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quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Guiné 61/74 - P23721: In Memoriam (458): O nosso Xico Allen (1950-2022) será cremado amanhã, dia 20, depois das cerimónias fúnebres na igreja de Lordelo do Ouro, Porto, às 14h30... Lembrando aqui os versinhos que ele fez em Empada quando era "Metralha" da CCAÇ 3566 (Empada e Catió, 1972/74)


Xico Allen (1950-2022) (*): Cerimónias fúnebres amanhã,  quinta feira, dia 20, na igreja de Lordelo do Ouro, Porto.  Informação da agência funerária. 


Francisco Allen Pereira (para nós será sempre o Xico Allen), numa das suas últimas viagens à Guiné-Bissau.  Aqui, em Agadir, Marrocos, 19/09/2017.  Foto da sua página do Facebook.


Guarda >27 de abril de 2019 >  Convívio de "Os Metralhas" (CCAÇ 3566, Empada e Catió, 1972/74) 
> "Alguns dos oficiais que prestaram serviço na Companhia dos Metralhas, com o Xico Allen, na ponta esquerda, que foi sempre o maior dinamizador destes convívios". Foto e legenda do médico Henrique Pinheiro Machado. Fonte: Página do Facebook do Francisco Allen Pereira.
 

1. Quando, em abril de 2006, o Xico Allen  (1950-2022) (*) voltou à Guiné, de jipe, e revisitou Empada, pela enésima vez (a primeira fora no ano já distante de 1992),  mas desta vez com a sua filha Inês e o Marques Lopes,  ele que era um homem de ação, pouco ou nada dado às escritas, mostrou uma outra faceta que, se calhar, nem a filha conhecia de todo, a de poeta popular, nortenho, tripeiro, ao rapar de uma folha de papel onde tinha rabiscado uns  versinhos, umas quadras de pé quebrado,  no seu tempo de Metralha, em Empada ... 

Nessa altura, em 2006, divulgámos, no nosso blogue, esses versos, sem qualquer retoque. E considerámo-los como mais uma pequena amostra do nosso Cancioneiro da Guiné (**), neste caso dedicado a Empada (***). 

Voltamos a reproduzi-los (com pequenos retoques nossos), como uma singela homenagem a este camarada e amigo  que, a partir de hoje,  se vai juntar aos amigos e camaradas da Guiné, membros ds Tabanca Grande, "que da lei da morte já se foram libertando"... Com ele, são já 125, o que não deixa de ser arrepiante: qual de nós será o próximo da lista?

 
Cancioneiro de Empada

por Xico Allen (1950-2022)
  
I
Antes d'chegar à Guiné,
Recebi uma medalha,
Hoje ainda a conservo
Com o nome de... Metralha (****)

II
Viajei de avião,
Rumo à cidade de Bissau,
Às primeiras impressões
Não me p'receu muito mau.

III
E depois de lá chegar
Segui para o Cumeré,
Fui conhecer o mato
Para saber como é.

IV
Quinze dias durou o estágio
P’rá condução na picada,
E depois fui obrigado
A juntar-me à macacada.

V
Quando cheguei a Bolama,
Muita fome lá passei,
De fome julguei morrer
Mas desta 'inda escapei.

VI
Bolama ficou p'ra trás
E rumei para Empada,
Lá iria ser melhor
Era o que tudo pensava.

VII
Empada estava à vista,
Qu'era o nosso destino
Andei pela mão dos grandes
Como se fosse um menino.

VIII
D'noite cheguei a Empada,
Estava tudo iluminado,
De manhã fui passear,
Fiquei decepcionado.

IX
Comecei a c'mer melhor
Depois que aqui cheguei,
Mas foi à minha custa
Pois cá me desenrasquei,

X
Houve cabritos e cabras,
Mortos a tiro e paulada,
Que, p'ra matar a malvada
Até nem custava nada.

XI
Neste rol de matanças
Também há porcos, leitões,
O que para nós mais tarde
São grandes recordações.

XII
Nos dias de avioneta,
Anda tudo em reboliço
Não só esperamos correio
Como presunto e chouriço.

XIII
Agora que somos velhos,
Esperamos rendição
Porque estamos quase, quase,
No fim desta 
 comissão.

XIV
E o tempo vai passando
Com muita dificuldade,
E eu vivo ansiando
Voltar à minha cidade

XV
Mas nas noites de Inverno,
Mil amarguras passei,
E nas horas de reforço
Muita chuva apanhei.

XVI
Trovoada e relâmpagos
Iluminavam com'o dia
Não desejo que tu passes
Aquilo que eu não queria.


Xico Allen

(Revisão / fixação de texto / título: LG)


s/l > s/d  > Da esquerda para a direita: Abel Moreira Santos, Francisco Allen Pereira, José Casimiro Carvalho e  José Vilas Ribeiro. Foto de J. Casimiro Carvalho, régulo da Tabanca da Maia, que comentou, na página do Facebook do Xico Allen, ontem, dia 18: "Partiste. O Régulo-Mor estará à tua espera. Foste sempre um bom camarada. Estiveste à espera em 2010 na Guiné, do Avião, para nos acompanhar e ajudar, foste sempre um Grande Homem e um "Homem Grande".  Adeus, Xico". https://www.facebook.com/fapereira1.  

