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segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21596: Notas de leitura (1327): "A Caixa de Correio de Nossa Senhora", por António Marujo; Círculo de Leitores e Temas e Debates, Outubro de 2020 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Novembro de 2020:

Queridos amigos, 

É uma incursão inédita sobre o culto a Nossa Senhora de Fátima na envolvente da guerra colonial, militares, familiares e amigos, todos envolvidos. António Marujo é um jornalista credenciado na temática religiosa, "enfrentou" a leitura de cerca de 50 mil mensagens entre as milhões existentes, privilegiou o período que vai de 1917 a 1974, consultou personalidades avisadas, os temas da paz e da guerra são dominantes nos pedidos à Mãe de Deus, sem detrimento de muitos outros que vão desde a conversão da Rússia a pedidos de saúde ou de emprego, amores proibidos e confessados, crimes escondidos, desilusões amorosas, angústias existenciais, até afloram situações de pedofilia, mas há muito mais. 

Um livro que nos permite ir conhecendo melhor o país através do analfabetismo, da pobreza e da falta de proteção social, uma obra que nos permite igualmente entender o papel desempenhado por Fátima na fé dos combatentes, seus pais, mulheres, noivas e namoradas, madrinhas de guerra e grandes amigos. Até hoje.

Um abraço do
Mário



Mãe, Senhora, ouve-me, que o meu filho venha são e salvo da guerra:
Uma assombrosa viagem pelo correio dirigido a Nossa Senhora de Fátima


Mário Beja Santos

A obra de investigação de que resultou esta reportagem jornalística intitula-se "A Caixa de Correio de Nossa Senhora", é seu autor António Marujo, um jornalista com largos créditos e pergaminhos na área da temática religiosa; afoitou-se à leitura de um bom número de dezenas de milhar de mensagens dirigidas a Nossa Senhora de Fátima, com os temas mais díspares (declarações, pedidos de saúde ou de emprego para o próprio ou para outras pessoas, amores proibidos e confessados, crimes escondidos, orações pela paz no mundo e pela conversão da Rússia, pedidos angustiantes para que filhos, maridos e familiares envolvidos nas guerras viessem sem beliscadura, obra editada pelo Círculo de Leitores e Temas e Debates, outubro de 2020. (*)

Investigação estimulante, o próprio autor observa que estas mensagens revelam muito do que era o país, há poucas décadas, marcado ainda pelo analfabetismo, pobreza e falta de proteção social.

Antes de nos centramos nas mensagens em tempo de guerra colonial, atenda-se às observações do autor. O país que estas mensagens revelam num acervo como não existe outro em Portugal, podemos ver quem era escolarizado ou não, saber que predominavam as mulheres, pois quem escrevia era quem ficava, não que os jovens que partiam não levassem a incumbência de rezar o terço ou ter no peito a medalhinha de Nossa Senhora ou contarem com ela as horas de aflição.

 Há depois a natureza da comunicação, mais a intimidade que a pura veneração, daí as invocações de Mãe, Mãezinha, Mãe Adorada, Querida Mãezinha do Céu, Minha Mãe Santíssima, Adorada Mãezinha do Céu, Minha Querida Nossa Senhora de Fátima, e muito mais. 

A mãe é protetora, é uma espiritualidade que se entrelaça com maternidade, envia-se mensagens a alguém que nos está próximo, pronto a ouvir, capaz de perceber que estes milhares de modos de escrever e falar, os pedidos são inúmeros, tem a ver com a saúde, com as fraquezas e traições, com as dúvidas de fé, pedidos de arrimo para os estudos, para se conseguir o amor dos pais, dos filhos ou do marido, pedidos para sair da pobreza, para curar a doença, pedido de amor quando se está em desespero. 

Há também nestas mensagens uma ligação estreita com a doutrina dos Papas, Paulo VI, surpreendentemente, em 13 de maio de 1967, centrou a sua mensagem na paz, Fátima nascera na I Guerra Mundial, houvera depois outra mais mortífera e o Papa tem conhecimento que Portugal vive numa guerra colonial, importa não esquecer que as primeiras questões postas por Lúcia tinham a ver com o fim da guerra.
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Nucleo Museológico Memória de Guiledje > Capela > 2010 > O Luís Branquinho Crespo e o António Camilo colocando a imagem na sua base.
Imagem de Nossa Senhora de Fátima, na capela do  Núcleo Museológico Memória de Guiledje.  Foi doada pelos nossos camaradas Luís Branquinho Crespo e António Camilo.  
Imagem do nosso blogue (**)


Consolidadas as mensagens de Fátima, e esta transformada em santuário com fama universal, desenvolveu-se cumulativamente a evocação anticomunista, falava-se na conversão da Rússia, não esquecer que se vivia em Guerra Fria e a imprensa portuguesa fazia o possível para revelar as perseguições da Igreja na Rússia. 

E António Marujo discorre sobre as cartas de mães aflitas a pedir que os filhos regressem salvos da guerra. É vasto o correio de Nossa Senhora quanto a testemunhos de angústia no tempo da guerra colonial, e logo desde 1961.
 
O autor escreve:

“As cartas que se referem à guerra dão conta da aflição ou da dúvida, do pedido genérico de paz ou da súplica dos mais próximos, da convicção ideológica alinhada pelo discurso oficial ou, mesmo se residualmente, da contestação ao regime e à guerra, de uma diversidade enorme: o soldado que envia a fotografia com uma mensagem escrita no verso, a mãe que pede pelo filho, a noiva que lembra o seu prometido, o soldado que quer regressar para ver os filhos, as madrinhas de guerra ou as crianças que nas escolas fazem trabalhos a pedir a paz no mundo e para Portugal. Neste último caso, há vários exemplos de mapas de Portugal e dos então territórios ultramarinos, desenhados em folhas de papel para as crianças colorirem ou preencherem com pequenas frases, junto a uma representação da Nossa Senhora de Fátima”.

Há também mensagens em que se pede para o filho não ir para a tropa ou não ir à guerra, há mensagens a pedir paz para todos os soldados que combatem nas frentes, há pedidos como este: “Salvai Portugal e os soldados que dão a vida pela Pátria”

Outro aspeto curioso que o autor regista são as mensagens referindo a guerra como um castigo pelos maus comportamentos da humanidade, há guerra porque os pecadores ainda não se converteram, há guerra porque é um castigo de Deus, porque ainda não se cumpriu a mensagem, perdoa Mãe Santíssima a estes filhos desavindos. E mais adiante:

  “Quando falam da guerra colonial, a esmagadora maioria das cartas são escritas por mães e irmãs, há depois as esposas, avós ou outras familiares aflitas, namoradas ou noivas esperançadas”.

Está hoje bem identificado que a mulher foi um grande apoio dos combatentes, procuravam dar estímulo e esperança no seu correio para o familiar na guerra, até conjuntamente se faziam promessas para ir agradecer a Nossa Senhora quando ele regressasse são e salvo.

Mais adiante, o autor fala dos jovens que regressaram são e salvos e que “reavivaram uma religiosidade de gratidão”. E veja-se um exemplo:

“A gratidão é o sentimento de Manuel Antunes, das Caldas da Rainha, hoje emigrante em Wasaga Beach (Canadá), onde casou. Todos os anos faz questão de estar no santuário português, acompanhado da esposa e do filho. Nos seus anos de guerra (Moçambique, 1967-69) rezava todos os dias a Senhora de Fátima. ‘Era a minha protetora, a minha fé foi fortificada na guerra e Nossa Senhora de Fátima fortificou a minha fé’, diz ele, durante a estadia em Portugal que o levaria ao santuário, em 10 de maio de 2019.

