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segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26384: Foi há 100 anos (2): A "saloiada" vem às sortes a Lisboa...enquanto bandos de operários, nas ruas, pedem "pão ou trabalho" ("O Domingo Ilustrado", nº 1, 18 de janeiro de 1925)... Estamos já a um ano e pico da instauração da Ditadura Militar.

 

Legenda: "Os Recrutas: Bandos de rapazes dos arredores, com os seus pitorescos trajes invadiram a cidade para a incorporação militar. No meio da monotomnia de Lisboa, o seu ar saudável e a sua indumentária característica aparecem como uma alegre saudação do campo. Oxalá so seus braços aprendam depressa o manejo das armas para as trocarem pela prosaica enxada, de glória humilde mas sagrada". Ilustração: B.B (pág. 1)


Fonte: Capa do semanário "O Domingo Ilustrado",  nº 1, 18 de janeiro de 1925,12 pp. (Custava 1 escudo.). Cortesia de Hemerateca Digital / Câmara Municipal de Lisboa.


Legenda: "A Parada da Fome: Bandos de operários percorreram a cidade pedindo pão com que matassem a fome. É um espetáculo desolador o que oferece uma sociedade que não consegue assegurar a existência dos que produzem. Sem revoltas e sem excessos contraproducentes, todos temos o dever de  arrumar melhor a vida. Por detrás de cada homem está um lar, e se o patriotismo é alguma coisa mais do que uma imagem retórica, façamos lares felizes para que a pátria possa viver". Ilustração: B. B. (pág. 12).

(Seleção, fixação / revisão de texto, reedição de imagens: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2025)

1. Estávamos a um ano e 4 meses do golpe militar do 28 de maio de 1926, que levaria à instauração da Ditadura Militar (1926-1933) e do Estado Novo (1933-1974). (*)

Sobre este novo semnanário, "O Domingo IIustrado" (DI), escreveu Rita Lopes, na ficha histórica disponível em formato pdf, no portal da Hemerateca Digital / Câmara Municipal de Lisboa (**)

(...) Semanário editado regularmente, em Lisboa, entre Janeiro de 1925 e Dezembro de 1927. A sua curta existência coincide com um período de grande perturbação política e social, que muitos autores consideram mesmo de guerra civil latente, e que conduzirá à Ditadura Militar, instaurada pelo golpe militar de 28 de Maio de 1926.

 (...) [Espelha] uma imagem profundamente negativa da política, enquanto jogo protagonizado por partidos, e, consequentemente, da própria democracia, enquanto sistema político. Esta será a mensagem de fundo que trespassará subliminarmente todas as edições até ao golpe de 28 de Maio de 1926. Era então chegada a hora de aclamar sem reservas as forças que, sob o comando do general Gomes da Costa, se sublevaram em Braga e se põem em movimento para Lisboa para confiscar o poder. O DI está ao serviço da sua legitimação e da mobilização da nação: «Este Homem tem poder: Ajudemos este homem a salvar Portugal!» − proclama em primeira página, ilustrada com a bandeira nacional e uma fotografia di militar" (...)

Um dos fundadores e diretor do DI foi o conhecido  Leitão de Barros (1896-1967), professor, realizador de cinema (Nazaré, 1927; Maria do Mar, 1930: A Severa, 1931; As Pupilas do Semhor Reitor, 1935; Ala, Arriba!, 1942; Camões, 1946...), escritor, jornalista, dramaturgo, cenógrafo, pintor, próximo de figuras do poder (António Ferro, Duarte Pacheco, Salazar...) sem contudo ter sido um "salazarista" indefetível (ecompletamente esquecido depois do 25 de Abril).

 (...) "O seu interesse pelas artes gráficas levaram-no a Frankental, na Alemanha, onde fez a aprendizagem da heliogravura. Foi um difusor deste processo em Portugal que fez brilhar no DI e, posteriormente, no Notícias Ilustrado, que também dirigiu, e no Século Ilustrado." (**) 
_____________

Notas do editor:

(**) Vd. Rita Correia (10 de Novembro de 2007). «Ficha histórica: O Domingo Ilustrado (1925-1927)» (pdf). Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 11 de janeiro de 2025.

domingo, 12 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26381: Recortes de imprensa (142): Lusodescendentes do Sri Lanka e o seu crioulo de base portuguesa (Diário de Notícas e Agência Lusa, 8 mai 2023 )



Jovens falantes de português no Sri Lanka, segundo o projecto "Preserving Sri Lanka Portuguese" 

 Foto DR/Facebook, https://www.facebook.com/preservingsrilankaportuguese1 (com a devida vénia)


Lusodescendentes do Sri Lanka com "interesse crescente" em salvar o crioulo

Diário de Notícias | Agência Lusa | 08 mai 2023 09:40  


É uma peça da Agência Lusa, reproduzida no portal www.dnoticias.pt, que merece a nossa atenção, de portugueses e lusófonos: a existência de uma pequena comunidade de lusodescendentes do Sri Lança (o antigo Ceilão) que teima em manter a sua identidade e inclusive  o crioulo de base portuguesa que está em sério risco de extinção. 

A estes esforços está associada a investigadora Patrícia Costa do Centro de Linguística da Unibversidade de Lisboa (CLUL) e que é entrevistada pela Agència Lusa.

Reproduzimos alguns excertos da peça, com a devida vénia (*):

(...) A investigadora Patrícia Costa lançou um projeto para divulgar o crioulo de base portuguesa do Sri Lanka nas redes sociais porque considera que há 'um interesse crescente' nas comunidades lusodescendentes em preservar a língua."

Em abril de 2023, um grupo de jovens começou a organizar aulas de crioulo português para jovens e crianças. 

(...) "O mesmo grupo tem também procurado dinamizar ações para promover a língua no Sri Lanka, onde 'a maior parte da população desconhece totalmente que existe esta comunidade de euro-asiáticos e desconhece que há uma língua totalmente diferente', referiu Costa." (...)

Destaque para um desses jovens, "Derrick Keil, lançou em fevereiro uma versão moderna de uma canção tradicional em crioulo português, 'Minha Amor',  após ter participado no programa de talentos 'The Voice Sri Lanka' (...)

 Patrícia Costa, ouvida pela Agência Lusa, diz que  é "um marco importante na história da comunidade, porque pela primeira vez temos uma música dirigida a audiências várias que tem o crioulo como língua" (...)

A "baila", hoje o género de música talvez mais popular no país, foi introduzidda no Sri Lanka justamente pela "comunidade de falantes do crioulo português",

Patrícia Costa e Vyvonne Joseph, "jovem falante da língua",  foram quem,  em 2020, kançaram o projeto Preserving Sri Lanka Portuguese (Preservar o Portuguès do Sri Lanka), nas redes sociais (Instagram e Facebook).

