segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12704: A guerra vista do outro lado... Explorando o Arquivo Amílcar Cabral / Casa Comum (10): O massacre do chão manjaco: acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry, de 11 a 13/5/1970: Transcrição, fixação de texto e notas de Jorge Picado

1. Mensagem,  enviada com data de 28 de janeiro último, pelo Jorge Picado [, foto à direita: ex-cap mil,  CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72 . . aos 32 anos, pai de 4 filhos, engenheiro agrónomo, ilhavense]:
Amigo Luís

[...] Olha, quanto às minhas pesquisas que vou fazendo,  sempre que posso,  no Arquivo Amílcar Cabral, descobri numa acta de um Conselho de Guerra as referências do PAIGC ao caso dos "3 Majores e do Alf Mil Mosca".

Não sei é retirar para publicação as referências.

Lê e vê se tem algum interesse. Entre parenteses rectos estão achegas pessoais que fiz. Jorge Picado


2. Reprodução, com a devida vénia, do documento Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry. 

 Transcrição, fixação de texto e notas pessoais [, dentro de parênteses retos, em itálicos] de Jorge Picado, que, como se sabe, também foi oficial do CAOP1, tal como os malogrados  Major Magalhães Osório, Major Passos Ramos, Major Pereira da Silva e Alferes Mosca


Para ver e ampliar o original, clicar aqui:

Conselho de Guerra: reuniões de 11-05-1970 a 1 13-05-1970: Acta das Sessões  (25 pp.)

Casa Comum

Instituição: Fundação Mário Soares

Pasta: 07073.129.004

Título: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry

Assunto: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra, de 11 a 13 de Maio de 1970, manuscrita por Vasco Cabral. Membros Presentes: Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Luís Cabral, João Bernardo Vieira (Nino), Osvaldo Vieira, Francisco Mendes, Pedro Pires, Paulo Correia, Mamadu N'Djai, Osvaldo Silva, Suleimane N'Djai 

Secretário: Vasco Cabral

Data: Segunda, 11 de Maio de 1970 - Quarta, 13 de Maio de 1970

Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios 1960-1970.

Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral

Tipo Documental: ACTAS

Direitos: A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora.

Citação:
(1970-1970), "Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34125 (2014-2-9)


“S. G. [Secretário Geral, Amílcar Cabral]- … A situação mudou também por causa da acção levada a cabo no Norte contra alguns oficiais superiores, em conseq[uência] da acção combinada das n[ossas] forças armadas, da segurança e da Dir[ecção] do P[artido]. 

A liquidação dos 3 majores, 1 Alferes e alguns outros elementos (2.º alguns cam[aradas] - um capitão e um Chefe da PIDE) [Não havia outros Of, mas sim mais 3 guineenses. Se algum era da PIDE, desconheço.], mostrou que era falsa a propaganda dos tugas [termo depreciativo para designar os Portugueses] de que estavam à vontade na n[ossa] terra e Por outro lado, os tugas estavam convencidos de que conseguiam comprar a n[ossa] gente. 

Toda a política de Spínola [COMCHEFE e GG], em conseq[uência] destas n[ossas] acções, está posta em causa. E para toda a gente, tanto dentro como fora da n[ossa] terra, o n[osso] prestígio aumentou bastante e até para o n[osso] inimigo. Sobretudo esta liquidação dos oficiais superiores, contribuiu para isso. O tuga, o Português, pensava antes que nós todos éramos cachorros. O tuga agora já se convenceu do contrário… Os nossos cam[aradas] foram capazes de enganar, discutir com eles, convencê-los, apesar da sua imensa experiência e capacidade e liquidá-los... 

Através [de] certos cam[aradas] que estão em CANCHUNGO, os tugas tentaram ligações com eles, com vistas a desmobilizar a n[ossa] gente. Tentaram, servindo-se de elementos do Fling [Frente de Libertação para a Independência Nacional da Guiné, fundada em Dakar-Senegal em 1962, opositora do PAIGC], portanto a um nível mais baixo, desmobilizar a n[ossa] gente. Sem resultados. As conseq[uências] foram a prisão de 4 dirigentes do Fling. Tentaram contactar Albino, Braima Dakar [Era um dos 2 componente do Comando Geral da Zona BIAMBI-NAGA-BULA, fazendo também parte do Comando Conjunto da Frente BIAMBI-CANCHUNGO] e outros. E na região de Quínara. E tb [também] com gente na periferia da n[ossa] luta: Laí, Pinto e João Cabral. 

