segunda-feira, 20 de novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1297: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (3): Do navio Timor ao Quartel de Santa Luzia



Lisboa > Navio da Marinha Mercante Portuguesa Timor > Navio misto (carga e passageiros), de duas hélices; construído em Inglaterra em 1950 e abatido em 1974, tinha mais de 130 metros de comprimento de fora a fora; arqueação bruta: cerca de 7,6 mil toneladas; velocidade máxima: 15 nós; 120 tripulantes; alojamentos para 4 em classe de luxo, 60 em primeira classe, 25 em terceira e 298 em terceira suplementar, no total de 387 passageiros. Armador: Companhia Nacional de Navegação - Lisboa.
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (1996) (com a devida vénia...)


O Palmeirim de Catió é o Joaquim Luís Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Os Palmeirins (Catió, 1964/66). Publicamos hoje a terceira parte das suas crónica (1). Já tive oportunidade de lhe dizer o seguinte:

"Caro Mendes Gomes: Como já tive ocasião de te dizer, hoje, no blogue e ontem ao telefone, tu és dos nossos e a gente já te arrumou um cantinho (confortável) na nossa caserna virtual. Se a antiguidade na tropa é um posto, então tu já és, com o Mário Dias e poucos mais, general… De facto, não é todos os dias que nos chega um… Canário de caqui amarelo, um homem que andou pelo Colmo, pelo Cachil, por Catió, no início da guerra… e conheceu o João Bacar Jaló, o Nuno Rubim, o Saraiva, etc."...

Ao que o Mendes Gomes respondeu, logo a seguir, nestes termos:

"Caro Luís: Fiquei muito feliz quando vi o meu texto publicado. Dedico-os sobretudo e em primeiro lugar, com muito carinho, aos meus camaradas Palmeirins que jamais esquecerei. Pesam-me na consciência a minha repetida ausência nos seus encontros anuais. O primeiro em que participei, no quartel de Évora, desencadeou-me uma sensação desagradável, muito estranha, que não quis repetir. Pode ser que passe...

"Estou em Aveiro, onde não tenho o meu espólio de guerra. Quando voltar a Lisboa, far-te-ei chegar algumas fotos e, claro, a do estandarte dos Palmeirins.
Foram muito pertinentes as tuas imediatas achegas literárias, sobre a questão das crónicas dos Palmeirins. Aliás, de Mestre"...

Obrigado e um abraço

Mendes Gomes


2.3. Despedida do Rio Tejo

De Évora, pela madrugada calada de uma noite tórrida de Agosto, saíu o comboio especial, com todo o cortejo militar que perfazia o numeroso batalhão, dado pronto para a luta.

Duas das companhias, a 726 e 728, iriam para a Guiné, outra para Angola e , creio, uma CCS, para Moçambique. O sorteio.

Uma noite de viagem ronceira, desde Évora a Lisboa, cais de Alcântara. Só 130 Km, de linha secundária e sem qualquer prioridade. A longa paragem de Casa Branca ficou na memória: esgotaram as bifanas de porco no pequeno bar da estação, mas não a cerveja… O resto da viagem, até de manhã, correu às mil maravilhas.

O imponente paquete Timor, amarelado, mais alto e corpulento do que a enorme estação fluvial, ali estava, calmo, à nossa espera, poisado nas águas paradas do Tejo. Várias escadas, longas, ligavam o cais ao bojo barrigudo mas elegante, do paquiderme, de proa arrebitada e pendão festivo, à solta.

Não demorou muito e toda a gente estava a bordo, distribuida pelos muitos pisos, docilmente transformados em quartel.

Um tremendo urro disparou nos ares e as máquinas medonhas aceleraram, lá no fundo.
A água do Tejo começou a ferver em ondas de espuma, em turbilhão, à popa, empurrando o gigante para mais uma oferenda, em sacrifício, no altar da ditosa pátria…

As varandas viradas ao cais abarrotavam de tropa. Mantos de lenços esvoçantes e lágrimas a escorrer refrescavam a dor dos que ficavam e dos que partiam…

Na sua lentidão insensível, o barco foi-se afastando, mais e mais até que o punhado de multidão do cais se tornou, apenas, numa seara escura, salpicada de folhas brancas ondulantes.

