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terça-feira, 9 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25362: Trabalho sobre a formação dos Comandos na Guiné, publicado na Revista da Associação de Comandos, MAMA SUME - Parte I (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando)



"Os Comandos na Guiné", artigo da autoria do nosso camarada Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando, publicado na Revista MAMA SUME, da Associação de Comandos, e enviado ao Blog no dia 22 de Março de 2024:

“Comandos” do CTIG - Parte I

As chefias militares da Guiné cedo se aperceberam que havia necessidade de se dispor de uma tropa que fosse capaz de fazer a contraguerrilha, móvel, aligeirada, com pequenos efectivos, autónoma e agressiva, uma tropa diferente.

Uma tropa que, aliás, já estava a dar provas em Angola. Foi em Quibala, no norte de Angola, que foram preparados os primeiros grupos de “Comandos”.

Em Julho de 1963, o Comando-Chefe da Guiné solicitou à Região Militar de Angola que recebesse e formasse um pequeno grupo de militares. Na mesma altura, foi enviada uma circular para todos os batalhões estacionados na Guiné, convidando oficiais e sargentos a oferecerem-se como voluntários para os “Comandos”.

Muita gente se ofereceu. Depois das selecções foram escolhidos para o curso em Angola, o major Correia Dinis, os alferes Maurício Saraiva e Justino Godinho, os sargentos e irmãos, Roseira Dias e os furriéis Vassalo Miranda e o Artur Pires. E ainda, o Adulai Queta Djamanca e o Adulai Djaló, naturais da Guiné.

(...) “A cerimónia de apresentação teve lugar no gabinete do Chefe do Estado-Maior. Fomos recebidos pelo Major Chefe da 2ª Rep, que fez votos para que, da nossa estadia em Angola, tirássemos o máximo proveito. Pôs em evidência os inconvenientes da nossa vinda naquela altura, pois tinha terminado um curso e não se sabia ainda quando teria início o próximo. Deste desencontro de datas, resultariam, naturalmente, limitações à nossa instrução.

Na manhã seguinte foi-nos exposta, com algum pormenor, a situação actual na Região Militar de Angola. Foram-nos indicadas as zonas consideradas activas, semi-activas e as pacificadas.
Cabinda, devido à localização e ao reduzido efectivo das NT e um triângulo com um vértice em Bessa Monteiro e base na região dos Dembos (Nambuangongo, Zala, Beira Baixa, etc), eram as zonas com maiores preocupações. Considerava esta última mais difícil, porque os grupos IN tinham mais experiência e mostravam-se aguerridos.

As alterações ao programa da nossa visita começaram aqui e mantiveram-se sempre, até ao fim da nossa estadia.

Tivemos uma palestra de um capitão, instrutor dos comandos. Começou por abordar a questão da disciplina:

Nada de tolerâncias. Que os comandos falam sempre em sentido. Que o mínimo desleixo, dos superiores ou dos inferiores, não pode passar em claro. Que a mentalização era a menina dos olhos dos cursos de comandos. Um comando luta para matar e não para não morrer.

Indicou-nos os processos e as técnicas que utilizam para a mentalização.

  • Slogans, dísticos humorísticos nas paredes, nos lavabos, em todo o lado, até dentro do pão.
  • Uma aparelhagem sonora nas casernas e nos quartos de sargentos e oficiais.
  • Alocuções de mensagens gravadas, para ouvirem sempre que estejam a descansar. Devem ser feitos testes para avaliar o grau de assimilação.
  • Emulação entre os instruendos, entre as equipas e entre os grupos. Cerimónias com aparato para realçar as qualidades e os méritos dos indivíduos que mais se destaquem.

Abordou o conceito da parelha, da equipa e do grupo. Numa primeira fase, deve dar-se aos instruendos a liberdade para se agregarem como entenderem, depois as relações tendem para alguma estabilidade.

Reforçar essas amizades, estimulá-los a comerem na mesma mesa, participarem nos mesmos jogos, fazerem os mesmos serviços.

Falou depois na constituição do grupo:

1. O indivíduo que concorre aos comandos tem que estar situado entre os 20 a 30% melhores do contingente donde é originário.
2. Os comandantes dos grupos e os chefes das equipas devem situar-se entre os 10% melhores do contingente de quadros.
3. A selecção é a operação mais importante na formação dos comandos.
4. A instrução deve assumir um carácter selectivo.
5. Sendo o tiro um aspecto muito sensível, não deve haver restrições nesta instrução.
6. Todos os elementos devem ser especialistas no tiro de precisão e no tiro instintivo e todos devem estar aptos na utilização de lança-rockets.

No dia 26 de Outubro partimos para o quartel de Quibala, onde estivemos 6 dias em contacto com os 3 grupos de comandos recentemente chegados de uma operação. O tenente Abreu Cardoso deu-nos explicações pormenorizadas sobre a mesma.

Regressámos a Luanda e ficámos a aguardar o início da operação que deveria ter lugar nas margens do M’Bridge. Patrulhar as margens do rio entre as picadas de Evange e Quiaia. Uma operação de rotina.

Na 2ª operação fomos integrados no grupo de comandos do batalhão de artilharia. Montámos a emboscada nas margens do rio Loge. 3 dias. (...)

Se deste estágio na R. Militar de Angola não tirámos o máximo proveito, ele foi, pelo menos, muito útil. Útil porque das lições dos instrutores ficámos com a cabeça mais arrumada, com muitos ensinamentos que nos serão úteis se um dia viermos a ser instrutores de comandos. Útil ainda, porque do contacto que mantivemos com os grupos em operações, adquirimos experiência, vimos como aquela tropa se comporta no mato e as situações que vivemos serão para nós motivos de ensinamento.

Resta acrescentar que os oficiais da R. Militar de Angola estiveram sempre ao nosso dispor e se mais não fizeram, foi, de facto, devido à nossa visita ter sido efectuada numa altura pouco conveniente."

Considerandos, directivas e orientações. Mais de cinquenta páginas do bloco de apontamentos do estágio na R. M. de Angola do alferes Justino Godinho, um dos voluntários da Guiné.

Depois de regressarem do estágio operacional em Angola, o Comandante-Chefe da Guiné pensou em aproveitar esses militares e integrá-los nas forças que iriam executar a operação "Tridente", marcada para o início do ano de 1964.

Aproveitaram os elementos que, anteriormente, tinham respondido ao apelo de 'voluntários precisam-se para os comandos', quase todos pertencentes aos efectivos do BCav 490, a unidade base que iria executar a operação ao Como.

Havia a necessidade de reforçar os efectivos do Gr. Cmds. Para isso, sob a orientação dos “Comandos” regressados de Angola, os que se ofereceram iniciaram um curto período de instrução operacional com vista à participação na referida operação.
GrCmds na Operação Tridente – Ilha do Como.
Grupo de Comandos no Como.

Constituiu-se assim o grupo que interveio na operação “Tridente”, de 14 de Janeiro a 24 de Março, nas ilhas do Como, Caiar e Catunco, integrados nas forças à disposição do Batalhão de Cavalaria 490. O comando do grupo foi entregue ao alferes Maurício Saraiva e, ao alferes Godinho, aos furriéis Mário Dias, Artur e Miranda, a chefia das equipas.

Mário Dias, um dos participantes na operação, esclarece as razões da operação:

(...) "Na ilha não existia qualquer autoridade administrativa nem força militar pelo que o PAIGC a ocupou (não conquistou) sem qualquer dificuldade em 1963. As tabancas existentes eram relativamente pequenas e muito dispersas. Possuía numerosos arrozais, o que convinha aos guerrilheiros pois aí tinham uma bela fonte de abastecimento, acrescido do factor estratégico da proximidade com a fronteira marítima sul e o estabelecimento de uma base num local que facilitava a penetração na península de Tombali e daí poderia ir progredindo para Norte.
Não tinha estradas. Apenas existia uma picada que ligava as instalações do comerciante de arroz, Manuel Pinho Brandão (na prática, o dono da ilha) a Cachil. A partir desta localidade o acesso ao continente (Catió) era feito de canoa ou em qualquer outra embarcação. A casa deste comerciante era, se não estou em erro, a única construída de cimento e coberta a telha.
Portugal não exercia, de facto, qualquer espécie de soberania sobre a ilha.