Tentaram a ligação com André Gomes e Quintino [O 1.º era um dos 3 responsáveis pela Zona de NHACRA, um dos 3 componentes do Comando Conjunto da Frente NHACRA-MORÉS, um dos 23 componentes do Comité Executivo da Luta (CEL) e por inerência também um dos componentes do Conselho Superior da Luta (CSL). O 2.º, Quintino (Vieira), era o responsável pela Segurança e Controle (SC) do Sector Autónomo de CANCHUNGO, no Comité Regional da Região Libertada a Norte do Geba (CRRLNG) e por inerência igualmente membro do Comité Nacional da Região libertada a Norte do Geba (CNRLNG)].

 Eles avisaram a Dir[ecção] do P[artido], para a interrogar. André Gomes deu mais uma prova de confiança ao P[artido]. Ele mesmo supunha que os tugas queriam desertar. Só depois é que se viu que o [que] queriam [era] desmobilizar a n[ossa] gente. O S.G. [ Secretárioi Geral, Amílcar Cabral] deu o seu acordo à proposta, mas pediu que agíssemos depressa.

 Luís Correia [Responsável pela SC do Sector do OIO no CRRLNG e igualmente do CNRLNG, além de membro do CSL e creio também do CEL], pôs-se, por sua própria iniciativa, em contacto com os cam. [camaradas] da zona. Lúcio Tombô [Ou Tombon, um dos comandos da Zona de BULA] tb [também] foi envolvido na combinação. Ele pôs-se em contacto com os tugas, mas quem devia falar era Braima Dakar que jogou um papel de defesa do P[artido]. 

Os tugas escreveram cartas amáveis e respeitosas aos cam[aradas], num grande namoro. Deram-lhes grandes presentes. Propunham que os guineenses deviam ir substituir os cabo-verdianos, de quem já tinham feito uma lista negra de 30 e que deviam ceder os seus lugares a guineenses. Deram presentes vários: conhaque, whisky, rádios, relógios, panos para as mulheres, cigarros bons, etc. Encontraram-se 5 vezes. Na 4.º vez esteve presente o Governador, que apertou a mão, tirando a luva, do n[osso] cam[arada] André Gomes. (Amílcar lê uma das cartas de um major, Pereira da Silva, a André Gomes). 

No dia do encontro deviam vir os n[ossos] cam[aradas] chefes e estava prevista a vinda do próprio Governador. Os cam[aradas] vieram de facto acompanhados das suas armas. Apareceu mesmo o Luís Correia e eles já sabiam da sua presença. Para não desconfiarem, disseram-lhes que o Luís Correia estava presente e era um alto dirig[ente] do P[artido]. Durante as conversações com os tugas, foi decidido pararem os bombardeamentos aéreos, e os combates. Isso aconteceu de facto: os nossos camar[adas] pararam também certas acções. (Amílcar lê uma outra carta do Major Mosca). [Mosca não era Maj, mas sim Alf Mil]. 

Durante as conversas, Braima Dakar, aproveitou para fazer certas exigências. Pediu a libertação de seu pai, a libertação de 2 cam[aradas] (Claude e José Sanhá) [Este 2.º elemento, antes de 1964 já comandava guerrilheiros numa Zona do Norte e depois de libertado foi novamente integrado pelos responsáveis da Frente BIAMBI-CANCHUNGO, sem que tivessem consultado a Direcção do Partido, acto entretanto criticado pelo S.G. na reunião alargada da Direcção Superior que teve lugar em Conakry de 12 a 15ABR70 e onde foi apresentada e aprovada uma nova Estrutura do Partido e onde este elemento em causa foi confirmado como um dos comandantes da Zona de BIAMBI, da Frente BIAMBI-CANCHUNGO] e foram mesmo soltos (já cá estão). 

Durante as tréguas, os cam [aradas] levantaram minas na estrada de Bula-Binar. Mesmo assim, houve uma emboscada em Biambi, aos tugas, na qual, 2.º uma carta apanhada, de um dos majores, afirmam que morreram 4 tugas. Também dão notícia dos ferimentos graves que sofreu um capitão que estivera com eles numa reunião, ao tentar detectar minas: perdeu um braço e uma das vistas. Salienta ainda o facto de ter havido nas nossas bases, vários camaradas que começavam a protestar contra as ligações que estavam a ver com os tugas. Alguns disseram que se isso continuasse se iam embora. Isto é tb [também] uma coisa muito importante, porque mostra a fidelidade desses cam[aradas ao P[artido] (eles não estavam ao corrente das coisas).

Nino – Saliente a import[ância] de os n[ossos] cam[aradas] terem levado à certa grandes homens dos tugas. Isso foi porque os tugas nos consideram como cachorros. Os tugas sentem hoje qual é a n[ossa] força, tanto moral como política.

