, pergunto-me então, depois de fazer a recuperação:
- Pichas, que é que se passou ai atrás ?

Só ele é fazia estas brincadeiras.

Já agora um pormenor: o Honório quando voava nos T 6G, só queria voar com bombas, para depois de as largar, ter o avião leve e fazer as suas acrobacias.

Sem mais um abraço.
Vitor Oliveira (Pichas)
1.º Cabo Melec
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P12305: Efemérides (147): Dia 9 de Novembro de 2013, data em que se assinalaram os seguintes aniversários: 95 Anos do Dia do Armistício da Grande Guerra, 90 Anos do Dia da Liga dos Combatentes e 39 Anos do Fim da Guerra do Ultramar (José Marcelino Martins)




1. Em mensagem do dia 9 de Novembro de 2013, o nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), mandou-nos mais uma reportagem fotográfica, desta feita referente aos: 95.º Aniversário do Dia do Armistício da Grande Guerra, 90.º Aniversário do Dia da Liga dos Combatentes e 39.º Aniversário do Fim da Guerra do Ultramar.



Realizaram-se hoje, 9 de Novembro, da parte da manhã, junto ao Monumento aos Combatentes, em Belém, as cerimónias comemorativas do:

95º Aniversários do Dia do Armistício da Grande Guerra

90º Aniversário do Dia da Liga dos Combatentes

39º Aniversário do Fim da Guerra do Ultramar


Forças em Parada – Companhia Mista de Armada, Exército e Força Aérea 
© Foto: José Martins 

Depois de usarem da palavra o Presidente da Liga dos Combatentes, General Chito Rodrigues, o orador convidado, Professor Doutor António José Telo e o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, General Luís Araújo, houve lugar a condecoração do Estandarte Nacional à guarda da Liga dos Combatentes, com a Medalha de Serviços Distintos, Grau Ouro.

O Estandarte Nacional a ser condecorado pelo CEMGFA 
© Foto: José Martins 

A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Lisbonenses, distinguiram a Liga dos Combatentes, condecorando o Estandarte da Liga com a Medalha de Agradecimento, Honra e Mérito, Grau Honra e Mérito – Grau Ouro

O Estandarte da Liga a ser condecorado pela AHBVL 
© Foto: José Martins

Pormenor da Condecoração atribuída pela AHBVL 
© Foto: José Martins 

Foram impostas condecorações da Medalha de Comportamento Exemplar - Grau Ouro (30 anos de serviço) e Medalhas da Liga – Grau Ouro

Entrega das Medalhas de Comportamento Exemplar - Grau Ouro, pelo Chefe do Estado-Maior do Exército, General Artur Neves Pina Monteiro. 
© Foto: José Martins

Entrega das Medalhas da Liga dos Combatentes - Grau Ouro, pelo seu Presidente, General Joaquim Chito Rodrigues. 
© Foto: José Martins

Seguiu-se a deposição de flores na base do Monumento, pelas diversas Organizações e Associações e Adidos Militares Estrangeiros.

Flores colocadas em Homenagem aos Combatentes Tombados pela Pátria. 
© Foto: José Martins

Desfile do Estandarte Nacional, ostentando a condecoração recebida 
© Foto: José Martins

A representação do Exército a desfilar em continência. 
© Foto: José Martins

Os Estandartes dos Núcleos da Liga, integrados no desfile. 
© Foto: José Martins

Visitando o Forte do Bom Sucesso, deparei com uma extraordinária maqueta, feita com fósforos, representando o próprio forte. 
© Foto: José Martins
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Nota do editor

Último poste da série de 11 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12275: Efemérides (146): Foi há 38 anos que Angola se tornou independente... Meio século depois do início da guerra do ultramar, continuamos divididos quanto à explicação da sua razão, sentido e duração (António Rosinha)

Guiné 63/74 - P12304: Bom ou mau tempo na bolanha (35): Morreu o Zé Pesca na Ilha do Como (Tony Borié)

Trigésimo quinto episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.


Morreu o “Zé Pesca”, na ilha do Como

Companheiros, hoje vou falar-vos de um episódio que me anda “atravessado” já há algum tempo. Quando o começo a trazer para o papel, escrevo umas tantas linhas e ponho tudo de parte, a emoção toma conta de mim, é mais forte, o som do “catra-pum- pum-pum”, começa a zumbir nos meus ouvidos, parece que vou a fugir para o meu abrigo preferido, a que eu chamava “Olossato”, por ter visto este tipo de abrigos, pela primeira vez no aquartelamento algo improvisado, que naquela altura lá existia.

No meu pensamento aparece o “Zé Pesca”, que era um soldado pára-quedista, do mesmo grupo de combate do meu companheiro de infância, também pára-quedista, que já aqui falei por diversas vezes, cujo nome de guerra era “Zargo”, e que uma vez vim no carro dos doentes à capital da província numa sexta-feira, regressando na segunda-feira seguinte na avioneta do furriel Honório, que sempre fazia passagem, quase obrigatória em Mansoa, passando todo o fim de semana, alojado em Bissalanca, no Batalhão de Pára-quedistas, na companhia do meu amigo “Zargo”, e nesse sábado, fizemos lá uma “tremenda patuscada”, que meteu ostras, ameijoas, camarão, onde bebemos um barril de vinho, entre todos, e para não ficar “vestígios”, queimou-se o barril.

O “Zé Pesca”, amigo da farra, lutador, combatente, com a boina verde sempre de lado, corpo de atleta, cujos pais eram agricultores no Ribatejo, já “contente”, dizia que não gostava da Guiné, “porque não havia cavalos”, que tinha ido para o corpo de pára-quedistas “por causa da farda”, certo dia morreu, crivado de balas daquela perigosa arma a que nós chamávamos “costureirinha”, que era uma metralhadora ligeira que também se usava em cima de um tripé com duas rodas em ferro, era transportada para a zona de combate e usada nas emboscadas, principalmente onde havia capim. Fazia fogo muito rasteiro, com cadência de tiro e som que a identificava, e quase sempre no fim da emboscada os guerrilheiros, talvez desesperados, abandonavam- na, ou pelo menos abandonavam o tripé, preocupando-se com os feridos. Também a usavam nas mãos, como uma arma vulgar, sem as ditas rodas. Pelo menos era esta a descrição que o Cifra recebia nas mensagens desses heróis combatentes que eram os militares de acção.