"Tornava-se imperiosa a recuperação do Como. Foi então planeada pelo Comando-Chefe a Operação ‘Tridente’ na qual foram envolvidos numerosos efectivos, divididos em 4 agrupamentos, num total de cerca de 1200 homens". (...)
Guerrilheiros do PAIGC no Como. Foto na Net. Com a devida vénia ao autor que desconheço.

(...) "O meu destacamento entrou na mata para fazer reconhecimento. Tínhamos desembarcado a 14 de Janeiro e esta operação foi a 19. Levei duas secções cerca de 25 homens. Andámos entre 100 a 150 metros e tivemos um choque frontal com uma força inimiga que calculei num numero de 60 a 70 homens. Foi um combate que durou 2 horas e meia. Foi um embate muito forte que me custou dois mortos e cinco feridos - cheguei a estar a dez metros de distância do inimigo. Tentei fazer um movimento de envolvimento pela direita, mas faltava-me massa de manobra. Pedi um reforço e enviaram-me um grupo de comandos - cerca de 20 homens - comandado por um extraordinário oficial, alferes Maurício Saraiva, e assim já pude fazer a manobra de envolvimento. Certo é que acabaram por retirar. Comigo estava o chefe de Estado-Maior da Defesa Marítima da Guiné, um capitão-tenente já com uma certa idade, Costa Santos. Era raro os altos comandos participarem nas operações, mas alguns iam, como era o caso deste (…) Alpoim Calvão Cmdt do Destacamento de Fuzileiros nº 8." (...)
Brá – Imposição dos crachás aos Grupos Fantasmas, Camaleões e Panteras.
Brá – Apresentação do Capitão Jaime Cardoso.
Desfile comandado pelo Capitão Jaime Cardoso.
Imposição de crachás aos Grupos Apaches, Centuriões, Diabólicos e Vampiros.
Apresentação pelo Capitão Saraiva ao Governador-Geral.

Publicamente reconhecida a contribuição que deram para o sucesso da operação, os “Comandos” receberam os crachás em cerimónia pública realizada em Bissau em 29 de Abril de 1964. Em finais de Julho e com a duração de 4 semanas começou a escola de quadros.

Entre 30 de Setembro e 17 de Novembro de 1964, realizou-se em Brá o 1º Curso de Comandos da Guiné[1]. Começaram cerca de 200, terminaram 78. “Fantasmas”, “Panteras” e “Camaleões” foram os nomes que escolheram para os grupos que saíram dessa formação.

E em Dezembro de 1964[2], o Boletim de Informação do E. Maior do Exército, relatava oficialmente as primeiras acções desses grupos:

(...)  "A actividade desenvolvida pelos grupos de “Comandos” conduziu a resultados muito remuneradores. Prova-se deste modo, a necessidade de se poder dispor de uma tropa com instrução especializada, apta a desempenhar missões que, pelas suas características, estão fora das capacidades das unidades normais.

Um grupo em actuação em Canjambari efectuou uma acção de muito interesse sobre um bando de terroristas, instalado a coberto do rio. Apoiados por um pelotão de auto-metralhadoras, os “Comandos” transpuseram o rio e lançaram-se ao assalto do IN, bem instalado no terreno e com bom e numeroso armamento. O IN foi desalojado, tendo deixado várias baixas no local.
Outro grupo efectuou uma emboscada na mesma região causando ao IN 2 mortos e vários feridos, tendo sido capturadas várias espingardas, pistolas-metralhadoras e granadas de mão.

Na zona de Tite, outro grupo realizou um golpe de mão a NE daquela povoação. Capturadas 8 espingardas, uma pistola-metralhadora e várias granadas de mão”. (...)


Nesse mês de Dezembro, numa reunião em Brá com os comandantes dos grupos, o Major Correia Dinis, preocupado com a aproximação das datas dos fins das comissões dos militares dos comandos, relia-lhes uma nota que endereçara ao Comandante Militar da Guiné:

"Exmº Senhor,
Por determinação de S. Ex.ª o General Venâncio Deslandes, apresentei-me na véspera do meu embarque de fim de licença na Defesa Nacional a fim de ser ouvido por aquele Exmº. Senhor.
A conversa baseou-se única e exclusivamente na organização de grupos de Comandos, seu interesse e modalidades de acção.

Para terminar, Sua Ex.ª o General mostrou-se interessado na organização de mais grupos de comandos no CTIG.

Informei que essa organização dependia não só do Centro Nacional de Instrução de Comandos em Angola, presentemente em organização, como também do necessário pessoal que deveria vir da metrópole para substituição, nos Batalhões, dos voluntários para os comandos.
Quanto a este segundo condicionamento, Sua Ex.ª esclareceu que o CTIG poderia pedir o envio desse pessoal.

No meu entender, a organização de novos grupos de comandos é da maior utilidade, tanto mais que a partir de Abril de 1965 os três grupos existentes começarão a ficar desfalcados com as desmobilizações.

Há que atender, porém, ao trabalho que o Centro Nacional de Comandos vai produzir na formação de novos grupos.

Estarão esses grupos prontos num futuro próximo e poderá o CTIG aproveitá-los em breve ou a formação desses grupos demorará ainda o bastante, que justifique como emergência, a formação de novos Grupos neste CTIG?

Assim, proponho:

1º- Que com a necessária urgência se procure obter da Região Militar de Angola as seguintes informações:
a). Qual o número de grupos de comandos que em 1ª prioridade serão atribuídos ao CTIG? Ainda se mantém a Companhia como foi pedido?
b). Qual a data provável da sua apresentação neste CTIG?
2º– Em face da resposta obtida, poderá então este CTIG pensar na formação ou não de novos grupos.
Em Brá, 26 de Novembro de 1964
O Comandante do Centro de Comandos, Correia Dinis, major."


Qual a resposta? Temos ainda algum tempo à nossa frente. Abril não vem longe, mas mesmo assim, também não é demasiado tarde ainda. Leu-lhes outra, que acabara de receber, a felicitá-los pela forma como elaboraram os programas do curso:

"Comando Territorial Independente da Guiné, Quartel-General, 3ª Repartição, ao
Sr. Director do CI de Comandos, Brá.

Encarrega-me Sua Ex.ª o Brigadeiro Comandante Militar de informar V. Ex.ª que aprovou os programas da Instrução de “Comandos” que acompanharam a nota em referência e manifestar o seu agrado pelo cuidado feito pelo Director de Instrução na elaboração dos respectivos programas.

O Chefe do Estado-Maior, sarrabiscos miúdos, o nome por extenso, Tenente-Coronel do CEM".

E uma cópia de uma outra que o Comandante Militar dirigira aos Comandos dos Batalhões:
"Por determinação do Comandante Militar, os comandantes dos batalhões em quadrícula devem não só prestar todo o apoio que lhes for pedido como também, eles próprios, devem proceder à escolha de voluntários, os quais devem dar garantias de permanência na Província pelo menos de 1 ano. Os “Comandos” não fazem qualquer outro serviço, actuam, em regra, durante 3 a 5 dias, e descansam dois ou três.

Trabalham, normalmente, em benefício dos Batalhões mas quando o CTIG o entender podem ser accionados directamente por este. (...) sarrabiscos iguais aos anteriores, o mesmo nome por extenso.

Execute-se."
Guarda de Honra – Palácio de Bissau.
Grupo de Comandos – Embarque rumo a Bafatá.

Entretanto os grupos foram-se mantendo em actividade, conforme atestam as numerosas citações de que foram alvo, apesar de actuarem com efectivos progressivamente mais reduzidos.

Para recordar os 9 camaradas mortos que tiveram numa tarde na zona de Madina do Boé, logo na semana seguinte os “Fantasmas” sobreviventes foram nomadizar para a zona do Oio. E terminaram em 6 de Maio de 1965, no sul, em Catunco, no acampamento chefiado pelo Pansau Na Isna, guerrilheiro do PAIGC que se tornou lendário.

