Major General Hélio Esteves Felgas (1920-2008) > Foto gentilmente cedida pela filha, Dra. Helena Felgas, advogada, amiga do nosso camarada Jorge Cabral, e que conheci pessoalmente no dia do funeral do pai. Reproduz-se igualmente a assinatura do então brigadeiro Hélio Felgas, em documento, de 1995, de que o Paulo Raposo me facultou fotocópia.
1. Hélio Felgas (Major General reformado):
(ii) Na última, começou por “chefiar o Estado-Maior do Sector de Mansoa”, depois passou ao “Comando do Batalhão de Artilharia de Tite, no sul” (BART 1914) e, por fim, ficou à frente do “Sector Leste, que abrangia cerca de metade do território e incluía batalhões das três armas combatentes, os quais, naquele tipo de guerra, actuavam concertadamente” (Agrupamento nº 2957).
(iii) Um dos batalhões que integrava o Agrupamento nº 2957 (sediado em Bafatá) era o BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70).
(iv) Com o posto de coronel, comandou a célebre Op Lança Afiada, uma das maiores que se fez no TO da Guiné (8 a 19 de Março de 1969);
(v) Foi um dos militares portugueses da sua geração mais brilhantes e mais condecorados;
(vi) Autor de dezenas de livros e artigos sobre a "luta contra o terrorismo", a guerra ultramarina...
(vii) Comparou a Guiné ao Vietname;
(viii) Considerava que a solução para a Guiné não era militar mas política;
(viii) Considerava que a solução para a Guiné não era militar mas política;
(ix) Foi um crítico de Spínola, que lhe terá roubado, entretanto, a ideia dos famosos reordenamentos (aldeias estratégicas);
(x) Um oficial intelectualmente brilhante mas controverso, dizem alguns dos seus pares, mais novos;
(x) Condecorado com a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito (1970), passou compulsivamente à Reserva, a seguir ao 25 de Abril, data em que estava em comissão de serviço em Angola.
(x) Condecorado com a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito (1970), passou compulsivamente à Reserva, a seguir ao 25 de Abril, data em que estava em comissão de serviço em Angola.
Esta nota biográfica é respigada de Os últimos guerreiros do império (Amadora: Erasmo, 1995), livro donde constam entrevistas com o Comandante Rebordão de Brito, o Coronel Caçorino Dias, e o Alferes Marcelino da Mata, entre outros. Nele, o então Brig Hélio Felgas faz um depoimento sobre a guerra da Guiné.
Já aqui publicámos a última parte do depoimento ("algumas considerações acerca da Guiné Portuguesa"), onde ele é intencionalmente polémico, comparando a Guiné com o Vietname... Nessa parte do livro (pp. 135 e ss.) , ele revelava - 27 anos depois ! - algumas ideias do relatório que terá enviado, no final do ano de 1968, ao General Spínola, "onde defendia que a concessão da independência à Guiné Portuguesa não iria agravar, antes pelo contrário, a situação em qualquer das outras Províncias Ultramarinas" (p. 135).
Outra peça de antologia é o seu relatório da Op Lança Afiada, onde não se coibe de fazer críticas à falta de apoio aéreo e de outros meios (não-participação das forças pára-quedistas e dos fuzileiros).
2. Alguns comentários de camaradas nossos, face à notícia do seu desaparecimento (em 24/6/2008):
Paz à sua alma a guerra, não resolve nada, veja-se os casos de todos os Países ou negociaram livremente ou aconteceu-lhe o mesmo que a Portugal, ter que negociar sem condições para o fazer.
Colaço
24/6/2008
Luís Graça, chocado com a notícia [da sua morte], reafirmo a admiração que sempre tive por esse Homem, um verdadeiro militar à moda antiga e, mais do que isso, uma pessoa com um sentido de justiça e um humanismo que só em muito poucos consegui encontrar na minha vida militar. Um abraço.