Dias depois o “Zargo”, explicou ao Cifra alguns pormenores da morte do “Zé Pesca”, onde estavam já há algumas horas, esperando uma pequena operação, quase um “golpe de mão”, como era costume dizer-se, cobertos com a típica capa camuflada impermeável, já com muitos buracos, portanto molhados “até aos ossos”, por uma chuva miudinha, e se não fosse da chuva, era pela humidade que naquela altura se fazia sentir. Já era noite quando saíram do aquartelamento onde estavam acantonados, todos beberam muito café, não sabiam se estavam sobre influência, mas estavam nervosos, queriam acção, passou um grupo de guerrilheiros perto, onde não deviam intervir, pois em caso de fogo todos os movimentos que fossem desenvolvidos, no futuro seriam denunciados. O “Zé Pesca” já aí queria intervir, os companheiros seguraram-no, foram avançando, próximo do objectivo não esperou por nada, avançou quase sozinho na frente, gritando, disparando, talvez amaldiçoando a sua própria alma, onde os companheiros aterrorizados com aquele gesto suicida, talvez heróico, nunca ninguém soube, ouviram a tal “costureirinha” fazendo soar o seu amaldiçoado som, do “catra-pum-pum-pum-pum”, que crivou o “Zé Pesca”, fazendo o seu corpo rodopiar em zig-zague, caindo uns metros à frente, encolhido, crivado de balas.


A operação desenrolou-se, queimaram o pequeno acampamento inimigo que estava naquela zona, destruindo muito material de guerra. No regresso, transportaram o corpo do “Zé Pesca”, trazendo também diversas mulheres guerrilheiras, transportadoras de material de guerra, que depois de feitas prisioneiras, amarrando-as nas mãos com uma corda umas às outras, acompanharam os militares, por uma certa distância, pois serviam de escudo, e compreendia-se, pois enquanto acompanhassem os militares, os guerrilheiros não atacavam. Já a manhã ia alta, perto do local onde deviam ser recolhidos, as libertaram.

Alguns dias depois, os militares do seu grupo de combate olhavam uns para os outros e diziam:
- Morreu o “Zé Pesca”, na ilha do Como.

Enquanto o grupo de combate a que pertencia o malogrado “Zé Pesca”, esteve estacionado na província, a sua cama nunca foi utilizada, estava lá, feita com roupa limpa, ao lado dos seus companheiros, que antes de se deitarem, lhes davam as boas noites.

Oxalá que Portugal respeitasse os seus combatentes, como estes militares de acção, respeitavam o companheiro morto em combate, pois é dos livros, já muitos escreveram que: “Nação que não respeita o passado, não pode ter bom futuro”.



Nós combatentes, defendemos a bandeira, fomos passado de um País que se chama Portugal.

Tony Borie, 2013
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Nota do editor

Último poste da série de 9 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12269: Bom ou mau tempo na bolanha (34): ...quase 50 anos (Toni Borié)

Guiné 63/74 – P12303: Memórias de Gabú (José Saúde) (33): Um olhar sobre uma tabanca onde se arquitetavam sonhos de… Crianças

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua série.


As minhas memórias de Gabu

Um olhar sobre uma tabanca onde se arquitetavam sonhos de… 

Crianças

Num trajeto ao conteúdo sobre as minhas memórias de Gabu, reconheço que se concentram ainda hoje imagens na minha mente que jamais ousarei enviar para um esconderijo, sabendo de antemão que o seu retorno não teria por certo bilhete de ida e de volta. Reparo para a foto exposta e revejo crianças numa tabanca algures na região de Gabu. As suas representações afiguravam-se decerto modo intemporais num tempo sem tempo.


Naquela tabanca, igual a tantas outras, arquitetavam-se sonhos de jovens, muitos de tenra idade, que tinham nascido sob as “escarpas” de uma guerra que se mantinha ativa e que não vislumbrava um prévio fim pacífico para as tropas em confronto. No horizonte de um firmamento tingido de tons africanos, cimentavam-se gritos de dor e de revolta. A paz era claramente desejada. 

Lembro, passados quatro décadas, o conteúdo real que se escondia numa tabanca que subjetivamente tinha nas suas crianças um mundo que suportava apenas… sonhos infantis. A imprevisibilidade do futuro considerava-se como infiel para um interminável número de meninos e meninas que colocavam no futuro uma incalculável imprevisibilidade e de agoirentas incógnitas.

O seu mundo, de criança, levavam-me a refletir: Qual será o seu destino? Eu, a cumprir a minha comissão militar obrigatória na Guiné, sabia que numa situação considerada absolutamente normal, um dia regressaria à minha pátria lusa, deixando para trás aquelas dóceis e ingénuas catraias que lançavam nos seus olhares evidentes querelas de profundas interrogações.

Sentia-me impotente para solucionar um problema de guerra, no qual eu era apenas uma peça simplória dum enigmático puzzle de um polvo cujos tentáculos ultrapassavam as fronteiras físicas e humanas, sendo que a guerrilha se assumia como uma máquina de irreverentes interesses, não se olhando aos inevitáveis males que se abatiam sobre miúdos e miúdas que na sua tabanca, o seu doce lar, idealizavam provavelmente o fim de uma lastimável guerra. A encruzilhada da guerrilha era simplesmente dúbia. Ficava, isso sim, a incerteza do dia seguinte.

Meditava, por outro lado, na estrutura moral do crescimento dessas afáveis criancinhas. Sabia, no entanto, que a mortalidade infantil ditava na Guiné, tal como em quase toda a África, indicies desoladores. Mas independentemente dessa profética verdade sabida, acreditava que aquelas crianças seriam mais tardes homens e mulheres felizes num país que sonhava ser livre.

Num olhar subtil à ilusória opulência de uma “vivenda” de campo observada em pleno mato guineense, constata-se de imediato que os bens caseiros eram diminutos. Todos nós, antigos combatentes, conhecemos essa inequívoca certeza. As crianças tinham sensibilidades diferentes e viviam de acordo com os meios físicos de que disponham. Restava porém a veracidade que os “tugas” eram gente amiga. Os “turras”, por sua vez, seriam, também, rapazes bem-vindos.

Nesta análise feita à dualidade de critérios de uma população que vivia de paredes-meias com as duas frentes da guerra, ficava-me a eloquente convicção que aquelas crianças seriam um dia pessoas adultas com hilariantes histórias de vida para contar aos seus descendentes.

Recordo o pitoresco ambiente que se vivia na tabanca. A atividade de gentes que se predispunham a uma autodeterminação para manter o sustento familiar. O chefe de família, homem hirto na imponente ação do seu agregado, descansava, incumbindo a mulher, melhor, as mulheres da faina do artesanal trabalho. As crianças, sempre ativas, eram uma preciosa ajuda nessas lides.

