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terça-feira, 20 de setembro de 2022

Guné 61/74 - P23631: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte V: Bissá: há festa na aldeia

Foto nº 1A > Tocador


Foto nº 1 > Tocador (o instrumento musical parece ser feito de chifre de vaca)


Fotoo nº 2 > Jovem caçador (de arco e flecha)


Foto nº 3 > Festa é partilha


Foto nº 4A > Festa, "manga de ronco" para as bajudas


Foto nº 4 > Festa, "manga de ronco" para as idades


Foto nº 5A> Festa (com participação de militares do destacamento, todos em tronco nu)... E claro, em aldeia balanta, não falta o vinho de palma e a aguardente de cana...


Foto nº 5 > Festa (com participação de militares do destacamento)


Foto nº 6A > E a festa continua...


Foto nº 6 > Festa (com participação de militares do destacamento)


Foto nº 7 > Festa (com participação de militares do destacamento)


Foto nº 8 > Construção de casa ("morança"), possivelmente integrada num reordenamento  

Guiné > Região do Oio > Sector 4 (Mansoa > BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) > s/ d > c. 1970 > Tabanca e destacamento de Bissá em dia de festa.

Os militares que se vêem nas fotos possivelmente pertenciam à CCAÇ 2587 / BCAÇ 2885, que em 5mar70, rendendo a CArt 2411, assumiu a responsabilidade do subsector de Porto Gole, com um destacamento em Bissá.

Fotos (e legendas): © José Torres Neves (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71).

Organização e seleção feitas pelo seu amigo e nosso camarada Ernestino Caniço, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2208 (Mansabá e Mansoa) e Rep ACAP - Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológica, (Bissau) (Fev 1970/Dez 1971) (médico, foi diretor do Hospital de Tomar, 6 anos, de 1990 a 1996, e diretor clínico cumulativamente 3 anos, de 1994 a 1996, vivendo então em Abrantes; hoje vive em Tomar).

O José Torres Neves é missionário da Consolata, ainda no ativo. Vai fazer 86 anos. Vive num PALOP. Esteve no CTIG, como capelão de 7/5/1969 a 3/3/1971.

As fotos (de um álbum com cerca de 200 imagens) estão a ser enviadas, não por ordem cronológica, mas por localidade, aquartelamentos ou destacamentos do sector de Mansoa. Sobre Bissá, temos já mais de 3 dezenas de referências no nosso blogue. A tabanca (e o destacamento) de Bissá  ficava a oste de Porto Gole.
___________

Nota do editor:

Último poste da série > 3 de agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P23488: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte IV: mais gentes de Bissá, c. 1970

sábado, 11 de junho de 2022

Guiné 61/74 - P23342: Estórias do Zé Teixeira (51): Há festa na Tabanca (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381)

Xitole, 2013 > Festa de casamento para a qual o José Teixeira fora convidado
Foto: © José Teixeira

1. Mensagem do nosso camarada José Teixeira (ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, QueboMampatá e Empada, 1968/70) com data de 10 de Junho de 2022, trazendo-nos mais uma das suas belíssimas estórias:


Há festa na Tabanca

Naquele princípio de noite de quinta-feira, o alferes notou que algo de anormal estava a ocorrer na tabanca. Do Iero, apenas recebera um alegre sorriso, quando o interpelou sobre o que estava acontecendo com a população. As mulheres andavam num algaraviado rodopio, as bajudas passaram a tarde no “cabeleireiro” apresentando-se com belos e inabituais penteados, os homens, como de costume, tagarelavam animadamente debaixo ao majestático poilão, que o alferes já fora tentado a abater, pois considerava que era um excelente ponto de mira para o inimigo e se ainda não o destruíra foi pelo respeito que lhe merecia aquela simpática gente. A sua frondosa sombra era a sala de honra onde os homens grandes se reuniam e tomavam as decisões importantes para a vida comunitária local, o salão de festas comunitário, a escolinha onde as crianças, sentadas no chão, ouviam o mestre, na sua aprendizagem corânica.