Por sua vez, o Abel Moreira Santos comentou: "Estamos a ficar cada vez menos, desta foto de quatro só restam dois, o último que partiu que descanse em paz, até já camarada e amigo".
__________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores > 


19 de outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23720: In Memoriam (457): Xico Allen (1950-2022), ex-Soldado Condutor Auto, CCAÇ 3566, "Os Metralhas" (Empada e Catió, 1972/74): A minha homenagem ao amigo Xico Allen, como sempre o tratei (Albano Costa)

(***) Vd. poste de 9 Vd. poste  1 de junho de  2006 > Guiné 63/74 - P829: Cancioneiro de Empada (Xico Allen)

(****) Ficha da undade: Companhia de Caçadores n.º 3566

Identificação: CCaç 3566
Unidade Mob: BC 10 - Chaves
Cmdt: Cap Mil Inf João Nuno Rocheta Guerreiro Rua | Cap Inf Herberto Amaro Vieira Nascimento | Cap Mil Inf Pedro Manuel Vilaça Ferreira de Castro
Divisa: "Os Metralhas"
Partida: Embarque (nos TAM) em 23mar72; desembarque em 23mar72 | Regresso: Embarque em 18jun74

Síntese da Actividade Operacional

Após realização da IAO, de 27mar72 a 22abr72, no CIM, em Bolama, seguiu em 24mai72, para Empada, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 3373.

Em 17mai72, assumiu a responsabilidade do subsector de Empada, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCaç 3852. 

Em 22jan73, por remodelação do dispositivo, o subsector passou à dependência do BCaç 4510/72. 

Em 3 e 21abr73, dois pelotões foram deslocados para Catió, em reforço da guarnição
local, onde se mantiveram até 23jan74.

Em 25fev73, a sua zona de acções foi alargada às áreas da península da Pobreza e Cubisseco de Baixo, por reformulação do dispositivo, incrementando então a sua actividade ofensiva, com realce para uma acção imediata sobre Iangué, em 19out73, com bons resultados.

Em 14jun74, foi rendida no subsector de Empada pela CCaç 4944/73, recolhendo seguidamente a Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n." 116 - 2ª Div/4ª  Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 412

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 - P22791: "Lendas e contos da Guiné-Bissau": Um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte IX: Conto - A lebre e o lobo no tempo da fome




Ilustrações do mestre Augusto Trigo (pp. 59, 60 e 61)



O autor, Carlos Fortunato, ex-fur mil arm pes inf, MA,
CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, é o presidente da direcção da ONGD Ajuda Amiga



1. Transcrição das págs. 59-62 do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau", com a devida autorização do autor (*)


J. Carlos M. Fortunato > 
Lendas e contos da Guiné-Bissau




Capa do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau / J. Carlos M. Fortunato ; il. Augusto Trigo... [et al.]. - 1ª ed. - [S.l.] : Ajuda Amiga : MIL Movimento Internacional Lusófono : DG Edições, 2017. - 102 p. : il. ; 24 cm. - ISBN 978-989-8661-68-5


Conto - A lebre e o lobo no tempo da fome 
 (pp. 59/62)


No tempo da fome, a lebre nada tinha para comer, e ela e o seu filho passavam muita fome. Como não conseguia encontrar nenhuma comi da perto de casa, a lebre decidiu partir e ir procurar comida noutros locais. 
Meu filho, tenho que ir procurar comida longe, mas vou voltar o mais rápido que puder  disse a lebre ao filho. 

A lebre procurou em todo o lado, contudo não encontrou nenhuma comida, pois era o tempo da fome e em nenhum lado havia comida. Mas ela descobriu que o lobo  (hiena) (34) tinha muita comida na casa dele, mais do que precisava. 

Apesar de saber que o lobo era mau, que nunca dava nada a ninguém, e até a podia comer, mesmo assim a lebre foi bater à porta do lobo e pedir-lhe um pouco de comida, para levar para o seu filho. 
– Eu só vou dar-te um pouco de comida depois de tu trabalhares, mas a partir de agora terás que ficar sempre a trabalhar para mim  disse o lobo
– Está bem respondeu a lebre. 
– Esta noite, vais ficar toda a noite de guarda à minha casa, para não  roubarem nada, mas não toques na casa do meu vizinho leão  disse o lobo
– Porquê?  perguntou a lebre. 
– Porque o leão é invejoso, arrogante e muito bruto  respondeu o lobo

Durante a noite, quando todos estavam a dormir, a lebre foi a casa do leão, roubou-lhe o filho e escondeu-o na casa do lobo. Quando chegou a manhã, o filho do leão começou a chorar, pois estava cheio de fome. O lobo, ao ver o filho do leão em casa dele e ainda por cima a chorar, ficou muito aflito sem saber o que fazer, pois tinha muito medo do leão. 
 – Como veio o filho do leão aqui parar? O que vou fazer agora? Será melhor escondê-lo?  dizia o lobo, andando de um lado para o outro, sem saber o que fazer. 

