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quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25105: Blogues da nossa blogosfera (185): O que é feito do "Vidas Lusófonas", sítio fundado e animado por Fernando Correia da Silva (1931-2014) ? Fomos revisitá-lo no Arquivo.pt e encontrámos revelações surpreendentes na biografia de Vasco Cabral...

 

1. Há um ano atrás fomos "revisitar" a nossa lista de  "blogues da nossa blogosfera" (*),  blogues e outras páginas (c. 110) que  constavam da coluna estática do nosso blogue, no lado esquerdo (a "aba", como lhe chama o Carlos Vinhal). Há muito  que não era atualizada, essa lista.


Numa verificação por amostragem demos conta  que mais de metade dos blogue e outras sítios (ou "sites")  tinham sido  descontinuadas, já não existiam ou tinham mudado de URL. 

Comentámos então que era o preço que se pagava por uma existência virtual, que é sempre precária, dependente da boa vontade ou dos caprichos dos servidores, das contingências da vida dos fundadores e animadores, etc.

Uma das páginas que seguíamos era a da  "Vidas Lusófonas" (vd. logo acima): 

O sítio era animado por  Fernando Correia da Silva (1931-2014), e outros jornalistas e escritores de língua portuguesa (mais de 3 dezenas de colaboradores). Infelizmente o sítio já não existe... Entretanto, e felizmente,  foi capturado pelo robô do Arquivo.pt (a última captura de écrã terá sido feita em 21 de fevereiro de 2017):



2. O "Vidas Lusófonas" ainda se mudou para a página "A Viagem  dos Argonautas" (onde também é argonauta o nosso camarada Adão Cruz). Aí escreveu o seguinte, em 21 de julho de 2015, a filha do Fernando Correia da Silva, Ethel Feldman:

(...) Queridos colaboradores,

No início, em 1998, tudo indicava que seria mais um projeto utópico de pouca dura. Um site cultural, onde todos os colaboradores estavam empenhados, cujo o intuito era o de partilhar a vida de personagens que fizeram história, cuja língua materna é o português.

O dinheiro não fez parte da equação. A dedicada teimosia de todos mostra que o Vidas Lusófonas só morrerá depois de todos termos partido.

No dia do aniversário da morte do seu fundador, meu pai, cumpro a promessa de um site renovado. A todos quero agradecer a paciência e confiança. O site continua tendo um número de visitas extraordinário.

Que se mantenha assim e sob o lema do Fernando: "Acho que cada vida tem que ser contada como se fosse um romance. Portanto, morra a prosa de notário! Morra a chatice do verbete enciclopédico!” (...)
 

Em quase duas centenas de biografias de gente lusófona,  de A a Z  (de Portugal, Brasil, Cabo Verde, Angola, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé Príncipe, Galiza, etc.) temos também a de Vasco Cabral (**), assinada pelo próprio Fernando Correia da Silva de quem foi colega da faculdade e amigo en Lisboa e depois ao longo da vida fora.  

Com o exílio de ambos, andaram desencontrados mais de vinte anos. Depois de regressar do Brasil, na sequência do 25 de Abril de 1974, o escritor e exilado político Fernando Correia da Silva integra a Federação das Cooperativas de Produção e +e numa viagem a Cabo Verde que reencontra o Vasco Cabral. Aqui vão excertos, com a devida vénia, do que ele escreveu sobre o seu amigo, e figura histórica do PAIGC.


3. Vidas Lusófonas > Biografia de Vasco Cabral  (Farim, 1926- Bissau, 2005)

por Fernando Correia da Silva


 (...) Achamos que o mais correcto seria convencer os operários a tomar conta dos meios de produção abandonados pós 25 de Abril. A ideia vinga e os trabalhadores de umas cinquenta pequenas e médias indústrias aceitam a proposta e assim nasce a Federação das Cooperativas de Produção.

Uma das metas da Federação é promover a compra de matérias primas e a venda de produtos manufacturados. Com a independência das ex-colónias portuguesas o mercado tende a alargar-se. Ainda em 1975 sou mandatado pela Federação para viajar até à Guiné-Bissau, já que Vasco Cabral, o Ministro da Economia da jovem nação, é meu amigo pessoal. 

Foi assim: em 1949 ambos participámos na campanha de Norton de Matos, candidato da Oposição anti-salazarista à presidência da República Portuguesa; em 1950 fomos colegas em Ciências Económicas e Financeiras, ele no 5.º e último ano, eu no 1.º; em 1953 participámos, em Bucareste, no IV Festival Mundial da Juventude (ele como militante comunista, eu apenas como aderente do MUD Juvenil, movimento unitário antifascista). Tanto bastou para firmar a nossa amizade. 

E agora passo a recordar o que vim a saber depois: Vasco é preso em 53 e libertado cinco anos depois. Em 62, numa fuga organizada pelo PCP, Vasco, juntamente com o angolano Agostinho Neto, de barco alcança Tânger. Ruma depois para o sul e vai procurar Amílcar Cabral para formalizar a sua adesão ao PAIGC e, junto com o fundador do Partido, lutar pela independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde. Cabral é pura coincidência de sobrenomes porque entre ambos não há qualquer parentesco. Em 63 começa a luta armada.

NA CIDADE DA PRAIA

Por telegrama, combino encontro com o Vasco Cabral em Cabo Verde, onde ele está transitoriamente. Desço na ilha do Sal, um longo, plano e calvo rochedo em alto mar. Dali, num pequeno bimotor sigo para a Cidade da Praia, na ilha de Santiago, esta já arqueada, cumes e vales, litoral recortado, arvoredo à beira-mar.

Na Alfândega, ao apresentar o meu passaporte, dizem-me que há um carro do Estado à minha espera. Sento-me ao lado do motorista. Atravessamos a Cidade da Praia e seguimos pela Marginal rumo à Prainha.

Paramos frente a uma vivenda e no alpendre está o Vasco Cabral à minha espera. Levanta-se e abre os braços, eu corro para ele, o grande e apertado abraço, há mais de 20 anos que a gente não se via. Em 54 eu fugira para o Brasil antes que a PIDE me deitasse a luva, o que parecia estar prestes a acontecer. Porém, sob a euforia do Vasco pressinto um alçapão. A ver vamos aonde é que ele vai dar…

Lá do fundo da vivenda surge então o Mário Pinto de Andrade, angolano meu amigo desde os tempos do Café Chiado, em Lisboa. Mais um longo e apertado abraço. O Mário fora um dos dirigentes da luta pela libertação de Angola. Mas depois da independência saíra do seu país por não suportar a prepotência do seu camarada Agostinho Neto e, na condição de refugiado, viera para Cabo Verde trabalhar na área da Cultura.

Anoitece, deito-me, durmo. No dia seguinte, de manhã, o Vasco convida-me a ir até à Cidade da Praia. Vou. Num clube local disputa umas partidas de ténis. Não tenho jeito para esse desporto e fico na bancada a assistir. Uma hora depois, já cansado, o Vasco vem sentar-se a meu lado enquanto, lá em baixo, outros pares continuam a bater bola. 

Evoco o IV Festival Mundial da Juventude. Sorrindo com malícia, o Vasco pergunta-me pela brasileirinha que eu andava a namorar em Bucareste. Óptimo! , se ele quer brincar talvez consinta que eu abra o seu alçapão secreto… 

Conto-lhe que em datas diferentes eu e a brasileirinha saímos de Bucareste porém marcámos reencontro em Paris. E de Paris rumámos para Lisboa onde viemos a casar em Janeiro de 54. O Vasco espantado com esta aventura mas não paro. Digo-lhe que ela era filha de judeus polacos emigrados para o Brasil e que o seu casamento com um não judeu causara traumas na família, apesar de progressistas serem eles. 