Desafiando as teias de factos observados nas minhas memórias de Gabu, recordo que na tabanca se criavam galinhas, cabritos, porcos, animais que a população muçulmana não comia e a malta “tuga” agradecia a troco de magros “patacões”, sendo que as crianças acompanhavam as progenitoras nas jeiras da mancarra, do arroz, do milho, entre outros velhos costumes herdados dos seus antepassados.

Hoje, revejo essa azáfama quotidiana dessas humildes crianças que no adensado mato pareciam não temer os alaridos de uma guerra que, em meu entender, lhe era decisivamente adversa.

Relembro, também, os magotes de adolescentes encontrados no mato e que tinham sido submetidos à “festa indígena” do fanado que a sua tribo lhes impusera. Recapitulo, também, os seus olhares fúteis, comprometidos, de jovens que deixavam antever uma embaraçosa explicação para o facto, talvez púdico, feito por mãos de gentes da sua tribo. Sábios vistos à luz dos costumes como homens e mulheres grandes.

Estes temas, literalmente equidistantes de um povo que convivia sob o conflito, eram então alvo de múltiplas ponderações, tendo em conta a flexibilidade que nós, humanos, amiúde presenciávamos numa Guiné que permanece presente na montra de um passado que teima em albergar inolvidáveis imagens. 

Um abraço, camaradas 
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


Guiné 63/74 - P12302: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (78): Notícias de Macau, do futuro grã-tabanqueiro Virgílio Valente, ex-alf mil, CCAÇ 4142, Gampará, 1972/74)

1. Mensagem de Virgilio Valente [, foto à esquerda,, em Macau, cortesia da página do Facebook de Wai Tchi Lone]. com data de 11 do corrente, em resposta a uma mensagem anterior, do nosso editor (*)

Luís Graça,

Obrigado pelo teu e-mail.

Sim, ainda continuo por Macau, terra que me acolheu em 1993. (**)

O Manuel Amante da Rosa já deixou Macau e também não tenho tido notícias recentes sobre onde está ou o que está fazendo agora.
Confesso que tenho andado bastante ocupado nos últimos tempos e por isso mesmo não tenho perguntado por ele. Culpa minha, prque devemos sempre saber dos amigos, ainda que não seja só para saber se estão bem.

O amigo [António] Estácio continua por aí por Portugal. De vez em quando dá notícias, poucas, mas vai dando. Continua a escrever sobre a Guiné. Sempre que vem a Macau costumamos encontrar-nos e falar um pouco. Faço parte de Associação dos Naturais e Amigos da Guiné-Bissau, em Macau, como sócio extraordinário. E é nas actividades desta associação que muitas vezes me encontro com o Estácio.

Reencontrei agora, por email, um amigo da CCAÇ 4142 e que foi furriel no meu pelotão (o 4.º), Dálio João Gil de Carvalho. Temos mantido algum contacto através do Facebook. Já lhe falei neste Blogue. Há três anos estive com o Sargento [Victor] Gonçalves, e esposa, em Vila Real quando aí fui de férias.

Sim, o António Graça Abreu é um nome bastante conhecido por estas bandas. Pessoa com bastantes conhecimentos e experiência sobre a vivência Chinesa. Estou interessado em ler o seu livro "Toda a China". espero que ele leia este email e me contacte pois sei que anda por Macau mas ainda não tivemos possibilidade de nos ver.

Quanto a escrever para o Blogue, ando para o fazer desde o primeiro dia. Tenho algumas fotos da Guiné, principalmente da Gampará e dos tempos que lá passei,  bem como histórias que nunca mais me sairão da lembrança.

Vou preparar algumas fotos e respectivas legendas e tentarei enviar para depois veres, se achares bem, se deves publicar no blogue.

Estou em Macau e estes são os meus contactos:

VIRGÍLIO VALENTE
Telemóvel (+853) 66808034
Telefone do serviço (+853) 89896116
Telefone de casa (+853) 28830781
email: oumunlinfa@gmail. com ou patelas@macau.ctm.net
Facebook: Wai Tchi Lone (é o meu nome em chinês)

Aguardo notícias tuas e dos restantes amigos [, acima citados,] para quem igualmente envio este email.

Fica também o voto de que vos possa receber em Macau e outro de que nos encontremos em breve em Portugal, talvez no próximo ano quando aí for em curto período de férias.

Parabéns pelo Blogue. Não há dia que não o leia. Parabéns a todos os que escrevem no Blogue. Nele as memórias de uma época, de um passado, de muitos portugueses. Triste o Povo que não tem Memória. (***)

Alfa Bravo com Afecto,

Virgílio Valente
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Notas do editor:

(*) Mensagem de L.G., enviada a 3 do corrente:

Virgílio: Não sei se ainda continuas por Macau ou se já voltaste à santa terrinha, a quem às vezes chamamos Pátria, Mátria, Fátria... ou simplesmente Madrasta. Em qualquer dos casos, muita saúde e longa vida, porque um combatente da Guiné merece tudo!...

Não tenho tido notícas do nosso comum amigo (e camarada) Manuel Amante da Rosa, a não ser há um ano atrás, quando o meu filho, João Graça (e a sua banda musical, os Melech Mechaya), jantou com ele, na Praia, Santiago.

Quanto ao grande Estácio, costumo vê-lo, em Monte Real, nos encontros anuais da nossa Tabanca Grande. Teve uns problemas de saúde que, penso, já ultrapassou felizmente.
Por sua vez, António Graça de Abreu que, penso, também é teu conhecido, nas andanças por China, Macau, etc., publicou mais recentemente um livro, que deve interessar-te: é o 1º volume de um livro de viagens e memórias, "Toda a China" (Lisboa: Guerra e Paz Editoras, 2013), lançado recentemente no Museu do Oriente, aqui em Lisboa.

Escrevo-te, entretanto, para te dar notícias de mais um camarada da tua CCAÇ 4142 que nos visita, por intermédio da sua filha, Elisabete Gonçalves... O Victor Gonçalves é hoje srgt chefe reformado... Deves lembrar-te dele. Tens aqui o link, no nosso blogue.

Escrevo-te ainda porque continuas a ter um lugar à tua espera, debaixo do frondoso, mágico e fraterno poilão da nossa Tabanca Grande. Já somos 631 (ou éramos, uma vez que quase 3 dezenas jde grã-tabanqueiros á nos deixaram, segundo no "barco de Caronte" para aquela última viagem que nenhum de nós quer fazer.. pelo menos tão cedo)...