Consigo, Manuel transportava sempre um pequeno papel com os dados pessoais, para o caso de lhe acontecer alguma coisa. ‘Choro, lamento, mas amanhã irei para o mato. Mas irei: Nossa Senhora de Fátima me acompanha’, escreveu na pequena folha, hoje ainda legível. ‘Regressei, regressei, mas alguns ficaram lá…’, recorda, comovido. ‘Venho cá todos os anos e venho sempre a Fátima, rezo na Capelinha… Não vou pagar nada, só agradeço, tudo, tudo, agradeço por aquilo que me tem feito. É a minha fé”
.
Imagem do Santuário nos anos 1970

António Marujo também recorda episódios dolorosos como o de António Guerreiro Calvinho, antigo presidente da Associação dos Deficientes das Forças Armadas  (ADFA), que não esqueceu Fátima na sua poesia. Sempre equacionando o papel da Mãe de Deus com a Mãe Natural, o autor recorda a importância da canção “Mãe” do Conjunto Oliveira Muge. Escrita por António Policarpo, a sonoridade da composição era semelhante a outras baladas pop de estrutura simples desses anos 1960. 

E há as madrinhas e namoros, envolvendo Nossa Senhora de Fátima. Há a história de Joaquim Gregório, taxista na Batalha, que embarcou nos primeiros contingentes enviados para Angola. Participou na tomada de Nambuangongo, todos os dias rezava o terço com vários camaradas, invocando a Senhora de Fátima. Ferido com gravidade, Gregório chega a ser dado como morto. Depois de regressar foi a Fátima várias vezes em agradecimento. E António Marujo lembra o poema “Nambuangongo, meu amor”, de Manuel Alegre, provavelmente o mais poderoso poema de toda a literatura da guerra colonial, que assim começa:

“Em Nambuangongo a gente pensa que não volta
cada carta é um adeus em cada carta se morre
cada carta é um silêncio e uma revolta.
Em Lisboa na mesma isto é a vida corre.
E em Nambuangongo a gente pensa que não volta.”


O autor discorre sobre a relação de Fátima com o tema da guerra e da paz logo encetado em 13 de maio de 1917, quanto à guerra colonial nem tudo era linear entre católicos, com o evoluir da guerra a chamada linha do catolicismo de vanguarda afrontou o regime, primeiro refletindo sobre o direito dos povos à autodeterminação e depois condenando a inflexibilidade em não se dialogar com quem queria ser livre.

Tratando-se de uma investigação inédita, julgo que também é inédito o alargado olhar sobre o papel de Fátima na guerra colonial. Uma leitura estimulante para entender a fé dos combatentes e dos seus familiares.
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Notas do editor

(* Último poste da série de 26 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21584: Notas de leitura (1326): família, casamento e sexualidade, comentário de Cherno Baldé a uma das "Estórias cabralianas" ["Cabral, salvador das bajudas desfloradas"], da autoria de Jorge Cabral (Lisboa, ed. José Almendra, 2020, pp. 93-94)

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17872: Agenda cultural (594): Lançamento do livro "Isabel Minha Mãe", da autoria do nosso camarada Guilherme Costa Ganança, dia 21 de Outubro de 2017, pelas 16,30 horas, no Auditório do Centro Cultural John dos Passos, Ponta do Sol, Ilha da Madeira


C O N V I  T E

Lançamento do livro "Isabel Minha Mãe", da autoria do nosso camarada Guilherme Costa Ganança, (ex-Alf Mil da CCAÇ 1788/BCAÇ 1932, Cabedú, Catió e Farim, 1967/69), no próximo dia 21 de Outubro de 2017, pelas 16,30 horas, no Auditório do Centro Cultural John dos Passos, Ponta do Sol, Ilha da Madeira

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Sobre o autor:

Guilherme da Costa Ganança nasceu no Funchal em 1945.
Concluiu o Ensino Secundário no Liceu de Jaime Moniz, do Funchal.

Licenciou-se em Engenharia Electrotécnica, pelo Instituto Superior Técnico de Lisboa e fez o Bacharelato em Engenharia Civil, pelo Instituto Politécnico de Castelo Branco.
Foi professor no Ensino Secundário e no Politécnico, Vereador e Director do Departamento de Desenvolvimento, Educação e Cultura, da Câmara Municipal de Castelo Branco.
Foi Director de Produção da empresa Cablesa, hoje, Delphi.
É também autor dos livros: "Do Cacine ao Cumbijã" e "O CORREDOR DE LAMEL - 68 GUINÉ 69".

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Nota do editor

Último poste da série de 17 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17871: Agenda cultural (593): Lançamento do livro "Os Silêncios da Guerra Colonial", da autoria da antropóloga Sara Primo Roque, filha de um DFA, combatente em Moçambique, dia 9 de Novembro, quinta-feira, às 18:30 h, na Av. Padre Cruz, na ADFA - Associação dos Deficientes das Forças Armadas

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P15999: In Memoriam (254): Nina Amado (1932-2016), Mãe do nosso camarada e amigo Juvenal Amado, falecida no passado dia 13 de Abril

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 15 de Abril de 2016, com um poema homenageando a memória de sua Mãe, falecida no passado dia 13, dias antes do nosso Encontro Nacional:

Carlos e Luís e restantes camaradas 
Ao longo dos anos em que participo neste nesta, tertúlia aprendi a sentir os camaradas como família. 
Assim dando resposta a muitos, que me foram perguntando pela saúde da minha mãe, venho cumprir a dolorosa obrigação de informar do seu falecimento no dia 13 de Abril. 
A foto é a minha mãe o meu pai jovens, que é assim que os quero recordar para sempre. 

Obrigado
Juvenal Amado

IN MEMORIAM

NITA AMADO - 1932-2016

Os Pais do Juvenal - Nátio e Nita Amado


O TEU PERFUME PARA NÓS SERÁ ETERNO

Os anos passaram sobre o teu olhar
Viste-nos crescer
Foste a nossa sombra protectora.
Cavaram-se no teu rosto as rugas
Olhavas para nós expectante
Os teus olhos falavam suplicantes

Não sei te lembravas
Nós saltávamos para tua cama,
regressávamos ao ninho do teu colo,
repartíamos alegria com beijos e risos.
O nossos risos de crianças ainda ecoam
Como fomos felizes sobe o teu olhar!

Foram dolosos os últimos anos
Definhaste
Como uma flor com o caule cortado,
foste-te despedindo de nós
suavemente .

Os cravos floriram e tu não viste,
não fomos capazes de parar o tempo
Ontem num gesto derradeiro
Acompanhámos-te,
depositámos-te na terra,
Para trás ficou um rasto de luz,
só habitas no nosso coração
Mas o teu perfume,
para nós será eterno.

Nita Sacadura Amado.
3 de Dezembro de 1932 - 13 de Abril de 2016

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Comentário do editor

Para o camarada Juvenal Amado, e demais familiares, vão as nossas mais sentidas condolências pelo falecimento da senhora Dona Nina Amado. 
Ele não quis que se publicasse a notícia da morte da senhora sua mãe antes do nosso Encontro. Aqueles que souberam da notícia antes, tiveram a oportunidade de lhe dar um abraço solidário em Monte Real.
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de abril de 2016 Guiné 63/74 - P15998: In Memoriam (253): António dos Santos Mano (Larinho, Torre de Moncorvo, 1943 - Estrada Missirá-Enxalé, 1966), fur mil op esp, CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá e Porto Gole, 1965/67) (Armando Gonçalves / Júlio Martins Pereira / Henrique Matos / João Crisóstomo)

domingo, 27 de dezembro de 2015

Guiné 63/74 - P15546: Blogpoesia (428): "Era Dezembro, Mãe" (Felismina Costa)

1. Mensagem da nossa amiga tertuliana Felismina Costa, aniversariante no passado dia 23, juntamente com os camaradas Albano Costa e Carlos Pinheiro, com data de hoje 27 de Dezembro:

Boa noite amigo Carlos Vinhal 
Quebrando um longo silêncio, por aqui, decidi voltar à Tabanca, donde nunca saí! 
Obrigada por mais um ano ter editado o poste alusivo ao meu aniversário e por ter permitido os comentários dos amigos. 