O objetivo da inciativa, segundo a investigadora  portuguesa do CLUL é4 de "dar a conhecer a audiências mais gerais, também fora do Sri Lanka,  a existência desta língua, porque mesmo em Portugal não há uma grande consciência de que estas comunidades crioulófonas existem".

Um segundo objetivo é auxiliar, com materiais didáticos simples, os membros da comunidade que querem aprender ou aperfeiçoar a língua.

(...) O crioulo português do Sri Lanka 'neste momento é uma língua definitivamente ameaçada. O número absoluto de falantes é bastante reduzido', por volta de 1.300, sendo que a maioria são 'pessoas mais velhas' (...). Para os jovens, 'aprender o crioulo português não tem o valor instrumental que as línguas oficiais do Sri Lanka, o cingalês e o tâmil, têm, no acesso à educação e ao emprego, referiu Costa" (...)

Além disso, disse a investigadora, é preciso superar alguns preconceitos e ideias feitas, no seio da própria comunidade: para alguns membros  seria uma língua obsoleta, e segundo outros   "aprender o crioulo português em casa pode prejudicar a aprendizagem de outras línguas na escola"...

Embora em risco de desaparecer, o crioulo português do Sri Lanka  pode ter futuro.

(...)  "A académica defendeu ainda que uma maior ligação com os países falantes de português 'seria muitíssimo vantajoso para as comunidades crioulófonas, que teriam uma espécie de reconhecimento oficial da sua existência, da sua importância e da sua herança.

"O crioulo português do Sri Lanka, antigo Ceilão, é uma herança da expansão marítima portuguesa no século XVI, quando nasceu como língua de contacto entre cingaleses e portugueses, os primeiros europeus a lá chegar.

"A colonização portuguesa da ilha não durou mais de 150 anos, mas, mais de meio século depois, este crioulo continua a ser falado no seio das comunidades burghers, tradicionalmente católicas." (...)


A palavra "burghers" ( "cidadãos", "citadinos", "burgieses", em holandês) é a designação comum, usada hoje  para todas as pessoas que tèm uma ascendência euro-asiática (n0omeadeamente  portugueses e holandeses),  no Sri Lanka.



Fonte: USA > CIA > The World Factbook (com a devida vénia...)

Mapa do Sri Lanka: principais cidades do país... Em três delas (assinalada a tracejado verde e vermelho) residem comunidades de lusodescendentes. Os portugueses e seus descendentes fixaram-se sobretudo na costa leste, em Trincomalee e em Batticalloa 

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2025)



(...) No Sri Lanka de hoje o crioulo limita-se à linguagem falada. A maioria dos falantes são os burghers da província oriental, em Baticaloa e Triquinimale. Atualmente o inglês tornou-se a língua comum, com o cingalês ensinado nas escolas como segunda língua. De influência portuguesa existem ainda os cafrinhas ou kaffir do Sri Lanka, uma comunidade de origem africana, na província do noroeste Putalão, originalmente trazidos por portugueses, neerlandeses e ingleses para trabalhar no Seri Lanca, e que mantêm assumidamente uma cultura e religião portuguesas.

No Censo de 1981 os burghers (holandeses e portugueses) contavam cerca de 40.000 (0,3% da população total do Sri lanka).

Muitos burghers emigraram para outros países. Existem ainda 100 famílias em Baticaloa e Triquinimale e 80 famílias Kaffir em Putalão que falam o crioulo português. Numerosos apelidos de origem portuguesa permanecem até hoje, como Perera, Pereira, Abreu, Salgado, Fonseca, Fernando, Rodrigo e Silva, que se tornaram parte da cultura do Seri Lanca.

A população burgher no mundo será de 100.000 aproximadamente, concentrada sobretudo no Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. (...)

(Fonte: Excerto de Wikipedia > Burghers Portugueses (com a devida vénia)...



Excerto de banda desenhada infantil "Portuguese in Sri Lanka: part two: their exploits" (em inglês). Texto. Hashana Bandara; ilustração: Saman Kalubowila. (Sumitha Publishers. s/d., s/l. 24 pp.) Fonte: Poth Pancha, Panadura, Sri Lanka: uma livraria "on line" para crianças com menos de 12 anos (Imagem reproduzida com a devida vénia...)


Na primeira imagem acima pode ler-se em inglês: "Os Portugueses que chegaram ao Sri Lanka acidentalmente, em 1505, empenharam-se em estabelecer o seu poder na região costeira norte da ilha, até por volta de 1580" (... o que não é exato: a presença portuguesa manteve-se até meados do séc. XVII, Colombom na costa oeste,  cairia nas mãos dos holandeses apenas em 1656, depois de uma heróica resistência, tendo sobrevivido apenas menos de uma centena de defensores...Os holandeses por sua vez serão substituídos pelos ingleses em finais do séc. XVIII, princípios do séc. XIX. O Sri Lanka tornou-se, mais ou ,menos pacificamente, independente da coroa britânica em 1948. 
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Nota do editor:

quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26338: Foi há 100 anos (1): "bodo aos pobres" por parte dos Armazéns Grandella, em 1 de janeiro de 1925 (Recorte do "Diário de Lisboa, 2/1/1925)

 




Diário de Lisboa, 2 de janeiro de 1925, pág. 1 
(Custava na época este jornal diário vespertino 30 centavos, 
o número avulso; e ia já no 4º ano de publicação).

Fonte: Casa Comum | Instituição: Fundação Mário Soares e Maria Barroso |  Pasta: 05742.006.01429 | Título: Diário de Lisboa | Número: 1147 | Ano: 4 | Data: Sexta, 2 de Janeiro de 1925 | Directores: Director: Joaquim Manso | Fundo: DRR - Documentos Ruella Ramos | Tipo Documental: Imprensa (com a devida vénia...)

Diário de Lisboa/Ruella Ramos 
Citação: (1925), "Diário de Lisboa", nº 1147, Ano 4, Sexta, 2 de Janeiro de 1925, Fundação Mário Soares / DRR - Documentos Ruella Ramos, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_31342 (2025-1-2)


Vd. aqui um pequena biográfica do homem que fundou os Armazéns Grandela, Francisco de Almeida Grandella (Aveiras de Cima, Azambuja,1853 — Foz do Arelho, Caldas da Rainha, 1934), um dos maiores senão o maior benemérito da República. Tendo começado como marçano ou moço de fretes, tornou-se empresário, comerciante, industrial, maçon, boémio,  autarca e benemérito. Uma figura notável do seu tempo, um exemplo bem português do homem que, não tendo nascido em berço de ouro, se fez a si próprio... E que tinha um pioneiro sentido de responsabilidade social como empresário.