Pois, caro Virgílio, ainda não tenho ninguém que represente, no blogue, os valorosos "Herdeiros de Gampará".. Como sabes, o preço é simbólico: 2 fotos e 1 história/10 linhas...Pensa lá nisso. Queria ver o teu nome junto desta valoroso rapaziada que um dia desembarcou na Guiné e alguns, como tu e eu, beberam a água do Geba... 

Um Alfa Bravo com afeto. Luís Graça

Guiné 63/74 - P12301: Parabéns a você (653): José António Viegas, ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 54 (Guiné, 1966/68)

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Nota do editor

Último poste da série de 15 de Novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12296: Parabéns a você (652): António Inverno, ex-Alf Mil Op Esp do BART 6522 e Pel Caç Nat 60 (Guiné, 1972/74); Orlando Pinela, ex-1.º Cabo Reab Material da CART 1614 (Guiné, 1966/68) e Cor Cav Ref Pacífico dos Reis, ex-Cap Cav, CMDT da CCAÇ 5 (Guiné, 1968/70)

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12300: Memórias da minha comissão em Fulacunda (Jorge Pinto, ex-alf mil, 3.ª CART/BART 6520/72, 1972/74) (Parte I)



Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Preparação das NT para mais uma saída mato (1)



Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Preparação das NT para mais uma saída mato (2)


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) >   As NT a instalarem-se na mata... [Jorge, gostava de saber que livro é que o militar que está à tua esquerda levou para o mato... Ampliando a foto dá para perceber o título: "O fim da mulher" (ou será o "O fim do mundo" ?)... O "fim da mulher" parece-me um título demasiado feminista para a época... Através da Porbase, encontrei um livro com o título "O fim do mundo", editado pelos Salesianos, Porto, 1946!...LG]


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74)  > Efeito de um ataque a Fulacunda: moranças queimadas



Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74)  >  Uma das ruas da tabanca de Fulacunda (1)




Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74)  >Uma das ruas da tabanca de Fulacunda (2)


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74)  > Mulher Beafada a avistar as NT, na mata.



Fotos (e legendas): © Jorge Pinto (2012).
Todos os direitos reservados.[Edição: L.G.]

1. Mensagem de ontem do nosso estimado 
amigo e camarada Jorge Pinto [ex-Alf Mil da 3.ª CART/BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74)], um alcobacence a viver na Grande Lisboa:

Caro amigo e camarada Luis Graça

Por vezes as "coisas da vida" e uma certa "preguiça" que teimosamente me tem impedido de descer à "cave" das memórias, levou-me a adiar a "promessa"  de ir enviando artigos para o nosso Blog (*).


Como, "mais vale tarde do que nunca", hoje meti "mãos à obra" e elaborei este pequeno texto sobre a actividade operacional da minha companhia (3ª Cart / Bart 6520/72), sediada em Fulacunda, desde Julho 72 a Agosto de 74.
Envio, ainda algumas fotos em anexos, cuja legenda acrescento:

F1010010 - Efeito de um ataque a Fulacunda.
F1010028 - Uma das ruas da tabanca de Fulacunda.
F1010040 - Mulher Beafada a avistar as NT, na mata.
F1020026 - Preparação das NT para mais uma saída mato.
F1000018 - NT a instalarem-se na mata.

Sei que este artigo devia ser acompanhado de uma carta geográfica da região, mas tal não me foi possível. Se tu conseguires fazê-lo agradeço, desde já.

Com um forte abraço, Jorge Pinto.




2. Memórias da minha comissão em Fulacunda (Jorge Pinto, ex-alf mil, 3.ª CART/BART 6520/72, 1972/74) (Parte I)

 Distraído com as “coisas da vida”, (netos, doença familiar, leituras, atividades inadiáveis e também alguma preguiça…), o tempo foi passando e a minha promessa de voltar a enviar notícias de Fulacunda foi sendo adiada…. Agora, vou mesmo descer à “cave” (ou subir ao “sótão”) das memórias e partilhar com “camaradas de armas”, algumas dessas memórias, que no fundo são coletivas. Hoje, vou dar particular relevo a memórias relacionadas com a atividade operacional da minha companhia: 3ª Cart do Bart6520/72.

A este propósito convém esclarecer que esta companhia a partir de meados do ano 1973, já com um ano de comissão, passou a pertencer ao COP7. Com esta mudança de comando, a atividade operacional tornou-se mais intensa, pois passámos a integrar operações em articulação com grupos de tropas especiais que ocasionalmente estacionavam em Fulacunda ou operavam na nossa área de intervenção.

Como se sabe, Fulacunda situa-se no Quínara, precisamente no cruzamento de estradas que fazem a ligação (tipo placa giratória) entre as margens esquerdas do rio Geba desde Jabadá , (Tabanca próximo de Tite), e do rio Corubal em direção a sul passando por Buba. Localiza-se aproximadamente, em linha reta, a 15/20 Kms, de cada margem e 35/40 Kms da confluência destes dois rios, local onde se começou a instalar, com muitas dificuldades, o quartel de Ganjauará.

Claro que todas estas estradas, da época colonial,. estavam intransitáveis devido às minas e aos pontões destruídos. De qualquer forma havia muitos “trilhos” e pequenos “carreiros” (sempre transitórios) a ladear estas estradas e a fazer a ligação entre as várias tabancas camufladas na mata e que muito frequentemente mudavam de local. 

Era uma vasta área de “chão Beafada”, considerada pelo PAIGC zona libertada, e berço da luta armada com implantação no terreno, a partir do ataque ao quartel de Tite, liderado por Arafan Mané, em 23 de Janeiro de 1963.

Em termos operacionais a nossa principal missão era impedir que o PAIGC usasse estes corredores como canal de infiltração. Assim muitas vezes o nosso aquartelamento era atacado, como forma de as NT, se manterem em defesa “intra valas”, enquanto o IN, passava com guerrilheiros e armamento em direção ao Geba. Sofremos cerca de 16 ataques, durante os 25 meses da nossa permanência no local. O último, ocorreu em 7 de Maio de 1974, quinze dias após o “25 de Abril”, mas sem grandes consequências, dado a maioria das granadas do canhão s/recuo, caírem fora do nosso aquartelamento.