Do meio do Tejo, era a vez de Lisboa, sempre afável e carinhosa, se despedir de nós, reconhecida, com votos sentidos de feliz e rápido regresso…

A ponte audaz que iria ligar as duas margens, em cabos de aço suspensa, apenas tinha construidas as duas largas sapatas a emergir da tona das águas esverdeadas. Quando regressássemos, se regressássemos…, haveria de estar pronta…para nos receber. Era o que constava.

Mais um pouco e o enigmático oceano recebia, sereno, a quilha altiva da nau castrense, pronta para a peleja.

A vida de quartel iniciou o seu ritual. A comida abundante ressomava festiva nos pratos mais fidalgos, no meio da vozearia frenética dos combatentes.

Cada companhia no seu lugar e cada pelotão bem entregue ao seu alferes e aos 3 sargentos, todos de galões, vaidosos, a estrear…nos ombros.

O programa de bordo já estava montado. Havia que manter a tropa, ocupada quanto possível. Era preciso que não houvesse tempo para pensar, para ninguém. O caminho era, sempre, para a frente.

Campeonatos de pingue-pongue atingiram o rubro entre oficiais, sargentos e praças; remedos de teatro ad hoc surgiram, espantosos de frescura e elevação; concursos de canto e outras habilidades se montaram sobre a parte mais larga do navio, à vista dos altos comandos, nsatisfeitos.

A travessia do equador fez-se sentir, quente, e foi festejada como convinha, a bordo, com alvoroço, muita cerveja e champanhe...

Os dias foram passando e uma sensação estranha começou a perpassar traduzida em nervosismo, disfarçado, muito a custo.

O céu tornou-se diferente e estranho para todos. As águas começaram a tornar-se cinzentas e espessas e o horizonte pardacento e negro. Já eram as águas do vasto estuário do Geba que nos iria levar a Bissau, dentro de algumas horas, à medida que as margens longínquas se iam aproximando.

Agora era um frondoso arvoredo, baixo e densamente entrelaçado que orlava uma e outra das margens do Geba caudaloso. Uma manta de floresta, salpicada de leques de palmeiras bamboleantes, seguia-se para o fundo, infinito e plano. Tinha-se a sensação de estarmos a devassar terras proibidas.

A cada momento, podíamos ser atingidos de qualquer das margens. O alcance de uma simples metralhadora abrangia-nos à vontade, desarmados. Depressa, se soube que uma ou várias curvetas de aço cinzento da marinha já nos vinha a escoltar, desde há muitas milhas, sobre o Atlântico. Ficámos mais serenos.
Além disso, aquela zona felizmente, era-nos fiel, supostamente. Era terra dos bijagós. Uma vez mais, os longínquos conhecimentos de geografia da 4ª classe, indelevelmente registados, entravam a funcionar.

As muitas raças que havia na nossa Guiné, os balantas, mandingas, fulas, papéis e os seus costumes despertavam enorme curiosidade a todos.
Um tiro soou. Um calafrio nos correu toda a espinha. Foi um crocodilo que apareceu ao longe, atrevido, possivelmente, atraído pelos restos que saíam da cozinha do vapor. Mergulhou e nunca mais se viu. A forte carapaça era o suficiente para nada lhe acontecer, se a bala o atingisse em oblíquo.

A temperatura é sufocante e húmida. A camisa de caqui amarelo cola-se à pele, apesar de ter tomado um duche há momentos. Uma ponta de terra, destacada da outra mais distante, na margem esquerda do Geba, começa a destacar-se e a alargar, elevando-se um pouco sobre as águas. De vez em quando, há clareiras, por entre a imensa manta de arvoredo verde acinzentado. Umas casotas de palha, espalhadas debaixo de uma família de embondeiros abrigam corpos nús de homens, mulheres e crianças irrequietas que andam e correm até à borda do rio.

Muitas canoas compridas, feitas num pedaço de tronco grosso, deslizam ao lado da margem, tangidas por um vulto negro à sua popa, pelas mãos, agarradas à ponta de uma vara que ele faz girar em arcos de oitava, mil vezes repetida e se traduzem na força propulsora da embarcação.

É uma ilhota em frente à cidade de Bissau que não tarda a aparecer, do lado direito.