Foi um golpe de mão como deve ser, entraram pelas barracas com o In a dormir e, como era de esperar, acordaram-nos. Retiraram eufóricos, um sucesso para finalizarem a guerra. No regresso alguém perguntou quem trazia o morteiro do inimigo. Ninguém o trazia! Duas equipas, metade do grupo, receberam ordem para o ir buscar. Voltaram para trás, ao acampamento que momentos antes tinham incendiado. Iluminados pelas labaredas, apareceram bem recortados aos olhos de alguns guerrilheiros, refugiados nas proximidades, que não tiveram dificuldade em mandar para o meio deles uma roquetada. Todos atingidos, um morto e nove feridos foi o saldo do regresso ao acampamento. A operação tinha recebido o nome de código “Ciao”.

Em Junho de 1965 começou o 2º curso de Comandos para oficiais e sargentos na Guiné.[3] E logo que terminou, começou a preparação dos novos grupos. Os nomes já estavam escolhidos, os Centuriões herdavam os sobreviventes dos Fantasmas do agora capitão Saraiva, os Apaches os dos Camaleões do alferes Godinho, os Vampiros o 4º grupo que não existia anteriormente e os Diabólicos absorviam o pessoal dos Panteras do tenente Pombo.

(continua)

(Revisão / fixação de texto, para efeitos de publicação do artigo no nossso blogue: CV/LG)
Porta de armas do quartel de Brá. Foto de V. Briote
O interior do aquartelamento de Brá. Messes em frente, à direita. Foto de Mário Dias.
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Notas de VB:

[1] - 23/7/64: início das actividades do Centro de Instrução Comandos em Brá. 03/8/64: início da Escola Preparatória de Quadros.24/8 a 17/10/64: Iº Curso de formação dos GrsCmds (Camaleões, Fantasmas e Panteras), com o apoio de instrutores e monitores do CI25/RMA e do GCmds "Gatos"/BArt 400/R.M Angola, que sob o comando do alferes Horácio Valente (morto mais tarde em Moçambique) permaneceu na Guiné entre 22 Set. e 28 Dez.1964, participando em três operações no sector do Batalhão de Artilharia 645.

[2] - De 20/10/64 a Junho de 1965: actividade operacional dos Grs. Comandos

[3] - Em meados de 1965 o Major Correia Diniz terminou a sua comissão tendo sido substituído pelo seu Adjunto, Capitão Varela Rubim. Nesta altura o QG decidiu extinguir o Centro de Instrução de Comandos e criar a Companhia de Comandos do CTIG com data de 1 de Julho.
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quarta-feira, 6 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25243: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Anexos: V. Listagem das principais atividades nos Gr Cmds "Fantasmas" e "Centuriões" e ainda na 1ª CCmds Africanos


Quinta do Paul, Ortigosa, Monte Real, Leiria > IV Encontro Nacional da Tabanca Grande >
20 de Junho de 2009... O Virgínio Briote e o Amadu Djaló. 

Foto: Arquivo do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010)


 

Capa do livro "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, il., edição esgotada) 




O autor, em Bafatá, sua terra natal, por volta de meados de 1966.
(Foto reproduzida no livro, na pág. 149)



1. Ainda com base no manuscrito, digitalizado, do livro do Amadu Bailo Djaló, "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, il., edição esgotada) (*), vamos publicar alguns "Anexos" (pp. 287-299).


Segue-se   a lista das operações dos Grupos de Comandos "Fantasmas" (out64 / maio 65) e "Centuriões" (set 65 - abr 66) a que o Amadu Djaló pertenceu, bem como as atividades da 1ª CCmds Africanos, desde jun 70 a set 73)... 

Posteriormente , o Amadu Djaló foi transferido para a CCAÇ 21 (até à sua extinção em agosto de 73, mas da qual não há história da unidade nem listagem das suas actividades operacionais) (pp. 297/299).

Anexos

V.  Operações dos Gr Cmds "Fantasmas" e "Centuriões" bem da 1ª CCmds Africanos


(i) Operações do Grupo de Comandos “Fantasmas”



- 24Out64: Cufar Nalu;

- 28Out64: Cufar Nalu;

- 25Out/04Nov64: Op “Confiança”, Oio, reabertura itinerário Mansabá-Farim, com Grupos Comandos “Camaleões” e “Panteras”;

- 03Nov64, golpe de mão acampamento Madina Mandinga;

- 11Nov64: operação “Vai à toca”, Gundagué Beafada, tabanca Darsalame Baio;

- 27Nov64: Guilege de Madina do Boé, estrada Madina do Boé-Contabane-Aldeia Formosa, levantamento mina a/c;

- 28Nov64: Gobige, deslocação auto, deflagração mina a/c;

- 09/10Dez64: nomadização, Talicó, Oio;

- 16/17Dez64: batida, Santambato>Maqué;

- 23/24Jan65: op “Campo”, mata de Cufar Nalu;

- 23/24Jan65: op “Alicate I”, cruzamento Cufar>Bedanda;

- 30/31Jan65: op “Raposa”, Cachil, mata Cassacá;

- 03/04Fev65: op “Alicate II”, mata de Cufar Nalu;

- 06/07Fev65: op “Ursa”, Cufar, mata de Cufar Nalu;

- 10/11Fev65: op “Alicate III”, Cufar, mata de Cufar Nalu;

- 11Mar65: Mansoa, Benifo-Sinre, golpe de mão;

- 21/22Mar65: Cambaju, golpe de mão;

- 22Mar65: Bissorã Iarom, Rua, Moia Fará, golpe de mão;

- 26Mar65: op “Ebro”, Canjambari;

- 31Mar65: Canjambari Cunacó, golpe de mão;

- 11/12Abr65: op “Faena”, Buba, Antuane-Banta-el Silá;

- 20/21Abr65: op “Açor”, Fulacunda, Incassol, tabanca Portugal;

- 06/07Mai65: op “Ciao”, Catunco, Cameconde.


(ii) Operações do Grupo de Comandos “Centuriões”




- 09/10Set65: op “Jagudi”, Mansabá Cai;

- 14Set65: op “Centopeia”, Iracunda. Operação conjunta com Grs Cmds “Apaches”, Diabólicos” e “Vampiros”;

- 25Out65: op “Vendaval”, Jolmete Bugula-Catafe;

- 11Nov65: op “Estoque”, Mansoa, Cutia;

- 11Dez65: op “Milésimo”, Guidage, Samoge;

- 15Dez: op “Trajectória”, Jambacunda, Mampatás (Casemansa);

- 14/15Fev66: op “Cobaia”;

- 22/23Fev66: op “Cleópatra”, Catunco;

- 06Mar66: op “Hermínia”, Jabadá Beafada, Galecunde. Operação com Gr Cmds “Diabólicos” (15H cada);

- 28/29Mar66: op “Vamp”, Faquina Mandinga, Cuntima. Operação com Gr Cmds “Diabólicos” (15H cada);

- 07/09Abr66: op “Zenaida”, Sitató. Operação com Gr Cmds “Apaches” (15H cada);

- 24/25Abr66: op “Virgínia”, Cuntima, Canja – Sinchã Mamadu. Operação com 15H Gr Cmds “Vampiros”.