 

sábado, 21 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26299: No 25 de Abril eu estava em... (35): Fulacunda, região de Quínara, chão biafada (José Claudino da Silva, ex-1º cabo cond auto, 3ª C/BART 6520/72, 1972/74): "entre a euforia e o receio"



Penafiel > Biblioteca Municipal > 15 de dezembro de 2023  > Apresentaçáo do último livro de José Claudino da Silva, "O Puto de Senradelas" (*).  O autor é natural de Penafiel, mas vive em Amarante. Assume publicamente que é filho de pai incógnito, e que foi criado com a avó, que vendia peixe, porta a porta, para sobreviver
... A mãe morreria cedo, em 1 de junho de 1974, estava ele  ainda no TO da Guiné.

"A minha mãe não teve meios de me criar e entregou-me à minha avó. Isso nunca impediu de a respeitar; orgulho-me da minha mãe. Sem ela, eu não estaria aqui. Só passei uma festa com a minha mãe: Foi o último Natal, antes de assentar praça. Ainda bem que o fiz!" (...)

Foto:  Cortesia dos Amigos da Biblioteca de Penafiel (com a devida vénia...) (Edição e legendagem:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2023)



Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BART 6520/72 (1972/74) > 1973 > O José Claudino da Silva junto a cartaz de parede com os dizeres: "Páscoa Feliz, Os Serrotes, Fulacunda". "Serrotes", além de ser o nome de guerra da companhia, era também o título do "jornal de caserna", dirigido pelo alf mil Jorge Pinto, também nosso grão-tabanqueiro.

Foto: © José Claudino da Silva (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Na sua série "Ai, Dino, o que te fizeram!" (**)...,  o nosso grão-tabanqueiro José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74), não tem uma referência explícita ao dia 25 de Abril. A última carta, para a namorada [Amélia, sua futura esposa] , de que ele publicou uns excertos, era de março de 1974. Ora no dia 25 de Abril ele  ainda estava em Fulacunda, 

(...) Estou muito perto de terminar esta partilha confidencial de emoções que guardei, sem nunca ter intenção de divulgar. Entre o drama e a comédia, tentei dar-vos uma visão dum soldado que escreveu apenas por amor, num tempo de guerra.

A partir de março de 74, e talvez por influência da mãe e do irmão, a Amélia deixou de guardar o correio que lhe enviava. Embora eu continuasse a escrever, já não o fazia tão assiduamente.

No meu mapa, não está marcado que tenha escrito, por exemplo, no dia 25 de Abril de 1974. Sei que festejei esse acontecimento em Fulacunda mas não me lembro como foi.

Ora, como é lógico, e partindo do princípio que me norteou, não quero citar nada que não possa provar. Contudo, mesmo assim, ainda consegui reaver alguma correspondência sem grande relevância, exceto a última que escrevi. Esta última carta tem 12 páginas que perfazem um total aproximado de 2700 palavras. (...) (*)



2, Excertos  de uma entrevista, que deu há 8 meses, ao "Amarante Magzine", edição de 24 de abril de 2024 (e aqui reproduzidos com a devida vénia):


Claudino Silva: no 25 de Abril senti euforia, mas também receio




(,,,) José Claudino da Silva nasceu em Penafiel em 1950. Serviu nas forças armadas portuguesas entre 1972 e 1974, em Fulacunda, na então Guiné Portuguesa. 

Chapeiro automóvel de profissão, entretanto passado à reforma, é conhecido e reconhecido em Amarante pela fundação do Bosque dos Avós, um projeto de reflorestação lançado em 2018, em terrenos dos Baldios de Aboadela, na Serra do Marão. É autor de vários livros, nomeadamente “O puto de Senradelas – Um Percurso ao Acaso”, apresentado em Amarante em janeiro deste ano.

Numa manhã que despontava com a promessa de mudança, o 1º cabo condutor José Claudino da Silva acordou com uma notícia que lhe despertou um turbilhão de emoções. A 25 de abril de 1974, enquanto o mundo ainda dormia, uma revolta militar eclodia em Lisboa, ecoando até ao coração da então Guiné Portuguesa, onde se encontrava ao serviço da 3ª Companhia do Batalhão 6520 de 1972.

“Confesso que senti uma grande euforia, de que tudo acabara para mim, mas não sem uma sombra de receio”, afirmou a Amarante Magazine. 

Aos 74 anos, este antigo chapeiro automóvel de Penafiel recorda-se bem daquele dia, numa altura em que enfrentava represálias por ter expressado críticas às chefias militares numa publicação interna, editada em finais de 1973.

O medo de retaliação por mostrar contentamento com a revolta era palpável, recorda. “Outras tentativas de revolta, anteriores ao 25 de abril de 1974, fracassaram. E naquela altura estava a ser castigado pelas minhas palavras“, frisa.

Aquele já era um tempo de abalar convicções para o jovem cabo que, no início da sua carreira, se considerava um “militarista”, crente nas razões que o levaram a Fulacunda, bem no interior da Guiné. “Fui para lá convencido que ia defender Portugal”, recorda. (...)


Após o assassinato de Amílcar Cabral, em 20 de janeiro de 1973, e oito meses mais tarde, com a declaração unilateral da independêrncia, em 24 de setembro, o nosso "Dino" começa a ter dúvidas, conforme confessa ao jornalista: 
 
 (...) “Houve uma altura em que comecei a questionar a legitimidade da nossa presença na Guiné, quando vivíamos cercados por arame farpado, num país reconhecido e independente”.

Em 11 de junho de 1974, Claudino da Silva regressou antecipadamenet a Portugal por motivo da morte da sua mãe. Já chegaria tarde para o enterreno: ela tinha morrido no dia 1 (*): 

  (...) “Deixei a minha G3 num canto da cantina [ na altura ele era o cantineiro] e trouxe comigo apenas o essencial: a farda, fotografias, algum dinheiro e as cartas da minha namorada. (...)  Só quando chego a Lisboa é que finalmente percebo que [a guerra] acabou para mim, que já não havia volta a dar”.