2.4. Bissau à Vista

Agora, é uma mancha de casaredo entremeado de árvores, terra avermelhada, muitas palhotas espalhadas à sombra de embondeiros gigantes, aos montes, um movimentado porto de pesca e descarga, com muitas barcaças enegrecidas, cheias de gente e carregadores, a crista de uma igreja mais elevada, alguns carros militares, girando rente às águas.

Grandes armazéns toscos, quanto baste, para arrecadar as mercadorias que chegam e partem;
um sinaleiro, de porte senhoril, preto, em cima de um tamborete improvisado, colorido, esforça-se por impor um pouco de ordem no trânsito variado de carros, bicicletas, que escorre, a esmo, pela artéria que vem de cima para o rio.

O Timor avança lento, ao meio do rio largo pelo caminho mais fundo e seguro. Não vai atracar à margem. Não há lugar para o seu tamanho.

Não chove mas o céu está pardacento, embora se adivinhe o sol a tentar rompê-lo. É mesmo assim. As chuvas vêm rigorosamente na sua época. Diziam que, no dia 15 de Maio começava a época das chuvas e foi verdade, rigorosamente comprovada, nos dois anos lá passados.

A tropa destinada à Guiné deixou o barco rapidamente. Os Unimogues militares transportaram toda a bagagem para o quartel de destino. Um desfile de todas as companhias desembarcadas foi imediatamente organizado, pela Avenida Central que cortava Bissau em duas partes, desde o palácio do Governador até ao pé do cais.

Era a habitual apresentação às gentes da Guiné de mais um reforço, chegado em sua defesa. Com júbilo multicolor, multidões de homens, mulheres e crianças, em trajes garridos de festa, preenchiam as alas da avenida, batendo palmas e acenando, agradecidos, à passagem, em marcha de desfile.

Éramos um rio de caqui amarelo e boinas castanhas com duas fitinhas, atrás, a escorrer, trepidantes e de olhares desatinados, perante aquele mundo desconhecido que se abria.

Os cheiros fortes das árvores e das flores, pujantes e exóticas, eram diferentes e novos.Eram quase enjoativos, sem deixarem de ser perfumados. Mais tarde, em cavaqueira à mesa de oficiais, o último comandante de batalhão, de Catió, famoso e chanfrado da cabeça, dizia deles, com gozo nosso, que as árvores da Guiné lhe cheiravam a espermatozóides…

Os gestos, as feições da população negra e todas as expressões obedeciam a um código que nos era inacessível. Só com o correr dos meses, nos fomos inserindo nele, lentamente e sem dar conta.


2.5. Quartel de Santa Luzia

Santa Luzia foi o nosso primeiro quartel. Afastado uma meia dúzia de km do centro de Bissau, em lugar cimeiro, bem encostado às bolanhas( extensos campos de arroz ), por precaução e defesa, ali estava o complexo Quartel – General.

O gorducho e pequeno brigadeiro Schultz e o seu estado maior, à frente das tropas.

Com todo o vasto sistema de apoio logístico-administrativo, distribuido por vários pavilhões de construção tão recente quanto a idade da guerra, era o coração de toda a complexa máquina bélica na Guiné.

Apenas convivíamos com eles, às refeições, no grande refeitório de oficiais. Vestiam como nós, mas nos ombros refulgiam as estrelas douradas do generalato, sobre fundo vermelho.

Eram os velhos senhores e donos da guerra que ali estavam, numa grande mesa, voltados para a frente, dominando toda as mesas da sala ampla. De lá, seguiam para os seus gabinetes por caminhos próprios, fechados ao comum das gentes, no edifício central mais engalanado.

Dentro do espaçoso recinto cercado de uma forte amurada, protegida por fortins de sentinelas, colocados em sítios estratégicos, ocupando muitos hectares, distribuia-se todo o sistema de aquartelamento, das tropas residentes e em trânsito, como nós, mais todos os serviços e espaços lúdicos. Piscina e campos de jogos.

Não fosse o permanente ribombar sinistro de morteiros ou de artilharia, do inimigo e dos nossos, nos longes do outro lado do Geba tortuoso, dia e noite, e sentir-nos-íamos em casa, como em qualquer quartel da metrópole ( assim se dizia do nosso pedaço de terra luso-ibérico, além-mar).