(iii) Actividades da 1ª Companhia de Comandos Africanos

- 21Jun/15Jul70: reforço ao COT1, Bajocunda;

- 30Out/7Nov70: Enxalé;

- 10/25Nov70: Op. “Mar Verde”, Conakry;

- Dez (fins) /Jan71 (fins), reforço temporário das guarnições de Gandembel e Guileje;

- Fev71/16Abr71, Nova Sintra, Brandão, Jabadá, Bissássema;

- 24Abr/finsJul71, 1ª fase instrução 2ªCCmds, Fá Mandinga;

- Fins Jul./meados Agosto71, Bolama, descanso;

- 28Ago/23Set71, 2ª fase instrução 2ª CCmds, Sancorlá, Cossarandim, Ponta Varela;

- 10/11Set71, 2ª fase instrução 2ª CCmds, Malafo, Enxalé;

- 06Out71, Cancodeá Beafada, operação conjunta com a 2ª CCmds;

- 18/22Out71, Choquemone, Bissum Naga, com a 2ª CCmds;

- 29Out/1Nov71, Tancroal, coma 2ª CCmds;

- 11/15Nov71, op “Satélite Dourado”, Gampará, Ganjuará, com a 2ª CCmds;

- 24/28Nov71, op “Pérola Amarela”, Gampará, Ganjuará, com a 2ª CCmds;

- 20/24Dez71, op “Safira Solitária”, Morés, Bissorã – Mansabá, com a 2ª CCmds;

- 07/12Fev72, op “Juventude II”), Morés, Sinchã – Inchula, com a 2ª CCmds;

- 28Mar/08Abr72, Salancaur, Unal, Guileje do Boé, com a 2ª CCmds;

- 28Abr/01Mai72, op “Joeirada”, Churo, Caboiana, com a 2ª CCmds e 35ª CCmds (?);

- 30Mai/03Jun72, Mansabá, Gussará – Tambicó, com a 2ª CCmds;

- 26/28Jun72, Caboiana, Churo, com a 2ª CCmds;

- 19/21Dez72, Churo, Caboiana, com a 2ª CCmds e 38ª CCmds (?);

- 15/19Jan73, op “Falcão Dourado”, Cantanhez, com o BCmds da Guiné;

- 25/27Jan73, op “Topázio Cantante”, Morés, com o BCmds;

- 13/16Fev73, op “Esmeralda Negra”, Porto Gole, Changalana – Sará, com o BCmds e 38ª CCmds;

- 27Fev/01Mar73, op “Titânica”, Mansoa, Morés – Cubonge, com o BCmds;

- 21/23Mar73, op “Canguru Indisposto”, Cantanhez, com o BCmds;

- 18/21Mai73, op “Ametista Real”, Guidaje, Cumbamori (Casamansa), com o BCmds;

- 21/24Jul73, op “Malaquite Utópica”, Caboiana, Belenguerez, com o BCmds e 38ª CCmds;

- 24/27Set73, op “Gema Opalina”, Bachile, Caboiana, com a 3ª CCmds;


(Revisão / fixação de texto: LG)
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segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25161: In Memoriam (494): Carlos Faria ("Black"), ex-1º cabo 'cmd', Cmds CTIG, Grupo "Diabólicos": era natural de Braga, viveu em Manchester, e nos anos últimos anos em Vila Verde (Virgínio Briote, ex-alf mil 'cmd', cmdt Grupo "Diabólicos", Brá, 1965/67)



Foto nº 1 >  Guiné > Bissau > Brá > Setembro de 1965 > Comandos do CTIG > Grupo Comandos Diabólicos > "Foto de finais de Set 65, tirada em Brá, quando começaram os 'ensaios'  com as boinas vermelhas... Da esquerda para a direita: Marcelino da Mata, Caetano Azevedo, Virgínio Briote  (VB), Carlos Faria ("Black") e Mário Valente".


Foto nº 2 > Guiné > Bissau >  Comndos do CTIG >  1966 > Na BA12, Bissalanca, durante o treino com os ALIII: d esquerda para a direita, Mário Valente , VB, Carlos Faria ("Black").


Foto nº 3 > Guiné > Região do Oio > Manso >  Comndos do CTIG >  Setembro de 1965 >  
 da esquerda para a direita, VB, Valente de Sousa, Cordeiro e Carlos Faria ("Blk")



Foto nº 4 > Guiné > Região do Oio > Manso >  Comndos do CTIG >  Setembro de 1965 > De pe, da esquerda para a direita, Valente de Sousa, Carlos Faria ("Black") e VB.


Fotos (e legendas): © Virgínio Briote (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do Virgínio Briote, nosso coeditor jubilado, ex-alf mil cav, CCAV 489/BCAV 490 (Cuntima) e ex-al mil cmd, Cmds do CTIG, cmdt do Grupo "Diabólicos" (Brá) ( 1965/67):

Data - 11 feve 20224 19:20

Assunto  - Baixas

Morreu o "Black", chegou a vez dele.

Em tempos,  escrevi isto no caderno das minhas memórias da Guiné, sobre o ex-1º cabo 'cmd' Carlos Faria ("Black"), do meu Grupo "Diabólicos", Comandos do CTIG (1965/67):

(...) Depois de um curto período de adaptação em Braga junto da família, e sem outros motivos que o prendessem, "Black" (o cabo Carlos Faria, o tal que omitira as habilitações escolares) resolveu esquecer tudo. Mudou-se para a terra dos Beatles, dormiu nas ruas, trabalhou em biscates, casou com uma inglesa, enveredou pela carreira de vendedor internacional, os filhos a crecer em Manchester, quando deu por si, estavam do tamanho dele. 

Nunca perdeu o contacto com alguns amigos de Braga, até que se decidiu pelo regresso. Vive só numa linda quinta em Vila Verde, nos arredores de Braga, onde de vez em quando é visitado pelos filhos e neta. Voltaram a encontrar-se em 2015, 
50 anos depois de terem partido para a Guiné no “Alfredo da Silva”. 

Um reencontro inesquecível. (,,,)

Hoje, a meio da tarde deste domingo, recebi uma chamada do João Machado, um excelente ex-alferes que correu a Guiné com os obuses entre 1965 e 67: "Morreu o Carlos, pá! Não há funeral! Telefono-te porque sei que eras amigo dele."

Com um abraço

V Briote
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Nota do editor:

Último poste da série > 13 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25066: In Memoriam (493): Falecimento do Capitão Miliciano de Artª da CCAÇ 3491 / BCAÇ 3872 (Dulombi e Galomaro, 1971/74), engº Fernando Pires (Luís Dias)

terça-feira, 9 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25052: (De) Caras (201): O cap art 'comando' Nuno Rubim (1938-2023): fotos do meu álbum (Virgínio Briote, ex-alf mil 'cmd', cmdt Gr Diabólicos, Brá, 1965/67)

 

Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4


Foto nº 4A


Foto nº 5


Foto nº 6


Foto nº 7


Foto nº 8


Foto  nº 9

Foto (e legenda): © Virgínio Briote (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Virgínio Briote, ex-allf mil da CCAV 489 (Cuntima) e alf mil 'cmd',  
cmdt do Grupo "Diabólicos",  CCmds CTIG, Brá; 1965/67). Cartão de identificação,
com a assinatura do cap Nuno Rubim 


1. Mensagem do nosso coeditor jubilado Virgínio Briote, com data de 1 do
corrente, às 17:14:

Boa tarde, Caros Carlos Vinhal e Luís Graça, envio-vos as fotos que tenho do cap Nuno Rubim e nota com algumas legendas. (*)

Abraço e Obrigado pelo vosso trabalho.
VBriote



Cap Art 'Cmd' Nuno Rubim,
Bissau, 1965

Legendas  > Fotos com  o cap art 'cmd' Nuno Rubim  (1938-2023),   setembro de 1965 e depois;

Foto n.º 1 > Cerimónia da imposição dos crachás de Cmds em Brá. 4Set1965. A CCmds do CTIG apresenta-se ao Gov Geral,  gen Schulz, ao Cmdt Militar e a dois chefes das Repartições do QG. O Nuno Rubim está à direita do gen Schulz.

Foto n.º 2 > Passagem em revista dos Gov Geral e Cmdt Militar,  seguidos pelo cap Maurício Saraiva (de óculos escuros e camuflado) e cap Nuno Rubim.

Foto n.º 3 > Entrega do crachá ao fur mil João Parreira, o cap Rubim está de costas e o cap Saraiva, de perfil, ao lado, de camuflado.

Fotos n.º 4 e 4A > O Cap Rubim bem destacado no meio do Gr Cmds Diabos,  na BA 12, Bissalanca, antes do embarque do Grupo no Dakota para Bafatá com deslocação por outros meios para o Xitole – operação ao Galo Corubal.