Na entrevista dada ao semanário Amarante Magazine, confidenciou que , durante a sua comissão de dois anos, escreveu perto de um milhar de cartas, na sua grande maioria para  a namorada, mas também para a família e amigos. Essa correspondência foi por ele listada e organizada.  Esses e outros escritos (em parte já publicados no nosso blogue), a par do seu álbum de 160 fotografias,  poderão estar na base de um futuro livro com as suas memórias da tropa e da guerra.(***)
 
(...) "Tudo isto é um legado para a minha neta, para que fique a saber quem era o avô e o que ele passou. (...)  Ao longo destes 50 anos, vivi tantas vicissitudes. Nasci e cresci numa condição humilde, mas sempre em evolução. E ainda continuo a evoluir, graças ao 25 de abril de 1974”. (****)

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos e itálicos, parênteses retos:  LG) 

segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26224: Recortes de imprensa (141): Morreu aos 80 anos o comandante do PAIGC, Júlio de Carvalho ("Julinho"), e também primeiro cmdt das Forças Armadas de Cabo Verde ("A Semana", de 26nov2024)


Júlio de Carvalho (1943 - 2024).
Foto. Cortesia de ACOLP / A Semana,
 26nov2024

1. Recorte de imprensa que nos chega através do nosso amigo e camarada Zeca Macedo
 (ex-2º tenente fuzileiro especial, RN, DFE 21, Cacheu e Bolama, 1973/74; nasceu na Praia, Santiago, Cabo Verde, em 1951; vive nos Estados Unidos, onde é advogado; é membro da nossa Tabanca Grande desde 13/2/2008):


Data . terça, 26/11, 14:06


Luis, junto te envio anoticia publicada hoje, dia 26 de Novembro, sobre o falecimento do Comandante Júlio Carvalho, um dos heróis da Luta pela Independência de Cabo Verde (e da Guiné)

 Ab, Ze Macedo

2. Recortes de imprensa  > Óbito: Faleceu Júlio de Carvalho o primeiro comandante das Forças Armadas de Cabo Verde

A Semana, 26 nov 2024


Faleceu na madrugada de hoje, na cidade da Praia, o primeiro comandante das Forças Armadas de Cabo Verde, Júlio de Carvalho, também combatente da liberdade da Pátria, comunicou a Associação dos Combatentes da liberdade da Pátria (ACOLP).

Julinho Carvalho, como era conhecido, de acordo com a ACOLP, nasceu no Mindelo a 27 de Janeiro de 1943, estudou no Liceu Gil Eanes, onde se destacou pela sua “participação apaixonada” pelas atividades desportivas, tendo inclusive integrado a seleção de voleibol do referido liceu.

Nessa altura, refere um comunicado da ACOLP, com Abílio Duarte, toma conhecimento dos ideais da luta pela independência de Cabo Verde desenvolvida pelo PAIGC, com as quais ele logo se simpatizou, tendo em 1961 viajado para Portugal onde se inscreve como estudante de Engenharia Química,  juntamente com Amaro da Luz, Tito Ramos, e outros estudantes nacionalistas.

“Decidido a exercer um papel activo na luta encabeçada pelo PAIGC, nos finais de 1964, Julinho foge para Paris onde se junta a Manecas Santos, Manuel Delgado, Joaquim Pedro Silva e Olívio Pires. Sob a orientação de Pedro Pires, ele participa na mobilização de um grupo de cabo-verdianos emigrantes na região de Moselle, na França”, lê-se no comunicado da ACOLP.

Júlio de Carvalho, segundo explica ACOLP, integrou a luta armada em Kandjafara, como comandante de artilharia da Frente Sul e, em Maio de 1973, participou na operação que culminou com a tomada do quartel fortificado de Guiledge, prenunciando o fim da ocupação portuguesa na Guiné.

Após o 25 de Abril de 1974, participou nas primeiras negociações com militares portugueses realizados a 15 de Julho, em Cantanhez, no sul da Guiné, visando o estabelecimento de um cessar fogo na Guiné, tendo em fins de 1974, depois da Independência da Guiné, permanecido em Bissau onde, durante cinco anos, exerceu as funções de comissário político das Forças Armadas.

Depois do golpe de Estado de 1980,  estabeleceu-se em Cabo Verde onde exerceu funções de ministro do Interior, primeiro e, de seguida, ministro da Defesa e Segurança, no último mandato de Pedro Pires como primeiro-ministro.

Com a derrota eleitoral do PAICV, fixou residência no Sal onde viveu nos últimos tempos como empresário.

Júlio de Carvalho foi membro da Comissão Política do PAICV e durante toda a sua vida de luta evidenciou, conforme a ACOLP, um “grande patriotismo” como “um elevado espírito de sacrifício e dedicação” em prol de Cabo Verde.
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quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26199: Recortes de imprensa (140): "Navio doado por Portugal, batizado "Centenário de Amílcar Cabral", veio facilitar a ligação entre Bissau e o arquipélago dos Bijagós



Fotograma de vídeo da RTP África > Notícias >14 out, 2024, 15:57 > "Navio 'Centenário de Amílcar Cabral' doado por Portugal facilita a ligação entre Bissau e Bijagós" (com a devida vénia...)


1.  Com a devida vénia, transcreve-se parcialmente uma peça da Lusa, constante do portal RTP Madeira > Política 12 out, 2024, 21:03


Pronto a zarpar navio oferecido por Portugal às populações da Guiné-Bissau


O navio oferecido por Portugal à Guiné-Bissau foi hoje batizado (...).

O secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal, Nuno Sampaio, entregou ao Presidente da República da Guiné-Bissau a chave da nova embarcação batizada com o nome “Centenário de Amilcar Cabral”, em homenagem ao líder histórico guineense.

O chefe de Estado agradeceu ao Governo português mais esta “demonstração clara da excelência das relações” entre os dois países e a concretização de um projeto que nasceu há dois anos e que ainda aguardará mais alguns dias para chegar a alto mar.

A perspetiva do Governo guineense, exposta na cerimónia de batismo pelo ministro dos Transportes, Marciano Silva Barbeiro, é de que as viagens entre Bissau e as ilhas comecem ainda durante o mês de outubro.(**)

O Governo português investiu mais de 2,5 milhões de euros na reparação e adaptação da embarcação com capacidade para transportar 340 passageiros e uma grua de carga de cinco toneladas, como explicou o secretário de Estado português.

O investimento foi suportado pelo Fundo Ambiental de Portugal e contou com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a colaboração de outros parceiros internacionais, segundo o governante.

O novo navio irá evitar o recurso a pirogas e canoas, o meio de transporte marítimo mais usado pelas populações das ilhas Bijagós, e “permitir mais segurança”, assim como servirá o turismo, a deslocação de doentes ou o transporte de máquinas para a agricultura, disse ainda.

Nas águas do rio Geba, este navio “irá cimentar as condições de desenvolvimento da Guiné-Bissau”, considerou o governante português, salientando que permite a recolha de passageiros mesmo na ausência de cais, com uma lancha para embarque e desembarque de passageiros.

O ministro dos Transportes da Guiné-Bissau, Marciano Silva Barbeiro, realçou a necessidade da construção de pontões flutuantes em Bissau, Bolama e Bubaque e que o Governo guineense já solicitou apoio à União Europeia para este fim.