Rui Felício
Ex-Alf Mil 2405
(Mansoa, Galomaro,Dulombi, 1968/70)
25/6/2008
Recebi, há momentos, a triste notícia. É, com Profundo Pesar que lhe apresento as minhas sentidas Condolências. Torno-as extensíveis á Senhora sua Avó e Família. Fui oficial subalterno de seu Avô, quando do Seu Comando no Sector Leste – Bafatá. Mereceu-me, sempre, o mais profundo respeito como Homem e Militar. Manterei, na minha memória, viva a sua recordação. Cumprimenta, Torcato Mendonça. Apartado 43, 6230-909 Fundão.torcatomendonca@gmail.com [Mensagem enviada ao neto do Maj Gen Hélio Felgas, Miguel Fezas Resende]
25/6/2008
25/6/2008
Foi meu comandante,fiz parte da Operação Lança Afiada que contou com 12 Companhias, entre elas a minha, e o resultado ao fim de 11 dias foi um absoluto fracasso, mas não sabia que [ele] defendia que a Força Aérea arrasasse populações inteiras desde que controladas pelo IN. Só que tenho a certaza de que a FA nunca aceitaria essa missão. Paz à sua alma.
Hilário Peixeiro
Cap de Infantaria na altura
19/11/2010
3. Reprodução da 4ª (e última) parte do depoimento do então brigadeiro Hélio Felgas (*). Selecção minha [ além da revisão e fixação de texto] e do Humberto Reis. Fonte: Os últimos guerreiros do império (Amadora: Erasmo, 1995. 135-139) (com a devida vénia...)
Trata-se do Capº III de um relatório que o então coronel, comandante do agrupamento de Bafatá , enviou ao General Spínola, "então meu Comandante-Chefe, onde defendia que a concessão da independência à Guiné Portuguesa não iria agravar, antes pelo contrário, a situação em qualquer das outras Províncias Ultramarinas".
Nesse documento Hélio Felgas defendia igualmente o seu ponto de vista segundo o qual "só no campo político podia ser encontrada uma solução honrosa e vantajosa, já que as nossas possibilidades militares se encontravam muitos reduzidas", face a um inimigo que se fortalecera em demasia.
No capítulo III do relatório, o autor debruça-se sobre "as nossas possibilidades militares". Algumas das suas frases, merecem destaque:
(i) "Não é com os actuais meios, mesmo reforçados, que podemos vencer o Inimigo de hoje".
(ii) "Ou se faz a guerra ou se acaba com ela. Assim é que não chegaremos a qualquer solução favorável".
(iii) "Há que abandonar radicalmente largos pedaços de território e concentrar os meios em áreas reduzidas que deverão ficar totalmente passadas a ferro".
(iv) "Há que empregar largamente os desfolhantes e outros agentes químicos que destruam as culturas".
(v) "Ou se destrói tudo ou de nada serve a operação".
(vi) "Deve ou não deve a Aviação atacar e destruir estas tabancas e a sua população ? Valerá a pena um tal massacre ou não valerá? Isto é que é preciso saber (...)".
(vii) "Calculando, por baixo, os efectivos In na Guiné, diremos que ele [o IN] tem 10 000 homens em armas (só combatentes). Nós temos 20 000, mas uma boa parte é consumida nas guarnições dos aquartelamentos. Precisaríamos ter 60 000, pelo menos. E, mesmo assim, a proporção seria de 1 para 6, o que, neste tipo de guerra, é ainda pouco".
(viii) "(...) o problema não é essencialmente militar. É acima de tudo, político".
(...) As nossas possibilidades militares
Neste final de 1968 a situação militar na Guiné chegou a um ponto tal que só muito dificilmente e com muito optimismo se poderá antever uma melhoria significativa.
Nos gabinetes e em frente da carta talvez não seja difícil encontrar-se uma solução vitoriosa. Os cercos, as batidas, os golpes de mão, o reordenamento das populações e sua autodefesa, tudo isso é aí fácil de fazer. No mato, porém, é muito difícil, e quem escreve isto tem 3 anos de mato.
Mesmo que venham mais helicópteros, mais páras, mais Artilharia e mais Aviação e ainda que os efectivos das forças terrestres sejam aumentados e estas sejam adequadamente dotadas com as granadas, munições e armas colectivas que agora lhes faltam, mesmo que isso suceda em breve prazo, nem assim o nosso êxito militar será garantido. O inimigo está demasiado bem armado, bem apoiado pela população, bem organizado e bem enraizado num terreno que lhe é favorável, para poder ser batido e expulso, pelo menos com a facilidade que se julga.