Ao apreciar esta azáfama deixou-se invadir por um sentimento de felicidade. A sua tabanca estava viva e ativa. Adorava aquela gente, o seu calor humano, os sorrisos que recebia e lhe preenchiam a alma. Havia um inimigo por perto que a todo o momento podia surgir e quebrar aquela harmonia, pelo que se decidiu a visitar, ao cair do sol, todos os abrigos e postos de sentinela e recomendar aos seus homens uma especial atenção para a noite que se aproximava. Como era seu hábito, ficava uns minutos largos numa silenciosa cavaqueira com cada militar em serviço de vigia e proteção, pelo que recolheu ao seu leito, um pouca tardiamente, depois de se refrescar à moda fula, com umas latadas de água colhida no bidon que tinha à porta da casa.

Sexta-feira, manhã cedo, foi acordado por uma voz feminina que o chamava docemente. Aferes! Alferes, vem, quero falar contigo!
Não reconheceu a voz de quem o estava a chamar. Olhou para o relógio, eram sete horas. Voltou-se para o outro lado e deixou-se ficar decumbente a saborear a manhã que se avizinhava bem cálida. Mas a voz insistiu; alferes! alferes, vem falar comigo! Sou a Djubae, a mãe do Adulai, o teu menino.

Levantou-se célere, enfaixou-se na toalha de banho e abriu a porta. Habitava uma casa típica local que lhe fora cedida pelo Iero. As paredes em cana entrançada recobertas de barro vermelho, encaixavam-se num chão térreo cobertas de palha de capim, que ladeava a casa até a um metro do chão providenciando ao espaço interior uma agradável frescura. Inclinou-se para passar a umbreira da porta e deparou com a Djubae toda aperaltada, com bonito vestido que lhe realçava a juventude e a beleza, com um lenço de seda pura na cabeça. Impulsivamente deixou-se espreguiçar enquanto o pensamento lhe devolvia o que tinha apreciado na tarde anterior e pensou: a festa vai continuar… que se passará com esta gente, meu Deus!?

- Alferes, o Adulai vem convidar-te para a sua festa!
- Que festa? Questionou, esfregando os olhos ensonados a precisar de uma chapada de água fresca para acordar.
- Hoje, a tabanca tem festa grande. Allah, louvada seja Ele, deu o dom da vida ao meu menino. Vem visitar-nos o grande Cherno Rachid para fazer oração a Allah o misericordioso, louvado seja Ele. Queremos que venhas à festa do Adulai, disse, num ato repentino como que a despejar um recado que lhe avassalava o coração e se atrofiava na garganta.
- Hum! Mas… O Cherno Rachid vem cá e vocês não me informaram para eu criar condições de segurança. Vou ter uma conversinha com o Iero!
- Tem calma alferes, o Aldje Cherno Rachid pode viajar por toda a Guiné sem risco de vida. É muito respeitado, até pelos bandidos que estão no mato. É um escolhido de Allah e só Allah é Deus protetor e misericordioso, disse calmamente, enquanto pegava na mão do alferes e a encostava ao seu coração.
- Djubae! Djubae! Faltavas tu para prenderes ainda mais o meu coração a esta terra maravilhosa, a esta gente de coração puro, que não merece a pouca sorte a que está votada. Maldita seja a puta da guerra! Vociferou aturdido pelo mavioso convite que acabara de receber. Uma lágrima libertou-se do seu coração e escorregou-lhe pela face duramente queimada pelo agreste sol africano. Lágrima que a Djubae recolheu religiosamente na manga do seu vestido domingueiro.
- Vai, disse meigamente o alferes, beijando ternamente a mão da Djubae. Eu não demoro. Quero alimentar-me do vosso júbilo, da vossa enorme vontade de viver. Vai, minha querida!