Envio um poema que ofereço a todos os Tertulianos da Tabanca, muito especialmente aos aniversariantes que comigo festejaram a data. 

Grata pela vossa amizade: 
Felismina Mealha

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"Era Dezembro mãe"

Era Dezembro mãe!
Tão Dezembro!
Tão perto do Natal…
E eu quis vir à festa,
Trazendo como prenda
o meu eu, que me ofereceste…
e que ficou tão meu, tão unicamente meu
que, sem ele… não sou eu…
Às vezes, querem que eu, não seja eu,
mas eu, não sei ser outro, senão eu!
E talvez, porque recordo os teus afagos,
os teus beijos, sublimados,
os teus braços e abraços
a tua voz cristalina,
eu… sou ainda uma menina!

Lembro Março, florindo sem cansaço
inundando o largo espaço de poesia,
enquanto no teu regaço, eu sorria e crescia.

Lembro Abril, de luz dançante
quando as nuvens com o vento se fragmentam
e desenham alegria esvoaçante.

Lembro o Maio das novas aves
dos chilreios coloridos, exultantes…

Lembro, os Agostos escaldantes e longuíssimos
que queimavam apenas os dias que passavam…
E à noite, o luar, trazia mensagens de outras galáxias,
Contava-me histórias que ouvia encantada,
ao som de orquestras, que não divisava.

Lembro os Outonos que amavas e me ensinaste a amar
nas cores dos poentes que namorávamos
em êxtase total,
absorvendo aromas que retenho ainda, como se o tempo
tivesse parado, ali à esquina…

E eis que regresso ao Dezembro de então,
Trazendo na mão o presente teu…
que era somente… a luz do que é meu.
Sorrindo me olhaste, sabendo que eu era
a pequena magia desse teu Natal,
Que juntas vivemos, e fomos cantar
A essa Belém, onde, de outra Maria,
um outro Menino…
Nascia também!

Felismina mealha
Agualva, 24 de Outubro de 2012
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de dezembro de 2015 Guiné 63/74 - P15482: Blogpoesia (427): No meio da Ponte (Joaquim Luís Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728)

domingo, 3 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14559: Blogpoesia (413): No dia em que se lembram todas as Mães, um poema do nosso camarada Domingos Gonçalves, ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887 (Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68)

1. Mensagem do nosso camarada Domingos Gonçalves, (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68) com data de 1 de Abril de 2015:

Prezado Dr. Graça:
Tomo a liberdade de remeter um pequeno poema, que poderá ser publicado o Blogue, caso o entenda conveniente.

Com um abraço amigo,
Domingos Gonçalves

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Mãe

 Não há outra tão breve, e sacrossanta.
É a primeira que a nossa voz murmura,
A que mais nossa pobre alma encanta.

Ao dizê-la, sentimos-lhe a doçura.
E não há palavra onde exista tanta.
E quem diz mãe, diz anjo. Diz ternura.
E diz amor, com piedade santa.

Mãe! A palavra é quase divinal.
É feita só de encanto, só de luz.
Para tudo quanto a vida tem de mal,

Ou de peso enorme, a lembrar a cruz,
Ela tem remédio. Ela traz bonança.
E tem sempre um gesto a brotar esperança.
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Nota do editor

Último poste da série de 10 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14452: Blogpoesia (412): 3 poemas recentes: (i) Mergulhei na Polónia; (ii) O barco na praia; e (iii) Rua dos impossíveis... (J. L. Mendes Gomes)

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13208: Blogpoesia (382): No colo de minha Mãe (J. L. Mendes Gomes, Berlim, 29 de maio de 2014, 7h43m, de chuva e vento frio)

No colo de minha Mãe

por J. L. Mendes Gomes 

No colo de minha Mãe...

Como um fio de água
Me desprendi,
Cresci e rolei no mundo,
Fiz-me um rio,
Estreito, largo
E sinuoso.
Como gavinha de uva,
Me prendi ao tronco
E nele me enrolei,
Para não cair
Ou ser levado
Pelo vento.
Como a hera verde,
De muitas folhas,
Me quereria ter colado
Ao colo de minha Mãe.
Mas veio a escola e a catequese.
E aquela eternidade
De seminário.
E a tropa em Mafra
Antes da guerra em África.
E veio a luta insana
Da sobrevivência,
E uma escada de muitos degraus,
Para eu trepar,
Só com meus braços.
E os percalços todos
Que, tão cruéis,
Torpedearam
Os meus passos.
E as derrotas
E pequenas vitórias,
Que registei na história
Da minha vida.
E as prendas todas
Que eu não recebi
No sapatinho
Dos meus natais.
Por tudo quanto de bom
Não fiz
E quisera ter feito aos montes,
Eu gostaria, agora,
De nunca ter deixado
O regaço, tão puro e quente,
Do colo de minha Mãe!…


O poeta, com os netos em Berlim. em 2012
Berlim, 29 de Maio de 2014, 7h43m ( de chuva e vento frio)

Joaquim Luís Mendes Gomes (*)

[ex-alf mil, CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66; jurista, reformado; autor do livro de poesia "Baladas de Berlim", Lisboa, Chiado Editora, 2013, 232 pp., preço de capa;: € 14; encomendar aqui] (**)

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(**) J. L. Mendes Gomes é autor, no nosso blogue, de várias séries, entre as quais a "Crónica de um Palmeirim de Catió":

29 de março de 2007 > Guiné 63/74 - P1634: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (10): A morte do Alferes Mário Sasso no Cantanhez

11 de março de 2007 > Guiné 63/74 - P1582: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (9): O fascínio africano da terra e das gentes (fotos de Vitor Condeço)

8 de fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1502: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (8): Com Bacar Jaló, no Cantanhez, a apanhar com o fogo da Marinha

22 de janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira

8 de janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1411: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (6): Por fim, o capitão...definitivo

11 de dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1359: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (5): Baptismo de fogo a 12 km de Cufar

1 de dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1330: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (4): Bissau-Bolama-Como, dois dias de viagem em LDG

20 novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1297: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (3): Do navio Timor ao Quartel de Santa Luzia

2 de novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1236: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (2): Do Alentejo à África: do meu tenente ao nosso cabo

20 de outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1194: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (1): Os canários, de caqui amarelo

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12711: In Memoriam (177): Senhora Dona Maria da Graça (1922-2014), mãe do nosso editor Luís Graça

1. A triste notícia chegou a meio da manhã, a senhora Dona Maria da Graça, mãe do nosso editor Luís Graça, tinha falecido durante a madrugada, em paz e sem dor.

A Dona Maria da Graça ia fazer 92 anos, nasceu a 6 de Agosto de 1922, na aldeia de Nadrupe, a 3 quilómetros da Lourinhã. Viveu vários anos em Lisboa, na sua juventude, mas foi a Lourinhã que a viu partir para a Eternidade. Estava no Lar de Nossa Senhiora da Guia, na Atalaia, Lourinhã, desde 2008.