Realize-se uma operação em larga escala e veja-se o resultado: uns mortos e uns feridos (nossos e deles), umas armas apreendidas, uns acampamentos destruídos e que mais ? Mais nada. Se ao Inimigo não convier o contacto, basta esconder-se no mato e esperar que as nossas tropas se retirem. Ele lá ficará e reaparecerá quando quiser, talvez até emboscando as NT quando elas, julgando-se vitoriosas, regressarem aos aquartelamentos.
Aliás, o que se entende por uma operação em larga escala ? 4 on 5 companhias de forças terrestres, uma ou duas de páras e comandos e a Aviação. Que faremos com estes efectivos? Uma operação, mais nada. Alguns dias depois tudo estará na mesma.
Há dias, aproveitando um PCV de uma Operação, andei «à cata» de acampamentos inimigos. Descobriram-se 5 ou 6. Assim que eram descobertos chamava-se a Aviação que os bombardeava. Mas o que era a Aviação ? Era uma parelha de Fiats que lançava as suas bombas, aliás com grande precisão, no objectivo indicado pelo PCV. Ou então eram os T-6 (só um), igualmente com excelente pontaria.
E eu pensei: com estes pilotos, se em vez de dois Fiats tivessem aparecido 15 ou 20, outros tantos T-6 e uma meia dúzia de helis armados, então sim, ter-se-ia feito uma acção lucrativa, em especial se fosse coordenada com o lançamento de uma companhia em helis.
Não é com os actuais meios, mesmo reforçados, que podemos vencer o Inimigo de hoje. Em minha opinião, toda a actividade militar na Guiné tem de ser mudada. Há que abandonar radicalmente largos pedaços de território e concentrar os meios em áreas reduzidas que deverão ficar totalmente «passadas a ferro». A actual dispersão não pode dar qualquer resultado.
Ou se faz a guerra ou se acaba com ela. Assim é que não chegaremos a qualquer solução favorável.
Há que empregar largamente os desfolhantes e outros agentes químicos que destruam as culturas. De que serve atacar um acampamento IN se a um quilómetro de distância ficaram tabancas e lavras que voltarão a ser utilizadas pelo IN, apoiando-o e permitindo-lhe que lá se mantenha? Ou se destrói tudo ou de nada serve a operação.
O que é preciso definir bem é este problema da população civil sob controlo do IN. Dezenas de milhares de nativos vivem nas regiões sob domínio do IN, em tabancas perfeitamente visíveis do ar. Deve ou não deve a Aviação atacar e destruir estas tabancas e a sua população ? Valerá a pena um tal massacre ou não valerá? Isto é que é preciso saber, pois enquanto estas populações existirem, o IN aguentar-se-á, estruturar-se-á e estará em condições de nos incomodar.
Não é com os actuais meios, mesmo reforçados, que podemos vencer o Inimigo de hoje. Em minha opinião, toda a actividade militar na Guiné tem de ser mudada. Há que abandonar radicalmente largos pedaços de território e concentrar os meios em áreas reduzidas que deverão ficar totalmente «passadas a ferro». A actual dispersão não pode dar qualquer resultado.
Ou se faz a guerra ou se acaba com ela. Assim é que não chegaremos a qualquer solução favorável.
Há que empregar largamente os desfolhantes e outros agentes químicos que destruam as culturas. De que serve atacar um acampamento IN se a um quilómetro de distância ficaram tabancas e lavras que voltarão a ser utilizadas pelo IN, apoiando-o e permitindo-lhe que lá se mantenha? Ou se destrói tudo ou de nada serve a operação.
O que é preciso definir bem é este problema da população civil sob controlo do IN. Dezenas de milhares de nativos vivem nas regiões sob domínio do IN, em tabancas perfeitamente visíveis do ar. Deve ou não deve a Aviação atacar e destruir estas tabancas e a sua população ? Valerá a pena um tal massacre ou não valerá? Isto é que é preciso saber, pois enquanto estas populações existirem, o IN aguentar-se-á, estruturar-se-á e estará em condições de nos incomodar.