O leão, que falava pouco e não gostava de brincadeiras, ficou furioso quando ouviu o filho chorar na casa do lobo
– Como se atreve o lobo a roubar-me o meu filho?  gritou o leão e correu para casa do lobo. O lobo nem teve tempo de dizer nada, pois o leão enfurecido rebentou com a porta e deu-lhe logo uma estalada. 

O lobo fugiu, e o leão correu atrás dele, mas o seu filho começou a chorar e o leão voltou para trás, para junto do filho. Ao ver o lobo fugir, a lebre deu pulos de contente, porque agora tinha comida e podia ficar a viver na casa do lobo, pois o lobo nunca voltaria com medo do leão, e correu a ir buscar o filho. 

Como o lobo tinha muita comida, a lebre dividiu-a com os outros animais que tinham fome. E foi assim que a lebre se livrou do lobo e conseguiu muita comida.

__________

Nota do autor:

(34) Lobo - palavra com origm no crioulo, é o nome dado à hiena: não existem lobos na Guiné-Bissau.
_____________

2. Como ajudar a "Ajuda Amiga" ?

Caro/a leitor/a, podes ajudar a "Ajuda Amiga" (e mais concretamente o Projecto da Escola de Nhenque, que já foi inaugurada dia 8 deste mês, com pompa e circunstância), fazendo uma transferência, em dinheiro, para a Conta da Ajuda Amiga:

NIB 0036 0133 99100025138 26

IBAN PT50 0036 0133 99100025138 26

BIC MPIOPTP

Para saber mais, vê aqui o sítio da ONGD Ajuda Amiga:


http://www.ajudaamiga.com

________________

Nota do editor:

terça-feira, 30 de junho de 2020

Guiné 61/74 - P21123: Historiografia da presença portuguesa em África (215): o jovem Amílcar Cabral, finalista de engenharia agronómica, saudando o regresso das chuvas e da esperança, após quatro anos de seca, fome e tragédia, escreveu: "A bem de Cabo Verde, pelo bom nome e pela glória de Portugal" (sic), a rematar um artigo publicado no nº 1 do Boletim de Informação e Propaganda, outubro de 1949



Capa do mensário "Cabo Verde: Boletim de Propaganda e Informação", Praia,  nº 1, ano I, 1 de outubro de 1949. Propriedade da Imprensa Nacional, 20 pp. Diretor:  Bento Benoliel Levy  (Preço de capa: 2$50)






















Artigo da autoria de Amílcar Lopes Cabral, futuro engenheiro agrónomo, e fundador e líder do PAIGC: "Algumas considerações acerca das chuvas", pp. 5-7.




Cabo Verde: Boletim de Propaganda e Informação, Ano I, nº 1, 1 de outubro de 1949. 

Notícias sobre as chuvas de setembro de 1949.  Há cinco anos que não chovia no arquipélago (!) (p. 7)
Fonte: Hemeroteca Digital, CM Lisboa (com a devida vénia)

 [Fixação de texto para efeitos de reprodução neste blogue: LG]

1. O novo governador de Cabo Verde  (1949-1953), Carlos [Alberto Garcia] Alves Roçadas (, major  de infantaria, licenciado em medicina,  e sobrinho do gen José Augusto Alves Roçadas, 1865 - 1927)  foi o "inspirador" deste orgão da imprensa cabo-verdiano (1949-1964). 

Era propriedade da Imprensa Nacional de Cabo Verde, e tinha como diretor Bento Benoliel Levy (Praia, 1911- Lisboa, 1991),  um político e jornalista, de origem judia sefardita,  afeto ao regime do Estado Novo e defensor (intransigente) da sua política ultramarina.

Bento Levy. Fonte:
Assembleia da República
Bento Levy era licenciado em Direito (Ciências Jurídicas) pela Universidade de Lisboa (1939). Teve uma carreira político-administrativaa feita na Praia, Santiago, Cabo Verde:

(i) administrador du concelho da Praia (1941);

(ii)  vohal do Conselho do Governo (1942); 

(iii) chefe des serviços de administração civil (1946);

(iv)  presidente do Conselho fiscal da caixa geral dos reformados;

(v) presidente do Centro Cultural de Sotavento;

(vi) diretor  técnico da  Imprensa Nacional de Cabo Verde (1948);

(vii) substituto do juiz de direito  da Comarca de Sotavento  (1949-1961);

(viii) diretor do Serviço de propaganda e informação; diretor do Centro de Informação e Turimos de Cabo Verde; fundador et presidente du Rádio Clube de Cabo Verde....

(ix) enfim, deputado à Assembleia Nacional por Cabo Verde (União Nacional, 1961-1965 / 1969-1973), onde abordou por várias veses o problema da seca e da fome.

Para além de responsabilidade pela criação deste Boletim (1949), foi também fundador da Rádio Clube de Cabo Verde (1944); e, mais tarde, fundador do semanário O Arquipélago (1962).