No longínquo ano de 1946, a 2 de Fevereiro, contraiu matrimónio com o senhor Luís Henriques, do qual veio a gerar 3 filhas e 1 filho. A família foi alargando e hoje ficam enlutados, além dos seus 4 filhos, 12 netos e 5 bisnetos. Em 8 de abril de 2012 viu partir do seu inseparável companheiro de uma vida.


O senhor Luís Henriques e a Dona Maria da Graça em 1991

Como a maioria das nossas mães, também a senhora Dona Maria da Graça chorou pelo filho que teve na Guiné, desde  maio de 1969 a março de 1971. Por certo, durante aqueles quase dois anos, mais de 700 dias de sofrimento e incerteza, rezou e implorou para que o seu filho regressasse vivo e sem qualquer mal.

Depois de tanto sofrimento e canseira para criar e educar os filhos e lutar ao lado do marido porque os tempos não eram fáceis, teve um fim de vida com a qualidade possível, atendendo à sua já muito precária saúde. A autoestrada da sua vida chegou ao fim. Vai voltar a encontrar o seu companheiro que a deixou há menos de 2 anos.


Corria o ano de 1947, o casal Luís Henriques e Maria da Graça com o filho Luís, ainda bebé

Aqui deixamos o nosso testemunho solidário ao nosso companheiro Luís, às suas 3 manas, assim como aos netos e bisnetos, demais familiares e amigos que sofrem esta perda esperada, mas sempre dolorosa.

O corpo da inditosa senhora está em Câmara Ardente na Igreja da Misericórdia, na rua pedonal da Misericórdia, na Lourinhã, vila que fica a escassos 70 Km a norte de Lisboa. O corpo seguirá depois para a Igreja do Castelo, a 100 metros, às 12h30, onde será rezada missa de corpo presente.
O funeral  está marcado para o dia 13, às 14h30, no cemitério local, que fica ao lado da Igreja do Castelo.
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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12607: In Memoriam (176): Maria Manuela Pinheiro (1950-2014), natural de Torres Novas... Um abraço fraterno e solidário para o Carlos Pinheiro, com quem a Maria Manuela era casada desde 1974... O casal esteve presente nos nossos três últimos encontros nacionais, em Monte Real

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12262: Memórias de um passado (Joaquim Cardoso) (3): Um bacalhau que ficou para a história

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Cardoso (ex-Soldado de TRMS do Pel Mort 4574, Nova Lamego, 1972/74), com data de 4 de Novembro de 2013:

Meu caro amigo, Carlos Vinhal:
Envio o presente texto, que é mais um episódio dos que retenho na memória.
Peço-te o favor de o ler e, caso entendas ser digno de publicação, dá-lhe o teu toque pessoal e coloca-o no respectivo lugar. 
Um grande abraço para ti e toda a tertúlia
Até breve.
J.Cardoso.


MEMÓRIAS DE UM PASSADO

3 - Um bacalhau que ficou para a história

Decorria o ano de 1973 e, em Agosto desse ano, completava eu, ou tinha completado, 1 ano (?) de permanência no Gabú-Nova Lamego-Guiné.
Os ponteiros do relógio teimavam em ser demasiado lentos, dando a sensação de cada hora passada ser um dia, cada dia um ano e, um ano uma eternidade!

A monotonia do dia a dia, juntamente com as saudades da família, o stress começava a apertar! Como se isso não bastasse, a alimentação que nunca foi famosa por aquelas bandas, vinha piorando cada vez mais, a ponto de haver mais que um levantamento de rancho, (recusa de comer a respectiva refeição).

Na ementa diária constava, salvo raras exceções, num dia arroz com "estilhaços" no outro esparguete com "estilhaços" (pedacinhos de carne). Legumes, não havia! Dizia-se que o Vagomestre se estava a governar com o "pilim" que era devido a cada militar para sua alimentação.

Por essa altura escrevi a meus pais, queixando-me da dita alimentação. Que estava enjoado de comer constantemente arroz e esparguete e, em termos de desabafo, manifestei um desejo à minha saudosa mãe, dizendo-lhe:
- Ah mãe... Quem me dera comer uma boa posta de bacalhau. Fosse cozido, assado ou mesmo cru! (É meu prato preferido).

 Confesso que nunca imaginei o resultado deste meu desabafo! Apesar de meus pais viverem numa aldeia e serem pessoas de fracos recursos, minha mãe interiorizou o meu queixume e o amor de mãe falou mais alto. Deslocou-se aos correios, percorrendo a pé uma distância de aproximadamente 8 quilómetros, informando-se sobre a possibilidade ou não, do envio de uma encomenda para a Guiné. Como a resposta foi afirmativa, na volta do correio entre outras coisas, dizia mais ou menos seguinte:
- Meu filho, recebi as tua carta e tomei nota do que dizias relativo à alimentação. Sabendo dos teus desejos, fui aos Correios de Vila Meã e despachei um pacote com bacalhau. Quando o receberes, dá-me notícias. Reconheço que não será o suficiente para te matar a fome, mas creio, contribuirá para teres alguns momentos de satisfação.

Cabe aqui uma nota de agradecimento:
- Obrigada mãe. Onde quer que estejas, que tenhas a devida recompensa pelo bem que me fizeste. De mim, nesta altura que escrevo, só poderei a título póstumo, publicamente agradecer-te e saudosamente recordar-te, vertendo algumas lágrimas de emoção causada pela prática do teu ato.

Depois de tão surpreendente novidade, dei por mim a imaginar se tal encomenda chegaria ao destino! Tomasse ela o rumo de algumas "folhas de vide" (notas de 20 escudos), que eram enviadas dobradinhas junto às notícias dentro dos aerogramas e, dificilmente comeria bacalhau! 

Felizmente assim não aconteceu! Passadas que foram cerca de 3 semanas(?), recebi o aviso e levantei a dita encomenda! Fiquei maravilhado. Coloquei o pacote às costas com cerca 4 kg, dirigi-me à caserna, e imediatamente o abri. Ali estavam diante de meus olhos umas boas postas do fiel amigo!

Para o saborear, convidei meia dúzia dos meus amigos e camaradas mais próximos e, no final do repasto, o resultado fica à imaginação de cada um, bastando para tanto visualizar as fotos que junto. Quando mais tarde noticiei a minha mãe o gosto que me tinha dado, ela, algum tempo depois, repetiu a dose, e o resultado final do segundo foi idêntico ao do primeiro. 

Penafiel. 4/11/2013
Joaquim Moreira Cardoso
Ex-Sold.Trans. NM 194530/71


Nesta foto, a começar da esquerda em plano mais baixo: O Vasco e eu Cardoso. Em plano mais alto, Pereira e Cunha(?). Na direita e plano mais baixo, o Monteiro e Morim(?)



Nesta foto, à esquerda, o Graça, de costas o A.Santos e mais 3 colegas dos morteiros e na direita eu, Cardoso
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Nota do editor

Último poste da série de 20 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12063: Memórias de um passado (Joaquim Cardoso) (2): Um só dia e uma só noite no mato bastaram para um grande susto

domingo, 15 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12047: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (13): A minha singela homenagem aos pais de todos nós

1. Mensagem do nosso camarada Vasco Pires (ex-Alf Mil Art.ª, CMDT do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72) com data de 24 de Agosto de 2013:

Cordiais saudações.
Tem-se falado muito que a nossa geração foi sacrificada, no que concordo plenamente.
Tenho dito em alguns comentários, e confirmo, que os nossos toscos, arrogantes e oportunistas líderes políticos nos derespeitaram e continuam fazendo-o, ao não reconhecer que estávamos a serviço compulsório do ESTADO PORTUGUÊS,  aliás é essa a minha opinião sobre as as nossas PSEUDO ELITES de longa data, com raras e honrosíssimas excepções.