Por outro lado, convém, talvez, olharmos para o que se passa no Vietname - que tem bastantes semelhanças com a Guiné. Mais de meio milhão de norte-americanos extraordinariamente bem armados e auxiliados por 850 000 soldados sul-vietnamitas, não conseguem liquidar um adversário que conta apenas 140 000 homens, dos quais só 80 000 são tropas regulares do Vietname do Norte. A proporção é de 1 para 10, em forças terrestres. Além disso, o Vietcong e o seu aliado norte-vietnamês não utilizam nem Aviação nem Marinha e só apresentaram uma amostra de blindados.
Apesar desta desproporção, o Vietcong não foi vencido e esta prestes a vencer. Na Guiné, o IN não é tão bom combatente como o Vietcong e o apoio externo que tem recebido, agora importante, não se compara com o que a Rússia e a China concedem ao Vietcong. Essas são as duas principais diferenças que notamos. Aliás, em parte compensada pela deficiência dos nossos efectivos, do nosso armamento, da nossa instrução militar, do nosso apoio aéreo e naval.
Para podermos dominar a guerrilha na Guiné precisaríamos triplicar, pelo menos, os efectivos agora existentes nos três ramos das forças armadas. E mesmo assim ficaríamos longe da proporção vietnamita (que não foi suficiente, note-se, para se obter a vitória militar). Calculando, por baixo, os efectivos In na Guiné, diremos que ele tem 10 000 homens em armas (só combatentes). Nós temos 20 000, mas uma boa parte é consumida nas guarnições dos aquartelamentos. Precisaríamos ter 60 000, pelo menos. E, mesmo assim, a proporção seria de 1 para 6, o que, neste tipo de guerra, é ainda pouco.
Eu bem sei que quem não conhece o mato da Guiné, nem as dificuldades deste tipo de guerra, sente-se inclinado a considerar exageradas as minhas palavras. Infelizmente, tenho a certeza do que afirmo. Deixou-se o IN inchar demais para se poder agora desalojá-lo com os meios que temos.
Esta afirmação pode parecer chocante, em especial para as pessoas que não conhecem o assunto com a profundidade que eu conheço. E com certeza que não me acarretará simpatias ou louvores, em especial por parte das pessoas que só gostam de ouvir aquilo que lhes agrade. É evidente que eu ficaria muito mais bem visto se traçasse o quadro da situação militar na Guiné, muito mais optimista, ainda que menos verdadeiro. Talvez até fosse louvado se afirmasse que a guerra na Guiné, tendo chegado ao ponto a que chegou, se pode vencer no campo militar e sem grande dificuldade.
Mas isso não o faço eu, até porque a euforia duraria pouco e seria, em breve, desmentido pelos factos. Eu desejo salientar que só pode mostrar-se optimista a quem conhecer a guerra da Guiné apenas do seu gabinete ou da sala de operações. Eu desejo afirmar que não estou imbuído de qualquer sentimento derrotista. Continuo a demonstrá-lo no mato, mantendo uma actividade ofensiva a que não poupo os meus subordinados nem me poupo a mim. Mas o que acho é que chegou a altura de se dizer a verdade. E a verdade é que, na Guiné, estamos apenas aguentando a situação. Estamos à espera que o IN adquira suficiente estrutura e capacidade militar para correr connosco. Limitamo-nos a espicaçá-lo e ao de leve. Mostramo-nos incapazes de o desalojar definitivamente seja de que área for.
E tudo isto porque não temos meios nem efectivos militares adequados e suficientes. Mas ainda que os tivéssemos e que conseguíssemos empurrar o IN em todas as frentes, até às fronteiras, que faríamos depois? Como conseguiríamos evitar novas infiltrações enquanto o Senegal e a República da Guiné derem a ajuda que dão ao PAIGC ?. A guerra no Vietname ensina-nos que o bombardeamento do Senegal ou do República da Guiné não resolveria o problema, pelo contrário, complicá-lo-ia. E isto porque o problema não é essencialmente militar. É acima de tudo, político, a guerra na Guiné só pode acabar se Portugal conseguir convencer o Senegal e a República da Guiné a deixarem de auxiliar o PAIGC ou qualquer outro movimento cujo objectivo seja independência da Guiné-Bissau.