…E chegou a hora da festa, chamemos-lhe de batizado, para melhor compreendermos o grande significado que tem para este povo, a entrada na comunidade de uma nova vida.
Xitole, 2013 > Festa de casamento
Foto © José Teixeira

Em tempo de guerra não é aconselhável usar o “bombolom” ou os “tam tam” para fazer o aviso e lançar o convite para a festa. Todavia, a tabanca enchera-se de caras que o alferes Barbosa não se lembrava de ter visto por ali. Os homens da terra e das tabancas vizinhas, vestidos de longa batina branca, com a cabeça coberta, solenemente sentados à sombra do poilão aguardavam a chegada do idolatrado Cherno Rachid, emblemático líder religioso a quem toda a Guiné muçulmana independentemente da opção político-militar, se curvava em respeito pelos seus profundos conhecimentos corânicos e pela sua forma de ser e estar no quotidiano da vida. Esta forma de viver tornara-o no homem de Deus mais respeitado em toda a Guiné e até países limítrofes, a quem o governador da província se inclinava com respeito e ousava consultar sobre os grandes problemas. Pelas mesmas razões era respeitado pelo bureau político da PAIGC e considerado intocável, pelo que se movia em paz pelas meandrosas picadas da Guiné, sem correr riscos de vida.

As mulheres grandes, aformoseadas nos seus trajes típicos, linguarejavam ruidosamente, sempre com o olho fixo na picada de onde surgiria o homem de Deus, enquanto a juventude se divertia a seu modo aguardando o momento mais solene.

O alferes José Barbosa sentado em lugar de honra no meio dos homens, ao lado do felizardo pai do Adulai, ouvia as conversas em linguagem crioula sobre o passado, o presente e o futuro da Guiné, tentando, nos seus parcos conhecimentos linguísticos locais, compreender de que falavam. O sentimento que tivera de se sentir a mais naquele meio desvanecera-se rapidamente. Sentia-se envolvido por um ambiente de bem-estar. Era como se fosse um filho da terra. Um estranho filho da terra.

Ao verem ao longe, no carreiro, a onda branca com o séquito do clérigo, gerou-se um alvoroço espontâneo:
- Dois jovens, engalanados com os mais belos trajes e pinturas guerreiras pelo corpo, munidos de estridentes assobios e braceletes musicais, agarraram os seus tambores, o djembé e o bougarabou, e prepararam-se para iniciar a festa.
- Quatro bajudas entre elas a Binta, aproximaram-se dos pilões e tomaram nos macetes, colocando-se em posição de começar a ação de pilar do arroz.
- O artista convidado afinava o Kora, um instrumento musical feito de madeira ou bambu com ranhuras transversais e uma caixa de ressonância obtida de uma cabaça partida ao meio. Instrumento de origem mandinga que gera uma musicalidade divinal, o que vai dar mais vida à festa do Adulai.
- O recém-nascido vestido apenas com o fato que a natureza divina lhe dera, é colocado no colo do avô, que tira do bolso uma farpa acastanhada de vidro, arrancada, talvez, de uma inútil garrafa de cerveja.
- O açougueiro segura, pelo pescoço, o carneiro que vai ser sacrificado em honra do glorioso, o senhor supremo do Universo, louvado seja Ele. Uma naifa afiada na mão espera pacientemente.
- A mulherada faz então uma longa roda que envolve todo este ambiente, fechado num silêncio espontâneo e expectante. Convidativo à meditação sobre o valor de uma vida. Uma vida humana que nasceu para ser feliz. Merece ser feliz.

O Califa, depois de ser cumprimentado religiosamente pelos presentes, entra no recinto, abre os braços aos céus e começa a orar.
Momento mágico para os olhos e coração do alferes que vê soltarem-se as mãos das bajudas, dos tocadores de batuque, das mulheres, de toda a gente, até do velho avô que começa a rapar com o vidro da gasta garrafa de cerveja, o cabelo negro do bebé Adulai, enquanto o carneiro dá o seu último mééé!