Digo ainda que, de navio, seguimos depois para o Brasil (eu já a furar o cerco da PIDE…) Ao descermos no porto de Santos lá estava toda a sua família, pais, irmão, avó, tios e primos. A avó, que teria mais de oitenta anos, dá-me um beijo e um abraço e, para a neta, diz qualquer coisa que me traduzem:

– Quando se cai de um cavalo, que seja de raça!

Aproximo-me da matriarca, dou-lhe um outro beijo e relincho.

O Vasco mata-se a rir com a história. Aproveito a galhofa para tentar abrir o alçapão. Pergunto-lhe como é que fora assassinado o Amílcar Cabral. Apesar de renitente, conta-me que um grupo de ex-guerrilheiros do PAIGC, controlados pela tropa colonial e pela PIDE, assaltara a sede do PAIGC na Guiné-Conacry, matara o Amílcar e preparava-se para matar outros dirigentes como o Aristides Pereira, o Pedro Pires e o próprio Vasco, quando Seku Touré, presidente da Guiné-Conacry interviera e frustara a tentativa. Pergunto depois se o bando de assassinos tinha sido caçado e justiçado. Responde-me o Vasco:

– Não quero falar disso.

E não fala, ponto final. Mas não desisto. No fim de tarde, ao regressar à vivenda na Marginal, puxo o Mário para o pátio e peço-lhe que me explique a agonia do Vasco. E ele explica ou tenta explicar:

Fernando, tu não sabes o que é a luta armada. Nem podes imaginar o que é ser traído por antigos companheiros de armas, a pretexto do tu seres cabo-verdiano e eles serem guineenses.

– Compreendo, ou tento compreender. E o Vasco caçou os assassinos?

– Todos.

– Quantos eram?

Mais ou menos cinquenta entre matadores e cúmplices. Caçou e executou ou mandou executá-los. É por isso que ele anda sorumbático, porque cada um dos executados tinha sido seu companheiro de armas, portanto tinha sido seu amigo. Compreendes?

Sim, compreendo. Magoado, mas compreendo…

No princípio da noite um carro, acompanhado por quatro motociclistas, pára frente à vivenda. É Pedro Pires, o primeiro-ministro de Cabo Verde que vem despedir-se do Vasco, o qual viaja amanhã para Bissau. Eu também viajarei amanhã, mas num voo diferente. Não quero ser intrometido e recolho-me lá para os fundos da vivenda. Porém, pouco tempo depois o Vasco vai buscar-me e apresenta-me o Pedro Pires. É uma simpatia de homem. Entre outras coisas pergunta-me:

– Como é que vai a Reforma Agrária portuguesa? Vinga?

E eu respondo:

– Se o folclore revolucionário for substituído por uma eficiente gestão económica, não há quem possa destruí-la. (...)

(Seleção, transcrição, revisão / fixação de texto, negritos, para efeitos de edição deste poste, com a devida vénia, e à memória do autor: LG. )

4. Outras vidas lusófonas (apemas uma amostra) que podem ser lidas, no sítio agora recuperado pelo Arquivo.pt:

Amílcar Cabral (1924-1973) (Guiné-Bissau), por Carlos Pinto Santos

Eugénio Tavares (1867 - 1930), (Cabo Verde) por Carlos Lopes

Fernando Correia da Silva (1931 - 2014) (Portugal), por José Brandão

Joaquim José da Silva Xavier, "O TIraddentes" (17446 - 1792) (Brasil), por João Sodré 

Joshua Benoliel (1873-1932) (Portugal), por Fernando Correia da Silva

Mário Pinto de Andrade  (1928 - 1990) (Angola(, por Fernando Correia da Silva

NGungunhane (c.1850 - 1906) (Moçambique),por Carlos Pinto Santos

Rainha Jinga (1582 - 1663) (Angola), por Fernando Correia da Silva

Salgueiro Maia (1944 . 1992) (Portugal), por Carlos Lopes

Samora Moisés Machel (1933 - 1986) (Moçambique), por Fernando Correia da Silva)

terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25102: Memórias cruzadas: o que o PAIGC sabia sobre Bissau, em 1969: (i) o "ataque" a Bissalanca em 19/2/1968; (ii) a carestia de bens essenciais como o arroz; (iii) a discriminação da população local no acesso aos cuidados de saúde; (iv) casos de violência verbal e física contra civis...


Vasco Cabral, membro do "bureau" político do PAIGC.
aqui em missão no exterior. Foto, s/d, s/l, cortesia do portal
Casa Comum >Arquivo Amilcar Cabral.
(Reeditada pelo Blogue Luís Graça
& Camaradas da Guiné, 2024)

1. É sempre interessante conhecer o que é que, numa guerra, os contendores sabem (e/ou pensam) uns sobre os outros... Mesmo quando a guerra acabou há muito, como foi o caso da guerra na Guiné (1961/74)... Daí esta série "Memórias cruzadas"...

As Forças Armadas Portugueses tinham as suas próprias fontes de informação: os serviços de informação militares p.d., a PIDE, a administração civil, os prisioneiros, os desertores, os gilas, etc. 

O PAIGC tinha também, embora mais elementares, os seus próprios serviços de recolha e tratamento de informação, quer de natureza política quer militar, a começar pelos seus próprios combatentes, e outros, incluindo os gilas (que atravessavam as fronteiras e faziam jogo duplo), os seus simpatizantes e militantes civis em Bissau e no mato, etc.  

Muitas das informações que o seu quartel-general recebia era grosseiras, pouco ou nada válidas em fiáveis,  porque a "ideologia" aldrava a "realidade": na ânsia de mostrar resultados no campo de batalha, comandantes e comissários políticos das FAPLA acrescentavam sempre muitos pontos aos seus contos... Mas, se calhar, era isso que os "Cabrais" (o Amílcar, o Luís, o Vasco, o Fidelis...) gostavam de ouvir...lá no bem-bom de Conacri. 

O documento que abaixo se reproduz,  é um exemplo das informações em bruto, que chegavam a Conacri, onde o PAIGC tinha o seu "quartel-general" e a sua "inteligentsia"...

Vasco Cabral (Farim, 1926 - Bissau, 2005) foi um dos mais qualificados quadros dirigentes do "Partido". (Não tinha qualquer relação de parentesco com o líder histórico do PAIGC, embora também fosse de origem cabo-verdiana ). Estudou em Portugal (licenciou-se em Ciências Económico-Finaneiras, pelo ISCEF/UTL),  apoiou a candidatura de Norton de Matos à Presidência da República em 1949, enquanto membro do MUD Juvenil, lutou contra o Estado Novo-

Não há muita informação (independente) sobre a sua biografia: foi preso político em Portugal, entre 1953/1954 e 1959, até que, já na clandestinidade, conseguiu fugir, em 1962, de barco até Tânger (cidade já itegrada, desde 1956, na soberania marroquina), juntamente com Agostinho Neto, com a ajuda (dizem)  do PCP - Partido Comunista Português. 

A partir daqui a sua história mistura-se com a de outros dirigentes (políticos) do PAIGC. Escapou à morte no atentado que tirou a vida a Amílcar Cabral.  Pertenceu ao "bureau" político e exerceu funções governativas depois da independência. Não se opôs ao "golpe de Estado" do 'Nino' Vieira, de 14 de novembro de 1980. Foi também escritor e poeta. E tem, juntamente, com Amílcar Cabral a melhor caligrafia de todos os dirigentes do PAIGC, a avaliar por esta amostra manuscrita que aqui hoje publicamos.