Para conseguir uma tarifa mais baixa para as populações, o governante guineense defende que uma parceria público-privada para assegurar o serviço. (...)

 O Presidente da República da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, anunciou que, além do novo navio, o país irá receber “nos próximos meses, 21 autocarros de Portugal”.

O chefe de Estado entende que a Guiné-Bissau irá precisar “de uma empresa gestora competente” e de indústria naval face aos novos avanços no sistema de mobilidade.(...)
 
Sissoco Embaló não tem dúvidas de que o dia de hoje “é um passo para vencer o isolamento entre a parte insular e continental” do país com 88 ilhas, 20 das quais habitadas, e cerca de dois milhões de habitantes.

O secretário de Estado português, Nuno Sampaio, assegurou “sempre apoio de Portugal à Guiné-Bissau” e anunciou que, em breve, vai ser assinado uma acordo para o desenvolvimento do das ilhas Bijagós

Portugal e a Guiné-Bissau têm um Programa Estratégico de Cooperação (PEC) em execução entre 2021 e 2025, que prevê um investimento de cerca de 60 milhões de euros no país da África Ocidental.


Lusa

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos: LG)

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 26 de setembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24702: Recortes de Imprensa (139): Jornal "Voz da Guiné" (9): Reprodução das 3.ª e 4.ª páginas do número especial de 10 de Setembro de 1974 (Abílio Magro)

(**) Vd. poste 26 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26197: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (43): Passeio à ilha de Orango Grande, com passagem por Bubaque - Parte I

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26126: Historiografia da presença portuguesa em África (451): o tecido económico da província em 1951, visto através dos anúncios publicados no suplemento, "dedicado ao Ultramar Português" (218 pp., no total), do "Diário Popular", de 20/10/1961



Barbosas & Cia: Import-export... com sede em Bissau. Representava sobretudo duas marcas norte-americanas, a General Eletric e a Studebaker


Ed. Guedes Lda era outro peso pesado do comércio local, já presente em Bolama quando esta era a capital... Tinha sucursais pelo território... "Cetió";  mais que provável erro tipográfico, deve ler-se Catió... Tchequal também deve ser gralha, é topónimo que não existe. Banta El deve ser Madina Bantael, entre Sonaco e  Sare Bacar (esta já na fronteira  com o  Senegal)... Chegava a Orango, a ilha do arquipélago dos Bijagós mas afastada do continente,

A nossa já conhecida  empresa francesa, a NOSOCO, onde trabalhou o nosso camarada Mário Dias... Tinha instalações em Bissau, Bolama,  Bafatá, Binta, Bissorã e Olossato. Tinha o exclusivo, para a Guiné, de marcas prestigiadas como a Shell, Phillips,  Electrolux, Frigelux, Dunlop...


SCOA: outra empresa de import-export, de origgm francesa, com sucursais em Bafatá, Bissorã, Bolama, Sonaco e Farim... Representava uma série de marcas (camiões, automovéis, eletrodomésticos, motores marítimos, cerveja alemã) e também companhias de navegação... Curioso: não estava representada na capital...



Enpresa de import-export e comércio geral, estava ligada ao BNU (Banco Nacional Ultramarino). e cobria praticamente todo o território, com  exceção do Nordeste (Gabu); Bafatá, Sonaco, Contuboel, Teixeira Pinto, Bissorã, Bolama, Bijagós, Chugué, Cabochanque,  Cadique, Cafine, Salancaur, Cabedu, Bedanda, Cacine, Brandão (seria na ilha do Como, a casa Brandão ?)...


O Fouad Faur, sírio-libanês, tinha sede em Bafatá, com "feitorias em Piche, Paunca, Bajocunda ("Bajicunda") e Bambadinca


Outro comerciante de origem sírio-libanesa, com sucursais na África Ocidental Francesa (Dacar e Coldá) e na Guiné Portuguesa (Mansoa, Mansabá, Xime, Bambadinca, Bafatá, Contuboel, Sonaco, Nova Lamego, Pecixe, Buba, Campeane, Cacine, Gadamael, Catió)



Foi a partir deste anúncio de 1956, que descobrimos o acrónimo ASCO (endereço telegráfico da empresa) (*)


Outro sírio-libanês, Mamud Eluar & Cia., com "sucursais em toda a província da Guiné"... Os comerciantes, de origtem sírio-libanesa, não eram mais do que uma centena na 1ª metade da década de 1920. O José Gardete Correia uma empresa de uma família prestigiada, com estabelecimentos em Bissorã. Olossato e Encheia.




Francisco Paulo, uma empresa em nome inmdividual, com estabelecimento em Bafatá e "feitorias" em  Xitole ("Chitoli"), Sara (Gabu), Baca (Sarde Bacar ?), Paunca, Bajocunda ("Bajicunda"), Cabuca ("Caboca"), Boé ("Mandina do Boé).  O Fausto da Silva Teixeira é o único industrial que aparece nesta amostra, e é já nosso conhecido (foi deportado.


João Batista Pinheiro & Irmão: com sede em Bafatá, e sucursais em Bussau, Buruntuna, Bajicunda (sic), Pirada, Paunca, Piche e... Sama  (deve ser é Sara, Gabú, presume-ser que seja gralha tipográfica, não há povoação com esse nome). O único anúncio da área da restauração e hotelaria é do Pensão Restaurante Bafatá, de Judite Teixeira Quaresma da Costa.



A OMES, com um grande currículo de obras de engenharia na Metrópole e  em Angola, tinha na Guiné, em 1951, duas obras em fase de conclusão: a ponte-cais de Bissau e a ponte de Ensalma


1. Estes anúncios refletem inegavelmente  o clima de relativa paz e prosperidade económica que a província começou a viver, no pós II Guerra Mundial,  com o governador Sarmento Rodrigues (1945-1950).

Curi0samente, em 1951, só há uma anúncio de um industrial (com exceção da OMES, que era uma empresa de engenharia e obras públicas, com sede em Lisboa). Referimo-nos ao madeireiro e antigo deportado Fausto Teixeira da Silva.

Ainda estamos longe dos trágicos acontecimentos de Angola, no princípio de 1961, que não deixaram de ter repercussões nas outros territórios ultramarinos protugueses,. incluindo a Guiné: loigo a partir de 1961/62, parte dos comerciantes locais  (cabo-verdianos, metropolitanos e sírio-libaneses) acabaram  por se retirar das zonas mais isoladas do interior, e fixaram-se em Bissau ou regressaram  mesmo à metrópole...