Não nos parece, porém, que em face da mentalidade internacional agora vigente, alguém bem informado considere possível Senegal ou a República da Guiné apoiarem a nossa política ultramarina. Porque só apoiando essa política os governos de Dakar e Conacri poderiam suspender o auxílio ao PAIGC (...). (**)
__________
Notas de L.G.:
Apesar desta desproporção, o Vietcong não foi vencido e esta prestes a vencer. Na Guiné, o IN não é tão bom combatente como o Vietcong e o apoio externo que tem recebido, agora importante, não se compara com o que a Rússia e a China concedem ao Vietcong. Essas são as duas principais diferenças que notamos. Aliás, em parte compensada pela deficiência dos nossos efectivos, do nosso armamento, da nossa instrução militar, do nosso apoio aéreo e naval.
Para podermos dominar a guerrilha na Guiné precisaríamos triplicar, pelo menos, os efectivos agora existentes nos três ramos das forças armadas. E mesmo assim ficaríamos longe da proporção vietnamita (que não foi suficiente, note-se, para se obter a vitória militar). Calculando, por baixo, os efectivos In na Guiné, diremos que ele tem 10 000 homens em armas (só combatentes). Nós temos 20 000, mas uma boa parte é consumida nas guarnições dos aquartelamentos. Precisaríamos ter 60 000, pelo menos. E, mesmo assim, a proporção seria de 1 para 6, o que, neste tipo de guerra, é ainda pouco.
Eu bem sei que quem não conhece o mato da Guiné, nem as dificuldades deste tipo de guerra, sente-se inclinado a considerar exageradas as minhas palavras. Infelizmente, tenho a certeza do que afirmo. Deixou-se o IN inchar demais para se poder agora desalojá-lo com os meios que temos.
Esta afirmação pode parecer chocante, em especial para as pessoas que não conhecem o assunto com a profundidade que eu conheço. E com certeza que não me acarretará simpatias ou louvores, em especial por parte das pessoas que só gostam de ouvir aquilo que lhes agrade. É evidente que eu ficaria muito mais bem visto se traçasse o quadro da situação militar na Guiné, muito mais optimista, ainda que menos verdadeiro. Talvez até fosse louvado se afirmasse que a guerra na Guiné, tendo chegado ao ponto a que chegou, se pode vencer no campo militar e sem grande dificuldade.
Mas isso não o faço eu, até porque a euforia duraria pouco e seria, em breve, desmentido pelos factos. Eu desejo salientar que só pode mostrar-se optimista a quem conhecer a guerra da Guiné apenas do seu gabinete ou da sala de operações. Eu desejo afirmar que não estou imbuído de qualquer sentimento derrotista. Continuo a demonstrá-lo no mato, mantendo uma actividade ofensiva a que não poupo os meus subordinados nem me poupo a mim. Mas o que acho é que chegou a altura de se dizer a verdade. E a verdade é que, na Guiné, estamos apenas aguentando a situação. Estamos à espera que o IN adquira suficiente estrutura e capacidade militar para correr connosco. Limitamo-nos a espicaçá-lo e ao de leve. Mostramo-nos incapazes de o desalojar definitivamente seja de que área for.
E tudo isto porque não temos meios nem efectivos militares adequados e suficientes. Mas ainda que os tivéssemos e que conseguíssemos empurrar o IN em todas as frentes, até às fronteiras, que faríamos depois? Como conseguiríamos evitar novas infiltrações enquanto o Senegal e a República da Guiné derem a ajuda que dão ao PAIGC ?. A guerra no Vietname ensina-nos que o bombardeamento do Senegal ou do República da Guiné não resolveria o problema, pelo contrário, complicá-lo-ia. E isto porque o problema não é essencialmente militar. É acima de tudo, político, a guerra na Guiné só pode acabar se Portugal conseguir convencer o Senegal e a República da Guiné a deixarem de auxiliar o PAIGC ou qualquer outro movimento cujo objectivo seja independência da Guiné-Bissau.
Não nos parece, porém, que em face da mentalidade internacional agora vigente, alguém bem informado considere possível Senegal ou a República da Guiné apoiarem a nossa política ultramarina. Porque só apoiando essa política os governos de Dakar e Conacri poderiam suspender o auxílio ao PAIGC (...). (**)
__________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLIII: Antologia (32): depoimento de Hélio Felgas (4): "Ou se faz a guerra ou se acaba com ela