Mas divaguei demais sobre algo que não era a minha ideia inicial.
Queria lembrar a ansiedade e sofrimento de nossos pais e demais familiares, enquanto nós estávamos por lá "perdidos" nas bolanhas de uma África inóspita.

Ao enviar a foto de meus pais, quero homenagear os de todos nós.
Será que o sofrimento deles foi em vão?

Forte abraço
Vasco Pires

 A família de Vasco Pires e um amigo (com óculos, à direita) da diáspora de Goa


José Martins Pires, pai de Vasco Pires, em 1930
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Nota do editor

Último poste da série de 11 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11929: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (12): Fotos do Cap Op Esp Fernando Assunção Silva em confraternização com oficiais e sargentos sob o seu comando

domingo, 5 de maio de 2013

Guiné 63/74 - P11530: Homenagem a todas as Mães; às que já partiram e às que ainda estão connosco (Juvenal Amado)

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 4 de Maio de 2013:

Luis, Carlos, Virgínio, Magalhães e restante Tabanca Grande
Poder homenagear as mães é uma alegria vedada aos muitos que já viram partir as suas. Mas penso quando celebramos as que estão junto de nós, homegeamos também as partiram.

Um abraço para todos
Juvenal Amado



Esta mulher deu-me tudo sem lhe pedir nada

Vigiou-me até eu começar a andar, acompanhou-me à escola até eu aprender o caminho, cuidou de mim quase sem eu dar por isso, depois cresci, pensei que tinha saído da sua sombra protectora, mas no fundo ela velou por mim mesmo quando estive longe.

Protegeu-me não medindo o perigo em momentos difíceis.
Hoje não é a mesma mulher, envelheceu, a doença tirou-lhe algum senso e dignidade que sempre lhe conheci.
Faz birras, é vaidosa, troca as coisas, faz confusão com os assuntos, tem sempre as razões dela na ponta da língua, não tem paciência para os outros, fica triste se por alguma razão um de nós a não vai buscar ao fim de semana.

Há dias caiu e partiu a cabeça. Já não é a primeira vez. Ficou com a cara negra.
O que se há-de fazer? É uma criança com 82 anos, em que a aprendizagem se faz em sentido inverso e que perdeu muitos dos conhecimentos adquiridos ao longo da sua vida, com mais preocupações do que regalias. Nós mudamos e ela também mudou.

Hoje respeito-a não pela beleza passada ou pela sua autoridade, mas pelo que sou e que nunca seria sem ela. Ela moldou-me, ensinou-me o que estava certo e o errado, indicou-me o caminho, assinalou-me os escolhos e os perigos.

Não evitou que no meu livre arbitro, tenha muitas vezes tropeçado e caído.
Amo-a hoje com sentido de protecção como o que em tempos ela me deu e porque representa um elo de ligação, com todos os entes queridos que já partiram e pelos que felizmente ainda tenho comigo.

Amanhã é dia da Mãe.

Felizmente eu tenho a minha e congratulo-me por para mim e pelos meus irmãos, porque todos os dias para nós o ser. Não vou estar com ela este dia, mas para a semana vou-lhe levar uma flor, sair de braço dado com ela e passear pelas ruas da sua e minha cidade, com um pouco de orgulho quando ela me apresenta como sendo novidade:
- Este é o meu filho mais velho.

Feliz dia da Mãe para todas as mães.

Texto e fotos: © Juvenal Amado (2013). Todos os direitos reservados
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Guiné 63/74 - P11529: Blogpoesia (336): Suadê, nome de mãe (José Teixeira)

1. Mensagem do nosso camarada José Teixeira (ex-1.º Cabo Enf.º da CCAÇ 2381, Buba, QueboMampatá e Empada , 1968/70), com data de 23 de Abril de 2013:

Caríssimos editores.
Aproxima-se o DIA DA MÃE.
Estarei na Guiné-Bissau, talvez no Centro Materno-Infantil de Elalab que a Tabanca Pequena ajudou a construir para apoiar as mães de hoje.
Gostava que colocassem no blogue este poema que escrevi em memória daquela mãe que no dia 14 de Janeiro de 1969 viu a sua bebé morrer ficando ela gravemente ferida no corpo e no espírito ao ponto de desejar a morte o que me dificultou imenso a sua estabilização.


Fevereiro, 1969 / Buba / 20 

 ...Tive muito que fazer na Enfermaria. Um dos feridos da população mais graves foi a mãe da menina que morreu. Tinha o corpo cheio de estilhaços, felizmente não foi atingida nos órgãos vitais e deve recuperar. O seu sofrimento interior impressionou-me. 
É seu hábito dormir com a criança amarrada às costas para poder levá-la para o abrigo subterrâneo quando o IN ataca. Como já era de manhã desamarrou-a pouco antes do ataque se dar. Quando ouviu o fogo correu para o abrigo e só nessa altura é que se apercebeu que a bebé estava a dormir na tabanca. Saiu a correr, mas foi atirada ao chão pelo rebentamento da granada de canhão que caiu em cima da sua casa e lhe matou a menina....


Suadê, nome de mãe. 

Estava viva, 
Estava morta, 
Pobre mãe preta, 
Desesperada, 
A morte bateu-lhe à porta, 
No sopro de uma granada. 
Chorava lágrimas de sangue, 
No seu corpo dilacerado. 
Dos olhos vítreos e secos, 
De tanta lágrima corrida, 
Um grito soava ardente. 
Não tenho direito à vida. 

Era alta madrugada, 
Quando a guerra eclodiu, 
E aquela mãe assustada, 
Da morte, a correr fugiu. 
Sua filhinha dormia, 
Dos justos, um sono forte, 
A granada explodiu, 
E com ela veio a morte. 

Chegou à porta do abrigo, 
Em noite de mau agoiro, 
E para trás voltou, apressada 
Na esperança de salvar, 
O seu mais valioso tesoiro. 
A razão do seu viver. 
E viu sua filha amada morrer 
Sem lhe poder valer. 

A mesma granada, 
Que sua filha matou, 
No calor do incêndio que lhe esmagou a alma 
Seu corpo cruelmente dilacerou, 
Prostrando-a no chão, inanimada. 
Num misto de sofrimento e dor. 
Que dor, pobre mãe, 
Tu viste tua filha morrer, 
A razão do teu viver. 
Sem lhe poderes valer. 

Já não choras mãe.
Esgotaste o cloreto de sódio, 
Teus olhos espelham ódio, 
À vida que teima em soprar. 
Queres morrer, 
Desaparecer. 
Ir ao encontro da tua amada, 
Que partiu, para não voltar. 

 Zé Teixeira
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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE MAIO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11515: Blogpoesia (335): Estamos à espera de quê ?...(J. L. Mendes Gomes)

domingo, 24 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11307: In Memoriam (146): D. Maria Hermínia Jesus Machado (Guifões, 1924-2013), mãe do nosso camarada Albano Costa, que faleceu hoje, dia 24 de Março (Editores)

Mais uma funesta notícia, desta vez a do falecimento da senhora D. Maria Hermínia Jesus Machado, mãe do nosso camarada Albano Costa na foto à direita.

Doente já há alguns anos, estava a ser cuidada pela nora Eduarda, a esposa do Albano, que por isso mesmo irá sentir esta perda especialmente. Na verdade os nossos velhos, quando ainda por cima doentes, criam laços especiais com os cuidadores, e a sua partida causa uma sensação de vazio difícil de preencher. 

O editor de serviço foi muitas vezes testemunha da dedicação daqueles filho e nora à D. Maria Hermínia, quando recusavam alguns convites ou quando deixavam apressadamente algumas confraternizações com a alegação de que tinham de prestar assistência à doente antes que adormecesse. Dar-lhe o jantar a horas e deitá-la, era tarefa diária prestada com desvelo.