O início da festa que irrompe ritmadamente ao som do bater do pilão, dos toques e assobios dos tamborileiros, acompanhados por dezenas de mãos a baterem palmas, com os corpos a gingarem num frenesim e as vozes num harmonioso coro de louvor a Allah, o Criador. Não faltou o acender da fogueira com a panela devidamente colocada pelas ágeis mãos das cozinheiras de serviço. Tudo num simultâneo festejar da vida do Adulai.

A sonoridade do macete a bater no pilão, alimentado pela cantilena mais linda, que o alferes jamais ouvira, ritmada pelo bater de palmas das suas jovens manobradoras numa cadência alucinante, com os seios, o mais belo símbolo da sua feminilidade, a acompanharem o bailado, revolvendo-se majestaticamente nos seus bronzeados corpos a pingar longas gotas de suor. Um espetáculo divinal, a que aqueles sons arrancados vigorosamente do fundo dos tambores, alimentados pela musicalidade do kora, com o seu toque especial, davam vida e cuja mensagem não conseguia interpretar. Tudo isto transporta o alferes Barbosa ao seu Portugal, à sua terra, entre o Douro e o Minho das desfolhadas, dos bailaricos animados pela viola e pela concertina, das cantigas ao desafio, deixando-o por momentos perdido na saudade que o devorava.

Procurou o olhar da Binta, mas não o encontrou. Queria suavizar a dor que lhe ia na alma, lado a lado com a alegria de estar ali, a viver com o seu povo (assim o considerava) uma festa tão linda. Precisava de esquecer, nem que fosse por momentos, a sua aldeia natal, nos braços da mulher africana que lhe prendera o coração.
A Binta, sentia-se aturdida. Faltava-lhe o seu Braima, que tantas vezes animara festas como esta. “Agredia” o pilão com a raiva desmedida, enfiada dentro dela, cantando sem nexo. O seu coração bailava longe dali. Como ela adorava tê-lo por perto, para lhe transmitir num olhar sereno todo o afeto que lhe enchia a alma. Talvez não estivesse distante assim, pensou, tentando consolar-se. As boas notícias voam rapidamente… perdeu-se no ritmo da festa e continuou a cantarolar, olhando de través para o alferes de quem gostava, mas não se prendia de amores. A vida continuava, mesmo com seu o Braima escondido na mata, não a podia perder.

E assim se passou a manhã, enquanto as mulheres e bajudas davam o seu passo de dança típica e se libertavam dos maus irãs, os homens alinhavam em conversas soltas, até que chegou a hora do almoço. Homens a um lado, mulheres a outro, algumas com as suas crianças. Grandes bacias cheias de arroz e pedaços de cabrito envolvidos em saboroso molho de chabéu, são espalhadas no recinto. Aninhados no chão, depois de lavarem as mãos, os convidados banqueteiam-se calmamente conversando de tudo e nada, porque o importante é viver o momento.

Para o alferes reservaram uma pequena bacia de arroz, com a melhor tranche de cabrito e uma colher, que o Barbosa recusou preferindo aninhar-se junto do Iero e partilhar do almoço comum, para alegria dos presentes que o acolheram com um rasgado sorriso de contentamento.

A tarde foi serena. Alguma música e muita conversa. Os visitantes aproveitaram para, em convívio, trocarem ideias, recordarem velhos tempos, projetarem o futuro.
E foram partindo discretamente ante que o sol se escondesse para além da mata.
E chegou a noite. Voltou o silêncio. Voltaram os medos.

O Alferes foi ter com os seus homens. Em cada posto de sentinela uns olhos vigilantes espreitavam o futuro.
Sábado seria um novo dia.