Foto n.º 5  > 1.º cabo Júlio Costa Abreu na despedida de final de comissão entre o cap Rubim e o alf Caldeira.

Foto n.º 6 > O cap Rubim de costas entre vários militares do QG e o Gov Geral,  gen Schulz, numa cerimónia nos Cmds em Brá, em fins de 1965.

Foto n.º 7 > O cap Rubim, cmdt da CCmds, no Palácio do Gov Geral.

Fotos n.ºs 8 e 9 > Cmds com comissão finda em despedida. No grupo destes, o da esquerda,  é o sold António Kássimo que veio a continuar nos Cmds quase até ao final da guerra.
____________

Nota do editor LG;

(*) Último poste da série > 9 de julho de 2023 > Guiné 61/74 - P24464: (De) Caras (200): Crónica pícara de uma noite de copos no Chez Toi e no Pilão, que meteu alguns dos nossos melhores e que até chegou, truncada e pirateada, à terra de um deles, Melgaço (Paulo Santiago, ex-alf mil, cmdt Pel Caç Nat 53, Saltinho, 1970/72)

domingo, 31 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P25019: In Memoriam (491): O Nuno Rubim (1938-2023) que eu conheci nos Comandos do CTIG, de junho a dezembro de 1965 (Virgínio Briote)

 

Capitão Art Nuno Rubim, o "cvapitrão fula" o tempo da CCAÇ 726 (Guileje, Mejo, Cachil, Catió, Out 1964/Jul 1966). Esta subunidade teve quatro comandantes, o último foi o cap art Nuno José Varela Rubim.

Foto: © Nuno Rubim (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legenbdagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

CTIG > Companhia de Comandos > Cartão de Identificação > Cartãonbº 03 > Gr Sang > "A" >Grupo "Diabólicos" > Posto > Alferes Mil  > Nome > Virgínmio António M. da SWilva Briote > O Comandante> Nuni J V Rubim, cap

Foto: © Virgínio Briote (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário (*) do nosso editor jubillado, Virgínio Briote (nascido em Cascais, frequentou a Academia Militar, foi alf mil em Cuntima, CCAV 489 / BCAV 490, entree janeiro e maio de 1965; fez  o 2º curso de Comandos do CTIG, de junho a setembro de 1965;  comandou o Grupo 'Diabólicos', de setembro de 1965 a setembro de 1966; regressou a casa em janeiro de  1967; asado com a Maria Irene Briote, professora do ensino csecundário; foi quadro superior da indústria farmacêutica; publicou entre janeiro de 2006 e junho  de 2009. o blogue  Guiné, Ir e Voltar: Tantas Vidas (entretantto descontinuado: pdoe ser visto aqui,no Arquivo.pt), parcialmente reproduzido no nosso blogue; foi editor lioyterário do livro de memórias do Amadu Bailo Djaló, publicado em 2010, pela Associação de Comandos; tem cerca de 280 referências, é autor,m entre outras. ,da série "Guiné, Ir e Voltar", de qwue se publicaram 27 postes, entre  junho d3e 2015 e janeiro de 2016.


Era do meu conhecimento que o estado de saúde do coronel Nuno Rubim vinha a degradar-se e era de esperar o desenlace a curto prazo.

Lamento a perda do meu antigo comandante que conheci em maio de 1965, e com quem privei até dezembro do mesmo ano.

Ambos fizemos parte de um grupo de cerca de 25 militares dos Cmds do CTIG, constituído por oficiais e sargentos e alguns militares guineesnses, entre os quais o Marcelino da Mata, o Abdulai Djaló, o Djmanca e talvez mais um ou dois militares. 

Durante cerca de dois meses que durou o curso, os nossos fins de semana, entre jun e set1965, foram passados no mato. A maior parte das vezes no Oio, que era muito próximo, e uma vez ao Piai (zona de Canquelifá).

Gostei de o ter conhecido, de ter privado com ele, e, naturalmente, a notícia da morte do cor  Rubim não me pode deixar indiferente.

V. Briote | 30 de dezembro de 2023 às 16:15 | (*)

2. Excertos dos escritos do Virgínio Briote, publicados no nosso blogue, sobre o Nuno Rubim (**):

(...) (xiv) Ponto da situação em Brá (***)

Os primeiros grupos, os 'Fantasmas', 'Camaleões' e 'Panteras', percorreram a Guiné de uma ponta a outra. Com o entusiasmo inicial, superaram tudo o que fossem dificuldades, empregaram-se a fundo, os resultados ultrapassaram as expectativas e eram vistos com muito apreço pelo Comandante Militar e pelo próprio Governador-Geral.

Olha vão ali os gajos dos Comandos, a maralha a olhar para eles. Sabe-se como é, ganharam fama e respeito pelo trabalho que fizeram e por aquilo que contaram também. As comissões individuais e as baixas em combate ou por doença, começaram a fazer estragos, os grupos ficaram mais pequenos, era necessário começar novo curso de quadros, aproveitar os resistentes e formar novos grupos.

O major Dinis fora entretanto promovido e regressou a Lisboa. Depois o capitão Rubim tomara conta do Centro e foi o que se sabe. Não por incompetência militar, operacionalmente até era bem competente. Talvez uma certa dificuldade ou falta de paciência no jogo diplomático dos corredores do QG. As questões prendiam-se com a logística e com o emprego operacional dos grupos.

Promessas e mais promessas. Resolveu bater com a porta, sem estrondo como era da sua maneira. Não se entenderam também uns com os outros, a história da Associação Comercial, os problemas disciplinares e os alferes também não ajudaram muito, a verdade tem que se dizer.

De baixa estatura, o corpo maciço escondia uma robustez física incomum. Espantava num tipo daqueles, o jeito que tinha para o desenho, para as pinturas, para tudo que metesse mãos. O tempo vago passava-o a montar modelos de peças de artilharia, carros de combate, aviões de sonho, militares e civis, navios de guerra, desde patrulhas a porta-aviões. Tudo pintado nas cores dos originais, os nomes e tudo. Na saída, deixou-lhe ficar um porta-aviões, as outras maravilhas levou-as todas.

Dois meses depois de ter tomado posse, o novo comandante de companhia estava a ver a história toda para trás, relatórios e actas nas mãos.

Analisara a organização, o quadro orgânico, os efectivos, o sistema de recrutamento, as instalações, a alimentação, a administração, fardamentos, cargas. O estado moral, físico e disciplinar do pessoal. Os oficiais, sargentos e praças, os materiais, a instrução durante e depois do curso, as operações em que intervieram, antes e depois da sua tomada de posse, a forma como os grupos estavam a ser utilizados, tudo a pente fino.

Apesar de ter poucos anos ainda como oficial, achava que, atendendo às circunstâncias próprias do povo português, o pessoal, entenda-se cabos e soldados, era quase sempre bom. Quando surgiam problemas, normalmente deviam-se à organização, frequentemente mal montada ou aos graduados, algumas vezes as duas coisas juntas. Neste caso dos Comandos da Guiné, os oficiais eram cruciais na organização, não se cansava de insistir.

Saía com eles para o mato, acompanhava-os na instrução, fazia-lhes ver a importância do papel deles na organização, moralizava-os, até os tempos livres aproveitava para os acompanhar.

Os alferes tinham colaborado e também neles sentiu a necessidade de falarem com ele. A agressividade incrível com que tinham sido formados e treinados, jovens de 20 e poucos! Como é possível que possam ter dois comportamentos tão distintos, no mato em contacto com o IN e umas horas depois com a PM (Polícia Militar) e a população civil na cidade?

E seria mesmo adequado que estivessem tão próximos de Bissau? Não seria mais sensato, e mais proveitoso até, que estivessem em Mansabá, em Nova Lamego, em Buba, ou num sítio desses? De quem fora a ideia, tê-los a meia dúzia de passos da cidade?