Normalmente, a atividade operacional regular consistia em patrulhamentos na zona sempre ao nível de bigrupo e montagem de emboscadas nos referidos eixos de infiltração. Muitas vezes executavam-se operações em articulação com tropa especial que ocasionalmente operava na nossa zona (ex. comandos africanos e páras) ou se aquartelava em Fulacunda, como, por exemplo um pelotão de tropa especial constituído exclusivamente por Balantas, que esteve connosco cerca de dois meses e que causou múltiplos problemas com a população local de etnia Beafada. 

Estas missões e, participei em várias, eram dirigidas especialmente na direção dos rios Geba (tabancas de Umbassa, Gã Formoso, Gã João, Garsene, Braia) e Corubal (tabancas de Guebambol, Uaná Beafada, Farená Beafada, Farená Balanta…), zonas consideradas libertadas pelo PAIGC. [Vd. mapa de Fulacunda]-

Por vezes, nestas operações havia contactos. Como exemplo, recordo uma operação à tabanca camuflada de Umbã, em que na aproximação à referida tabanca as NT e o IN se encontraram frente a frente, no mesmo trilho. Ambos os grupos abriram fogo de imediato, caindo feridos um guerrilheiro IN e o nosso Furriel Santos, distanciados uns cinco metros um do outro. Nem as NT abandonavam o nosso camarada nem o IN o seu ferido. Como nós estávamos em maior número conseguimos fazer o envolvimento. O IN foi obrigado a afastar-se e parou o fogo momentaneamente. 

Foi nesta fase que socorremos ambos os feridos e verificámos estar já morto o guerrilheiro do PAIGC. Pedimos evacuação por heli que veio acompanhado do helicanhão. Porém, logo que este, nos ares rumou a Bissau e as NT, em terra, se preparavam para rumar a Fulacunda, verificámos que o IN tinha entretanto montado um semi-cerco,  cortando-nos o acesso a Fulacunda. Foi com muito esforço e perícia da força aérea, que veio novamente em nosso auxílio, que conseguimos sair dali e chegar ao quartel, sem mais feridos, já com a noite a cair…

Outros contactos houve, igualmente com alguns feridos, principalmente do pelotão de milícias de Fulacunda que nos acompanhava sempre e que nos serviam de guias. Contudo, não quero terminar este pequeno artigo, sem salientar com grande felicidade que todos os homens que constituíram a 3º CART/BART6520/72 e saíram do RAL 5 (Penafiel), em 24 de Junho de 1972, apesar de alguns feridos, regressaram todos vivos e unidos por uma amizade que ainda hoje perdura e nos faz reunir todos os anos em Penafiel, no restaurante Ramirinho, propriedade do nosso 1º cabo Silva,  do 3º pelotão.
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Guiné 63/74 - P12299: Memória dos lugares (254): Uma rua de Cacheu, em 1993, com o edifício da antiga Casa Gouveia (António Bastos, ex-1.º Cabo, Pel Caç Ind 953, Teixeira Pinto e Farim, 1964/66)



Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Cacheu > 1993 > Fotograma nº 1 > Rua da antiga Casa Gouveia 


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Cacheu > 1993 > Fotograma nº 2 > Rua da antiga Casa Gouveia 


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Cacheu > 1993 > Fotograma nº 3 > Fachada da antiga Casa Gouveia 


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Cacheu > 1993 > Fotograma nº 4 > Fachada da antiga Casa Gouveia 


Fotos: © António Bastos (2013). Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem: L.G.).
1. Mensagem, de ontem, do António Bastos (ex-1.º Cabo, Pel Caç Ind 953, Teixeira Pinto e Farim, 1964/66)

Luís, cá estou novamente, essas fotos são de Março de 1993, foram tiradas dos vídeos que eu fiz na altura.

Voltei à Guiné em 2000, e por último em 2008 quando foi o Simpósio Internacional de de Guileje 28 de março de 2008]. Aliás,  eu mandei-te já há muito tempo uma foto quando íamos no avião a caminho de Bissau.

Eu não fui a Guileje, andei pelo Norte, mas estive no Hotel e fui também à audiência com o 1º Ministro  e depois com o Nino. Tenho isso tudo em vídeo.

Um abraço e sempre ao dispor para ajudar em alguma coisa.
António Paulo.


2. Em 13 do corrente, o Carlos Silva tinha-nos mandado a seguinte mensagem:

Luís e Paulo Bastos

Do álbum do Paulo Bastos, que ele me enviou para inserir no meu site, não consta qualquer foto relativamente à casa, mas pode ser que os camaradas do pelotão dele tenham e são de 1964/65.
Portanto, daqui apelo ao Paulo Bastos se possível que faça essa diligência, pois eu não conheço mais rapaziada que estivesse por lá.
Um abraço,
Carlos Silva.

3. Comentário de L.G.:

Amigos e camaradas:
Estamos a fazer progressos, neste caso recuando no tempo... Estas imagens (, fotogramas de um vídeo do António Paulo Bastos)  são já de 1993!... Nessa altura a casa tinha uma espécie de telheiro (ou alpendre) sobre a entrada principal no piso térreo... Era, como diz o Pepito, uma casa de sobrado o que, no Brasil significa "andar de casa, propriamente andar com balcão ou varanda saliente.

Fonte: "sobrado", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/DLPO/sobrado [consultado em 15-11-2013].

Enfim, para os engenheiros e arquitectos da equipa técnica do projeto, são mais umas achegas importantes para se 'reconhecer' aspectos da fachada. Alguns aspetos do interior do edifício (que irá albergar o Museu da Escravatura e Tráfico Negreiro de Cacheu, podem ser vistos aqui).
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Nota do editor:

Último poste da série > 13 de novembro de  2013 > Guiné 63/74 - P12286: Memória dos lugares (253): Cacheu, centro histórico, antiga Casa Gouveia, futuro Memorial da Escravatura (Carlos Silva)

Guiné 63/74 - P12298: Notas de leitura (534): Escravos e Traficantes no Império Português, por Arlindo Manuel Caldeira (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 25 de Junho de 2013:

Queridos amigos,
Esta obra de leitura compulsiva poderá contribuir para dissipar muita dúvida que possamos ter à volta do comércio negreiro. O historiador desmantela certos preconceitos, insere o fenómeno na história das mentalidades, a ponto de ficarmos a saber que deste tráfico beneficiavam a família real, os membros do Governo, a aristocracia, os grandes comerciantes e o clero.
Tudo começou nos “rios da Guiné” e a obscura história da Guiné portuguesa tornar-se-ia mais incompreensível se não se atendesse ao papel de feitorias como as que se situaram na Goreia (no Senegal), em Cacheu, no Rio Grande de Buba. E vale a pena conhecer os grandes negreiros, alguns deles filantropos importantíssimos como o Conde de Ferreira.

