Foto: © Jorge Canhão (2007). Direitos reservados.
1. Mensagem do nosso camarada Jorge Canhão, a propósito do depoimento do Gen Almeida Bruno, no programa A Guerra, II Série, da autoria de Joaquim Furtado, que passou na RTP1, na passada na 4ª feira, da 25 de Março, e que está a causar indignação entre os membros da nossa Tabanca Grande e de outros camaradas que acompanham o nosso blogue:
Camarada Luís Graça:
Sou o Jorge Canhão, ex-Fur Mil da 3ª CCAÇ do BCAÇ 4612/72, sediada em Mansoa.
Em relação ao email (**) que nos enviaste sobre o último episódio da guerra colonial (12), informo-te que tenho todos os episódios gravados, e espero gravar tudo o que falta.
Sobre o depoimento do Gen Almeida Bruno, vou transcrever o que ele disse:
"Eu digo-lhe com toda a franqueza, sem qualquer crítica aos meus camaradas, mas esta é a verdade e a verdade tem de se dizer. A maioria esmagadora eram BANDOS, que estavam atrás do arame farpado, à espera que o inimigo atacasse para se defenderem. Havia muito pouca iniciativa, com excepção, como lhe disse, dos pára-quedistas e dos fuzileiros, isso de facto, esses nunca perderam, nunca perderam o rumo". (Transcrito, tal como está na gravação)
É, no meu entender, uma maneira muito vergonhosa de adjectivar os milhares de militares que, nas mais penosas condições, combatiam em nome de alguns poucos e do sistema que governava o País e as colónias. Muitos não tinham água, a comida era pouca, repetida e muitas vezes de péssima qualidade. As condições de habitabilidade, excepto nos quartéis das cidades e vilas, eram as que todos sabemos.
O treino militar a que fomos sujeitos era inadequado, as balas eram contadas, as granadas..., enfim tudo era contado pois não se podia gastar mais que o estipulado, e de maneira insuficiente.
No teatro de guerra, aí sim começava o verdadeiro treino, mas esse já era para valer, e aí verificávamos toda a nossa inferioridade de material de guerra em relação ao PAIGC.
Foi por isto que "os bandos" passaram, mas foram esses bandos que, à custa do seu sangue, mantiveram esta guerra por cerca de 11 anos, para que os militares do ar condicionado acumulassem comissões atrás de comissões.
Por agora fico-me por aqui, acho que me alonguei um pouco, mas enfim... saiu.
Abraços
Jorge Canhão
___________
Notas de L.G.:
(*) 18 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1855: Tabanca Grande (13): Apresenta-se o ex-Fur Mil At Inf Jorge Canhão, da 3ª Companhia do BCAÇ 4612/72
(...) Chegámos à Guiné a 5/10/72, fizémos o IAO na zona do Cumeré e a 17/11/72 fomos para Mansoa.
A 18/6/73 deixámos o Batalhão e passámos a estar dependentes do COP 5 e do COT 9 como Companhia de Intervenção.
Fizémos operações nas zonas de Mansoa, Mansabá, Bissorã, Farim, Bula, Cacine e Gadamael, onde estivémos com as excepcionais Companhias de Paraquedistas 121 e 123.
A 12/5/74 deixámos de ser Companhia de Intervenção e regressámos ao Batalhão.
Em 26/8/74 embarcámos de avião para Portugal.
Em toda a comissão e após algumas centenas de operações, tivémos 2 mortos (um furriel e um soldado), 2 feridos graves (soldados) e uma dezena de ligeiros, entre oficiais, furriéis e praças. (...)
(**) Mails de Luís Graça, um copm data de 26 de Março e outro com data de 27, enviados a toda a Tabanca Grande:
Assunto - Direito à indignação:
Camaradas:
Quem viu ontem, do princípio ao fim, na RTP 1, o 'episódio' semanal de A Guerrra, do Joaquim Furtado, II Série ? Como estive em aulas até às 22h, só vi o fim, quando cheguei a casa...Estava-se a falar do desastre do Cheche, no Corubal, na sequência da retirada de Madina do Boé, em 6 de Fevereiro de 1969... (Temos no blogue um dossiê, bastante completo, sobre este trágico episódio da Guerra da Guiné).
Ainda reconheci o nosso camarada Paulo Raposo, mais novinho uns anos, em imagens de arquivo (presumo)... O Paulo pertencia à CCAÇ 2405, de Dulombi/Galomaro, que perdeu 17 homens (no total, foram 47 as vítimas)... Também ouvi de raspão o Cor Aparício (que comandava a outra companhia, que teve ainda mais baixas)... O Aparício repartiu culpas por toda a gente, à boa maneira de Pilatos...
Como perdi a maior parte do programa, não sei o que disse antes o Gen Almeida Bruno... E protanto não posso comentar.
Vejam, a seguir, o texto do nosso camarada Mário Pinto, que está indignado com as declarações do antigo ajudante de campo do Spínola... Alguém quer comentar, com vista uma eventual publicação no blogue ?
Um Alfa Bravo. Luís
Assunto - A Guerra, II Série - Programa de Joaquim Furtado > Último episódio (desastre do Corubal), que passou 4ª F, na RTP
Amigos e camaradas: Alguém gravou o episódio de 4ª feira ? Era importante, por causa das alegadamente polémicas e ofensivas palavras do Gen Bruno de Almeida (***) sobre a "tropa macaca"... Eu não vi, gostava de ver.
(**) A primeira mensagem, de protesto, foi-nos enviada , em 26 de Março, por Mário Pinto, ex-Fur Mil, CART 2519, Buba Mampatá, Aldeia Formosa (1969/71), e que não é formalmente membro da nossa Tabanca Grande:
Assunto - Direito à indignação
Ontem ao ver o programa Guerra do Ultramar na RTP1, fiquei indignado com a falta de respeito do Sr. General Almeida Bruno em relação aos nossos camaradas militares conhecidos por tropa macaca, como BANDO, que se limitavam a estar presentes dentro do arame farpado.
Sr. General, é preciso ter descaramento e ser insultuoso para criticar os nossos bravos militares que tão abnegadamente serviram a Pátria em condições de inferioridade táctica e material e desconhecendo o inimigo que defrontavam porque tiveram uma instrução deficiente, que é da sua responsabilidade e dos oficiais superiores que nos comandavam entre aspas. Porque estes, sim, é que estavam no arame farpado.
V. Exa. Sr. General, já se esqueceu que a guerra fora do arame farpado era comandada pelos milicianos e graças a eles lá fomos adiando o fim do Império Colonial.
Para terminar só posso acrescentar que fui ferido em combate e não dentro do arame farpado, louvado e premiado por actos de coragem e fui não foi dentro do arame farpado.
Cumprimentos, camarada Luis Graça
ex furriel Mário