Em alguns casos, não tinha dúvidas, tinham sido mal orientados, deixados ao sabor da intuição de cada um, sem a mínima directiva. Até achava que o produto final era positivo e, se tivessem tido orientação, os problemas disciplinares que ocorreram não teriam existido.

Dos cinco alferes a que a companhia tinha direito, quatro comandantes de grupo e um adjunto, restavam-lhe agora dois, o sobrevivente dos chefes de grupo iniciais e o adjunto, o Caldeira, até então com mais experiência administrativa que operacional. E, pelo que tinha visto deles até agora, achava-os competentes, mereciam-lhe confiança, esperava que continuassem como até aqui na parte operacional, e se integrassem no seu estilo de comando. Contava com eles, eram as pedras base do edifício a reconstruir, dissera-lhes mais que uma vez.

No relatório inicial que fizera para o Comandante Militar, adiantara várias propostas, pensara até que com tantas dificuldades, de tanto lado, se calhar não seria má ideia extinguir os grupos. O Brigadeiro refutou com o argumento de que, apesar de todas as dificuldades, os grupos até então existentes eram os que mais contactos tinham tido com o IN e com mais material capturado até à data. Vira os resultados das tropas especiais que a 3.ª Repartição tinha preparado para o brigadeiro, comparou-os com os fuzos, os páras e com os anteriores grupos de comandos.

Contacto efectivo com o IN em mais de 80% das saídas para o mato. Ouvira o Brigadeiro dizer que não se podia esquecer que os Comandos, a maior parte das vezes, actuavam em áreas densas de IN, em grupos de 20 a 25 homens e às vezes menos, enquanto as outras forças não se metiam lá com efectivos inferiores a meia centena de homens.

Nem um por cento do efectivo total das NT na Guiné, quase 10% das baixas totais causadas ao IN. Extingui-los? Não, a saída deve ser outra, o Brigadeiro a decidir-se por outra solução, para aproveitar o pessoal que restava.

Concluíram a reunião assentando que deveria ser feito o recompletamento para manter o quadro orgânico, isolá-los em Brá, resolver a questão alimentar, ministrar o próximo curso e utilizar os grupos em operações específicas para Comandos e não para reforçar algumas guarnições em sector.

O capitão regressara encorajado, sentira o apoio que andava a reclamar. Depois mudou quase toda a organização administrativa, conseguiu mais praças para o recompletamento, arranjou cozinheiros, alimentação própria, obrigou-os a almoçar todos juntos, disciplinou as saídas, arranjou novas viaturas, melhorou as instalações, e conseguiu, o que não fora nada fácil, fazer aprovar as orientações e normas para o emprego dos grupos.

Agora, todo este tempo passado, achava que valera a pena, que tinha feito bom trabalho.
Os grupos melhoraram os resultados, os conflitos com a PM deixaram praticamente de ocorrer, nem um castigo fora necessário. (...)



Assinatura do Nuno J. V.  Rubim, cap art


(...) (xxvi) Uns continuaram nessas guerras, outros noutras 

(...) O capitão Rubim fez 4 comissões, num total de 9 anos em África. Nos anos de brasa envolveu-se ou foi envolvido pelos acontecimentos do 25 de Novembro, esteve preso em Custóias e em Caxias.

 Depois de ter passado à reserva dedicou-se àquilo que sempre o interessou, o estudo da história militar. Foi professor na Academia Militar, deu aulas a mestrandos nas Faculdades de Letras de Lisboa (Universidade Clássica) e Coimbra, montou vários projectos museológicos, como a Artilharia da Fragata D. Fernando, o Museu da Escola Prática de Artilharia, o Forte de Oitavos em Cascais, foi colaborador da Comissão Nacional dos Descobrimentos e do IPPAR num estudo que realizou sobre a Torre de Belém e tem feito palestras e conferências para alunos de Escolas Primárias, professores universitários, idosos iletrados. Tem vários trabalhos publicados, a maioria como separatas da Revista de Artilharia. E continua a investigar e a escrever enquanto para isso se sentir com forças. (...)

(***) Vd., poste de 24 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15149: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (XIV Parte): Fuzileiros, Páras e Felupes; O que se terá passado em Catió; Casamento com data marcada e Ponto da situação em Brá

(****) Vd. poste de 17 de dezembro de  2015 > Guiné 63/74 - P15498: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (XXVI Parte): Uns continuaram nessas guerras, outros noutras - 2

quinta-feira, 9 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24131: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XXI: Finalmente, Bafatá, a minha linda princesa do Geba...


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > O autor, em Bafatá, sua terra natal, por volta de meados de 1966. (Foto reproduzida no livro, na pág. 149)


1. Continuação da publicação das memórias do Amadu Djaló (Bafatá, 1940-Lisboa, 2015), a partir do manuscrito, digital,  do seu livro "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp,  il., edição esgotada) (*).

O seu editor literário, ou "copydesk", o seu camarada e amigo Virgínio Briote,  facultou-nos uma cópia digital; o Amadu, membro da Tabanca Grande, desde 2010, tem cerca de nove dezenas de referências no nosso blogue.


Recorde-se aqui o passado militar do autor:

(i) começou a recruta, como voluntário, em 4 de janeiro de 1962, no Centro de Instrução Militar (CIM) de Bolama;

(ii) esteve depois no CICA/BAC, em Bissau, onde tirou a especialidade de soldado condutor auto-rodas;

(iii) passou por Bedanda, 4ª CCaç (futura CCAÇ 6), e depois Farim, 1ª CCAÇ (futura CCAÇ 3), como sold cond auto;

(iv) regressou entretanto à CCS/QG, e alistou-se no Gr Cmds "Os Fantasmas", comandado pelo alf mil 'cmd' Maurício Saraiva, de outubro de 1964 a maio de 1965;

(v) em junho de 1965, fez a escola de cabos em Bissau, foi promovido a 1º cabo condutor, em 2 de janeiro de 1966;

(vi) voltou aos Comandos do CTIG, integrando-se desta vez no Gr Cmds "Os Centuriões", do alf mil 'cmd' Luís Rainha e do 1º cabo 'cmd' Júlio Costa Abreu (que vive atualmente em Amesterdão);

(vii)  depois da última saída do Grupo, Op Virgínia, 24/25 de abril de 1966, na fronteira do Senegal, Amadu foi transferido, a seu pedido,  por razões familitares, para Bafatá, sua terra natal (**), para o BCAV 757; ficará em Bafatá até final de 1969, altura em que vai integrar a 1ª CCmds Africanos, que será comandada pelo seu amigo João Bacar Djaló.


 

Capa do livro do Amadu Bailo Djaló, "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974", Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada.  


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Bafatá   (vd. carta de 1955, escala 1/50 mil) > Vista aérea da "princesa do Geba" > Em primeiro plano, o rio Geba, à esquerda, e a piscina de Bafatá (que tinha o nome do administrador Guerra Ribeiro e foi inaugurada em 1962, tendo sido construído - segundo a informação que temos - por militares de uma unidade aqui estacionada ainda antes do início da guerra).

Ainda do lado esquerdo, o cais fluvial, uma zona ajardinada, a estátua do governador Oliveira Muzanty (1906-1909)... Ao centro, a rua principal da cidade. Ao fundo, ao alto da avenida principal, já não se chega a ver o troço da estrada que conduzia à saída para Nova Lamego (que ficava a nordeste de Bafatá); havia um a outra, alcatroada, para  Bambadinca, a oeste, mas também com acesso à estrada (não alcatroada) de Galomaro-Dulombi, povoações do regulado do Cossé, que ficava a sul. À entrada de Bafatá, havia uma rotunda. ao alto. Para quem entrava, o café do Teófilo, o "desterrado", era à esquerda..

Do lado direito pode observar-se as traseiras do mercado. Do lado esquerdo, no início da rua, um belo edifício, de arquitetura tipicamente colonial, pertencente à Casa Gouveia, que representava os interesses da CUF, e que, no nosso tempo, era o principal bazar da cidade, tendo florescido com o patacão (dinheiro) da tropa. Por aqui passaram milhares e milhares de homens ao longo da guerra,. que aqui faziam as suas compras, iam aos restaurantes e se divertiam... com as meninas do Bataclã.