José Teixeira

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Nota do editor

Último poste da série de 7 DE AGOSTO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22441: Estórias do Zé Teixeira (50): Amores em tempo de guerra - O sonho da Luisinha (José Teixeira, ex-1.º Cabo Auxiliar Enfermeiro da CCAÇ 2381)

domingo, 23 de dezembro de 2018

Guiné 61/74 - P19322: Manuscrito(s) (Luís Graça) (148): Revisitando o Portugal profundo de 1960...Festa de Nª Sra. do Socorro, Paredes de Viadores, Marco de Canaveses: 7 contos e 600 de foguetório, 2 bandas filarmónicas, 4 quilos de cavacas... para os anjinhos; 450 escudos para os padres; e mil escudos de vinho para os músicos...Quando as festas populares davam prejuízo e os mordomos tinham de abrir os cordões à bolsa, honrando a palavra dada...





Marco de Canaveses > Antiga freguesia de Paredes de Viadores  > Festa de Nossa Senhora do Socorro > Estrutura da despesa e receita > Documento s/d c. 1950/60]. Fonte: Arquivo da Quinta de Candoz

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)



1. Gosto de mexer nos papéis antigos: cartas, fotografias, faturas, diários, jornais... Estão lá pedaços dos nosso passado, das nossas vidas, individuais e coletivas 

Ontem, remexendo nos papéis do meu falecido sogro, José Carneiro (1911-1996), voltei a examinar, com mais atenção,  um documento manuscrito, sem data, com a discriminação das despesas e receitas da comissão das festas de Nossa Senhora do Socorro, que se realiza todos os anos, no último fim de semana do mês de julho. É uma romaria antiga, se bem que a capela tenha sido edificada nas últimas décadas do séc. XIX (c. 1875).

Estas terras são antiquíssimas. Já o concelho de Marco de Canaveses é uma criação do liberalismo, remonta a 1852, tendo resultado da anexação dos concelhos de Benviver, Canaveses, Soalhães, Portocarreiro e parte dos de Gouveia e Santa Cruz de Riba Tâmega.

O meu sogro, José Carneiro,  foi várias vezes mordomo destas festas, as fr N. Sra. do Socorro, consideradas uma das maiores e mais concorrids festas populares do concelho. O documento que encontrámos deve dizer respeito ao ano de 1960, segundo informação das mulheres da família que nestas coisas têm melhor memória do que os homens.

A minha cunhada Nitas  [Ana Carneiro] lembra-se, tinha ela 13 anos já feitos, de andar na festa a angariara dinheiro com as florinhas de papel, com um alfinete,  que eram espetadas na lapela do casaco dos cavalheiros, à entrada do recinto. As receitas que daí provieram ainda atingiram uma cifra razoável para a época: c. de 650$00... Mas, mesmo assim, insuficientes para pagar o imposto de selo: selar 35 programas, nas finanças, custava na altura  914$40  (!), uam exorbitância.
.
O total de despesas desse  ano ultrapou os 24 contos, o quivalente, a preços de hoje,  a 10 726 euros.  Repare-se, que o foguetório já nessa altura representava quase um terço (31,1%)  do total das despesas.  Havia 4 fogueteiros,  que deitavam fogo à competição, havendo um prémio para o melhor...

Para a contratação de duas bandas de músicas, mais os Zés Pereiras, uns e outros pagos em dinheiro e em géneros, ia a maior fatia do bolo  (41,7%):

  • Banda de música dos Bombeiros Volunários: 4100;
  • Banda de música de Tio Mau: 2500;
  • Zés Pereiras: 450
  • Carne para os músicos: 1222;
  • Vinho para os músicos: 1000.
  • Mercearias, e pão:

Subotal: 10191,6.

As duas rúbricas somavam mais de 70% das despesas...  Ontem como hoje... Com uma diferença: as bandas filarmónicas tem de competir hoje com os "artistas de variedades" e "bandas de música ligeira" que têm cachês de dezenas de milhares de euros.