Ao Albano, à Eduarda, aos seus filhos e aos demais familiares da D. Maria Hermínia, em nome desta tertúlia, deixamos os nossos sentidos pêsames e a nossa solidariedade nesta hora de dor pela partida da sua matriarca.

O corpo da inditosa senhora está em câmara ardente na Capela sita junto à Igreja Paroquial de Guifões, realizando-se amanhã, segunda-feira, 25 de Março, pelas 15 horas, o seu funeral.

Para quem conheça mal esta área metropolitana, Guifões é uma freguesia do Concelho de Matosinhos e a sua Igreja Paroquial [foto à esquerda] fica situada no Largo Padre José Joaquim Pereira Santos (no fim da Rua Passos Manuel). 

Chega-se a Guifões a partir da A4, abandonando a autoestrada na saída 2. 
Outros acessos são possíveis a partir de Matosinhos, Senhora da Hora e Custóias, pelas estradas nacionais.


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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 11 DE MARÇO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11236: In Memoriam (145): Domingos de Sousa Torres, sold cond Berliet, CCAÇ 3549 (Fajonquito, 1972/74)...Funeral, hoje, às 10h30, Capela do Senhor dos Aflitos, Canelas, Vila Nova de Gaia... Até sempre, camarada! (José Cortes)

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11102: Blogoterapia (223): Agradeço as manifestações de pesar que me foram dirigidas a propósito do falecimento da minha mãe (Carlos Vinhal)

Ano de 1948 > Maria Henriqueta, Carlos pai e Carlos filho.

1. Triângulo desfeito

É assim a vida de (quase) todos os casais. Casamento, nascimento do(s) filho(s), foto oficial de família e inúmeros acontecimentos, bons e maus, para alguns mais maus do que bons, até que a lei da vida (ou da morte) selecciona o supostamente mais fraco deixando ao outro a hipótese de viver mais uns anos.

Decorria o ano de 1981 quando o meu pai faleceu, vítima de insuficiência cardíaca. A minha mãe, então com 58 anos, encarou heroicamente a partida do seu eterno namorado. Dizia-lhe eu, às vezes, por que não refazia a sua vida, mas quem amou um único homem desde os 16 anos jamais conseguiria, mesmo fingindo, viver outro romance.

Sem darmos conta passaram-se 32 anos e de repente a minha mãe está muito velhinha, não só na idade mas também porque o seu estado de saúde físico se começa a debilitar a olhos vistos. Felizmente para mim e para ela o seu estado mental manteve-se praticamente normal até ao último minuto de vida. Ainda no sábado, poucas horas antes de falecer, conversou comigo e com a Dina. Protestou pelas muitas horas passadas no dia anterior na urgência do Pedro Hispano. Quem espera desespera.
Conversamos sobre roupa, sobre o seu estado de saúde e coisas triviais para a ajudar a ocupar o tempo. Até lhe comprei umas meias quentinhas e uns miminhos para durante a semana aconchegar o estômago no intervalo das refeições. Viemos embora ficando ela à mesa a tomar a sua cevadinha quentinha.

Domingo de manhã o telefone tocou, e quando verifiquei que era do Lar, estava longe de imaginar que era para me darem a notícia do seu falecimento*. Talvez eu não "quisesse" ter visto o mais óbvio, a minha mãe estava mesmo no fim.


2. Agradecimento

Tentei agradecer individualmente a cada amigo que de alguma maneira se me dirigiu com as suas condolências, confortando-me nesta hora, muito, mas mesmo muito difícil. Se a algum não agradeci pessoalmente, peço mil desculpas. Fica aqui um agradecimento sincero a todos.

Sei que muita gente não teve conhecimento do falecimento da minha mãe. Outros não puderam comparecer porque era dia de trabalho, havia ponte de carnaval, etc. Sei que mesmo os ausentes estiveram comigo. Muito obrigado também.
Quero ainda deixar aqui um agradecimento muito especial aos camaradas que se deslocaram de mais longe para estarem comigo no momento em que a minha mãe desceu à terra. Por uma questão de ética não vou enunciar nomes, mas os destinatários reconhecem-se neste agradecimento.
Não posso esquecer os de mais perto que me fizeram companhia nos dois dias em que a minha mãe esteve em câmara ardente na Capela do Corpo Santo. Conversaram comigo e ajudaram a minorar a sensação de perda mais sentida naquelas primeiras horas. Nestas alturas se reconhece o valor dos amigos.

Disse-me o Luís que a vida continua, concordo, mas hoje sinto-me muito mais velho.
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 10 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11085: In Memoriam (137): Maria Henriqueta Esteves Afonso (Valença, 1922 - Leça da Palmeira, Matosinhos, 2013), mãe do nosso querido co-editor Carlos Vinhal... Corpo em câmara ardente na Capela do Corpo Santo, funeral amanhã às 15h para o cemitério nº 1 de Leça da Palmeira

30 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11027: Blogoterapia (222): Agradecendo os vossos mimos, as guloseimas (para a alma), em dia de aniversário com capicua... (Luís Graça)

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10948: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (2): A caminho de Bissau




1. Em mensagem do dia 9 de Janeiro de 2013, o nosso camarada  Manuel Joaquim (ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, BissauBissorã e Mansabá, 1965/67), enviou-nos a sua segunda "Carta de Amor e de Guerra" que se segue: 





CARTAS DE AMOR E DE GUERRA

2. A caminho de Bissau

Estava a gostar da viagem marítima, apesar das angústias me enovelarem os sentimentos, apesar das imagens dos meus entes queridos no cais de embarque não me saírem da cabeça, principalmente as de minha Mãe.

Chegados à Madeira, eu fui um dos muitos que saíram para dar uma volta pela cidade do Funchal. Aproveitei para inaugurar a minha correspondência de guerra pondo no correio um aerograma para a namorada.

Durante o passeio fui alertado para as más condições físicas e higiénicas em que viajavam os praças. Eu, passageiro alojado em classe turística com ar condicionado, tempo gasto a pensar mais nos meus problemas pessoais do que em qualquer outra coisa, não escalado ainda para qualquer serviço na Companhia, fiquei muito surpreendido com esta informação.

No dia seguinte, navio zarpado do Funchal, dirigi-me aos porões para confirmar o que me tinham dito. Quando descia pensei logo em voltar para trás, tão acre, pesado e gorduroso era o ar que respirava. Mas continuei e o choque que sofri com aquela miserável situação foi tão grande que, no momento, odiei todo o poder político e militar que se permitia tratar assim os seus soldados. Como é que era possível?

Num diálogo de circunstância com alguns soldados presentes percebi o seu descontentamento mas demorei pouco tempo, tal era o incómodo. Tentando disfarçar a vontade de vomitar, saí apressado e revoltado. Umas horas depois ainda sentia fortemente tais cheiros porque as partículas em suspensão no ar que respirara tinham ficado, certamente, coladas nas minhas fossas nasais. Fiquei tão marcado que, 47 anos passados, ainda me parece senti-los presentes.

A viagem que, apesar das circunstâncias, me estava a agradar ficou estragada, senti-me ultrajado como homem e como cidadão de um país cujos diversos “chefes” assim tratavam os seus soldados ao mesmo tempo que lhes cantavam hinos de louvor pela sua coragem e patriotismo!