O Boletim foi definido, logo de início como um " jornal de todos [e para todos], em que cada ideia construtiva terá cabimento (...), necessita[ndo], como é óbvio, de colaboração - colaboração de todos quantos de algum modo se interessam por Cabo Verde, ou porque aqui nasceram, ou porque aqui viveram, ou por cá passaram como simples curiosos, ou ainda porque, como portugueses, se acham lígados a esta parcela do Império, para o desenvolvimento e progresso da qual todos devemos contribuir."


É expressament referido que "a ideia desta iniciativa [é] devida a Sua Ex.a o Governador da colónia [, foto acima], que honra o Boletim com um editorial a todos os títulos notável, dando o exemplo e incitanto quantos possam contribuir para se fazer mais e melhor por Cabo Verde" (...).

(...) "É essa colaboração que se pede, pois dela depende a continuação de tão útil, como indispensável elemento de vida da colónia. (...)".

2. E logo no primeiro número surgem nomes, como o do jovem Amílcar Cabral, que de modo algum se podem considerar como "alinhados" com o regime. Veja.se o teor do artigo que acima reproduzimos: Amílcar Cabral ia fazer 25 anos em 12/9/1949, e estava a estudar agronomia em Lisboa, curso que vai concluir em 1950, e cuja escolha estará relacionada com a trágica seca e fome de 1941/43, período que concidiu com a comissão de serviço militar de alguns dos nossos pais (em São Vicente e no Sal).

Filho de pai cabo-verdiano de ascendência guineense, Juvenal Lopes Cabral, professor, e de mãe guineense, de ascêndencia caboverdiana, Iva Pinhel Évora, o Amílcar tinha nascido em Bafatá, em 1924, onde o seu pai fora colocado à época.

Com os oito anos de idade, em 1932, vem com a família para Cabo Verde. Completaria o ensino primário em Santa Catarina, na ilha de Santiago. No Mindelo, São Vicente, termina o curso liceal em 1943, no Liceu Gil Eanes. Tem um primeiro emprego na Imprensa Nacional (1944), já na Praia, Santiago. Ganha uma bolsa de estudos e vai para Lisboa em 1945. Estuda no Instituto Superior de Agronomia (ISA), ode conhece a futura esposa, flaviense. Convive com futuros dirigentes nacionalistas africanos, na Casa dos Estudantes do Império, tais como Agostinho Neto, Marcelino dos Santos e Mário de Andrade.

Em 1941/43 e em 1947/48, Cabo Verde tinha sofrido mais um ciclo de devastadoras secas, com trágicas consequências: dezenas de milhares de mortos, crise económica e social, emigração forçada (nomeadamente para S. Tomé e Príncipe, mas também para a Guiné.).. Em agosto e setembro de 1949, as chuvas (abundantes) voltam a cobrir as ilhas de "palha verde"...

É neste contexto, e na expetativa (moderada) de "mudança de rumo" do governo das ilhas, que deve ser lido este e outros artigos desta revista mensal, que se começa a publicar justamente em outubro de 1949 (e vai durar até 1964, tendo tido um certo impacto na vida cultural, social, intelectual e literária e do arquipélago, apesar do seu alinhamento político-ideológico com o regime de Salazar).
__________

Nota do editor:

Último poste da série > 24 de junho de 2020 > Guiné 61/74 - P21107: Historiografia da presença portuguesa em África (214): A imprensa na Guiné, numa tese de doutoramento de Isadora de Ataíde Fonseca, denominada “A Imprensa e o Império na África Portuguesa, 1842-1974" (1) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P21018: Ser solidário (232): Campanha do Banco Alimentar Contra a Fome: 22 a 31 de Maio - Ajude a divulgar ! Obrigado (António Ramalho)





1. Mensagem do António Ramalho [ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), natural da Vila de Fernando, Elvas, a viver em Vila Franca de Xira, membro da Tabanca Grande, com o nº 757: tem mais de duas dezenas de referências no nosso blogue]
Data: 28 de maio de 2020  | 07:33

Assunto - Campanha do Banco Alimentar: 22 a 31 de Maio - Ajude a divulgar ! Obrigado


Caros amigos, muito bom dia!

Queria lembrar-vos que está a decorrer a referida Campanha Vale do BACF. [Banco Alimentar Contra a Fome].

Se todos puderem e desejarem participar,  vai ser um êxito e contribuirá para aliviar um pouco a necessidade alimentar de muitas famílias.

Nas GMS [, grandes e médias superfícies,] que visitei, os vales estão à vossa disposição nos seguintes locais:

LIDL - Num expositor algures à entrada ou nos corredores recolher os Vales e entregar à Operadora da Caixa;

PINGO DOCE - Solicitar à Operadora da Caixa;

MODELO/CONTINENTE - Solicitar à Operadora da Caixa-

Conto com o vosso espírito de solidariedade, os que assim o entenderem.

Um abraço

António Fernando Rouqueiro Ramalho

______________

Nota do editor:

quarta-feira, 8 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20829: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (11): Viagem a Mansoa e a Bafatá, onde estamos a levar a água potável aos hospitais... Este ano, muita gente vai morrer, não da COVID-19, mas de fome: o caju ninguém o vem cá comprar...