Não sabemos exatamente  onde decorreu esta "audição de camaradas fugidos de Bubaque" (sic), transcrita por Vasco Cabral em 5/12/1969 (*). Tudo indica que tenha sido em Conacri. Os três "camaradas", provavelmente de etnia bijagó (tal  como o Inocêncio Kani, o carrasco do Amílcar Cabral), eram o Marcelino Banca, o Marcos da Silva e o José Albino Sonda.  (Não parecem ter deixado "peugadas" na história do PAIGC...).

Vasco Cabral destaca o M.S. (Marcos da Silva) como informante priveligiado, que mostra conhecer razoavelmente Bissau (cidade que, ao tempo,  o Vasco Cabral já não devia cohecer de todo):

(i) fala, embora de maneira fantasiosa e propagandística, sobre a flagelação a Bissalanca, em 19 de fevereiro de 1968, quando um pequeno grupo, comandado por André Pedro Gomes e Joaquim N’Com,  fez uma incursão noturna na área de Bissau, atacando a BA 12 com tiros de morteiro e armas ligeiras; esta ação, embora audaciosa mas de alcance limitado, foi habilmente explorada por Amílcar Cabral para mostrar, sobretudo no exterior, a sua  capacidade para desferir ataques nos prósprios santuários do inimigo, neste caso a capital;

(ii) indica a localização dos principais quartéis em Bissau, Bissalanca e Brá, coisa que não era nenhum segredo militar, sendo conhecida de toda a gente; referência a um alegado "paiol da pólvora", a 800 metros abaixo do QG (Santa Luzia), de que nunca ouvimos falar;

(iii) refere o problema dos preços e do alegado racionamento de alguns bens essenciais como o arroz e o açúcar: já no meu tempo, em meados de 1969, em Bambadinca, o preço do arroz (comprado pela população) andava  à volta dos 6$00; o pré dos nossos soldados guineenses (600$00 + a diária para a alimentação, sendo desarranchados, 24$50) dava para eles compraram 2 sacos de 100 quilos de arroz (com que se podia alimentar uma família extensa e numerosa);

(iv) enfim, denuncia alguns casos (que naturalmente terão existido, pontuais)  de violência física e verbal contra a população civil de Bissau, já no tempo de Spínola...

Vamos lá a ver se há leitores que queiram cruzar,  com estas, as suas memórias de Bissau daquele tempo (1968/69).



ORGANIZAÇÃO, FORMAÇÃO POLÍTICA E IDEOLÓGICA
5-12-69

Audição de camaradas fugidos de Bubaque [folhas nºs, 13-16 ] 

(A láspis, no alto da folha nº 1, está escrito: "Informações recolhidas pelo camarada Vasco Cabral")

M.S.  [Marcos da Silva ]  - Depois do ataque do Partido a Bissau,  
[em fevereiro do ano passado,
muitos africnos em Bissau ficaram contentes com isso. Os colonialis-
tas reagiram violentamente no dia seguinte atacando algumas taban-
cas mais próximas do campo de aviação como as tabancas de Bis-
salanca e de Plaque. Fizeram-lhes de madrugada uma emboscada, 
tendo matado algumas pessoas, ferido outras, e prendido toda a popu-
lação restante. Mais tarde,vieram a soltar alguns presos, mas outros fi-
caram presos até lá até agora.

A partir desse ataque os tugas tomaram outras medidas: reforçaram
a vigilância; agora, a partir das 6h da tarde, dirigem-se para o cam-  



po de aviação 4 ou 5 camiões grandes Unimog 
[no original, Hanomag], 
 [cheios de soldados
e vigiam o campo até de manhã. De vez em quando efectuam bombar-
deamentos pelas redondezas. Minaram as imediações do campo. Puseram 
à volta do campo 2 filas de arame farpado que deve ser electrifica-
do, pois puseram avisos em que se diz: "Perigo de alta tensão!" - avis-
ando o povo para se manter afastado.

Com o ataque que se fez, ficaram destruídos aviões, hangares 
 [angares, no original]  uma parte 
importante da Central Elétrica, o que ocasionou falta de luz durante
1 dia.

A população de Bissau não se deixa influenciar pela popaganda do 
tuga de uma Guiné Melhor. Dizem que o Spínola segue uma política por


causa da guerra, mas sabem que a guerra não vai acabar,

Há em Bissau milhares de soldados. À  [há, no original] volta de Bissau  há
7 quartéis: o Quartel-General que está em Santa Luzia; há
uns 800 metros mais abaixo o Paiol de pólvora;  há o quartel
da Amura; o Batalhão de Serviço de Material perto da Amura;  em
Brá há o Quartel de Engenharia; há também em Brá mais 
dois quartéis: o de Comandos e um outro de Adidos. Há ainda
o Quartel dos Fuzileiros, ligado à ponte de Pidgiguiti.

Perto do campo de aviação há ainda 2 quartéis: o dos Páras e outro
da Força Aérea. Estes 2 quartéis estão dentro da cercadura de arame
farpado.

= Há bichas em Bissau para a compra de arroz e de carne. Isto acontece du-


rante todo o ano. O preço do arroz varia com frequência. O ano passado vendia-
-se a 5$60 / kg., agora custa 6$90/kg. Há grande falta de açúcar.

Estabelecem às vezes para a venda do arroz um contingente máximo de venda   
[avulsa
de 1 kg. Também para o açúcar estabelecem 250 gramas, por pessoa.  Mas  
[açúcar
falta âs vezes durante 15 dias ou mais.


Há dificuldades sanitárias grandes: em 1º lugar , às consultas; fazem-
se bichas para as consultas e há muita gente que não é atendida, às vezes
durante 1 mês; em 2º lugar quanto a medicamentos que faltam em grande
quantidade. Afirmam que os medicamenmtos são só para os militares.

Não há bichas para os europeus civis, é só para os africanos.

Também qanto às outras bichas, são só para os africanos, uma única


excepção do Serviço dos Correios, onde os europeus também entram nas bichas.

= Coisas que os soldados tugas dizem dos africanos abertamemte nas
ruas: "Barrote queimado", "saco de carvão", "nharro", "negro",
nas suas relações com os africanos.

De vez em quando os fuzileiros liquidam africanos. No Alto Crim
este ano mataram 4 mulheres, uma rapaz em Santa Luzia, 3 pessoas
(2 rapazes e 1 rapariga) na Avenida Gago Coutinho. Para isso fazem
provocações.

Este ano a 2 de Novembro houve um incidente no Alto Crim entre 
um fuzileiro e um rapaz africano. Este agrediu o fuzileiro. Então.
ele queixou-se no quartel dizendo que um terrorista o agredira. Mais



tarde mandaram do quartel um pelotão de soldados que incendiou
casas, bateram em várias pessoas e feriram outras.

Ha frequentemente incidentes entre a população e a tropa colonialista.
Há habitualmenmte cenas com as raparigas africanas que passam nas
ruas. Os soldados tentam beijá-las, como elas reagem, às vezes, batem-
-lhes. Quando os africanos se dirigem à Polícia, para se queixarem
de certos abusos dos europeus, a Polícia não liga, não toma nenhumas medidas.

= É proibido ouvir-se a nossa Rádio em Bissau. Mas há muita gente
que ouve. Um tio do camarada Conrado foi preso por estar a ouvir
a nossa Rádio, em Julho deste ano. Ainda está preso por isso.