Foto (e legenda): © Humberto Reis (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.] 


Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um    luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XXI:   

Finalmente, Bafatá, a minha linda princesa do Geba 
(pp. 147-153)


Foi só em agosto [de 1966] que apanhei o barco para Bafatá.

Enquanto vou reescrevendo estas histórias da minha vida militar, vêem-me à memória outros factos que ocorreram.

Vou voltar a falar do exame de condução em Bissau. Éramos quatro, dois 1ºs cabos e dois soldados. Eu era o único negro, os outros eram todos brancos. O examinador era um tenente.

À saída do quartel, com um cabo europeu ao volante, quando chegámos às vielas da Achada, o tenente mandou-lhe fazer inversão de marcha. Concluído o exame, mandou entrar outro. Um soldado europeu, que pertencia ao batalhão de Bafatá, o mesmo para onde eu ia como adido, ocupou o lugar. Então, o tenente perguntou-lhe se ele tinha precedência sobre os outros.

Ele não respondeu e o tenente disse para ele olhar bem e ver se havia alguém que tinha direito a ir à frente dele. Ele olhou para trás e manteve-se mudo. Então o tenente, virando-se para mim, chamou "N
osso cabo!!,  e mandou-me entrar. Fiz o exame na vez que me competia, fiquei apto, o outro a seguir também ficou e ele ficou inapto.

Esse militar europeu ficou tão aborrecido que, quando eu já estava em Bafatá, nunca me falou, nem os olhos dele me viam bem.

Cerca de uma semana depois da minha chegada a Bafatá um soldado europeu disse-me que eu tinha faltado ao serviço no dia anterior.

 Não consultaste a escala de serviço?

 
  Sim, claro que consultei!

 
  Então, por que faltaste?

Chegou o furriel e disse-me a mesma coisa, que eu tinha faltado ao serviço. Eu não sabia que tinha estado de serviço. Então ele disse-me que o acompanhasse ao gabinete do 1º sargento.

 
  Este é o cabo que faltou ontem, meu primeiro !

O nosso primeiro pegou em mim e levou-me ao gabinete do nosso major [1], o 2º comandante.

 Então, que se passa?

 O 1º cabo que faltou ao serviço, ontem, meu major!

 Onde foste, para faltar?  perguntou-me.

 Meu major, eu não sabia que um 1º cabo fazia serviço de soldado. Eu sou cabo para fazer reforço.

- Aqui os cabos africanos fazem reforço, meu major   
 cortou o nosso primeiro.

Então, o major virou-se para o 1º sargento:

– Ele tem razão ou não?

O 1º sargento queria voltar a explicar e o major mandou-nos sair, dizendo:

 Ele tem razão, é cabo, não é soldado!

No dia seguinte estive de cabo de guarda. Apresentei-me na parada, como deve ser, passados 5 dias fiquei de cabo de dia, correu tudo normal também. Até que, alguns dias depois, às 08h45 rendi o colega, um cabo europeu, na Ponte. Eram cerca de 10h00, estava eu a ajudar um rapaz a pescar, chegou um jipe com um cabo europeu para me render.

 
  O que terá acontecido? Por que entrei de serviço às 08h45 e às 10 aparece um colega para me render?

Tomei o lugar no jipe, algo preocupado. Quando cheguei, o sargento mandou-me entregar todos os materiais e disse-me para depois ir falar com ele. Entreguei o material e voltei, então, ao 1º sargento que me levou ao gabinete do nosso major. Aqui, o sargento retirou-se e eu fiquei só com o 2º comandante.

 Agora, passas a sair comigo e com o nosso comandante. Amanhã de manhã, às 07h30, estás aqui para irmos a Fajonquito.

A partir dessa data fiquei como guarda-costas e intérprete dos oficiais.

Uns dias depois, chegou um tenente miliciano, João Pereira da Cruz, que veio a ser o oficial de informações do Batalhão de Caçadores 1877, e passei a trabalhar com ele. Passados uns dias, o tenente foi promovido e acompanhei-o até ao fim da comissão dele Passámos os dois por situações difíceis de esquecer. E ficámos amigos até aos dias de hoje.

 Cantacunda 
[tem 40 referências no nosso blogue, pertencia ao subsetor de Geba], a cerca de 13 kms a nordeste de Bafatá, foi atacada com grande violência ao início da madrugada de 11 de abril de 1968 [2]. Alguns militares [3] foram capturados pelo PAIGC [4]. No ataque morreu um cabo europeu [5], um milícia e um civil. A tabanca ficou a arder, toda destruída.

Em Bafatá ouvimos os rebentamentos. Logo pela manhã, uma coluna, comandada pelo capitão Cruz, pôs-se em movimento, em direcção a Cantacunda. Chegámos ao cruzamento do Geba, onde nos aguardava a companhia [6] de que os militares sequestrados faziam parte.

Continuámos a marcha até que vimos Cantacunda, num silêncio total, arrasada. Seguimos o rasto do PAIGC, vimos latas e garrafas vazias de todo o tipo de bebidas e fomos andando até que o capitão decidiu regressar ao aquartelamento e depois a Bafatá.

Às 21h00 do domingo, dia 8 de setembro do mesmo ano, o PAIGC atacou o aquartelamento de Sare Banda, na antiga estrada de Bafatá para Mansabá. Com os militares daquele destacamento da CArt 1690 vivia apenas um civil, já idoso. O ataque foi bem combinado, da mesma forma como tinham feito em Cantacunda.

Aproximaram-se e foram contornando o aquartelamento, dispondo as forças de maneira a tentarem fechar a saída para Bafatá e Geba. Deixaram uma única saída para o mato. O aquartelamento era rodeado por duas fiadas de arame farpado.

Quando acabaram de preparar o cerco abriram fogo cerrado. O ataque começou com um tiro de canhão [7] contra uma tenda onde estava um alferes [8] e um furriel com um petromax aceso, que tiveram morte imediata. O petromax do posto de comando apagou-se. 

Animados com o ataque, os guerrilheiros, no meio da escuridão avançaram até à primeira fiada do arame, gritando “para Jobel, para Jobel!”. Era para aí, para Jobel que queriam que os atacados se dirigissem. Em Jobel estava o mais forte acampamento do PAIGC, em todo o sector de Bafatá. Depois de ultrapassarem a primeira fiada, atacaram a segunda, intensificando o fogo.

Quando a guerrilha começou a tocar na segunda fiada do arame farpado, começaram a acender-se luzes. Militares do aquartelamento estavam a acender algumas garrafas com petróleo que costumavam dependurar no arame farpado. Foi como um relâmpago que nunca mais se apagava. Surpreendidos já muito perto dos abrigos, alguns dos atacantes foram dizimados à queima-roupa [9]. Os sobreviventes fugiram como puderam abandonando o local de qualquer maneira, deixando corpos amarrados ao arame, alguns a gemerem até de manhã.

Este ataque também foi ouvido por nós em Bafatá. No dia seguinte saímos em coluna para Sare Banda. Depois de chegarmos, seguimos os rastos da retirada. No meio de sangue que fomos vendo, demos com duas sepulturas frescas, ainda acabadas de fazer.

O soldado Saliu Baldé [10] foi apresentado ao General Spínola como a “máquina defensiva” de Sare Banda, um dos heróis daquela noite. Mas todos os que lá ficaram a resistir foram heróis, menos o 1º cabo Bari que, ao que parece, fugiu, sempre a correr até ao Geba. Mais tarde disse que tinha saído do quartel para pedir reforços.

Os visitantes pensaram repetir, em Sare Banda, a vitória que tinham tido em Cantacunda, mas tiveram uma derrota inesquecível. E para os prisioneiros de Cantacunda, a derrota não foi definitiva. Dois anos passados, foram libertados da prisão de Conackry, pelas nossas tropas que foram lá abrir-lhes as portas para regressaram às suas famílias [na sequência da Op Mar Verde, 22 de novembro de 1970]  . Sorte que não tiveram os que morreram em Cantacunda e em Sare Banda.