“O Niassa atracado no cais do Funchal prenho de jovens para despejar na Guiné”
© Rumo a Fulacunda, blogue fotográfico de Henrique Cabral


Lisboa, 5/8/1965

Meu querido: (…) já quase deixava de esperar notícias de bordo (…). [resposta ao meu aerograma enviado do Funchal] As tuas palavras de hoje, meu amor, vieram colocar mais um sinal, mais um ponto positivo na minha vida que tem sido nestes dias tão monótona, tão sem interesse. Vieram acordar-me deste letargo em que mergulhei sem forças para dele sair, desde que os teus pais me deixaram.

Foram embora domingo à tarde. Parecia-me que a tua mãe ia mais bem-disposta, mais calma e mais conformada. Aqui passou o tempo mais ou menos animada, parecia-lhe, dizia-me ela à partida, que ainda estava junto de ti. Eu sentia o mesmo. Tens uma mãe encantadora, meu querido. Eu fiquei deveras maravilhada com ela, com as atenções que me dedicou. [ (*)ver nota ] É bastante justo o amor, a dedicação, a admiração que lhe votas, (…). Eu farei tudo para lhe amenizar a dor, a saudade pela tua partida. Devia ter recebido uma carta minha a participar-lhe que não ia lá passar o domingo como tinha prometido. (…) mas eu não posso, embora tenha a 2ª feira livre até às 14 horas para podermos assistir ao juramento e investidura do Presidente da República. [Em 9/ VIII/1965, Américo Tomás inicia o seu 2º mandato como PR (1965-1972).]

(…). Consegui na hora da despedida sorrir-te, pôr nesse sorriso toda a minha esperança e toda a confiança no belo futuro que havemos de ter mas, interiormente, a minha constituição física ressentiu-se com a excitação de que depois fui tomada. Já é natural o que agora me aconteceu, quando me excito, por isso evito as viagens porque experimento um mal-estar, uma indisposição horrível. (…).

Olha por ti. Não desanimes, (…) é preciso que no nosso espírito haja um apoio, uma segurança, alegria indestrutível. Tudo passará, (…). E tu regressarás. (…). Acredito-o. Haverá nestes anos muita dor, muitas saudades, momentos de desespero mas para vencermos tudo isso e o mais a que estamos sujeitos é preciso que tenhamos um ponto de apoio, qualquer coisa pela qual teremos de vencer tudo para a possuir. (…). Nós somos capazes de transformar em triunfo todas as dores, fracassos, decepções. (…), apesar de tudo e contra tudo o que se lhes oponha. (…). Com esta segurança, querido, com esta força que nos guia podem vir desgraças, desânimos, decepções que sempre fica na nossa alma uma réstia de luz, de paz e alegria, capazes de suplantar todas as dores.

(…) aguardemos confiantes a hora do encontro.

(…). Beijo-te e abraço-te, meu amor querido. Só e sempre tua, N.



 Foto da mãe Belmira da Piedade, Maio/1967, pouco depois do meu regresso da Guiné
© Manuel Joaquim.


*Memória de minha Mãe:

Foi uma “moira de trabalho” na lida doméstica e na agricultura das suas pequenas propriedades. Meu pai, como carpinteiro, passava muito tempo fora e, a certa altura, partiu e foi emigrante durante 17 anos.

Analfabeta, nunca descurou a educação e a instrução dos seus três filhos. Quando herdou de seus pais incentivou o marido a vender a herança para custear os estudos dos filhos, na altura só os meus pois os manos mais novos andavam na escola primária. Assim se fez mas o dinheiro não durou muito e meu pai teve de emigrar: Lourenço Marques, Joanesburgo, Paris.

Ela ficou a tomar conta dos filhos, a cuidar da terra e a gerir as verbas mandadas pelo marido. Passados dois anos, a vida militar começou a ameaçar os filhos. Fui o primeiro a sê-lo, era o mais velho, mas adiei a incorporação dois anos, concedida por razões académicas, e o meu mano “do meio” foi juntar-se ao pai em Joanesburgo. A certa altura teve a “feliz” ideia de ir a Lourenço Marques oferecer-se para cumprir o serviço militar. Dizia ele que assim ainda poderia ir a tempo de se safar da guerra que já se adivinhava próxima e, por pouco, não o conseguiu. Teve azar, apareceu-lhe a guerra em Mueda, tendo a “sorte” de receber dela um premiozinho que foi a hospitalização por ferimentos sofridos.

Entretanto o filho mais novo chega aos 18 anos, então com o pai já em Paris e resolveu juntar-se ao pai, pois claro. E por lá ficou durante anos sem poder vir ver a mãe. Como estava com o pai, ela não se incomodava muito com isso. Mas mais um filho na tropa é que não! Já lhes bastava terem lá dois! Em janeiro de 1964 fui incorporado e a minha “mãe coragem” ficou sozinha, menos nos meses de férias de meu pai, com um filho em França e os outros no serviço militar.

Tive a sorte de ter o Pai e a Mãe no meu embarque para a Guiné mas a Mãe, um mês depois, com o marido e os três filhos dispersos, tornou a ficar sozinha! E assim ficou uns meses, com dois filhos na guerra até um deles regressar de Moçambique.

Guardo bem nítida na memória a imagem que dela levei para a Guiné: debruçada sobre o varandim do cais, amparada por meu pai e pela minha namorada, chorava e gritava de braços estendidos em direcção do navio. Situação terrivelmente dolorosa que me fez refugiar no interior do “Niassa” donde vivi a separação olhando os meus entes queridos através dos vidros, com o ruído ambiente do salão abafando totalmente o do exterior, vendo as imagens do cais como que fazendo parte de um filme mudo com centenas de figurantes e onde meus pais e namorada entravam como intérpretes, sendo minha MÃE a personagem principal.

A minha emoção, contida, amarfanhava-me. E lembrei-me das palavras de um instrutor para motivar os recrutas a empenharem-se no treino operacional: “quando embarcarem podem ter a certeza de que não regressam todos!” Olhei aquela “massa” de militares que enchiam o navio, já a afastar-se de terra, e fiquei a pensar se não seria um dos que não iriam voltar. Olhei para fora e, pensando naquelas mães que já só adivinhava ao longe, lembrei-me do João Villaret recitando na TV “O menino da sua mãe”, um poema de F. Pessoa que eu, na altura, abominava politicamente. E fiquei a perguntar-me:
- Quantos de nós se tornarão “o menino da sua mãe”?


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Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 8 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10910: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (1): A separação e a partida

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9054: In memoriam (96): Dia 17 de Novembro de 1967, data tão distante, ainda hoje lembrada (Felismina Costa)

Mensagem da nossa tertuliana Felismina Costa*:

Caro Editor e Amigo Carlos Vinhal
Acometida pela nostalgia, escrevi as palavras que lhe envio, que sem pretenderem ser uma homenagem são acima de tudo, a minha saudade dum passado, que pese embora difícil e pobre, foi muito rico de valores e que gostaria de ver perpetuados por todas as gerações vindouras.

Sei, que sai do âmbito do blogue, mas, se aí permaneço e a minha vivência não foi a da guerra, que vivi à distância, apenas posso falar do que vivi, que também já é História, uma história feliz, na pacatez da minha condição, mas rica, muito rica no que confere aos valores que me fizeram crescer agradecida à vida, por tudo o que me deu em criança.

Um abraço fraterno
Felismina Costa


É Outono!

Por que razão me terei lembrado hoje, de um dia tão distante?
Era 17 de Novembro de 1967.

O dia, muito nublado, já bastante frio, pedia a sementeira de favas e ervilhas e o avô Carlos, à rabiça do arado lavrava a terra, onde a mãe ia deixando cair as favas secas e depois as ervilhas.