Foram ouvidos os seguintes camaradas:
- Marcelino Banca
- Marcos da Silva
- José Albino Sonda

(Seleção, transcrição, fixação / revisão de texto, itálicos e negritos: LG. Observ: Mantivemos a ortografia usada por Vasco Cabral)
_________________

Citação:
(1969), "Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41391 (2024-1-16) (Com a devida vénia...)

Fonte: Casa Comum | Instituição: Fundação Mário Soares
Pasta: 07073.128.006 | 
Título: Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós. | Assunto: Informações de carácter militar, extraídas da audição com os "camaradas" vindos dos Bijagós, sobre Soga, Bubaque, Formosa, Uno, Caravela, Orango, Orangozinho, Canhabaque, Galinhas e Uracane. Organização e formação política e ideológica dos Bijagós, manuscritos por Vasco Cabral. | Data: Terça, 2 de Dezembro de 1969 | Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios 1965-1969. | Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral | Tipo Documental: Documentos.
___________

Nota do editor:

(*)Vd. último poste da série > 16 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25076: Memórias cruzadas: o que o PAIGC sabia sobre Bubaque, em 1969... "O antigo governador Schulz ia lá de vez em quando, com outros militares e algumas mulheres. O atual governador nunca lá esteve morado. Foi só visitar."...

terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25076: Memórias cruzadas: o que o PAIGC sabia sobre Bubaque, em 1969... "O antigo governador Schulz ia lá de vez em quando, com outros militares e algumas mulheres. O atual governador nunca lá esteve morado. Foi só visitar."...


Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > 1978  >  O "Palácio do Estado" (hoje, 2024, em completa ruína)... Edifício da época colonial, de arquitetura alemã,conhecido também como "Palácio do Governador"... Do lado esquerdo,  uma outra casa que terá sido construida, para efeito de lazer,  para os oficiais superiores portugueses...  ("Foto tirada pelo médico cirurgião Dr. Luís Tierno Bagulho em 1978, como cooperante, já falecido"). Cortesia de Patrício Ribeiro (*)


Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > O "Palácio do Estado" "ou "Palácio do Governador", hoje uma total ruina...


Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


ORGANIZAÇÃO, FORNAÇÃO POLÍTICA E IDEOLÓGICA
2-12-69
Audição de camaradas vindos de Bijagós
(A láspis,no alto da folha,está escrito: "Informações recolhidas pelo camarada Vasco Cabral")


(...) BUBAQUE não tem quartel. Tem lá padres italianos (2) e co-
merciantes cabo-verdianos, que são 4. Um deles, sabe-se de certeza
que é contra o Partido e está como empregado encarregado da
Casa Gouveia em Bubaque. A loja da Gouveia vende tecido, compra
coconote, compra óleo de palma. Vende também arroz.
 

Há 3 tugas que trabalham na fábrica de extração de óleo de 
palma. Esta fábrica pertenceu em tempos aos alemães. Esses
tugas estão armados com armas de defesa pessoal - pistolas.
Estão em Bubaque uns 10 cipaios que se enontram armados 
de carabinas Mauser, mas só usasm as armas em momentos
de serviço. O serviço de vigilância é montado poe 2 cipaios : um que circula 
na ilha eoutro que monta a guarda à Administração. Drante o
dia não usam armas no seu serviço. De noite usam as armas.
Por volta das 10h da noite o cipaio da guarda à Administração
custuma ir dormir. Mss o cipaio que vigia a iha faz  ua roda
até de manhã.

De uma maneira eral as pessoas da ilha são favoráveis ao Partido.







ORGANIZAÇÃO, FORNAÇÃO POLÍTICA E IDEOLÓGICA
3-12-69
Audição de camaradas vindos de Bijagós

(...) 2. BUBAQUE - Está contra o Partido um comerciante cabo-verdiano de     
[nome 
Juca Ferraz que pertence à Pide. Também pertence  à
à Pide um outro empregado cabo-verdiano de nome Alberto
dos Santos.

Cada cipaio trabalha 24 h seguidas: das 7h da manhã de um 
dia às 7h da manhã do dia seguinte.

As tabancas grandes têm um nº de pessoas que oscila



entre 600 e 1 000.

Há um outro elemento favorável ao Partido e que ouvia frequente-
mete as nossas emissões. Trata-se de Luís de Barros, empregado da Casa
Espinheiro [? ] .

Há carreiras turística de avião e de barco que vêm de Bissau para
gente visitar as praias ao fim de semana. Em geral, trata-se de oficiais do Exér-
cito português que aí vão com as suas famílias. Às vezes, alguns, aproveitando
o tempo de férias ou gozando um certo tempo de licença, permanecem 15 dias e
até um mês. Existe em construção ainda uma casa destinada a albergar esses
oficiais. Trata-se de um edifício em  3 blocos, cada um com uns 4 quartos,
o que perfaz um total de 12 quartos. Situa-se à beira-mar.

Há também cerca deste edifício a casa do Governador da Guiné que já
está pronta. Trata-se de uma casa grande com 4 grandes quartos, também


está na praia. O antigo governador Schultz  [sic, Schulz ]   ia lá 
de vez  em quando,
com outros militares e algumas mulheres. O atual governador nunca lá
esteve morado. Foi só visitar. (*)

Uns aspirantes [cadetes ] da Marinha, um grupo vindo 
de  Portugal,  comeram  lá perto por altu- 
ras do mês de março e abril. Comeram numa pensão à beira-mar que é des-
tinada aos turistas e que foi construída pelos alemães. Esta casa pertence
ao Estado, mas é explorada comercialmente por um tal Teodoro Romano Pe-
reira.  Há ainda mais 2 casas semelhantes a esta, que pertencem ao
Estado e onde moram os empregados portugueses da Fábrica de Extração de
Óleo de Palma, em nº de 3, havendo um outro ainda de nome Lourenço de Pina.

  [ Seleção, edição,  transcrição, revsão / fxação de texto, parênteses retos: LG ]

Citação:
(1969), "Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41391 (2024-1-16) (Com a devida vénia...)

Fonte: Casa Comum | Instituição: Fundação Mário Soares
Pasta: 07073.128.006 | 
Título: Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós. | Assunto: Informações de carácter militar, extraídas da audição com os "camaradas" vindos dos Bijagós, sobre Soga, Bubaque, Formosa, Uno, Caravela, Orango, Orangozinho, Canhabaque, Galinhas e Uracane. Organização e formação política e ideológica dos Bijagós, manuscritos por Vasco Cabral. | Data: Terça, 2 de Dezembro de 1969 | Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios 1965-1969. | Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral | Tipo Documental: Documentos.

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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 15 de janeiro de  2024 > Guiné 61/74 - P25073: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (32): Os encantos e os mistérios da ilha deBubaque (incluindo o "Palácio do Governador", hoje em total ruína, onde o PAIGC quis matar Spínola)

sexta-feira, 10 de junho de 2022

Guiné 61/74 - P23341: Notas de leitura (1454): “La fin de l’empire colonial portugais, Témoignages sur un dénouement tardif et tourmenté”, por Éric e Jeanne Makédonsky; L’Harmattan, 2018 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Setembro de 2019:

Queridos amigos,
O casal Éric e Jeanne Makédonsky dão como explicação de que este acervo apreciável de testemunhos recolhidos junto de intervenientes guineenses, cabo-verdianos e portugueses, entre 1980 e 1982, não foi publicado logo a seguir atendendo a que a aura de que a guerrilha guineense se cobrira de glória, no campo internacional, perdera-se, deixou de haver interesse em acompanhar o fenómeno revolucionário da Guiné-Bissau, entrara-se por um caminho sombrio, a própria investigação, que continuou a fazer-se, perdeu muito do interesse inicial. No entanto, a despeito de que todos estes testemunhos introduzam novidades de maior, a sequência cronológica como se estrutura a obra permite ao iniciado seguir a trama de forma sequencial, do princípio a uma quase atualidade. Tudo começou em estado de tormenta e em tormenta e profunda inquietação prossegue.