O pelotão que tinha recebido as instruções para a defensiva, em Sare Banda, aplicou-as bem e ganharam. É por isso mesmo que temos de saber aplicar as regras, de estabelecer um novo plano, e lembrarmo-nos que surpresa é só a primeira vez, à segunda já não é surpresa. Há que preparar um novo plano e cumpri-lo. E vai ser sempre assim, enquanto houver guerra. Por isso, eu disse atrás, que a guerra aumenta o conhecimento do homem, porque a guerra precisa sempre de novas artes para vencer e não ser vencido.

(Continua)
________

Notas do autor ou do editor VB:

[1] Nota do editor: Major Joaquim Ribeiro Simões?

[2] Nota do editor: 5ª feira Santa.

[3] Nota do editor: um dos militares capturados, o Soldado cozinheiro Luís dos Santos Marques, morreu no cativeiro em Conakry. Os outros dez foram libertados, aquando da operação “Mar Verde”. Um outro, Luís Francisco da Silva, radiotelegrafista, passou-se para o PAIGC e nunca mais foi visto desde que chegaram à prisão.

[4] Nota do editor: Furriel miliciano José Neto Vaz, comandante interino do destacamento; primeiros-cabos José Manuel Moreira Duarte e José da Silva Morais; soldados António Ângelo Duarte, Armindo Correia Paulino, David Nóbrega Gouveia Pedras, Domingos Noversa da Costa, Francisco Gomes da Silva, João da Costa Sousa, José dos Santos Teixeira, Luís Salvador Antunes de Almeida Vieira, Luís dos Santos Marques e Luís Francisco da Silva, radiotelegrafista.

[5] Nota do editor: 1º Cabo João Aguiar, morto à facada à saída do abrigo.

[6] Nota do editor: CArt 1690

[7] Nota do editor: o relatório do ataque diz:

 “O ataque iniciado com um tiro de canhão s/recuo e dois LGF, dirigidos contra a cantina e depósitos de géneros, atingiram mortalmente o alferes, comandante do destacamento, e um furriel e provocaram ferimentos num soldado. Estes tiros iniciais do IN atingiram e destruíram o mastro da antena horizontal do rádio, ficando assim o destacamento com as comunicações cortadas com toda a rede de Geba. 

"No seguimento da acção o IN atingiu com uma granada incendiária uma barraca coberta por 2 panos de lona de viaturas pesadas, onde costumavam dormir vários elementos das NT por não caberem todos nos abrigos, o que provocou a destruição de todo o material lá existente e a iluminação das posições das NT.” 

Mais à frente, lê-se no mesmo relatório: 

“Refira-se ainda que o facto do destacamento de Sare Banda ter ficado sem comunicações, logo no início do ataque, permitiu que Geba só tivesse conhecimento do sucedido cerca das 09H0209SET68, através de 2 praças do destacamento que haviam vindo a pé voluntariamente comunicar a ocorrência.”

[8] Nota do editor: Alferes Carlos Alberto Trindade Peixoto e Furriel Raul Canadas Ferreira.

[9] Nota do editor:

 “O destacamento era comandado pelo Alferes Carlos Alberto Trindade Peixoto, sendo eu próprio, alferes António Moreira, nessa altura, Comandante da CArt 1690. O aquartelamento tinha sido construído no mês anterior, em Agosto de 1968, pelo meu grupo de combate, reforçado com granadeiros e auto-metralhadoras do Esquadrão de Cavalaria 2350 de Bafatá e elementos de Engenharia, sob o meu comando directo. Construímos seis abrigos subterrâneos, com 2 fiadas de arame farpado, a interior armadilhada. 

"Fui ali visitado pelo General Spínola, que me forneceu, em menos de uma semana, todo o material de guerra e de logística que lhe solicitei. No edifício do comando, numa palhota no centro do destacamento, onde tínhamos os aparelhos de rádio e a cantina estavam o Alferes, dois furriéis e dois ou três soldados a petiscarem, com o petromax aceso. O primeiro tiro foi uma canhoada, directa a esta luz, que, de imediato, fulminou o Alferes Peixoto, sendo o Furriel Raul Canadas Ferreira atingido mortalmente com vários estilhaços que lhe cortaram a veia jugular. Veio a falecer cerca das quatro horas da manhã do dia seguinte, completamente esvaído em sangue, nos meus braços e de dois guarda-costas meus. 

"Quem dirigiu a reacção ao ataque, na sequência da baixa do alferes, do furriel Canadas e do outro furriel, que ficou em pânico e se meteu num abrigo até ao fim, foi um cabo pára-quedista, chamado António da Costa Pacheco, que tinha sido colocado na CArt 1690, por castigo, em substituição de outro, caído em combate. Este pára era um excelente operacional e foi ele quem me foi chamar à sede da Companhia, onde chegou às 3 horas, de 09Set68, a pedir socorro. Fez o percurso sozinho, a pé, percorrendo cerca de 14 quilómetros, pela picada, até Geba. Fui eu próprio quem o propôs para uma Cruz de Guerra. 

"Reuni de imediato uma força de cerca de 40 a 50 homens que avançou, sob o meu comando, para Sare Banda, que alcançámos pelas 4 horas. Pelas 5 horas, ao raiar da aurora, iniciamos um reconhecimento à volta do quartel, por fora do arame farpado. Encontramos dois cadáveres de guerrilheiros e um terceiro com as pernas esfaceladas, que ao ver-nos aproximar, ainda tentou empunhar uma G-3 e varrer-nos com uma rajada, a mim e aos dois guarda-costas, que me ladeavam. De imediato um destes meus guarda-costas, um madeirense de nome Jaime, disparou-lhe uma rajada que lhe cortou a cavidade craniana em 2 faces, deixando-o com “os miolos” à vista e a fumegar. 

"Este guerrilheiro era o enfermeiro e possuía uma excelente bolsa de medicamentos, muito mais moderna e sofisticada que as nossas, de origem chinesa, e a arma que empunhava, a G3, pertencia à nossa Companhia, que tinha sido retirada do cadáver do Alferes Fernando da Costa Fernandes, no dia 18 Dezembro de 1967, durante o ataque a Sinchã Jobel. 

"A coluna que veio de Bafatá e alcançou Sare Banda, era comandada pelo Major de Cavalaria Vergas Rocha, e chegou a este destacamento cerca das 08h30. O PAIGC sofreu aqui um forte revés, pois encontrámos rastos de sangue, o que denota que tiveram várias baixas que ainda recuperaram, à excepção daquelas três que não conseguiram. 

"De iluminação, possuíamos apenas umas garrafas de cerveja vazias, com petróleo, dependuradas no arame farpado, com uma torcida de pano acesa a improvisar um candeeiro. Quando se iniciou o ataque, mal vimos rebentar o primeiro tiro de canhão, apagámos o petromax do edifício do comando, e acenderam-se, momentos depois, algumas das tais garrafas de cerveja, no interior dos abrigos e no abrigo do morteiro 81, para orientar o tiro.” 

Depoimento escrito por António Moreira, Alferes miliciano na CART 1690 durante os 23 meses de comissão na Guiné. Foi o único alferes que cumpriu a totalidade do tempo de comissão. Dos outros, três foram feridos e dois morreram em combate. Após regressar da Guiné, António Moreira licenciou-se em Direito e é, há muitos anos, advogado com escritório em Torres Vedras.

[10] Nota do editor: Saliu Baldé tinha sido ligeiramente ferido e o General levou-o no helicóptero para Bafatá. Depois de recuperado foi para o grupo do Marcelino da Mata. Posteriormente foi condecorado com a Cruz de Guerra de 3ª classe.

[Seleção / Revisão e fixação de texto / Negritos / Subtítulo / Parênteses retos com notas: LG]
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Notas do editor:


(**) Vd. poste de 22 de outubro de 2022 >  Guiné 61/74 - P23728: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte IV: Infância e adolescência