Amílcar – Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos n[ossos] cam[aradas] do Norte. É a 1.ª vez que numa luta de libertação nacional se mata assim 3 majores, 3 oficiais superiores que, nas condições da n[ossa]  luta, equivale de facto à morte de generais…“.


3. Esclarecimento posterior do Jorge Picado [12 fev 2014, 23:18]


Amigo Luís:

Sobre o conteúdo transcrito nas actas desse Conselho de Guerra, apenas encontrei motivo de interesse nessa parte que transcrevi sobre o caso dos "3 Majores e do Alf Mil do CAOP 1" e que se resumiu a esse pedaço.

Quanto ao resto são questões variadas internas do PAIGC sem qualquer interesse para a nossa temática da Guerra.

Abraço, Jorge.
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Nota do editor:

Último poste da série > 27 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12349: A guerra vista do outro lado... Explorando o Arquivo Amílcar Cabral / Casa Comum (9): Em setembro de 1964, a situação estava feia na antiga Zona 7 do PAIGC, segundo carta do 'Nino' Vieira [Marga]: (i) falta de homens, material, medicamentos e alimentos; (ii) 1 guerrilheiro deserta e apresenta-se em Bambadinca; (iii) as NT desembarcam no Rio Corubal, na Ponta Luís Dias, e avançam até ao Poindom e à Ponta do Inglês, provocando baixas entre a população e a guerrilha; (iv) 300 fulas da zona leste recebem instrução militar em Bissau, mas... (v) o moral da guerrilha parece ser... alto, estando disposta a ocupar militarmente o Saltinho e o Xitole (o que, como sabemos, nunca virá a acontecer até ao fim da guerra)

15 comentários:

Anónimo disse...

Pois Jorge Picado, obrigado e venha mais que fiquei em pulgas. Será que finalmente vamos saber como tudo aconteceu?Um abraço do
Veríssimo Ferreira

Anónimo disse...

Erros, omissões, aldrabices.
.na mais pura propaganda sem vergonha...

Mandar matar pessoas desarmadas mesmo sendo militares é um assassinato puro e duro e não se limitaram a matar, mataram de forma sádica e premeditada, em resumo.. UM CRIME DE GUERRA SÁDICO.

Nós também o fizemos..é verdade..mas não desta forma sádica.

Fizeram-no simplesmente por.. MEDO..para servir de exemplo para nós e para eles..é que podiam tê-los feito prisioneiros..mas não era dissuasor..

Não enganaram "porra nenhuma"..queriam mesmo entregar-se só que foram descobertos e a partir daí foram obrigados a continuar no jogo..
Pensaram que o General Spínola também iria e não seria feito prisioneiro..teria o mesmo destino..

Os negociadores tiveram como prémio o seu fuzilamento posterior..

Ah...acreditem se quiserem no que acabei de escrever..

C.Martins

antonio graça de abreu disse...

Se Amílcar Cabral disse isto, como está no documento, se disse isto depois de se assassinarem três majores e um alferes, mais dois guias negros, desarmados, a sangue frio, e de os terem retalhado à catanada, quando estes homens prucuravam a paz e não a guerra, se Amílcar Cabral disse mesmo o seguinte, e é de crer que disse, porque o documento é do PAIGC:

"Amílcar – Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos n[ossos] cam[aradas] do Norte. É a 1.ª vez que numa luta de libertação nacional se mata assim 3 majores, 3 oficiais superiores que, nas condições da n[ossa] luta, equivale de facto à morte de generais…“.

Que tristeza, até dói de vez em quando termos ainda hoje camaradas aqui no blogue a defender a estatura política, militar, e humana desse senhor chamado Amílcar Cabral.

A História não perdoa, isto não é para cada um sua verdade.
Até dói...

Abraço,

António Graça de Abreu

antonio graça de abreu disse...


Para assentar o pó, e não ir muito longe,fui simplesmente ao poste 1166 de 31 de Maio de 2013, ler o que escreveu numa recensão nosso camarada Mário Beja Santos:

"Se era certo que o líder do PAIGC resumia admiravelmente os ideais de inconformismo, de protesto, de honesto sentimento revolucionário, e personificava a revolta visionária da utopia possível," etc., etc.

E não quero mais polémicas com o MBS, nem com quer que seja.

Respeitemos os nossos mortos.

Abraço,

António Graça de Abreu

Luís Graça disse...

Jorge:

Deixa-me dizer-te aqui, em público, que fizeste um excelente (e paciente) trabalho de laboratório...