Os sírio-libaneses, que se começaram a radicar no território a partir de 1910, alguns  acabaram por ligar-se, pelo casamento, a famílias portuguesas... Inicialmente não eram, porém, bem vistos pela concorrência nem até pelas autoridades locais, Por outro lado, em 1974, todos já teriam a nacionalidade portuguesa...Mas parte desta comunidade optou por ficar no novo país lusófono, a Guiné-Bissau.

Estes anúncios acima publicados fazem parte de um suplemento, "dedicado ao ultramar portuguès", que integrou a edição do "Diário Popular", de 20 de outubro de 1951. São em menor número dos que seráo  publicados, mais tarde,  na revista "Turismo", edição de janeiro/fevereiro de 1956 )(ano XVIII, 2ª série, nº 2,  número temático dedicado à Guiné), e reproduzdos em  tempos no nosso blogue (em dez postes, com material fornecido pelo nosso saud0so camarada Mário Vasconcelosl, 1045-2'17) (**)

Na amostra de 1951, verificamos que  todos os anunciantes  se dedicavam ao "comércio geral: compra e venda de produtos da província" e alguns ao "!import-export#", a começar pelas empresas francesas, a NOSOCO e a SCOA... Mas também as portuguesas, Barbosas & Cia, Ed. Guedes Lda, Sociedade Comercial Ultramarina, SARL.

O que havia para exportar ? Muito pouco, alguns produtos agrícolas e matérias-primas: arroz, oleaginosas (amendoim, coconote, óleo de palma), e pouco mais...  E importava-se tudo, da cerveja às viaturas automóveis... Tal como hoje, agora na Guiné-Bissau (só que o amendoim foi substituído pelo caju.)

Alguns valores: em 1950, a colónia tinha exportado c. de 118 mil toneladas, e importado pouco mais de 128 mil... Os cinco produtos mais exportados eram  (com base nas médias anuais): 

  • o amendoim (61,0%), 
  • o coconote (26,6%), 
  • o arroz (4,1%), 
  • o óleo de palma (1,7%) 
  • e os couros (0,8%)...  

Por outro lado, na década de 40 (1941-1950), as importações passavam de 49 mil contos para 128 mil (um aumento de 260%). As exportações, por sua vez,  passavam, no mesmo período, de  65 mil para 118 mil contos (um aumento de 180%).

Em outubro de 1951 já se escrevia-se "província" e não "colónia", com a revogaçãpo do "Acto Colonial" e a revisão da Constituição (Lei nº 2048, de 11 de junho de 1951).   Mas a grafia dos topónimos ainda não era respeitada: vejam-se grafias como Bajicunda, Pitche, Contubo El,

Em suma, estes anúncios tem hoje algum interesse documental pelas inesperadas informações que nos trazem de gentes e de lugares que conhececmos e que depois de 1961 vão ser varridos pela guerra, oficial ou oficiosamente iniciada em  Tite, região de Quínara, em 23 de janeiro de 1963...

É interessante assinalar a ausência de uma grande casa como a  Gouveia  neste pequeno mostruário das "forças vivas" da província, cujo tecido económico parece ser  constituída por apenas pela Ultramarina, ligada ao BNU, duas empresas francesas de import-export, a SCOA e a NOSOCO, e sobretudo por pequenos comerciantes e empresários, de origem metropolitana, cabo-verdiana e sírio-libanesa. (***)
 
Esta edição do "Diário Popular", de 20 de outubro de 1951 (e não 1961, como vem escrito por lapso , na Hemeroteca Digital de Lisboa / Câmara Municipal de Lisboa, a quem agradecemos a cortesia).  É uma raridade bibliográfica: o suplemento dedicado ao Ultramar tem 218 páginas (22 dedicadas à Guiné, pp. 45-66).  Disponível  aqui em formato digital. 

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domingo, 13 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26041: A nossa guerra em números (26): Aceitemos, provisoriamente, o número (oficioso) de 437 "internacionalistas cubanos" que terão combatido ao lado do PAIGC, "de 1966 a 1975"


Guiné > Bissau > HM 241 > 1969 >  O capitão cubano Pedro Rodriguez Peralta. Fotograma, sem indicação de fonte (RTP ?). Cortesia da página do Facebook de António José Vale, 26 de maio de 2018. Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné /2024), com a devida vénia...







Citação: (1963-1973); "Fernando de Andrade com um grupo de guerrilheiros do PAIGC e internacionalistas cubanos", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43457 (com a devida vénia). (*)

A maior parte destes combatentes seria de origem afro-americana, como parece deduzir-se desta foto de grupo. Segundo lemos algures,  Amílcar Cabral não queria gente de tez branca, dava muito nas vistas à CIA e às demais "secretas" dos países ocidentais... Por outro lado, era mais fácil para o PAIGC e seus apoiantes, tanto a nível interno como externo, justificar a presença de "estrangeiros" nas fileiras dos combatentes da liberdade da Pátria: os cubanos de origem afro-americano podiam ser apresentados e aceites como lídimos representantes dos escravos, brutalmente arrancados das suas aldeias e levados pelos "negreiros" para o Novo Mundo... Quanto ao Fernando Andrade, aqui referido, era irmão de Lucette de Andrade, esposa do Luís Cabral.  


1.  O número de "internacionalistas cubanos" (sic) que combateram na Guiné-Bissau, de 1965 a 1974, ao lado do PAIGC, é objeto de especulações, não havendo fontes independentes, válidas e fiáveis onde nos possamos basear para apontar o seu número exato. Tal como o número de baixas mortais.

Numa carta de 17 de agosto de 1966 remetida ao seu amigo Paulo António Osório de Castro Barbieri, em Lisboa,  o  alf mil Pedro Barros e Silva , SPM 0368, escreveu o seguinte sobre o IN (**):

(...) "As secções do Exército Popular encontram-se fardadas, treinadas e armadas até aos dentes. E, para ajudar à festa, temos os russos e os cubanos (estes, pelo menos, já têm levado umas coças bastante razoáveis). Pensa-se que dentre em pouco estarão na Guiné mil ou mais cubanos.

"O material que o IN possuiu é o que de há de melhor pelos sítios. Só lhes falta aviação e marinha. De resto, postos-rádio, antiaéreas quádruplas, canhões sem recuo de infantaria (fala-se em obuses), bazucas, rockets, morteiros de 61, 82 e até talvez de 120, metralhadoras de todos os tipos e feitios, automáticas a dar com pau, enfim, estão mais bem armados que cá a rapaziada." (...)

Não sabemos ao certo a unidade a que pertencia o Pedro Barros da Silva, correspondente ao SPM 0368,  mas tudo indica, por outra carta do seu amigo Nuno Barbieri, 1º tenente fuzileiro especial, que estava colocado no Quartel-General, em Bissau, trabalhando  "numa repartição de nome estranho e pouca importância" (carta de 2 de maio de 1967).  Ou seja, estava na "guerra do ar condicionado" (que não podia ser para todos, porque alguém tinha que matar e morrer...).