Deliciosa é a rúbrica das cavacas:  100 escudos de cavacas (4 quilos) para...os anjinhos (que animavam as procissões...). Ou as dos Zés Pereiras (450 escudos), sem esquecer a GNR que não andava a cavalo nem tinha meio de transporte próprio (400 escudos). Nas despesas com os padres (450 escudos),  inclui-se o pregador, que vinha de fora, e cuja obrigação era de arrebatar as almas e de pôr os corações a sangrar...

Apesar da pobreza generalizada (estamos em terras de rendeiros e de grande emigração...), também era vulgar as pessoas ofereceram à Nª Srª do Socorro objetos em ouro (brincos, cordões,  fios, pulseiras, etc.), como forma de pagamento de promessas. Essa prática terá aumentado com a emigração e com a guerra colonial, nos anos 60/70. Ainda me lembro de ver, nos anos 70, já no pós-25d e Abril, o andor da santa coberto de notas, escudos, francos, marcos...

 As receitas, nesse ano de 1960, foram inferiores às despesas... O prejuízo foi dividido pelos seis mordomos da comissão organizadora (cabendo 961$63, a cada um…).

 O meu sogro, além de proprietário agrícola, era construtor de ramadas, ofício que herdou do irmão mais velho. Temos registo da sua facturação de 3 ou 4 décadas.  A equipa de ramadeiros era flexível, variando entre 3 a 7, incluindo o próprio construtor e pelo menos um dos seus filhos (primeiro o mais velho, o António que irá para o Brasil e depois para Moçambque,  e a seguir  o Manuel Ferreira Carneiro, no final dos anos e, mais tarde, nos anos de 1963 a 1967, o José Ferreira Carneiro, o benjamim da família, que também foi mobilizado para Angola (1969/71)

Em geral, o construtor ganhava o dobro dos seus oficiais. Os honorários do construtor vão, nesta época (em que praticamente não havia inflação, até  meados dos anos 60) , entre os 30 e os 50 escudos, dependendo do cliente e da distância da obra em relação ao local do estabelecimento principal (que era Candoz, Paredes de Viadores, Marco de Canaveses). As ferramentas eram dele. O material (esteios, em pedra, e mais tarde em cimento, bem como o fio de arame) eram fornecidos pelo cliente (, o proprietário). Fazia ramadas na região mas também em Trás-os-Montes, nas Quintas do Douro.

 Tudo isto para dizer que a soma que ele teve de desembolsar, como mordomo da festa,em 1960, equivalia a um mês de trabalho nas ramadas... Mas a palavra dada para ele era "sagrada",,, Ser mordomo era, de resto,  um privilégio e uma honra.

Enfim, outros tempos, outras gentes, outros princípios, outros valores!... E outras formas de sociabilidade e de de lazer.



Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Candoz > 7 de Dezembro de 2007 > A Linha de Caminho de Ferro do Douro, entre o Juncal  e Mosteiró,   vista da Quinta de Candoz.


Foto (e legenda): © Luís Graça  (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Marco de Canaveses, Paredes de Viadores, Adro da Igreja de Nª Sra. do Socorro > 7 de setembro de 2013 > Festa da Família Ferreira  > Fotografia de grupo... Pelas nossas contas, e pelas fotos, teremos tido nesse ano mais de uma centena de presenças. A a nossa grã-tabanqueira Alice Carneiro é filha de Maria Ferreira e José Carneiro.

Foto (e legenda): © Luís Graça  (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

domingo, 19 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16215: Convívios (755): AVECO- Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste , nas festas do concelho da Lourinhã (23 a 26 de junho de 2016)... Mas também a banda de música Melech Mechaya (a 25, sábado, 23h30)


Cartaz promocional da Tasca do Combatente, da AVECO - Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste, com sede na Lourinhã, no âmbito das Festas do Concelho da Lourinhã (de 23 a 26 de junho de 2016)

Parabéns à nossa AVECO
E à Tasca do Combatente,
´Tá bem giro o boneco,
Vamos lá todos dar ao dente!