Se quiseres continuar, agradeço... Agrdecemos todos...São só 25 páginas... ou menos: agora 22,5..

Alguns camaradas poderão "reagir mal"... A brutalidade e a gratuidade do "masscre do chão manjaco" ainda continuam a indignar-nos, àqueles de nós que fomos contemporâneos dos acontecimentos. Não temos (nem nunca teremos) distância suficiente em relação a esses trágicos acontecimentos...

As tuas notas, pessoais, são preciosas... Para ti, que estiveste no CAOP1, também não é "tarefa fácil", deve mexer contigo, mexe com todos nós...

Obrigado. Um alfabravo. Luis

PS - Vai mandando três páginas de cada vez...

Antº Rosinha disse...

Ficou a ideia em Bissau, que foi difícil segurar Spínola, para não ser ele a ir ao tchon Manjaco.
(PIDE e Oficiais é que impediram)

Spínola teria autoconfiança em excesso.

Olhando hoje para traz, também Amílcar e Luís Cabral padeceram do mesmo mal.

Em Angola teve sucesso seguir processos do Spínola, casos do recém falecido Soares Carneiro como governador do distrito da Lunda, Branco Ló no Cuando Cubango.

Mas lá não era preciso de intérpretes para falar com o povo, como os deputados e políticos guineenses, Spínola e Amílcar Cabral.

Em Angola, desde comerciantes, fazendeiros e administrativos antigos, falavam fluentemente uma ou duas línguas étnicas.

É que a língua portuguesa é muito difícil, "bolso e algibeira" é a mesma coisa.

Anónimo disse...

Eu tenho dito e ainda recentemente, que muitos deitam loas, ao Amilcar e aos do PAIGC de então. Leiam e eu já o fiz toda esta noite. Vejam quem foi essa gente a quem parece haver o medo de lhes chamarem terroristas.
De Veríssimo Ferreira

Anónimo disse...

Olá Camaradas
Presumo que o camarada Picado difundirá o resto das folhas da acta da Rn do PAIGC. Nessa altura farei um comentário mais aprofundado.
Um Ab.
António J. P. Costa

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
manuel carvalho disse...

Estes acontecimentos no chão Manjaco impressioram-me muito porque tinha terminado a minha comissão há uns dias e acabado de chegar nos primeiros dias de Abril e isto aconteceu se não9 erro no dia 20 de abril de 70 num local onde eu passei muitas vezes e onde tivemos um morto.Estes assacinatos foram um ato bárbaro e sem explicação.Mas nas guerras acontecem estas coisas em todas, assacinatos, massacres, traições mentiras, propaganda tudo isto e muito mais dum lado e do outro.Eles fizeram aquela patifaria e a seguir tentaram tirar partido dela junto dos seus combatentes e seus aliados o que é normal.Isto é o que eu penso.
Fico muito grato ao camarada Jorge Picado e atodos os camaradas que nos facultam tudo o que diga respeito aquela guerra e que nos ajude a compreende-la melhor.
Já agora para o camarada Jorge Picado conheci no Pelundo um sarg. das Panhards Pel 1143 chamado Américo Picado será que é teu familiar? Já tenho dito em vários sítios foram talves as pessoas com quem mais aprendi na Guiné.Eles eram velhinhos e nós tinhamos acabado de chegar.Se ele ainda andar por ai mando-lhe um forte abraço.

Manuel Carvalho c caç 2366 Jolmete

Anónimo disse...

Jorge Picado
11 fev 2014 23:18

Amigo Luís

Sobre o conteúdo transcrito nas actas desse Conselho de Guerra, apenas encontrei motivo de interesse nessa parte que transcrevi sobre o caso dos "3 Majores e do Alf Mil do CAOP 1" e que se resumiu a esse pedaço.
Quanto ao resto são questões variadas internas do PAIGC sem qualquer interesse para a nossa temática da Guerra.

Abraço
Jorge

Anónimo disse...

