- 10425 baixas mortais ("mortos"), por todas as causas (combate, acidente e doença),
- a par de 31300 feridos graves (3 feridos graves por cada morto; 10 feridos, graves e não graves, por cada morto)
- 2854 mortos (dos quais 1717 em combate);
- 9400 feridos graves.
- Ferimentos em combate = 1273 (58,5%)
- Acidente com arma = 251 (11,5%)
- Acidente de viação = 166 (7,6%)
- Acidente de aviação = 2 (0,0%)
- Afogamento = 138 (6,3%)
- Outras causas = 66 (3,0%)
- Doença = 281 (12,9%)
- Total= 2177 (100%)
3. O caso do cap art Fausto Manteigas da Fonseca Ferraz é, inegavelmente, um dos que podemos classificar como homicídio.
Houve testemunhas desse funesto acontecimento. O cap SGE ref José Neto (1929-2007), um dos históricos do nosso blogue (**), contou-me (e depois contou-nos), antes de morrer, que o autor dos disparos foi o soldado condutor autorrodas José Manuel Vieira Cavaco.
A mobilização para a Guiné (em vez de Angola), as andanças do batalhão e da companhia, as saudades da terra, a incerteza face ao futuro, as recordações do Natal na ilha e a poncha (ou o rum) fizeram uma mistura explosiva.
Creio que feriu mais militares. O Zé Neto, na altura 2º sargento a exercer as funções de 1º srgt, "teve que o esconder para ele não ser linchado" (sic). (***)
Inicialmente, na orgânica do Batalhão, o Cap Corvacho era o oficial mais antigo no seu posto e desempenhava as funções Oficial de Pessoal e Reabastecimento.
Eu já tinha lidado com ele em Brá, pois foi o oficial instrutor dum processo disciplinar que exigi ao comandante, na iminência de ser punido por uma infracção de trânsito - excesso de velocidade da viatura que me transportava - apenas em face da participação dum furriel da PM [Polícia Militar] e dum sistema de deteção de velocidade discutível.
O Cap Corvacho (que tinha o curso de Polícia Militar) levou as suas averiguações até ao mínimo pormenor e concluiu – e assim o exarou no final do processo – que a minha ordem ao condutor (não dada, mas assumida) de ultrapassar uma camioneta do BENG [Batalhão de Engenharia] que travou ao ver a patrulha da PM, foi a adequada para evitar a possível colisão, e o excesso de velocidade assinalado pelo aparelho, 12 Km/hora (62-50) em nenhum momento pôs em perigo a circulação na faixa contrária. (...)
O primeiro ato de comando do Capitão Corvacho foi mandar formar a companhia. A sua breve alocução resumiu-se a:
– Estou aqui para vos comandar até à chegada do novo comandante que há-de vir da Metrópole. Enquanto esta situação se mantiver vou exigir-vos o máximo e dar-vos todo o meu apoio. A minha primeira exigência fica já aqui: O que se passou esta noite foi uma tragédia que, contada e recontada, pode vir a sofrer deturpações que em nada favorecem a companhia. Por isso não vos peço que esqueçam, mas sim que não alimentem as coscuvilhices de Bissau e acho que a melhor resposta que podemos dar aos curiosos é: Isso é um assunto interno da companhia, ponto final.
Mandou destroçar e convocou os oficiais e sargentos para uma reunião. Disse-nos que queria o pessoal o mais ocupado possível. Que fossem à lenha, que fossem jogar a bola, que fossem banhar-se na praia, e que o resto do programa de treino operacional era para cumprir no duro.
Depois chamou-me à parte e fomos dar uma volta para conhecer o quartel – eu tinha chegado ali na véspera, pois tinha ficado em Brá a tratar da papelada e pedi para ir passar o Natal com os “meus rapazes” – e a nossa conversa andou à volta da situação algo calamitosa em que se encontrava o setor da alimentação com os desvarios que o Furriel vagomestre tinha apontado na reunião.
Ficou assente que eu não ia regressar a Bissau no dia 27, como estava previsto, e ficava em São João a fazer um balanço e pôr um pouco de ordem no setor administrativo enquanto ele ia tentar tirar a pele ao pessoal até fazer deles uns combatentes de verdade.
Em princípios de janeiro de 1967, a CART 1613 que regressou a Brá para ficar como companhia de intervenção à ordem do Comando-Chefe, era outra.
Eu nunca tinha visto, nem achava possível, uma manifestação de soldados. Mas o que é certo é que, por organização espontânea, a minha tropa foi postar-se frente ao gabinete do comando do batalhão a gritar:
Com a voz embargada pela comoção, o Capitão Corvacho disse-lhes:
Toda a companhia, desde o Básico ao Alferes mais antigo, compreendeu aquela decisão do Homem que trocava o sossego da Messa e da Gestetner (máquinas dactilográficas e policopiadoras) pela terrível G3. (...)
Tanto eu como o furriel e o cabo respondemos apenas às perguntas que nos foram formuladas. O tenente, a certa altura, perguntou-me qual era a minha opinião sobre o comportamento do réu, anterior aos factos.Gerou-se uma pequena quezília processual entre o promotor e o advogado que acabou com o juiz auditor (civil) a intrometer-se e declarar que aquele Tribunal tinha a obrigação de conhecer o caráter do réu e, naquele momento, ninguém mais conhecedor do que o depoente (eu) podia responder a perguntas que levassem a fazer um juízo acertado.
Fiquei sob o fogo cerrado, ora de um, ora de outro, com respostas curtas, quase sim e não. O coronel presidente acabou por me interpelar dizendo-me que, por palavras minhas, classificasse a qualidade de soldado do réu. Respondi com convicção:
A pena foi de vinte e três anos de prisão maior, a cumprir em estabelecimento penal adequado na Metrópole. Nunca mais o vi, mas tive notícias de que o rapaz não cumpriu nem metade da pena. (...) (***).
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 13 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26386: Humor de caserna (95): Os meus Natais de 66 e 67 no HM 241, em Bissau (António Reis)
10 de janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - P417: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (1): Prelúdio(s)
(****) Vd. poste de 11 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - P504: Memórias de Guileje (Zé Neto, 1967/68) (7): Francesinho e Cavaco, o belo e o monstro