Um abraço do
Mário



Assitiram à independência da Guiné, décadas depois publicam livro (2)

Beja Santos

“La fin de l’empire colonial portugais, Témoignages sur un dénouement tardif et tourmenté”, por Éric e Jeanne Makédonsky, L’Harmattan, 2018, é uma obra que forçosamente nos surpreende. Marido e mulher eram jornalistas que permaneceram longamente no continente africano. E abrem o seu livro explicando porquê, só agora, dão à estampa os testemunhos que recolheram décadas atrás. Entenderam os autores que a guerrilha guineense em poucos anos perdeu o furor e o entusiasmo com que eram vistos pelo movimento revolucionário à escala mundial. No entanto, não quiseram deixar de contribuir para que a investigação sobre os acontecimentos relacionados com a independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde perdesse a possibilidade de conhecer os testemunhos de inúmeras personalidades intervenientes, do lado guineense, cabo-verdiano e português.

Após o testemunho dos guineenses (Nino, Paulo Correia, Vasco Cabral, Fidelis Cabral d’Almada) que dão conta da evolução da luta a partir de 1968, fica-se com uma apreciação do quadro político e militar até ao assassinato de Amílcar Cabral. É um dado curioso, atenda-se que estes testemunhos são recolhidos entre 1980 e 1982, do lado cabo-verdiano já há insinuações de compromisso guineense ao mais alto nível. Aristides Pereira chega a dizer quando foi raptado e metido numa lancha cuja marcha foi travada em Boké, ouviu elementos do complô referir nomes de altos dirigentes do PAIGC naturais da Guiné. Mas não diz quais. Refere a reação dos órgãos diretivos e a intensificação da luta. Pedro Pires enfatiza a preparação e execução da operação Amílcar Cabral e as consequências associadas aos mísseis Strela e ao uso de viaturas já no interior do território da Guiné para lançar mísseis sobre os quarteis. Pedro Pires recorda o pedido que fez a Aristides Pereira, então em tratamento em Moscovo, era necessário mais artilharia pesada, canhões 122, novas rampas de lançamento de mísseis GRAD e os temíveis morteiros de 120 milímetros, bem como canhões B10 e de 85 e 76 mm. O Conselho Executivo da Luta dera luz verde para uma ofensiva prevista para os meses de novembro e dezembro de 1974 com blindados T34 e BRDM, isto num quadro em que ainda se desconhecia qual seria a decisão da Organização de Unidade Africana, que tinha apelado à formação de um exército africano para expulsar as forças portuguesas.

Sobre as mesmas matérias do assassinato e da reação político-militar do assassinato de Amílcar Cabral, depõem José Araújo, Manuel dos Santos, Osvaldo Lopes da Silva, entre outros. E seguem-se os testemunhos guineenses de Nino, Vasco Cabral e Fidelis Cabral d’Almada. Uns atribuem o complô a quadros que se tinham marginalizado e que até viviam do roubo, há também quem atribua um papel relevante a Momo Touré e Aristides Barbosa, na época era uma acusação que parecia vingar, ainda não se sopesara tal inviabilidade quando o complô, como se veio a apurar, envolvera centenas de participantes de diferentes perfis. Do lado português irão depor Carlos Fabião, Otelo Saraiva de Carvalho e Carlos Matos Gomes. Fabião nega perentoriamente qualquer envolvimento de Spínola ou das Forças Armadas, mas fica a pairar no ar a possibilidade de uma intervenção completamente fora das regras clássicas de Alpoim Calvão, que ao tempo dirigia um discreto serviço de informações em Lisboa. Mas não exclui uma intervenção da PIDE, a título meramente institucional. Otelo também se mostra persuadido da intervenção da PIDE e recorda que encontrou Alpoim Calvão em Bissau em dezembro de 1972. À distância destes anos todos, estes depoimentos revelam-se profundamente datados, presunções sem mostra de prova.

Chegamos ao 25 de Abril, há um conjunto de depoimentos sobre o que era possível fazer de descolonização da Guiné, como se atuou em 25 de Abril, como se abriram conversações com o PAIGC, etc. Obviamente que os testemunhos cabo-verdianos remetem-nos para a realidade do envio de quadros para Cabo Verde, o modo como tal se processou é contado por Aristides Pereira, Pedro Pires, José Araújo, Silvino da Luz, Osvaldo Lopes da Silva, Julinho e Corsino Tolentino. Do lado guineense, Juvêncio Gomes confirma um depoimento que deu igualmente noutros locais sobre o seu papel de primeiro interlocutor do PAIGC após o 25 de Abril.

Insiste-se que a generalidade destes depoimentos não se reveste de aspetos inovadores. Nino Vieira, a propósito do golpe de 14 de novembro de 1980, repete que existia um quadro persecutório cabo-verdiano e que eram humilhantes para os guineenses os contextos institucionais existentes em Cabo Verde que inferiorizavam a Guiné, segundo Nino, Luís Cabral estava incapaz de ler a realidade. A linha guineense, caso de Fidelis Cabral d’ Almada, não deixará de referir os excessos da polícia de segurança, que gradualmente se tornou um Estado dentro do Estado. Dá-nos um quadro alucinante de uma pseudo insurreição dos antigos Comandos africanos, quando eles vieram do Senegal, aonde se tinham refugiado, apareceram praticamente sem qualquer armamento, quem os chamara dissera que vinham para apoiar Nino para fazer parte de um grande exército nacional, foram presos pela segurança e mais tarde executados.

No final desta recolha de depoimentos e dado que a sua publicação ocorreu em 2018, os autores dão-nos conta do que se passou com todos estes protagonistas: 

  • Fidelis Cabral d’Almada, Ministro da Justiça após o golpe de 14 de novembro de 1980, depois Ministro de Estado na Presidência, deixou a esfera pública em 1996 para se dedicar aos negócios, faleceu em 2002; 
  • José Araújo manteve-se em Bissau até ao golpe de 14 de novembro de 1980, foi para Cabo Verde onde seria Ministro da Educação, faleceu em 1982; 
  • Vasco Cabral manteve-se em funções governativas depois da rutura entre a Guiné e Cabo Verde, já faleceu;
  • Vítor Saúde Maria foi várias vezes ministro, será nomeado Secretário Permanente do PAIGC e membro do Conselho de Estado, faleceu em 2009; 
  • Paulo Correia irá ocupar altos cargos e será detido em 1986 acusado de tentativa de golpe de Estado, sujeito a espancamentos e depois fuzilado; 
  • Juvêncio Gomes será afastado do cargo de Presidente da Câmara Municipal de Bissau após o golpe de 14 de novembro, será depois recuperado e exercerá funções de responsabilidade, incluindo o Ministério do Interior, faleceu em 2016; 
  • Manuel dos Santos (também chamado Manecas) ficará na Guiné-Bissau depois do golpe de Estado e será várias vezes ministro, dedicar-se-á mais tarde aos seus negócios; não deixará de publicamente se insurgir quanto às pensões de miséria dos antigos combatentes, dando o exemplo de um velho combatente, com deficiência, não recebia mais de 21 euros de pensão; 
  • o destino de Nino é bem conhecido, irá gradualmente proceder como um ditador, será afastado do poder após o conflito político-militar de 1998-1999, para espanto geral regressa do exílio português e apresenta-se como candidato presidencial, será eleito, irá entrar em conflito frontal com as chefias militares, será acusado de ter mandado liquidar Tagmé Na Waié e em sua sequência, em março de 2009, morto em sua casa, de forma bárbara.