(refrão)

Vamos lá todos dar ao dente,
Sejas cabo ou general,
Branco ou tinto, p'ra toda a gente,
Que o Santo  não te leva  a mal.

Que o Santo  não te leva  a mal,
Lourinhã é sua terra,
Deu a volta a Portugal,
Veio cansado da guerra.

Veio cansado da guerra,
D' África ou colonial,
Deixou de estar na berra,
Só quer a paz... celestial.

Só quer a paz celestial,
O nosso são Joãozinho,
Mas aqui tem um rival,
Que é um tal santo Antoninho.

Que é um tal santo Antoninho,
Brejeiro e folgazão,
Depois de morto foi soldadinho,
Santo protetor da Nação.

Santo protetor da Nação,
E dos nossos veteranos,
A quem desejo, do coração,
Muita saúde, muitos anos.

Parabéns à nossa AVECO
E à Tasca do Combatente,
´Tá bem giro o boneco,
Vamos lá todos dar ao dente!

(refrão)

Letra: Luís Graça (2016)


2. Destaque, no âmbito das Festas do Concelho da Lourinhã (de 23 a 26 de junho de 2016), para a atuação da banda musical Melech Mechaya, dia 25, sábado, às 23h30.  (Ver aqui página no grupo no Facebook.)

O recinto das festas é no Estádio do Sporting Clube Lourinhanense. A entrada é livre. Que não falta a alegria e a sã camaradagem aos nossos veteranos do Oeste e seus amigos e familiares. Boas festas populares para todos os nossos leitores!
____________

Nota do editor:

Último poste da série > 16 de junho de  2016 > Guiné 63/74 - P16209: Convívios (755): Grande ronco no 31ºConvívio Anual da CART 3494 em Arcozelo – Vila Nova de Gaia (Sousa de Castro)

terça-feira, 12 de maio de 2015

Guiné 63/734 - P14606: História da CART 3494 (7): A passagem de ano de 1973/74 da CART 3494 (dois anos após a chegada à Guiné) (Jorge Araújo)

1. Mensagem do nosso camarada Jorge Araújo (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), com data de 8 de Maio de 2015: 


Camaradas,

Conforme prometi no meu comentário ao P14540 [29ABR15], a propósito da criação do conjunto musical «Os Bambadincas», realizei mais uma visita ao baú de memórias relacionadas com as vivências da nossa presença no CTIGuiné, de que resultou a presente narrativa.

Nela recupero alguns dos momentos mais sugestivos da passagem de ano 1973’74, em Mansambo, numa altura em que, com dois anos de comissão no bornal, a incógnita, quanto ao número de meses que faltariam ainda para a rendição, continuava a pairar no seio do contingente da CART 3494.

Estas memórias estão, agora, a uma distância de mais de quatro décadas.

A PASSAGEM DE ANO DE 1973’74 DA CART 3494
(DOIS ANOS APÓS A CHEGADA À GUINÉ)
-Com animação musical em Mansambo-

I– INTRODUÇÃO

Conforme se pode confirmar no caderno fotocopiado da História da Unidade – BART 3873, no 20.º Fascículo referente ao mês de Dezembro de 1973 [P14535; 28ABR15], as diferentes unidades do Batalhão festejaram, pela terceira vez, a quadra Natalícia, cada uma em seu aquartelamento… como não podia deixar de ser.

Em Bambadinca, sede do Comando, na consoada de 1973 reuniram-se Oficiais, Sargentos e Praças e no dia 25 [uma novidade!] houve um acto de variedades organizado por militares da CCS. Dias mais tarde, os mesmos elementos constituintes desse grupo, composto por milicianos da CCS e da CART 3494, percorreram, respectivamente, o Xitole [CART 3492] e Mansambo [Cap.II; pp 78/80].