Guiné-Bissau > Bissau > Abril de 2020 > Fruta da época... Mango ou manga, fruto da mangueira (Mangifera indica)


Guiné-Bissau > Região do Oio  > Mansoa > Abril de 2020 > Ponte sobre o rio Mansoa


Guiné-Bissau > Região do Oio  > Mansoa > Abril de 2020 > Ponte Nova,  na estrada para Mansabá (a nordeste)


Guiné-Bissau > Região do Oio  > Mansoa > Abril de 2020 > Restos da ponte antiga


Guiné-Bissau > Região de Bafatá   > Bafatá > Abril de 2020 > Bolanha de arroz de rega


Guiné-Bissau > Região de Bafatá   > Bafatá > Abril de 2020 > Rio Geba ao fundo, estrada Bambadinca-Bafatá


Guiné-Bissau > Região de Bafatá   > Bafatá > Abril de 2020 > Rio Geba, ponte nova


Guiné-Bissau > Região de Bafatá   > Bafatá > Abril de 2020 >  Hospital


Guiné-Bissau > Região de Bafatá   > Bafatá > Abril de 2020 > Cidade

Fotos (e legendas): © Patrício Ribeiro (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso amaigo e camarada Patrício Ribeiro, um português, natural de Águeda, criado e casado em Angola, Huambo, ex-fuzileiro em Angola durante a guerra colonial, a viver na Guiné-Bissau desde meados dos anos 80 do séc. passado, fundador, sócio-gerente e director técnico da firma Impar, Lda.]

Date: domingo, 5/04/2020 à(s) 12:43
Subject: Viagem ao interior da Guiné

Bom dia, Luís

Já chegamos ontem há noite a Bissau.

Tenho alguma fotos para enviar, desta viagem de 3 dias, mas ainda está no WTS, quando tiver tempo passo para o email, para te enviar.

Informo que ainda há cerveja em Bafatá e com os 45º do telemóvel, temos que beber muiiiii...tasssss.

Lá em Bafatá, deixamos mais uns milhares de pessoas, com água potável, na zona do quartel e Ponte Nova. Assim como no "velho" hospital, que todos conheceram. Naquela noite nasceram 9 bebés, com água corrente nas torneiras.

O Hospital de Gabú também já tem água. O Hospital de Mansoa, estamos a tratar assim como em outros hospitais.

Por cá, começa a haver algumas restrições na circulação, que pouca gente cumpre... Eles vão apertando, mas se apertarem mais... a população das cidades morre primeiro de fome ... já que agora a malária é pouca.

No campo, é a época das frutas: caju, mango, galinhas, cabra, etc. Está tudo é muito seco. Como a maioria da população, vive da colheita do caju, como este ano ninguém a vem comprar,
vai haver muita fome na Guiné.

Abraço,
Patricio Ribeiro

IMPAR Lda
Av. Domingos Ramos 43D - C.P. 489 - Bissau , Guine Bissau
Tel,00245 966623168 / 955290250
www.imparbissau.com
impar_bissau@hotmail.com

quinta-feira, 21 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18762: Fotos à procura de... uma legenda (105): O 'rancho dos pobres'... (Virgílio Teixeira / Luís Graça / Cherno Baldé / Valdemar Queiroz)


Foto nº 1 A


Foto nº 1 B


Foto nº 1 C


Foto nº 1 > Guiné > Região de Cacheu >São Domingos > CCS/BCAÇ 1933 > 1968 > "O rancho dos pobres"

Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 

1. Legenda, completa, do autor, Virgílio Teixeira:

"Mais uma vez apresenta-se aqui a vergonha das nossas vidas. ‘O rancho dos pobres’. Eram miúdos indígenas, que vinham no fim das refeições, com as suas latas, à procura dos restos do rancho ou das messes para comerem, eles e famílias. Depois de levarem para as suas palhotas, voltavam novamente para levar o máximo possível. Isto chocava-me muito, mas nada poderia fazer, a não ser facilitar estas operações, a sopa dos pobres. São Domingos,  1968. (*)

2. Comentários dos leitores (*):

(i) Tabanca Grande [Luís Graça]:

Notável,  a foto... Não direi que diz "tudo", mas diz "muito"... O fotógrafo estava lá, milhares de nós assistíamos, quotidianamente, a esta cena, tão "comovedora" quanto "constrangedora",  dos meninos e meninas que viviam nas imediações dos nossos quartéis, com as latas (recuperadas do lixo da tropa) a servirem de marmitas, à cabeça, ordeiramente, pacientemente, à espera dos "restos do rancho da tropa"...

Parabéns, Virgílio,  pela tua sensibilidade e sentido de oportunidade... É uma foto com grande interesse documental...

50 anos depois continua a haver fome na Guiné-Bissau... Ainda há dias falei, ao telefone, com um desgraçado de um camarada nosso, o ex-1º cabo António Baldé, de Contuboel, que regressou à Guiné, sem um tostão, sem uma pequena reforma, e que, aos setenta e tal anos, passa fome em Caboxanque, no Cantanhez... O tal que tinha o sonho de vir a ser apicultor. E que era o pai da infeliz Alicinha do Cantanhez... Trabalhou com o Pepito, no DEPA... Vou ter que fazer alguma coisa por ele, para o ajudar... São situações que nos destroçam o coração... [O António Baldé esteve no CIM, Bolama (1966/69), Pel Caç Nat 57 (São João, 1969/70) e CART 11 (Paunca e Sinchã Queuto, 1970/71): é membro da Tabanca Grande,  nº 610].