Reconheça-se que o trabalho de Éric e Jeanne Makédonsky merece realce relativamente à cronologia dos acontecimentos desde a era das independências africanas até ao período pós-independência da Guiné e Cabo Verde. São relatos após a recente rutura entre a Guiné e Cabo Verde, há, como é evidente, alguns indícios de ressentimentos, mas no essencial os testemunhos guineenses e cabo-verdianos mantiveram consistência ao longo de décadas.

Éric Makédonsky
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Nota do editor

Último poste da série de 6 DE JUNHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23331: Notas de leitura (1453): “La fin de l’empire colonial portugais, Témoignages sur un dénouement tardif et tourmenté”, por Éric e Jeanne Makédonsky; L’Harmattan, 2018 (1) (Mário Beja Santos)

domingo, 22 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23284: Documentos (39): Amílcar Cabral, a "honra militar" e o assassinato dos 3 majores e seus acompanhantes, no chão manjaco, em 20/4/1970: acta (informal) do Conselho de Guerra do PAIGC, Conacri, 11 de maio de 1970, um "documento para a história"


Guiné-Bissau > Bissau > Restaurante Colete Encarnado > 21 de Abril de 2006 > O nossso camarada e amigo coronel inf DFA,  ref, A. Marques Lopes  (à direita), jantando com o "inimigo de ontem", comandante Lúcio Soares e o comandante Braima Dakar. Sobre este último acrescentou: "O Braima Dakar, nome de guerra de Braima Camará, numa das fotografias, é outro comandante que esteve ligado à morte dos três majores em chão manjaco. Disse-me que se disseram muitas coisas sobre isso que não são verdade, que não queria falar, e não me contou nada" (...) (*) 

Foto (e legenda): © Xico Allen (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Capa da ata (informal da Reunião do Conselho de Guerra do PAIGC, Conacri, que teve início em 11 de maio de 1970 e onde se aborda o assassínio dos 3 majores e seus acompanhantes, em 20 de abril de 1970, entre Jolmente e Pelundo (chão manjaco).


1. A Acta da Reunião do Conselho de Guerra (Alargado),  do PAIGC, Conacri, 11 de maio de 1970, ou pelo menos as suas cinco primeiras páginas de um total de 25, é um "documento para a História"...  Daí dever ser conhecida, ou melhor conhecida, pelos nossos leitores. E comentada, com a necessária distância e capacidade crítica...

Ficamos  a saber que Amílcar Cabral, pessoalmente, deu o seu OK ao assassinato ("liquidação") dos três majores e seus acompanhantes, perpretado em 20 de abril de 1970, fez agora 52 anos.  Não sabemos se os queria ver mortos ou apenas aprisiononados, até por que havia a perspetiva de o PAIGC  "fazer bingo": apanhar também o Spínola!... A acta não é inteiramente inclusiva: Amílcar Cabral "deu o seu acordo à proposta, mas pediu que agíssemos depressa" (sic). Há dúvidas sobre donde a ordem, de Dacar ou de Conacri. Talvez os biógrafos de Amílcar Cabral tenham mais elementos, que eu não tenho, agora, aqui à mão.

Entre 0s presentes nesta reunião do Conselho de Guerra estavam estavam três homens que estariam, também, mais tarde envolvidos no seu (dele, Amílcar Cabral) assassinado em 20 de janeiro de 1972 em Conacri pelos seus homens: Mamadu Indjai, seguramente, mas também, como suspeitos ou cumplíces,  Osvaldo Vieira e até o próprio 'Nino' Vieira (seu primo). 

Mamadu Indjai será condenado à morte e fuzilado, injustamente ou não, o  Osvaldo e o 'Nino' levaram para a cova este segredo (o seu eventual envolvimento no complô contra o "pai da Pátria"), bem como muitos outros segredos...

Não sabemos se houve emoção, ódio ou raiva na intervenção do Amílcar Cabral, muitas vezes considerado o "Che" Guevara africano, o revolucionário romântico... Para alguns de nós, a sua máscara caiu aqui (foi o meu caso, estava na Guiné em abril de 1970, e perdi todas as ilusões sobre aquela maldita guerra  ao fim de um duríssimo ano de atividade operacional, mas confesso que, em Bambadinca, em leno mato, em abril d 1970 sabia-se muito poucos pormenores sobre o que acontecera, e a censura, por sua vez, não deuixou que trabsparecesse nada nos jornais da metrópole, para além da seca notícia necrológica das Forças Armadas)... 

Cinismo, sim. Silêncio, sim. Dificulade em assumir a "barbaridade" de um acto destes, o assassínio de sete inimigos, sete homens, indefesos, desarmados..., contra todos os códigos de ética da guerra e da guerrilha... 

E  branqueamento das profundas divisões que já afetavam o PAIGC (e de alguns dos seus fracassos dois anos depois da chegada de Spínola). Cinismo típico d0s revolucionários (e contra-revolucionários), homens e mulheres, ideólogos, políticos e militares, formatados pelo "pensamento único",  para quem  os fins justificam os meios... Por isso, conceitos como "honra militar", "código de ético", "direitos humanos", "compaixão",  "convenções de Genebra", etc., não existem. 

Os nossos camaradas Jorge Picado (JP) e Jorge Araújo (JA) tiveram a trabalheira e a santa paciência de ler e retranscrever esta minuta de ata, em postes publicados há uns anos atrás: P12704 de 10 de fevereiro de 2014 (*), e P20891, de 23 de abril de 2020 (**).

A ata, manuscrita, foi redigida por Vasco Cabral (Farim, 1926 — Bissau, 2005) (mais tarde ministro da Economia e das Finanças, ministro da Justiça e vice-presidente da Guiné-Bissau, e que ficará na história como sofrível poeta bilingue,   tendo conhecido as prisões políticas de Salazar e não não tinha qualquer relação de parentesco com o líder Amílcar Cabral nem com o Luís Cabral).

No documento o secretário do Conselho de Guerra (o único, presente, com estudos universários completos,  para além de Amílar Cabral)  usa muito as abreviaturas, que se procurou manter, completando-as. Vê-se que tinha treino a minutar atas de reuniões do Partido.

Uma ou outra gralha, de pequena monta,  na fixação e revisão do texto, tanto na versão de JP como na de JA, leveram-nos a fundir os  dois trabalhos. Optámos por manter as preciosas notas de JP e JA, relativamente aos nomes que são referidos na ata. Ajudam a torná-la mais legível, sem perder a preocupação de rigor. (Uma das gralhas tem graça: o Braima Dakar não exigiu aos "tugas" a libertação do seu "país", mas sim tão apenas do seu "pai"; outra, com piada, foi a troca de "track", panfleto, por "pacto"...).


2. Transcrição da intervenção do Secretário Geral do PAIGC, Amílcar Cabral (1924-1973), manuscrita por Vasco Cabral (1926-2005), secretário da reunião do Conselho de Guerra. realizada em Conacri, de 11 a 13 de Maio de 1970.