De qualquer modo, o nosso camarada Pedro Barros e Silva deveria estar, em 1966,  mais bem informado sobre os cubanos (e os russos) que a maioria dos seus camaradas "do mato"...

No entanto, parece-nos "alarmista" a sua especulação sobre o número exponencial de cubanos (que dentro em breve poderiam chegar aos "mil ou mais", escrevia ele em meados de 1966...). E, seguramente,  "despropositada", no que diz respeito à presença de russos no território da nossa "Guinézinha": a Cilinha nunca os viu e eu também não... 

Quanto ao morteiro 120, só há notícia dele, em agosto de 1968,  utilizado pela primeira vez em Gandembel, na região de Tombali. As bases de fogos eram sempre localizadas no território da Guiné-Conacri. Foi utilizada, contra as NT, como arma de artilharia, e terá sido a arma mais mortífera do PAIGC. (Convirá lembrar que as NT não tinham, à exceção de Gandembel, Guileje e pouco mais, abrigos à prova do morteiro 120 mm. Os nossos "bunkers" eram literalmente "bu...rakos", escavados na terra, e com cobertura de terra, chapa de zinco e troncos de cibe...).

Embora próximo do poder (estando no QG), o nosso camarada Pedro Barros e Silva não estava assim tão bem informado, como fazia crer na carta que escreveu ao seu amigo Paulo António Osório de Castro Barbieri (que, por ua vez,  ainda não deveria estar em idade de ir para a tropa...).

2. Sabemos que em 1966 o PAIGC terá recebido umas escassas três dezenas de cubanos, entre "instrutores militares" (de artilharia) (3), médicos (2) e "combatentes" (25). (***)

(...) " 1966: Abril – Chega a Conacri o grupo avançado de três artilheiros e dois médicos, comandado pelo tenente António Lahera Fonseca;

"Junho – Chega por via marítima, ao Porto de Conacri, o grupo de 25 combatentes cubanos chefiado pelo tenente Aurélio Riscard Hernandez" (...) (**)

Nos anos seguintes (1967, 1969, 1970 e n1972) há notícia de chegada a Conacri de barcos com "pessoal militar e meios materiais", oriundos de Cuba, sem indicação das quantidades... Nem Cuba nem  o PAIGC tinha capacidade logística (barcos de transportes e instalações em Conacri)  para receber de chofre centenas e centenas de combatentes, entre 1967 e 1972. +E possível que, depois da independência, tenha aumentada o número de conselheiros militares cubanos na Guiné-Bissau.
O mais célebre (ou mediático) de todos os "internacionalistas cubanos" foi o capitão Pedro Rodriguez Peralta (****), capturado por tropas paraquedistas em 18 de novembro de 1969, no decurso da Op Jove.. 

Com ferimentos graves, foi enviado para o HM 241 (Bissau) e depois para Lisboa, onde foi devidamente tratado. Foi julgado em Tribunal Militar e condenado em 2 anos e 2 meses de prisão.

Depois do 25 de Abril de 1974, o capitão Peralta foi libertado. Aliás, houve manifestações (do MRPP e outras organizações da  extrema esquerda) a favor da sua libertação incondicional. Os americanos queriam trocá-lo por um alegado espião preso em Cuba...

Peralta, que fez amigos em Portugal, pode ser visto aqui numa reportagem da RTP, no aeroporto de Lisboa, em 15 de setembro de 1974, sempre sorridente e amável na presença entre outros do seu advogado, Manuel João da Palma Carlos (1915-2001), momentos antes de embarcar para Havana onde foi recebido como herói (depois de esquecido, por incómodo, durante os anos de cativeiro)...

Antes do 25 de Abril, era considerado um "preso político", o governo de então recusava-se a tratá-lo como "prisioneiro de guerra", negando haver uma guerra na Guinén(técnica e legalmente falando). Além disso, Portugal e Cuba mantinham relaçóes diplomáticas, contrariamente à ex-URRS e demais países da Europa de Leste. 

Depois do 25 de Abril, mudou o estatuto do capitão Peralta: passaria a ser "prisioneiro de guerra", não ficando abrangido pela amnistia aos presos políticos... E só foi libertado, em 15 de setembro de 1974, após a entrega, pelo PAIGC, dos "prisioneiros de guerra" portugueses, entre os quais o nosso saudoso António Batista, o "morto-vivo", membro da nossa Tabanca Grande.

Sabe-se que, em 2008, com o posto de coronel reformado, pertencia ao Comité Central do Partido Comunista Cubano.  

Era seguramente o mais célebre dos 437 combatentes que, segundo o regime de Havana, terão combatido, no TO da Guiné, nas fileiras do PAIGC, durante a guerra da independência  (dos quais terão morrido 9 ou 17, conforme as duas fontes cubanas oficiosas, já aqui citadas no nosso blogue). (De qualquer modo, é uma taxa de letalidade elevada: 2,05% e 3,89%, respetivamente.)

Mesmo assim, achamos inflacionado o número de combatentes cubanos (a menos que se incluia ainda, indevidamente,  o ano de 1975: aliás, desde meados de maio de 1974, deixou de haver combates entre as NT e o PAIGC) (*****).


3. Leia-se aqui um recorte do jornal "Granma", de 29 de maio de 2007:

Recuerdan misión militar cubana en Guinea Bissau


Internacionalistas cubanos de La Habana y Pinar del Río que combatieron en Guinea Bissau y Cabo Verde se reunieron en la Casa Central de las FAR

Publicado: Martes 29 mayo 2007 | 12:43:23 am.

Autor: Dora Pérez Sáez | dora@juventudrebelde.cu


Jorge Risquet, miembro del Comité Central del Partido, conversa con el coronel Pedro Rodríguez Peralta, uno de los 437 cubanos que combatió en Guinea Bissau.

Foto: Franklin Reyes (não disponível)

El primer encuentro de internacionalistas cubanos residentes en Ciudad de La Habana, La Habana y Pinar del Río que combatieron en Guinea Bissau y Cabo Verde desde 1966 hasta 1975 se efectuó en la Casa Central de las FAR.

En el encuentro participaron 190 combatientes que lucharon junto al Partido Africano para la Independencia de Guinea y Cabo Verde (PAIGC) y su líder, Amílcar Cabral, hasta que alcanzaron su independencia.

El general de brigada (r) Harry Villegas, Héroe de la República de Cuba y vicepresidente de la Asociación de Combatientes de la Revolución, expresó que esta misión hizo reconocer a los portugueses la imposibilidad de seguir manteniendo el colonialismo.