Durante dois meses e meio, a minha companhia ali ficou aquartelada. Servia de segurança ao quartel-general e dali partia, em acções nocturnas, montando emboscadas, para as imediações alagadas ou de densa vegetação, nos arredores de Bissau.

Era fundamental tomar-se contacto com os barulhos da mata africana. Das enormes e variadas aves noctívagas e dos permanentes batuques, soturnos, das tabancas, em toques de festa, de luto ou de simples intercomunicação de mensagens, entre aldeias.

Noites longas e escuras de cacimbo húmido ou luminosas de luar fulgente, quase da cor do dia, deram para sonhar, para temer e rezar.

Com o pelotão disposto em linha, as 3 secções de doze homens, espaçadas, sob o comando do respectivo sargento, ao longo de um caminho, ali se permanecia, deitado, reprimindo a tosse e, quase, o respirar, em constante guerra aos ruídos que poderiam ser fatais.

Se um falso alarme provocava o disparo de um soldado mais timorato, logo outro local teria de ser procurado, uns quilómetros mais adiante, para cumprir a emboscada gorada.

Ao fim de umas semanas, já toda a gente sabia distinguir o piar provocador do passaredo medonho, tropical ou os ruídos normais das aldeias mais próximas.O medo, a pouco e pouco, foi-se ocultando e a tensão, de todos nós, abrandando, até porque não havia notícia de ter ocorrido qualquer contacto com o inimigo naquelas zonas, consideradas fiéis.

Lembro aquela noite luarenta, muito perto de Mansoa, em que momentos após toda a gente ter sido instalada, um sururú crescente, percorreu o pelotão agitado e acabou às gargalhadas e gritos incontroláveis.

O pelotão tinha sido posto em cima de um carreiro de formigas pretas. Aquelas que constroem altas torres de barro, duras que nem cimento, óptimos abrigos para a metralha, mas que tiram pedaços de carne, em cada mordedura das suas poderosas tenazes…

Não demorou muito e todos estávamos despidos a sacudir, como se podia, as vorazes infiltrações mais atrevidas e dolorosas... O espírito de corpo, que deveria ligar todo o pelotão, já estava consolidado ao fim de umas semanas de intenso treino nas matas, aparentemente, bonançosas dos arredores de Bissau.

Só aparentemente, porque era sabido que os turras (assim se chamava ao inimigo) tinham ali os seus familiares e éra-lhes fácil a clandestina infiltração, para colherem as informações fundamentais e preciosas à guerra que suportavam e alimentavam por toda a Guiné.

Por isso, não era muito recomendável vaguear-se pelas muitas e populosas tabancas (as aldeias dos negros) que rodeavam a cidade, de vez em quando lá desaparecia um dos nossos, e, nos cafés ou lojas comerciais de Bissau, toda a probidade era pouca. Um turra poderia estar ao lado, de orelhas afiladas…pronto a seguir, à velocidade da luz, para o mato com a preciosa notícia de uma operação, em tal zona…Era certo que uma terrível emboscada abortaria, com sangue, a operação programada…

A cidade de Bissau visitava-se em pouco tempo. Várias ruas transversais à já referida Avenida Central, a que corta Bissau ao meio, continham as lojas, os cafés e as moradias dos residentes, a maioria, feita de cabo-verdianos, mais desenvolvidos que os nativos da Guiné.

Um banco, um liceu, uma catedral, um hotel, um grande centro comercial da CUF e muitas esplanadas de cafés eram tudo o que conseguia proporcionar aos militares uma óptima estadia, quer em suculentas férias do mato, quer em sortuda comissão militar para aqueles que ali permaneciam durante os dois anos e meio de serviço.

O resto era dado pela pujante vida das tabancas negras, onde havia sempre bom churrasco, muito marisco, baratíssimo, e muita cerveja.

A expectativa constante em saber para onde iríamos ser destacados não era propícia à exploração daquele mundo de diversão, diferente e enigmático.

O tempo era pouco para ouvir os mais velhos que vinham do mato, em descanso ou férias forçadas, com passagem pelo moderno hospital militar, a uns 8 km de Bissau.

Não era difícil reconhecê-los. Os ares quentes daquelas paragens equatoriais já lhes tinham tisnado os rostos, de ar cansado e sofredor. Nem eles próprios já o reconheciam.