“S[ecretário] G[eral] : 

Saúdo os  cam[aradas] . É com o máximo prazer que fiz esta  r[eunião]  que, desta vez, é em Conacri, para variar. 

Desde a última reunião do B[ureau] P[olítico] até esta, a luta já mudou bastante. A Leste é uma mudança constante. Por ex., fomos capazes de atacar Mansoa e Bissorã, com novas armas. 

Nesta altura, a posição do inimigo é diferente. O inimigo deve estar a pensar o que deve fazer para evitar os n[ossos] ataques aos centros urbanos. Conseguimos fazer causar ao inimigo, em todas as frentes, um choque psicológico bastante grande. Conseguimos anular a tentativa do inimigo de desorientar as nossas populações.

A situação mudou também por causa da acção levada a cabo no Norte contra alguns oficiais superiores, em conseq[uência] da acção combinada das n[ossas] forças armadas, da segurança e da Dir[ecção] do P[artido].

A liquidação dos três majores, um alferes e alguns outros elementos (segundo alguns cam[aradas] - um capitão e um Chefe da PIDE) [1]  mostrou que era falsa a propaganda dos tugas [2] de que estavam à vontade na n[ossa] terra e Por outro lado, os tugas estavam convencidos de que conseguiam comprar a n[ossa] gente.

Toda a política de Spínola [3], em conseq[uência] destas n[ossas] acções, está posta em causa. E para toda a gente, tanto dentro como fora da n[ossa] terra, o n[osso] prestígio aumentou bastante e até para o n[osso] inimigo. Sobretudo esta liquidação dos oficiais superiores, contribuiu para isso. 

O tuga pensava antes que nós todos éramos cachorros. O tuga agora já se convenceu do contrário. Isso aumentou a n[ossa] dignidade, a n[ossa] importância aos olhos do próprio inimigo.

Os nossos cam[aradas] foram capazes de enganar, discutir com eles, convencê-los, apesar da sua imensa experiência e capacidade e liquidá-los...

A situação hoje é diferente da altura em que fizemos a r[eunião] em Boké  [4]. Os n[ossos] cam[aradas] deram provas de capacidade. Nesta luta, como costumamos dizer, tudo é possível. Conseguimos levar armas pesadas do Sul para o Norte, quase sem perdas: perdemos dois  cam[aradas] e três armas. Os  n[ossos] cam[aradas] foram capazes de enganar, discutir com eles, convencê-los, apesar da sua imensa experiência e capacidade e liquidá-los.

No intervalo da reunião de Boké para este, um ponto importante da n[ossa] terra que é o Kebo [5] foi atacado diversas vezes. Isto é t[tam]b[ém] importante. Sobre a passagem de armas do Sul para o Norte [6].

Através [de] certos cam[aradas] que estão em Canchungo  [7]. , os tugas tentaram ligações com eles, com vistas a desmobilizar a n[ossa] gente. Tentaram, servindo-se de elementos do FLING [8], portanto a um nível mais baixo, desmobilizar a n[ossa] gente. Sem resultados. 

As conseq[uências] foram a prisão de quatro dirigentes da FLING. Tentaram contactar Albino, Braima Dakar [9] e outros. E na região de Quínara. E t[tam]b[ém] com gente na periferia da n[ossa] luta: Laí, Pinto e João Cabral.

Tentaram a ligação com André Gomes  [10] e Quintino   [11]. Eles avisaram a Dir[ecção] do P[artido], para a interrogar. André Gomes deu mais uma prova de confiança ao P[artido]. Ele mesmo supunha que os tugas queriam desertar. Só depois é que se viu que o [que] queriam [era] desmobilizar a n[ossa] gente. 

O S [ecretárioi] G [eral deu o seu acordo à proposta, mas pediu que agíssemos depressa.

Luís Correia [12], pôs-se, por sua própria iniciativa, em contacto com os cam[camaradas] da zona. Lúcio Tombô [13] t[am]b[ém]  foi  envolvido na combinação. Ele pôs-se em contacto com os tugas, mas quem devia falar era Braima Dakar que jogou um papel de defesa do P[artido].

Os tugas escreveram cartas amáveis e respeitosas aos cam[aradas], num grande namoro. Deram-lhes grandes presentes. Propunham que os guineenses deviam ir substituir os cabo-verdianos, de quem já tinham feito uma lista negra de 30 e que deviam ceder os seus lugares a guineenses. Deram presentes vários: conhaque, whisky, rádios, relógios, panos para as mulheres, cigarros bons, etc.

Encontraram-se cinco vezes [13] Na quarta vez esteve presente o Governador, que apertou a mão, tirando a luva, do n[osso] cam[arada] André Gomes. (Amílcar lê uma das cartas de um major, Pereira da Silva, a André Gomes.)

No dia do encontro deviam vir os n[ossos] cam[aradas] chefes e estava prevista a vinda do próprio Governador. Os cam[aradas] vieram de facto acompanhados das suas armas. Apareceu mesmo o Luís Correia e eles já sabiam da sua presença. Para não desconfiarem, disseram-lhes que o Luís Correia estava presente e era um alto resp[onsável] do P[artido]. Durante as conversações com os tugas, foi decidido pararem os bombardeamentos aéreos, e os combates. Isso aconteceu de facto: os nossos camar[adas] pararam também certas regiõs. (Amílcar lê uma outra carta do Major Mosca) [14].


Durante as conversas, Braima Dakar, aproveitou para fazer certas exigências. Pediu a libertação de seu pai, a libertação de 2 cam[aradas] (Claude e José Sanhá) [15]  e foram mesmo soltos (já cá estão).

Durante as tréguas, os cam[aradas] levantaram minas na estrada de Bula-Binar. Mesmo assim, houve uma emboscada em Biambi, aos tugas, na qual, segundo  uma carta apanhada, de um dos majores, afirmam que morreram quatro tugas 
[16].

Também dão notícia dos ferimentos graves que sofreu um capitão que estivera com eles numa reunião, ao tentar detectar minas: perdeu um braço e uma das vistas [17].

Salienta ainda o facto de ter havido nas nossas bases, vários cam [aradas] que começavam a protestar contra as ligações que estavam a ver com os tugas. Alguns disseram que se isso continuasse se iam embora. Isto é t[am]b[ém]  uma coisa muito importante, porque mostra a fidelidade desses cam[aradas ao P[artido] (eles não estavam ao corrente das coisas).

Nino – Saliente a import[ância] de os n[ossos] cam[aradas] terem levado à certa grandes homens dos tugas. Isso foi porque os tugas nos consideram como cachorros. Os tugas sentem hoje qual é a n[ossa] força, tanto moral como política.

Amílcar – Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos n[ossos] cam[aradas] do Norte. É a primeira vez que numa luta de libertação nacional se mata assim 3 majores, 3 oficiais superiores que, nas condições da n[ossa] luta, equivale de facto à morte de generais.



Capa da Revista Militar, nº 4, abril de 1970


Refere o artigo de Felgas [18] na Rev[ista]   Militar [19] que, no fundo, é um grande elogio ao PAIGC. Diz algumas das suas observações a nosso respeito. Talvez que os tugas vão desenvolver uma acção de grande envergadura e de repressão.

Depois do acontecimento [20], publicaram um tract [21] ao qual propunham mais contactos com os  n[ossos] militares,  mas não onde se realizaram [22] mais em Canchungo e em Pelundo.