(ii) Cherno Baldé:

É verdade que os miúdos iam lá pedir sobras do rancho, eu fui um deles [, em Fajonquito,], mas também, não vamos exagerar ao ponto de afirmar que era para comerem eles e suas famílias,  o que não corresponde à verdade. Primeiro porque, normalmente e por regra, as sobras não eram tão abundantes que dessem para alimentar a população. Em Segundo lugar, a população,  mesmo pobre,  era muito digna e conformava-se com o pouco que tinha em suas casas e, no caso das populações de confissão muçulmana, os adultos não comiam nada que viesse dos quartéis por motivos religiosos. Às vezes as aparências iludem e penso que foi este o teu caso.

A minha experiência de rafeiro de quartel diz-me que a quantidade das sobras dependia mais da qualidade da comida do que da bondade alheia, pois variava em função do prato do dia. Assim, nos dias em que havia carne de vaca ou cozido à portuguesa, não sobrava nada, mesmo para os soldados que se atrasavam a chegar ao refeitório.

(iii) Virgílio Teixeira:

Sobre os teus comentários a esta foto, a única que tenho, apesar de ter presenciado esta cena e outras imensas vezes, e só por vergonha nunca mais tirei nenhuma. Conheces aqueles ex-militares, com uma abraçadeira vermelha no braço esquerdo? Lembras-te ou não? Faziam de Oficial de Dia, os responsáveis por tudo o que acontecia durante 24 horas, incluindo nessa missão, assistir a todas as refeições nos refeitórios das praças e também provar e até muitas vezes também comiam do rancho.
Esses meninos e meninas, cujo exemplo estão aí, não fabriquei essa foto, fui eu o fotógrafo, mas não tenho abraçadeira, não estava de serviço, e quando estava não podia fazer fotografias a tudo. Mas a minha memória visual fenomenal não me deixa esquecer, e sei todos os pormenores de tanta coisa, mas não de tudo. Estes aqui que relatei são autênticos, só não sei se iam levar a comida à tabanca para alimentar os familiares ou se era com outros fins, por exemplo a pecuária.

Não sabia sequer,  nessa altura, os hábitos dos muçulmanos, palavra que estava longe de pensar que não comiam carne de porco e outras coisas. Por isso em Chão Fula, Nova Lamego,  não era tão gritante esta prática, mas existia na mesma. Mas em especial no Quartel de Brá, nos Adidos, onde se serviam mais de 1000 militares todos os dias, e sobrava muito e as filas eram imensas, eu vi isso, pois estive lá com o meu Batalhão durante o mês de Março de 68 e fiz vários serviços de Oficial de Dia e assistia obrigatoriamente a estas cenas, tanto eu, como os outros. 

A minha sensibilidade não dava para ver isto, por isso tentei esquecer, até ao dia que voltei a ver as fotos, 50 anos depois.

Não queria de modo nenhum alimentar uma polémica sobre este assunto, que não me agrada, mas espero que aceites - tu e os outros - esta minha versão dos acontecimentos, pois esta é a minha versão e não a dos outros, cada um pensa o que sente, e não, nunca faria quaisquer juízos de valor sobre isto. Sabes que eu gosto muito da população guineense, durante a guerra e depois dela, nunca esquecerei.
Quando estive aí, em 1984/85, três vezes, voltei a ver a fome nas populações, eram eles que me diziam, voltem para cá....

(iv) Cherno Baldé: 

As tuas fotografias são excepcionais e muito importantes sob todos os pontos de vista. Não há motivo para vergonha nenhuma nas fotos que, com todo o mérito, conseguiste salvar e conservar em muito bom estado. A pobreza não é uma desgraça em si e, na verdade, ela é sempre relativa, pois, se não existissem pobres, não haveria ricos no mundo.

Também não alimento polémicas, tão só tento corrigir possíveis erros de interpretação, muitas vezes, puramente subjectivos,  que os antigos combatentes metropolitanos podem estar, injustamente, a cometer sem ter a noção completa dos seus erros. A minha função é tentar corrigir os tiros da malta que se embala no entusiasmo das palavras, tal Homem Pereira de Melo, como uma vez disse o nosso amigo Valdemar Queiroz.

Todas as críticas e/ou observações que os bloguistas fizerem dos trabalhos (textos e fotos) publicados, só servirão para testar, enriquecer e consolidar os conteúdos assim expostos à observação e crítica do vasto auditório para uma eventual validação. Por isso, não convém que sejamos muito sensíveis nem que sejamos tentados a defender a todo o custo aquilo que expomos ao público da nossa Tabanca Grande.

Muito obrigado pelas simpáticas palavras de amizade dirigidas ao povo da Guiné-Bissau, em geral, e a mim, em particular. 