«Esa misión fue, justamente, la que creó las posibilidades para la presencia masiva de los cubanos en África. No se trata solo de Guinea Bissau, sino de nuestra colaboración con otros países de ese continente, que culminó con la caída del apartheid».

En Guinea Bissau combatieron 437 cubanos, de los cuales murieron nueve. Desde el fin de la misión hasta el momento, han fallecido otros 51 compañeros.

El acto contó con la presencia de Jorge Risquet Valdés, miembro del Comité Central del Partido.

F0nte: Dora Pérez Sáez - Recuerdan misión militar cubana en Guinea Bissau: Internacionalistas cubanos de La Habana y Pinar del Río que combatieron en Guinea Bissau y Cabo Verde se reunieron en la Casa Central de las FAR". Juventud Rebelde. ,martes 29 mayo 2007 | 12:43:23 am.

(Seleção, revisão / fixação de texto: LG)

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Notas do editor:




Vd. também postes de:



14 de julho de 2006 > Guiné 63/74 - P960: Antologia (49): Oficialmente morreram 17 cubanos durante a guerra

terça-feira, 3 de setembro de 2024

Guiné 61/74 - P25907: Manuel de Pinho Brandão: entre o mito e a realidade - Parte VIII: Nascido por volta de 1893, terá chegado à Guiné depois da I Grande Guerra, tendo-se instalado em Bolama, nos Bijagós e, mais tarde, em Ganjola: em 1960 produzia duas mil toneladas de arroz (Recorte de jornal, enviado pelo Manuel Barros Castro, que o conheceu pessoalmente, e que foi fur mil enf, CCAÇ 414, Catió, 1963/645, e Cabo Verde, 1964/65)



"Manuel de Pinho Brandão quando chegou à Guiné"




Em 1960/1961 tinha 68 anos, e mais de 40 anos de Guiné. Pelas nossas contas, terá nascido por volta de 1892/93, e terá chegado à Guiné depois da I Grande Guerra,  c. 1918/19. São as primeiras fotos que temos do "velho Brandão" de Bolama, de Ganjolá, da ilha do Como, de Catió.



Manuel Barros Castro, ex-fur mil enf,
CCAÇ 414, Catió (1963/64) e Cabo Verde (1964/65);
nascido em 1940, Pica, São Gens, Fafe;
é um dos nossos "veteraníssimos";
integra a nossa Tabanca Grande desde 4/7/2019;
tem 18 referências no blogue


1. Mensagem do nosso camarada Manuel Barros Castro:

Data - domingo, 1/09/2024, 16:57
Assuntio - Manuel Brandão

Caro Camarada Carlos Vinhal,

Ao entrar no blogue deparou-se-me a notícia de uma reclamação apresentada pelo sr. Manuel de Pinho Brandão, em 1935.

O meu camarada Manuel Silva emprestou-me o n.º 95 da revista ilustrada “Portugal d`aquém e d`além mar”, do ano XXIV, da qual extraí as digitalizações aqui anexas sobre o sr Brandão, que conheci pessoalmente em Ganjola.

Junto, também a capa da revista.

Com grande abraço,

Manuel Castro (tabanqueiro 793).

2. Excertos da revista ilustrada "Portugal d'Aquém e d'Além Mar",  ano XXIV, nº 95, março  de 1961, pp. 38-39.  O "diretor, proprietário e editor" desta revista, muito ao gosto da época, de divulgação e propaganda das várias parcelas do território ultramarino, está de "visita" à Guiné, em data que não podemos precisar, mas tudo indica que seria no tempo seco, no início do ano de 1961, "na hora conturbada que (o país) atravessa" (referência õbvia aos acontecimentos em Angola).  Faz questão de ir a Ganjola, a 300 km de Bissau, para conhecer os vastos "domínios" do Manuel de Pinho Brandão que havia conhecido há 5 anos atrás (c. 1955/56) e que ele descreve como um lídimo representante dos portugueses de antanho. 

Ficamos a saber algo mais sobre a história (até então de sucesso)  deste "beirão",   de "espírito industrioso e coração magnânimo",  que  vivia em Ganjola, "como um rei, nos seus vastos domínios, em cuja coroa está gravado o honrado brasão do trabalho" (...), "feliz, entre os seus leais súbditos,preocupado apenas com o bom governo do seu reino", e raramente "transpo(ndo) as suas fronteiras". 

O Santos Guerra vai visitá-lo "de surpresa", encontrando-o em plena atividade, no campo,  "em cima do camião carregado  de sacos e de pretos, de peito e barriga à vela" (sic). 

Não há qualquer referência aos seus primórdios na Guiné, e às razões que o levaram até lá... Nem à sua família.  

Estabeleceu-se primeiro em Bolama e nos Bijagós (apanhou a guerra de Canhabaque, em 1936), para se tornar mais tarde  um grande agricultor, instalando-se em Tombali...  Produzia erntão mais de 2 mil toneladas de arroz... Tinha meia centena de trabalhadores permanentes (e três vezes mais, de trabalhadores sazonais) e já um parque de máquinas, razoável para a época.

(A quantidade de produção de arrroz, destinado a exportação e ao consumo interno, era notável, sabendo-se que a média de exportação do arroz, na Guiné, no período de 1956-60 foi de 1398 toneladas e no valor de  4238 contos, destinada sobretudo a Cabo Verde. LG. )

Em suma, o Manuel de Pinho Brandão era um típico colono na época, cujo património e atividade (agrícola e comercial) vão ser profundamente afetados com o início da guerra, a começar pela ocupação da ilha do Como pelo PAIGC em 1963.   Do retrato que o autor lhe faz,  ficamos também a saber que, "embora de aspeto rude", tinha "boa presença", era "amável" (...) "conversa(va) muito bem e não e(ra) nada tolo".

E o autor remata com um piscar de olho a Lisboa: "Não seria demais o Governo da Nação tributar-lhe a homenagem que ele merece"... O que, pensamos, nunca chegou a acontecer: com a guerra, o velho Brandão caiu em desgraça e perecebe-se a razão por que ele nunca quis nada com a tropa de Catió...



















Portugal d'Aquém e d'Além Mar - Revista Ilustrada, Ano XXIV, nº 95, março de 1961
Proprietário, diretor e editor: Manuel dos Santos Guerra, pp. 38-39.


(Recortes, revisão / fixação de texto: LG)

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Nota do editor:

Último poste da série > 2 de setembro de 2024 > Guiné 61/74 - P25903: Manuel de Pinho Brandão: entre o mito e a realidade - Parte VII: A Bolama de finais dos anos 30