Dizem que os n[ossos] militares não cumpriram os preceitos de honra militar. Mas que eles cumprirão no futuro os deveres de honra militar. Eles afirmam que querem o fim da guerra. 

T[am]b[ém] as populações de certas zonas (Mansoa, por exemplo) estão bastante influenciadas pela realidade, pela utilização de novas armas. Dizem por exemplo: "agora, mama acabou" (querendo significar que já não há protecção junto dos tugas nas cidades). 

Apela aos camar[adas] para terem iniciativas, pensarem profunda[mente] nos problemas, criarem, conhecerem bem cada um dos seus homens.

Anuncia os problemas que vão a seguir ser discutidos (Ordem de trabalhos). (...)

 [A transcrição das 5 prineiras páginas de um total de  25, a revisão e fixação de texto, bem como as notas, são da responsabilidade de Jorge Picado, Jorge Araújo e Luis Graça. Os negritos são de LG. ]

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Notas de Jorge Picado (JP), Jorge Araújo (JA) ou Luís Graça:

[1] Não havia outros ofciais, mas sim mais 3 guineenses. Se algum era da PIDE, desconheço. JP.

[2] Tuga: termo depreciativo para designar os Portugueses. JP.

[3] Gen António Spinola (1910-1997): Com-Chefe e Governador Geral da Guiné (1968-1973)- JP/JA. Sabe-se que, contrariamente à sua vontade, não compareceu a este encontro fatal, por conselho do secretário-geral da província, ten-cor Pedro Cardoso, que recebia em primeira mão as informações da PIDE. LG.

 [4] Importante base do PAIGC em território da Guiné-Conacri, a sul, importantíssima para a logística da guerrilha e para o apoio, nomeadamente, médico-hospitalar da guerrilha.  LG.

[5] Kebo, Quebo, Aldeia Formosa, no sul da Guiné, junto à fronteira com a Guiné-Conacri. LG.

[6] A frase parece estar incompleta... LG.

[7] Canchungo, Teixeira Pinto: coração do chão manjaco. LG.

[8] FLING: Frente de Libertação para a Independência Nacional da Guiné, fundada em Dakar-Senegal em 1962, opositora do PAIGC. JP.

[9] Braima Dakar: era um dos dois componentes do Comando Geral da Zona Biambi-Naga-Bula fazendo também parte do Comando Conjunto da Frente Biamb-Canchung. JP.  Nome de guerra de Braima Camará: vd. foto acima, Bissau, 2006.  Temos a informação de que já faleceu há anos. Terá sido ele a levar, até  Conacri, como "despojos de guerra", os galões dos quatro oficiais assassinados, os 3 majores e o alferes... LG.

[10] André Pedro Gomes: era um dos três responsáveis pela Zona de Nhacra, um dos três componentes do Comando Conjunto da Frente Nhacra-Morés, um dos vinte e três  componentes do Comité Executivo da Luta (CEL) e por inerência também um dos componentes do Conselho Superior da Luta (CSL).

Em 17 de Fevereiro de 1968, terá sido ele a chefiar o comando que flagelou, com foguetes (Katiusha), o aeroporto de Bissau. Em 1972 era um homem da inteira confiança de Amílcar Cabral, membro do Comité Executivo da Luta e Comandante da frente Nhacra – Morés.

Será mais tarde um dos braços direitos de Buscardini. Em 31 de Dezembro de 1980, um mês e meio depois do golpe de Estado de 14 de mobembro de 1980, o Nô Pintcha noticiava o seu "suicídio" na prisão... 

[11] Quintino (Vieira) era o responsável pela Segurança e Controle (SC) do Sector Autónomo de Canchungo no Comité Regional da Região Libertada a Norte do Geba (CRRLNG) e por inerência igualmente membro do Comité Nacional da Região libertada a Norte do Geba (CNRLNG)]. JP.

[12] Luís Correia era responsável pela Segurança e Controlo (SC) do Sector do Oio no CRRLNG e igualmente do CNRLNG, além de membro do CSL e creio também do CEL, JP.

[13] Lúcio Tombom, um dos comandos da Zona de BULA. JP.

[14] o PAIGC e o Amílcar Cabral nunca foram bons em números: os encontros dos "negociadores  portugeses"  com os homens de André Gome foram nove (9) ou dez (10), conformeas fontes  e não 5 (cinco). LG.

[14] João Mosca era alf mil cav, não major. JP.

[15] José Sanhá: antes de 1964 já comandava guerrilheiros numa Zona do Norte e depois de libertado foi novamente integrado pelos responsáveis da Frente Biambi-Canchungo, sem que tivessem consultado a Direcção do Partido, acto entretanto criticado pelo S.G. na reunião alargada da Direcção Superior que teve lugar em Conacri de 12 a 15 de abril de 1970 e onde foi apresentada e aprovada uma nova Estrutura do Partido e onde este elemento em causa foi confirmado como um dos comandantes da Zona de Biambi, da Frente Biambi-Canchungo. JP,

[16] Será que se referem a: António da Silva Capela e Henrique Ferreira da Anunciação Costa, da CCAV 2487, em 18Out69; e Joaquim José Ramalho Rei e Manuel Domingos Martins, da CCAV 2525, em 07Dez69]? JA. 

De todo improvável, acrescenta LG: as "negociações secretas" dos homens do CAOP1 terão começado em fevereiro de 1970...

[
17] José Paulo [Abreu Nogueira] Pestana (então capitão da CCAÇ 2466/BCAÇ 2861), "foi ele que mais tarde foi substituir o capitão [José Júlio da Silva de] Santana Pereira [CCAÇ 2367/BCAÇ 2845], ferido com uma mina antipessoal na zona de Có-Pelundo, onde se construía uma estrada entre Bula e Teixeira Pinto. Nunca podíamos descurar as minas colocadas nos trilhos, que já haviam vitimado um alferes (José Manuel Brandão, da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892, em 02Mar70) e ferido o capitão". - in https://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/conheci-os-tres-majores-assassinados (04Jan2009), com a devida vénia. JA.

[18] Cor inf Hélio Esteves Felgas (1920-2008). JA. ntigo coamndante do Comando de Agrupamento 2957, Bafatá, 1968/70.

[19] Revista Militar, n.º 4 – Abril de 1970, " A luta na Guiné", pp. 219-236. JA / LG

[20] Referência à liquidação dos três majores e seus acompanhantes, em 20 de abril de 1970

[21] Tract (sic), em inglês: panfleto.

[22] Refência aos anteriores encontros
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Fonte:

Citação:
(1970-1970), "Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34125 (2022-5-22)

Instituição: Fundação Mário Soares | Pasta: 07073.129.004 | Título: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry | Assunto: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra, em 11 e 13 de Maio de 1970, manuscrita por Vasco Cabral. | Membros Presentes: Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Luís Cabral, João Bernardo Vieira (Nino), Osvaldo Vieira, Francisco Mendes, Pedro Pires, Paulo Correia, Mamadu N'Djai [Indjai], Osvaldo Silva, Suleimane N'Djai. | Secretário: Vasco Cabral.
Data: Segunda, 11 de Maio de 1970 – Quarta, 13 de Maio de 1970. | Observações: Doc incluído no dossier intitulado Relatórios: 1960-1970. | Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral.
Tipo Documental: ACTAS

(Com a devida vénia...)
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Notas do editor:

(**) Vd. poste de 23 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20891: (D)o outro lado do combate (59): A morte dos três majores no chão manjaco, em 20/4/1970, e a intervenção de Amíclar Cabral, três semanas depois, na reunião do Conselho de Guerra (Jorge Araújo)