(v) Valdemar Queiroz:

Muito interessante a foto nº. 1. Era habitual a 'formatura' das crianças à espera das sobras do rancho da tropa. Também assisti em Bissau a uma 'formatura' destas, mas com muitas dezenas de crianças, quando estive de 'Sargento de Dia' no Quartel dos Adidos. Mas, bem longe daquelas terras, na Europa da abundância, que até deita por fora, e há cerca de uns vinte anos, assisti à porta das instalações militares ou da Academia Militar ou dos Comandos, na Amadora, a uma 'formatura', de lata na mão, que me fez lembrar aquelas que nós muito bem conhecemos na Guiné.

(vi) António Rosinha:

O Cherno esclarece um pouco o que era ir ao quartel apanhar restos, mas ainda não diz completamente tudo sobre o assunto para não melindrar algumas sensibilidades (penso eu)

Aqueles pretos não eram assim tão "coitadinhos", como havia uma tendência para os julgar assim, para quem passava lá 24 meses.

Na África subsariana não havia fome, aquela fome que nos era exibida em Lisboa e Porto e menos em cidades e aldeias mais pequenas do interior.

Aquela fome que as guerras provocavam foram uma excepção, assim como a fome e carências primárias de algumas independências com total desorganização.

Ainda há três ou quatro dias uns repórteres entrevistaram uns jovens gambianos que,  rejeitados pelos italianos, vieram para Valência, e o problema deles não era a fome nem a guerra, estavam bem tratados e bem dispostos, e um deles apenas queria uma oportunidade de poder jogar à bola.

As carências africanas nunca foram a  alimentação, tal como a conhecíamos aqui, antes de haver os peditórios à porta dos supermercados para as pessoas e para os animais.[Referência ais bancos alimentares].

Ao contrário das nossas tribos,  as tribos na África "partem" tudo entre si, dá para todos, aqui,  como cantava o Zeca Afonso, :eles comem tudo e não deixam nada.

______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 19 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18758: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXVI: História e imagens de São Domingos: fotos de 1 a 8

(**)  Último poste da série > 18 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18432; Foto à procura de...uma legenda (104): O caso da mulher fula amamentando, com o leite do seu próprio peito, a "sua" cabrinha... O João Martins queixa-se de escesso de zelo censório por parte do Facebook...

sábado, 1 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16545: Blogpoesia (471): Promessas de paz (José Teixeira)

 

1. Em mensagem do dia 29 de Setembro de 2016 o nosso camarada José Teixeira (ex-1.º Cabo Aux. Enf.º da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70), enviou-nos este poema alusivo à paz que tanto desejamos e que cada vez é menos viável.


Promessas de paz

Prometem-me a paz das armas
Que calam armas matando pessoas,
E eu quero encontrar apenas a paz do pão,
Para matar a fome a quem estende a mão.
E construir em cada momento
A paz da solidariedade -
E do entendimento.

Prometem-me a paz das armas
Que calam armas espalhando a dor,
E eu quero encontrar apenas a paz do amor.
Para espalhar no mundo a esperança
Que o enche de afetos -
E de bonança.

Prometem-me a paz das armas
E as armas trazem mais armas
Enchendo o mundo de receios.
E eu quero encontrar apenas a paz do perdão,
Da paciência e da compreensão.
São para a paz, esteios -
E transformam as balas em pão.

José Teixeira
____________

Nota do editor

Último poste da série de 25 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16522: Blogpoesia (470): "Naquele olhar..."; Se tivesse o poder de amainar as tempestades..." e "Horas luminosas de sol...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11124: Álbum fotográfico de Abílio Duarte (fur mil art da CART 2479, mais tarde CART 11/ CCAÇ 11, Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paunca, 1969/70) (Parte IV): A guerra e a fome que chegam à região de Gabu...


Guiné > Zona leste > Algures, s/d >   "Restaurante Michelin: o furriel Cunha, o alferes Fagundes e outros camaradas"... [e os djubis à espera dos restos do tacho...]


Guiné > Zona leste >  CART 11 (1969/70) > Pirada >  Padaria... [Podia faltar tudo, menos o pão fresco, o "casqueiro"]


Guiné > Zona leste > Algures, s/d >  Soldados da CART 11 assando peixe no mato [... Nunca vi homens tão frugais como os fulas que, sendo desarranchados,  levavam para o mato, para operações, uma mão chão cheia de arroz cozido, embrulhado num lenço...]


Guiné > Zona leste > Algures, s/d >  Uma aldeia atacada e destruída pelo IN (1) [...Decididamente o PAIGC elegeu o chão fula, o leste, como terra de ninguém... Afinal os fulas eram os aliados 'naturais' dos tugas...]


Guiné > Zona leste > Algures, s/d >  Uma aldeia atacada e destruída pelo IN (2) [... A mesma desolução que conheci na outra ponta do leste, no regulado do Corubal...]

Guiné > Zona leste > CART 11 (Nova Lamego, Piche, Paunca, 1969/1970) > Fotos do álbum do Abílio Duarte.

.
Fotos (e legendas): © Abílio Duarte (2013). Todos os direitos reservados. (*) [Edição e legendagem complementar: L.G.]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Abílio Duarte, ex-fur mil art da CART 2479 (mais tarde CART 11 e finalmente, já depois do regresso à Metrópole do Duarte, CCAÇ 11, a famosa companhia de “Os Lacraus de Paunca”) (Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paunca, 1969/70) (*).