O triângulo de Bafatá, Mansabá e Bissorã, ao norte; Catió, Bedanda e Bissalanca Ur, ao sul; Guilege e Madina do Boé, a Leste, eram, sem dúvida, os pontos mais escaldantes no teatro de guerra.[Vd. carta da província, 1961].

Para oeste, ficava o mar da nossa liberdade, se a sorte o permitisse...passados dois anos e tal.

Mansoa, a 30 km de Bissau, o arquipélago dos Bijagós pela sua localização natural ou pela predominância da raça, leal, ali residente eram os poucos sítios apetecidos. Para além de Bissau, claro.

Se bem que era corrente e aceite que, na Guiné, não havia espaços calmos e seguros. A tropa só dominava nos espaços reduzidos dos centros administrativos restantes da secular colonização. 4 ou 5 km fora da cerca e tudo poderia acontecer. Minas, emboscadas ou raptos.

No geral, a ideia corrente era que se estava num impasse teimoso, com tendência para o agravamento de ambas as partes.

Constava que a nossa vantagem aérea estava a ser ameaçada. Os turras já estavam a ser abastecidos por helicópteros, em pleno campo de luta…e os apoios vindos da Rússia, em material e dos homens, ali preparados, eram crescentes, de dia para dia.

Estávamos na época seca e, por isso, a mais turbulenta. Os helicópteros poisavam, constantemente, no redondel do hospital. Não era aconselhável ir para aqueles lados…Muito menos, entrar nas enfermarias.

Era impossível disfarçar-se a preocupação, por mais forte que fosse o espírito. Nas noites, não havia lugar para sonhos, só pesadelos.

Já que tinha de ser que fosse o mais depressa possível. A imaginação e as cores cinzentas das matas distantes esmagavam-nos nas horas longas de cada dia que passava.

Nos primeiros dias de Outubro, veio, por fim, a notícia. Fatal. A companhia 728 ia para Ilha do Como, zona de Catió, render a Companhia 556, que ficara a defender, ali, a soberania, depois da mais brava refrega que o Chefe-Mor, o brigadeiro Schulz, resolveu desencadear durante 3 meses. Com todos os meios militares disponíveis, desde a marinha à força aérea e à artilharia. No fim, a montanha parira um rato… Para não vir para Bissau, de mãos a abanar, decidiu deixar, melhor, imolar uma das últimas companhias a chegar à refrega (2).

Foi deixada entregue a si própria, instalada na bordinha sudoeste da ilha do Como, rica em produtos hortícolas e arrozais. Nela fora proclamada a Républica Independente pelo PAIGC.

Corremos para o mapa a espiolhar o enredo daquelas terras, bem ao sul, às portas da vizinha Guiné-Conacri e da Serra Leoa.

A cota máxima do relevo não passava dos 6 a 7 metros. Um terço das terras ficava debaixo de água em cada maré cheia. Os rios Corubal e Cacine eram uma verdadeira teia de braços tortuosos, com zonas que mais pareciam mar alto, a perder de vista. As matas frondosas e entrelaçadas cobriam o resto que ficava dos arrozais. O seu seio escondia as numerosas tabancas e aquartelamentos, umas e outras, muito primários, quase ambulantes.

O horizonte não podia ser mais pardacento. Só a esperança nos valia e deixava espaço para respirar.

- Seja o que Deus quiser…voltou a ser a expressão mais corrente em todas as bocas. Agora, já um pouco mais conscientes do seu significado.

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Notas de L.G.:

(1) Vd. posts de:



5 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1249: As primeiras fotos do Palmeirim de Catió (Manuel Gomes, CCAÇ 728)

2 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1236: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (2): Do Alentejo à África: do meu tenente ao nosso cabo

20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1194: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (1): Os canários, de caqui amarelo


(2) Sobre a batalha da Ilha do Como (1964), vd. posts de:

17 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXCV: A verdade sobre a Op Tridente (Ilha do Como, 1964) (Carlos Fortunato / Mário Dias)

15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXX: Histórias do Como (Mário Dias)

15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXII: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): Parte I (Mário Dias)

16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXV: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): II Parte (Mário Dias)

17 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXX: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): III Parte (Mário Dias)

15 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLI: Falsificação da história: a batalha da Ilha do Como (Mário Dias)

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