A mãe, fazia anos nesse dia, dia sem festa, sem bolos, sem convidados. Fazia anos e pronto. Nós dávamos-lhes os parabéns e a vida continuava sem alterações. A mesma roupa para trabalhar a terra, para nesse dia semear as favas e as ervilhas e fazer um sem numero de trabalhos, como todos os dias. A refeição, também não sofria alterações, aliás, a mãe não ligava muito à cozinha, porque lhe roubava muito tempo ao trabalho, que urgia fazer. O pai, muitas vezes, é que nos brindava com os seus acepipes, sempre caprichados, sempre carinhosos. A mãe acarinhava-nos constantemente, mas, não havia tempo para parar junto ao fogão, enquanto lá fora havia tanta coisa à espera dela. As favas e as ervilhas nasciam e tinham de ser cavadas, mondadas, a seguir o trigo, e todo o ano o trabalho na quinta era um sem cessar de urgências; couves, pimentos, tomates, cebolas, feijão verde, milho, feijão e outras leguminosas, exigiam tratamento e rega, para que os seus curtos braços eram pequenos. Nos grandes dias de verão, lavava-se no tanque a roupa, à hora do calor e, era ainda nessas horas que se limpava e arrumava a casa, para depois, pela frescura da tarde, voltar novamente ao labor infindável do trabalho agrícola. A seu lado escutava atenta, as suas conversas intencionalmente formativas, num desejo manifesto de criar em nós uma consciência o mais possível, de acordo com o seu carácter bem formado.

A noite, sem portas, como ela dizia, permitia que se fizesse serão até às duas da manhã, costurando e engomando a roupa, que os filhos levariam para a escola no dia seguinte. Caía, depois, exausta sobre o leito, e durante quatro ou cinco horas descansava, para novamente se erguer e de novo recomeçar a sua rotina, que diga-se, a bem da verdade, a encantava. A terra para ela era uma mãe abençoada. Eu via nos seus olhos a alegria de ver a semente transformar-se em flor e fruto, em pão. A enxada era uma ferramenta que manuseava com destreza. Plantar, arranjar, num brio perfeccionista, era seu apanágio.

Metro e meio de altura de capacidades infindáveis, de sentimentos, de dádiva.
Foi assim até 27 de Julho de 1981, data em que nos deixou sós, tristes e saudosos, recordando para sempre a sua actividade, as suas palavras, os seus sentimentos, o seu carinho, tão grande como o seu coração, que não lhe cabia no peito e por isso a levou para outra dimensão, para outras paragens, desconhecidas para os que por cá continuamos.

Descobri então, porque recordo aquele dia tão distante de 17 de Novembro de 1967!
Eu era jovem e tinha uma mãe jovem, tão jovem e tão madura, tão belamente formada, no trabalho, no conhecimento das gentes, no respeito e na coragem para enfrentar dificuldades, que nos transmitia toda a confiança no mundo, desde que nos dispuséssemos a trabalhar como ela.

A cultura encantava-a, e, muito à frente do seu tempo, ela interessava-se por tudo, em todas as áreas. Desde a literatura à ciência, ela demonstrava o seu interesse profundo, com uma avidez de conhecimento extraordinária, que alimentava mentalmente, ao mesmo tempo que desenvolvia o seu trabalho no sector primário.

E, tenho saudades, muitas saudades, da sua voz, da sua coragem, do seu exemplo, do seu carinho e por conseguinte, da minha infância e Juventude.

Faria agora 87 anos, mas há já 30 anos que a não vejo!


“Saudade”

Há sempre no fundo do meu ser
Uma saudade do passado!
Saudade de uma voz.
De um corpo querido
Que há muito partiu
e nos deixou sós!
Uma voz estridente!
Bem timbrada!
Inteligente!
Forte!
Calma!
Uma voz que me enche a alma
e me acalma…
A voz da minha mãe!..

Felismina Costa
Agualva, 26 de Março de 2006
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 2 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8847: Notas de leitura (280): As Mulheres nas Malhas da Guerra Colonial, de Ana Bela Vinagre (Felismina Costa)

Vd. último poste da série de 12 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9031: In Memoriam (95): Zé Santos, da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, capturado e assassinado pelo PAIGC (Manuel Maia)

Gravura retirada de http://prenoviciadosdb.blogspot.com/, com a devida vénia

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7750: Homenagem à minha mãe na hora da despedida. Mãe, até amanhã! (José da Câmara)


1. Mensagem de José da Câmara* (ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Guiné, 1971/73), com data de 7 de Fevereiro de 2011:

Meus amigos,
No passado dia 25 de Janeiro, na Igreja da Imaculada Conceição em Easton, MA., por imposição da lei da vida, cumpri a missão mais difícil e mais nobre que até hoje me foi imposta. Homenagear a minha mãe na hora da última despedida.




Mãe, até amanhã!

Segundo os Livros Sagrados, aprendemos que há

tempo para nascer e tempo para morrer,
tempo para plantar e tempo para arrancar o que se plantou,
tempo para chorar e tempo para rir,
tempo para calar e tempo para falar.

Foi assim que a minha mãe, a nossa mãe e a vossa amiga, percorreu o seu tempo dividido entre as ilhas das Flores e Faial e os Estados Unidos da América.

Foram muitas as experiências de vida que viveu, umas melhores que outras. Todas elas fizeram parte do seu sonho, dar aos seus e aos outros o melhor que tinha de si mesma: amor e fé!

Durante os seus anos de vivência semeou vidas, cultivou-as e fez todos os possíveis para que a sua hortinha familiar e social produzisse frutos, bons frutos, com a sábia certeza de que nenhum era mais importante ou mais saboroso que outro.

A sua devoção à Sagrada Família, fizeram dela uma esposa cúmplice, uma mãe extremosa, uma avó e bisavó compreensiva, uma amiga de todos aqueles que dela se aproximaram.

Foi uma mulher irrepreensível e inteligente, uma mulher do seu tempo. Com o seu exemplo ajudou a construir um mundo melhor à sua volta.

Em nós, nos seus filhos, incutiu o respeito pelas instituições e pelos outros. Ensinou-nos a lutar pela edificação de um mundo mais tolerante, mais compreensivo, mais igual, mais justo.

Ensinou-nos a ser fortes nos momentos de adversidade, e reconhecidos e modestos na hora do triunfo.

Viveu a sua vida sem se queixar. Derramou as suas lágrimas sozinha, nunca comprometeu os sonhos da sua vida e ajudou a construir os nossos.

Perto do fim, sem um lamento e sem um sinal de revolta, pediu-nos que a deixássemos caminhar em paz.

Neste mundo tinha cumprido a sua missão. Para ela, na Ressurreição, teria o grande Pai à sua espera e o resto da nossa família.

Morreu nas vésperas de completar as suas 84 primaveras.

Mãe, minha querida "melra preta", como muito carinhosamente lhe chamava, Deus bem sabe o quanto gostaríamos de continuar a ver-te esvoaçar entre nós. Preferistes, pela lei da vida, te libertares desta tua passagem pelo mundo, para ires ao encontro de um outro de Paz Eterna.

Que o teu último voo seja suave, firme e gracioso. Nunca olhes para trás.

Para nós, que continuaremos o teu sonho, fica a certeza de que hoje, mais do que nunca, compreendemos o significado da roda do tempo: nascer, viver, morrer!

Um amigo meu, que também foi militar na Guiné, ao perder alguém muito querido, escreveu:

O vazio que ficou,
A dor que nos atingiu,
Vão transformar-se em ausência
E mais tarde saudade.


É verdade! Já a sentimos.

Hoje, agora e aqui, vamos ser fortes na hora da despedida e humildes no reconhecimento à boa mãe que fostes e à amiga que nunca deixastes de ser de todos nós.

Mãe, descansa em Paz!