Ao ver a foto da aldeia fula destruída (em baixo) bem como da foto de cima (com os putos fulas esperando pacientemente os restos da comida dos tugas), possivelmente nas regiões fronteiriças de Pirada ou de Paunca (ou, talvez, Piche,   desguarnecida com a retirada de Madina do Boé, Beli e Cheche, no princípio de de 1969), lembrei-me de outras tabancas, que conheci na mesma altura do Abílio, nos regulados de Joladu, Badora, Corubal... e veio-me à memória um poema que, a propósito, escrevi e que publiquei há um ano atrás, dedicado aos bravos fulas  da minha CCAÇ 12 (, na realidade, uma irmã gémea da CCAÇ 11).

(...) Não reconheces os sinais de guerra,
O feroz combate em noite de luar,
O cavalo de frisa,
Os pássaros de morte,
Os jagudis no alto da árvore descarnada,
A terra desventrada, ensaguentada,
O arame farpado, aqui e acolá cortado,
O colmo das moranças, carbonizado,
O medo que se sente mas não se vê,
As cápsulas de 12.7 da Degtyarev,
Um par de chinelos,
Os caracteres chineses dos invólucros, amarelos,
Das granadas de RPG… (...) (**)



(...) Elegia para uma triste tabanca fula
por Luís Graça

Poema dedicada
aos valorosos soldados fulas
da CCAÇ 12 (1969/71),
de Badora, do Cossé, do Corubal
E de repente
Tudo te é estranho,
O muro que corta, rente,
A brisa da manhã,
A fonte onde ainda ontem
Os jubis tomavam banho,
O poilão aonde ias rezar,
À tua maneira,
Ao teu irã,
A ponta onde colhias a manga e o abacaxi,
O macaco-cão que ora chora ora ri…

De repente
Não sabes donde vens,
Não sabes quem és,
Aqui de camuflado e de G-3,
Nem a verdadeira razão para matar e morrer,
Não sabes o que fazes neste lugar,
Triste tuga entre tristes fulas,
Abaixo do Trópico de Câncer,
A 11 graus e tal de latitude norte.

Não reconheces os sinais de guerra,
O feroz combate em noite de luar,
O cavalo de frisa,
Os pássaros de morte,
Os jagudis no alto da árvore descarnada,
A terra desventrada, ensaguentada,
O arame farpado, aqui e acolá cortado,
O colmo das moranças, carbonizado,
O medo que se sente mas não se vê,
As cápsulas de 12.7 da Degtyarev,
Um par de chinelos,
Os caracteres chineses dos invólucros, amarelos,
Das granadas de RPG…

Um triste cão vadio ladra
Ao cacimbo fumegante
E o seu latido lancinante
Ecoa pela bolanha fora.
A seu lado, a única velha,
Que não se foi embora,
Com a sua máscara impassível
De séculos de dor.

Mais tarde saberás
- Mas nunca o saberão, de cor,
Os jovens pioneiros com os seus lenços multicolores -,
Que por aqui passou
Mamadu Indjai,
Hoje valoroso, amanhã insidioso,
Combatente da liberdade da pátria,
Hoje herói, amanhã traidor.

Diz-me, mãe e pitonisa,
Onde estão as mulheres com os balaios à cabeça
E os seus filhos às costas ?
Onde estão as gentis bajudas,
Cujo sorriso nos climatizava os pesadelos ?
Onde estão o régulo e os suas valentes milícias ?
Para que lado corre o Rio Corubal
E donde vêm aqueles sons de bombolom?

Diz-me, homem grande,
Onde fica o Futa Djalon ?
E de que ponto cardeal
Sopram os ventos da história, afinal ?
Dizes-me para que lado fica Meca, meu irmão ?
E, no seu conciliábulo,
O que sobre nós decidirão,
Os nossos deuses, o teu e o meu ?

Diz-me onde está o velho cego, mandinga,
A quem demos boleia,
Em Bambadinca,
Que tocava kora
E nos contava histórias
De velhos e altivos senhores,
Agora prisioneiros no seu chão ?

Passei, na madrugada de um dia qualquer,
Pela tua tabanca, abandonada,
Do triste regulado do Corubal,
De que já não guardo o nome,
Na memória.
Tabanca onde passámos sede e fome,
Sinchã qualquer coisa,
Agora posta a ferro e fogo,
Que importa, minha irmã,
O topónimo para a história ?!...

Venho apenas em teu socorro,
Irmãozinho,
Quando as cinzas ainda estão quentes
No forno da tua morança,
Da morança que também fora minha…
Raiva, sim, meu camarada,
Como eu te compreendo…
Mas vingança, para quê ?
De guerra em guerra se chega à vertigem do nada!

A um espelho partido me estou vendo,
E a mim mesmo me pergunto-me quem sou eu
Triste tuga entre tristes fulas, ai!,
Para te dar lições de história ?!
Quem somos, ao fim e ao cabo, nós, os dois ?
Saberei apenas, muito anos depois,
Que fuzilaram o Mamadu Indjai!…