Camaradas
Mais umas palavras a justificar este postado.
Não faço nem ando a fazer qualquer trabalho de pesquisa, já que não passo muito tempo ao computador.
Acontece que esta invernia que nos tem assolado, obriga-me a passar mais tempo retido em casa e por isso fui compelido a dedicar umas horitas mais a “computar”.
Quando o “Nosso Maior e Amigo” Luís Graça me interpelou via email, acerca de um dos livros do meu conterrâneo Capitão Bacalhoeiro Valdemar Aveiro, comum amigo, tinha acabado de ler e transcrever esta parte que lhe enviei, que é quase o princípio da acta, mas sem ter avançado mais.
Três ou quatro dias depois ao retomar a leitura, verifico que nada mais é adiantado sobre o caso em questão. Fiquei também desiludido. Ingenuidade a minha, pensei.
A acta foi manuscrita por Vasco Cabral na qualidade de “Secretário” e aquelas palavras são as que constam, em português correcto e numa caligrafia bem feita, mas miudinha.
As achegas que fiz referem-se aos nomes que consegui identificar e posicionar entre aqueles que constam duma “Acta informal da Direcção Superior do PAIGC”, que uns dias antes tinha encontrado na Pasta 07071.122.001. Esta acta da reunião que decorreu de 12 a 15ABR70, igualmente manuscrita pelo mesmo “secretário” trata de “Relatórios. Estrutura do Partido. Congresso. Organização Militar. Direcção Superior. Comité Nacional das Regiões Libertadas. Comité Executivo da Luta. Conselho Superior da Luta. Comandos.”

Quanto ao meu possível parentesco com um nosso camarada Américo Picado, que o Manuel Carvalho questiona, tenho a comunicar-lhe que não há qualquer ligação. Há muitos “Picado”, por este Portugal fora que não têm, pelo menos desde meados do Século XIX, qualquer ligação conhecida. Em localidades bem perto de Ílhavo há pessoas quase com o mesmo nome que tenho e não existe qualquer parentesco.

Abraço
JPicado

manuel carvalho disse...

Caro Jorge Picado

Pensava que os Picados não fossem assim tantos porque eu só conhecia dois.
Fico na mesma agradecido pela informação.
Um abraço

Manuel Carvalho

Anónimo disse...

Meu caro amigo Jorge Picado,

Apesar da modéstia implícita nas tuas explicações, a verdade é que nos trouxestes um excelente trabalho.

Por experiência própria não conheço exageros cometidos pelas tropas em que estive directamente inserido. Dito isso, não me é difícil aceitar que em situações pontuais no ardor das lutas travadas não tenha havido exageros de parte a parte. Porém, de acordo com esta Acta não foi isso que aconteceu.

No Jolmete foi cometido um crime premeditado, bárbaro, hediondo, levado a cabo não por libertadores de coisa nenhuma, mas por autênticos assassinos de guerra. Num mundo civilizado, gente desta estirpe deveria ser julgada severamente.

Na II Guerra Mundial, este tipo de crime, a diferença foram os números, foi severamente punido. Ainda o está a ser nos dias de hoje.

Na guerra, tal como em tudo na vida, o verdadeiro soldado actua com dignidade e nobreza. Amílcar Cabral e os seus acólitos nem sabiam o que isso era.

Com um abraço,
José Câmara

João José disse...

Camaradas
O massacre do chão manjaco é uma das mais tristes e inesquecíveis páginas da Guerra do Ultramar.
A guerra que travámos não tinha um inimigo bem definido, pelo contrário, combatiamos muitos inimigos, dos quais, não podemos incluir as populações que, regra geral, estavam ao nosso lado e também eram flageladas.
Os principais inimigos eram as grandes potências, nomeadamente, a URSS, a China e os USA.
Os africanos, caboverdeanos e guineenses, tinham pessoas com maiores capacidades e com aspirações a lugares de estado mais elevados que os levaram a desenvolver uma guerra de libertação. Era maior a desconfiança e o confronto entre eles do que os que os opunha aos metropolitanos, por isso, sempre que puderam, foram-se "neutralizando" uns aos outros.
A guerra era de guerrilha, de clássica, não tinha nada, podiamos andar aos abraços em um dia, e, no outro dia, andarmos aos tiros uns aos outros.
É por essa razão que não fazia qualquer sentido o encontro procurando uma negociação. Negociações, seria com políticos, nunca com militares.
Spínola, apesar do muito de positivo que desenvolveu na aproximação às populações, revelou nesta acção que não estava à altura do que se lhe pedia, aliás, como o governo português na condução política desta guerra. Acção que poderia ter tido uma evolução bem mais digna evitando o assassínio de muitos dos nossos camaradas africanos no pós-25 de abril.
Quanto a Amílcar Cabral, sendo o ideólogo e chefe político, facilmente seria ultrapassado e dominado pelas armas pelo João Bernardo Vieira que aspirava à total liderança do partido, daí o facto de ter sido ultrapassado pela corrente mais ligada aos interesses comunistas e ter que se subordinar, politicamente, às suas decisões. O que aconteceu, até ser assassinado, na Guiné Conakry, por elementos pró-Sekou Touré, pró-Nino Vieira e pró-URSS.
Esta é a minha opinião.
João Martins