Um abraço do
Mário


Escravos e traficantes no Império Português, o caso da Guiné-Bissau (2)

Beja Santos

Como se referiu no primeiro texto dedicado ao livro “Escravos e Traficantes no Império Português, O comércio negreiro português no Atlântico durante os séculos XV a XIX”, por Arlindo Manuel Caldeira, A Esfera dos Livros, 2013, estamos perante uma obra de indiscutível importância para se conhecer sem preconceitos ou falsas moralidades a extensão da participação portuguesa no chamado “infame comércio”.

O historiador Arlindo Caldeira estruturou cuidadosamente a investigação laboriosa que levou a cabo, fez bem ter começado por clarificar a natureza da escravatura e como esta já existia antes do tráfico atlântico, conduzido inicialmente por portugueses e espanhóis. Deixou esclarecido que nem portugueses nem espanhóis estavam em condições de interferir nas contendas regionais, estabeleceram acordos com alguns chefes, comercializaram os bens que nestas paragens eram mais apetecidos, como cavalos, manilhas de cobre, quinquilharia, armas de fogo e cavalos. E igualmente se esclareceu que o comércio da Senegâmbia foi muitíssimo inferior àquele que se exerceu no golfo da Guiné.

Quanto ao perfil dos mercadores, armadores e contratadores, o historiador refere que “Em Cabo Verde, em S. Tome e Príncipe ou em Angola, durante o Antigo Regime, todos os homens livres, independentemente do estatuto social ou da cor da pele, desde que dispusessem de um mínimo capital, estavam ligados, direta ou indiretamente ao tráfico de escravos”. Nada como exemplificar com o negociante da Guiné que veio a enriquecer no Perú. Tratava-se de um cristão-novo, Manuel Batista Peres. Nasceu em 1591, em Ançã, distrito de Coimbra. Seguiu para Sevilha aos 11 anos e na maioridade regressou a Lisboa. Embarcou para a Guiné e fixou-se no Cacheu. Dedicou-se a comprar escravos e exportá-las para as Índias de Castela. Em 1618 abandonou a costa de África em direção a Cartagena das Índias. Não foi de mãos vazias. No navio que partiu de Cacheu (a nau Nossa Senhora do Vencimento), de que era dono e capitão transportava 509 escravos e durante a travessia morreram 90.

A cidade de Cartagena, neste tempo, era um dos mais animados centros económicos das américas. O afluxo de metais preciosos, de pérolas e de esmeraldas, bem como os negócios de tabaco e plantas tintureiras, ajudaram Cartagena a tornar-se uma cidade dinâmica e cosmopolita. O tráfico de escravos era uma atividade muito importante e exercida preponderantemente por grandes comerciantes portugueses, a mercadoria humana era reexportada para o Caribe e o interior do continente. Será nestes circuitos cercados que o comerciante de Cacheu irá inserir-se. É seu sócio e mais tarde seu cunhado Sebastião Duarte, vindo dos rios da Guiné, outro cristão-novo. Batista Peres soube diversificar os seus investimentos que abarcavam a exploração de minas de prata. Fez crescer a fortuna, era culto e tudo indicava ser um católico fervoroso. Em 1635, porém, aquele mundo de prosperidade desabou para Batista Peres, o Santo Ofício acusou os cristãos-novos portugueses de práticas judaizantes e de estarem mancomunados numa tenebrosa conspiração para dominarem a América Espanhola. Batista Peres foi detido, e não lhe valeram as testemunhas que vieram em sua defesa. Durante quatro anos, sofreu todo o tipo de interrogatórios e humilhações, manteve-se firme até ao fim. Foi queimado vivo em 1639, muitos dos incriminados foram expulsos da América Espanhola. Como refere o historiador, a fama dos portugueses monopolizarem no vice-reinado do Perú o tráfico de escravos fora-lhes fatal.

Vejamos agora o comércio negreiro ao tempo do Marquês de Pombal. Em 1755 foi criada a Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão, companhia privilegiada que ficava com o exclusivo do fornecimento de escravos às capitanias do Pará e Maranhão. Entre muitos privilégios que lhe foram concedidos, contava-se o direito a dispor de navios da armada real. A Companhia procurou instalar uma poderosa rede comercial que abraçava a Europa, a África e a América do Sul. Aqui entra a Guiné. Para o resgate de escravos nas costas de África recebeu o comércio exclusivo das ilhas de Cabo Verde e da Costa da Guiné, desde o cabo Branco até ao cabo das Palmas. Estabeleceu as suas bases estratégicas em quase todas as ilhas de Cabo Verde, na Serra Leoa, em Cacheu, em Bissau, em Luanda e em Benguela. Entre 1756 e 1788, a Companhia transportou para o Brasil cerca de 30 mil escravos. Desses escravos, mais de dois terços eram provenientes dos “rios da Guiné” (entre o rio Casamansa e a Serra Leoa). No fim dos anos 1750, foi criada a Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba, que em pouco tempo ficou com o campo livre para operar quase exclusivamente em Angola. Entre os acionistas das duas companhias estava a nata da sociedade portuguesa. No topo, a família real. D. José I subscreveu 50 ações da Companhia de Pernambuco e Paraíba e sua mulher, D. Marina Vitória de Bourbon, filha do rei Filipe V de Espanha, possuía o mesmo número de ações da Companhia do Grão-Pará e Maranhão. Por sua vez, Sebastião José de Carvalho e Melo e a mulher, D. Leonor Ernestina Eva Josefa Wolfgang, condessa de Daun, tinham ambos ações da Companhia do Grão-Pará. Eram acionistas membros do Governo, da nobreza e até bispos. Entre os acionistas da Companhia do Grão-Pará e Maranhão surgem as abadessas e religiosas dos conventos da Nossa Senhora da Nazaré (Setúbal) e de Santa Apolónia (Lisboa), a congregação do Oratório da cidade do Porto ou o recolhimento de Nossa Senhora da Conceição (Penafiel).

Arlindo Caldeira com este admirável livro prestou um grande serviço à cultura portuguesa, escalpeliza as mentalidades, os interesses e mostra a miríade de tensões que trouxe o abolicionismo da escravatura, tanto em Portugal como no Brasil, mostra estatísticas e como tudo se passou até à ilegalização do tráfico. Nesta última fase, o transporte dos escravos cresceu em desumanidade, a clandestinidade levava a esconder escravizados nos lugares mais inimagináveis; para alijar culpas no momento da captura, as tripulações eram capazes de recorrer a qualquer expediente, incluindo a eliminação física dos escravos embarcados. É uma leitura palpitante e desconcertante, até ficamos a saber que o famoso filantropo Conde de Ferreira foi um importante traficante de escravos, acionista de várias companhias de seguros marítimos e com uma apreciável diversificação de investimentos. Não tendo herdeiros diretos deixou da sua imensa fortuna uma grossa fatia para solidariedade social, contemplando hospitais, asilos e misericórdias em Portugal e no Brasil, um fundo para a criação de 120 escolas primárias e a construção e manutenção de um hospital psiquiátrico ainda hoje em funcionamento na cidade do Porto. É uma leitura assombrosa que a todos se recomenda.
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Nota do editor

Vd. poste anterior de 11 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12276: Notas de leitura (533): Escravos e Traficantes no Império Português, por Arlindo Manuel Caldeira (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P12297: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (77): Dois antigos camaradas da mesma unidade (CCAÇ 12), mas de épocas diferentes, sem grande tempo para se encontrarem em Lisboa, partem sábado, no mesmo avião, para Luanda, onde vão em trabalho...




CCAÇ 2590/ CCAÇ 12 (Contubowel, Bambadinca e Xime, 196974) > Ficha de unidade 



1. Eis uma aqui uma inesperada troca de mensagens entre mim e o António Duarte , meu "neto, na CCAÇ 12 [, foto à esquerda,] , pois ele é da "geração", de 1973/74, enquanto eu sou um dos "pais-fundadores" (1969/71)... A seguir a estes, veio a "geração" de quadros de 1971/72... Aliás, éramos todos de "rendição indvidual"... O António Duarte é um membro sénior da nossa Tabanca Grande, acompanha-nos, pelo menos, desde 11/5/2006... mas sempre com grande discrição. Creio que só nos encontrámos um a vez ou duas,  sendo a primeira num 10 de junho... Mas vamos trocando alguns mails.

Ele agora teve a gentileza de me mandar uma cópia, em pdf, da história do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74), que veio render o BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), o qual por sua vez substituiu o primeiro batalhão com que trabalhámos (BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70).

Trocando impressões um com o outro sobre a "nossa" CCAÇ 12, acabámos por descobrir que partimos no sábado, no mesmo avião, para Luanda, em trabalho... (LG)

(i) António Duarte, 1/11/2013

Camaradas: Tal como tinha assumido, segue em anexo a história do BART 3873, já em pdf. O documento em causa estava à época classificado de "Confidencial", mas obviamente que,  passados estes já quase 40 anos, tal já não terá impacto/importância jurídica.

Chamo a atenção especial do Luís Graça, que vai ter a oportunidade de reviver quase ao vivo e em directo, os feitos da "sua/nossa" CCAÇ 12 de janeiro  de 1972 a março de 1974.

Abraços com amizade
António Duarte
Cart 3493 e Ccaç 12 

(ii) Luís Graça, 1/11/2013

Obrigado, António. Se publicar alguma excerto que valha a pena, associarei sempre o teu nome... O seu a seu dono. Estou-te muito grato pelo teu gesto. Um abração. Luis.

PS - Lembras-te do teu capitão na CCAÇ 12? Quem era, no teu tempo? Tens fotos dele? Mais: tens fotos tuas e dos nossos antigos soldados que queiras divulgar?

[Foto à direita: fur mil Henriques com o sold
condutor Dalot, na estrada de Bambadinca-
Mansambo-Xitole, outubro de 1969]


(iii) António Duarte, 3/11/2013

Boa noite, Luís

Obrigado pela tua gentileza, mas utiliza o material da maneira que entenderes e não necessitas de me mencionar, pois eu fui um mero guardião deste material.

Quando cheguei, em janeiro de 1973, o capitão da CCAÇ 12 era o Bordalo, homem do quadro, que suponho ser originário de Lamego. Os vossos substitutos [, a 2ª geração,] tinham grande admiração por ele. O nome completo está algures na história do BART 3873, que simultaneamente também tem a história da nossa CCaç 12. (O Mexia Alves já o mencionou num poste).

Em fevereiro de 1973 o novo capitão foi o José António Campos Simão, à época recrutado a "martelo", para capitão a partir do COM (não me recordo se o curso era o de comandantes de companhia ou o curso de capitães, um deles era destinado a ex-alferes que não tinham sido mobilizados, que não era o caso, pois o Simão era estudante de medicina).

O nosso relacionamento foi muito agradável, até final da minha comissão, janeiro de 1974.

Sei que é médico ortopedista e parece-me que trabalha,  muito provavelmente, em Évora. Não tenho o contacto dele.

Quanto a fotografias, a seu tempo aparecerão, pois estou na fase de transformação de slides em fotos digitais.

Demorarei ainda algum tempo, pois todo o espólio da minha ida à guerra estava (ou ainda está) mais ao menos a "monte". 

Atualmente estou ligado a um projeto profissional em Angola que me ocupa bastante. Irei ainda lá este mês, onde permanecerei cerca de duas semanas. Quando regressar vou meter mãos à obra. Fica consciente que tu és o "responsável" por esta viagem ao baú da minha memória... 

 Abraços, António Duarte.

(iv) Luís Graça, 4/11/2013

Bom, dia, António. Muito me contas!... Espero que este "regressso ao passado" só te faça bem... De qualquer modo, temos também o "dever de memória"... Estou-te grato pela tua generosidade...

Fico a saber que vais a Angola este mês. Eu vou lá desde 2003. Parto no próximo dia 16 e volto a 23... Estarei na Clínica da Sagrada Esperança, na Ilha de Luanda, a dar um módulo do I Curso de Especialização em Medicina do Trabalho... Diz-me quando vais...

Abraço fraterno, Luis

(v) António Duarte, 4/11/2013

Bom dia, Luís. Vou também a 16, na TAP à noite. Confirma se vais às 23h e 15m.

Eu vou lá exclusivamente dar formação para bancários e vou por intermédio do Instituto de Formação Bancária, escola onde dou aulas desde 1991, com uma interrupção de alguns anos, quando fui diretor comercial da zona centro de uma empra de leasing.

Só este ano é que tenho ido a Angola, pois reformei-me do banco em dezembro passado. Esta será a quinta vez e normalmente fico lá perto de duas semanas. Desta vez regressarei a 28 também na Tap. Vou ficar hospedado no Skyna.

Abraços, António Duarte.

(vi) Luís Graça, 4/11/2013

Como vês, o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!... Vamos os dois no TP 289... Vou com dois  colegas da ENSP/UNL. Voltamos a 23, à noite. Ficamos na Clínica da Sagrada Esperança, na Ilha. Fica com o meu nº de telemóvel (...). Haveremos de conversar. Abraço. Luís
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P12296: Parabéns a você (652): António Inverno, ex-Alf Mil Op Esp do BART 6522 e Pel Caç Nat 60 (Guiné, 1972/74); Orlando Pinela, ex-1.º Cabo Reab Material da CART 1614 (Guiné, 1966/68) e Cor Cav Ref Pacífico dos Reis, ex-Cap Cav, CMDT da CCAÇ 5 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 14 de Novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12288: Parabéns a você (651): César Dias, ex-Fur Mil Sap Inf do BCAÇ 2885 (Guiné, 1969/71); Jacinto Cristina, ex-Soldado At Inf da CCAÇ 3546 (Guiné, 1972/74) e Maria Arminda Santos, ex-Tenente Enf.ª Paraquedista (1961/1970)

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12295: Os nossos seres, saberes e lazeres (61): Tao Te Ching, o livro da sabedoria, na RTP 2, programa Agora, com o nosso António Graça de Abreu, no passado dia 3

1. Mensagem de António Graça de Abreu, com data de 9 do corrente:

 Assunto - Tao Te Ching na RTP 2, programa "Agora" de 3/11/2013

É só copiar o link [, programa Agora, RTP 2, emissão de 3/11/2013,] e pôr a correr. Entre o minuto 35 e o 40, no fim do programa, têm o António Graça de Abreu, em mais cinco minutos de tempo de antena, sobre o Tao Te Ching...

[Foi no programa Agora, (*), na RTP 2, dia 3 de Novembro, domingo passado.]

Se tiverem paciência, vejam, A peça está bem feita e este vosso amigo está assim-assim. (**)

Abraço, António Graça de Abreu


2. Comentário de L.G.:

António, não te falta muito para entares no Livro dos Recordes do Guiness... Há, pelo menos, um título de que te podes orgulhar (e, por tabela, nós, sendo tu membro da nossa Tabanca Grande): És o português que melhor conhece a China (João Paulo Meneses dixit, jornal digital "Ponto Final", Macau, 19/1/2010)...

Fico feliz por te ver no programa "Agora". Apreciei a tua tranquilidade e a tua sabedoria, e a referência aos teus melhores amigos chienese, que são os poetas e os pensadores clássicos... Fiquei a conhecer um pouco mais do taoismo e da sua influência.  Parabéns por o teu nome ficar indelevelmente associado, enquanto tradutor, prefaciador e anotador, a esse grande clássico, património cultural da humanidade (tal como a Bíblia), que é o livro Tao Te Ching | Livro da Via e da Virtude, da  autoria de Lao Zi (Lao Tsé), finalmente em português de Portugal, em edição bilingue, com a chancela da editiora Nova Vega.
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Notas do editor:

(*) AGORA é o novo magazine cultural da RTP2

Primeira Emissão: 03 Nov 2013
Duração: 41m
Classificação: Todos

O programa AGORA é o novo magazine cultural semanal da RTP2 que cobre a atualidade artística em todas as suas vertentes. O universo literário, ensaístico, artístico e científico, além de produções e eventos nas áreas da banda desenhada e fotografia; as artes cénicas - designadamente teatro, dança, circo e ópera - a arquitetura, design, pintura, museologia e património; bem como a temática infanto-juvenil (espetáculos, edições em livro, disco ou suportes digitais), contam-se entre as matérias a tratar.
Além da atualidade nacional, AGORA dará particular atenção ao universo cultural lusófono ... dos PALOP, Brasil, Timor-Leste, Macau e comunidades emigrantes portuguesas.
A apresentação cabe a Filomena Cautela. O magazine semanal é complementado com um apontamento de agenda diária, de 2ª a 6ª feira às 21h55 com a duração de 5 min.

Coordenadora: Marisa Feio / Editora: Cláudia Galhós

(**) Último poste da série > 5 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12254: Os nossos seres, saberes e lazeres (60): O livro Baladas de Berlim, de J.L. Mendes Gomes, Lisboa, Chiado Editora: O "pequeno grande segredo" do poeta...

Guiné 63/74 - P12294: Blogpoesia (359): Um poema a África (Juvenal Amado)

1. Em mensagem de 10 de Novembro de 2013, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), enviou-nos o seu poema "África".

O anoitecer no Cantanhez
Foto: © João Graça (2009). Todos os direitos reservados.

África

No teu corpo moreno
O teu perfume inebriante
Os teus braços prisão de doces muralhas
Em ti descobri a cor para além do cinzento

Os teus olhos amendoados
São ditadura dos sentidos
Misticismo das tuas crenças
No morno entardecer ventania e redopio
Tanto mar entre nós, ainda te reconheço
Em ti descobri a diferença

Calo fundo o desejo como que se ignora a dor
Dormir, sonhar e não querer acordar na tua ausência
Não querer apalpar o teu lugar vazio
Mergulhar para sempre no teu abraço
Varrer o teu passado e tornar luminoso o futuro
Em ti descobri a emoção

Sentir para sempre o odor
O doce aroma que o Sol castiga
Ainda julgo ver os teus panos coloridos
A brancura dos teus sorrisos
Os teus seios pujantes
Na bolanha o teu corpo bronze dourado
Juventude imortalizada e renovada
Em ti descobri a beleza

Uma mulher grande sussurrou-me que em África,
Era perigoso bebermos o pôr-do-sol
Cheirarmos as trovoadas
Olhar de frente os relâmpagos
E que, se nos enamorássemos
Também podíamos morrer de amor
Em ti descobri a saudade

Juvenal Amado

Foto: © Juvenal Amado. Todos os direitos reservados.
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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12242: Blogpoesia (358): Ele ensinou-nos a viver a sua ausência, / mas nunca com a saudade que temos dele (Juvenal Amado)

Guiné 63/74 - P12293: Breve historial da madeirense CCAÇ 2446 (José Martins)

1. Mensagem do nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 11 de Outubro de 2013:

Bom dia
Conforme explicação dada no próprio texto, segue a história da Companhia de Caçadores 2446, mais uma Companhia Madeirense, como tributo à memória de mais um dos nossos valentes enfermeiros, desta feita o Ângelo Jorge Conde Vitorino.

Bom fim de semana.
José Martins