No que concerne ao espectáculo realizado em Mansambo [CART 3494], este ocorreu nos primeiros dias de 1974, aproveitando-se esse evento para comemorar, também, os vinte e quatro meses da chegada do contingenteao CTIG, coincidindo com a terceira passagem de ano na Guiné – a 1.ª em Bolama (1971’72), a 2.ª no Xime (1972’73) e esta, a 3.ª (1973’74). 

Entretanto, nesta data aindanão existiam informações precisas sobre quantos meses faltariampara a rendição e posterior conclusão da Comissão.Esta, somente,viria a acontecer três meses depois, em 3 de Abril de 1974.

Quanto ao programa de variedades, este foi concebido em Bambadinca, onde decorreram os ensaios, sendo constituído por várias artes do espectáculo – teatro, poesia e música.No âmbito musical, foi constituído o conjunto «Ou Vai ou Racha», sabendo-se hoje [P14540] que os instrumentos utilizados por este grupo do BART 3873 tinham sido os mesmos que, quatro anos antes, estiveram na génese do conjunto musical «Os Bambadincas» [foto 1, ao lado, com a devida vénia], da CCS/BCAÇ 2852 (1968/70), e que se mantiveram à guarda das sucessivas unidades que passaram por aquele Aquartelamento. 

A origem desses instrumentos é atribuída a Cecília Maria Castro Pereira Carvalho Supico Pinto (1921-2011), que os ofertou a essa Unidade por ocasião da sua visita aos militares metropolitanos sediados em Bambadinca, em Maio de 1969 (?) [foto 2], chefiando uma delegação do Movimento Nacional Feminino (MNF) [P14455; 10ABR15], de que foi a única presidente e a principal mentora, ajudando-o a fundar em 28ABR1961 [data do 72.º aniversário de Oliveira Salazar (1889-1970)]. De referir que este encontro de Cecília Supico Pinto [e de outros que realizou durante os treze anos em que durou a guerra, nas três frentes ultramarinas], se inscrevia na filosofia da missão da sua organização, fundada por vinte e cinco mulheres provenientes da elite do regime do Estado Novo. O elemento fundante do MNF era/foi o apoio ao regime de então, promovendo a caridade e as condições subjectivas e emocionais dos militares em campanha.

É da sua responsabilidade a iniciativa de serem gravadas mensagens dos militares a desejarem um Natal cheio de “propriedades” às suas famílias, e transmitidas na RTP, bem como mensagens áudio gravadas em Portugal pelas famílias para serem emitidas nas rádios locais para aqueles. Foi através desta iniciativa que se popularizou a frase “Adeus, até ao meu regresso”.

É do MNF a iniciativa da criação dos “Aerogramas” bem como o lançamento da ideia das “Madrinhas de Guerra”, em que uma rapariga/mulher aceitava trocar correspondência com um miliciano durante a sua estadia no Ultramar. É, ainda, do MNF a iniciativa da digressão de artistas e espectáculos à Guiné, Angola e Moçambique para os militares.

Este Movimento viria a ser extinto na sequência do «25 de Abril de 1974» por decreto da Junta de Salvação Nacional, em 22JUN1974.

II – FOTOGALERIA DO ESPECTÁCULO EM MANSAMBO - CART 3494


Foto 3 – Mansambo - Jan/1974. Grupo Musical «Ou Vai ou Racha». Da esqª/dtª (1.ª linha) – Américo Russa (fur. CCS); Manuel Dias (fur. Cart 3494) e Luciano Jesus (fur. Cart 3494). Comparando a foto 1 [1969] com a foto 3 [1973], constata-se que os instrumentos são iguais… ou seja; os mesmos. 


Foto 4 – Mansambo - Jan/74. No improvisado palco, estão os camaradas Manuel Dias e Luciano Jesus, furriéis da CART 3494, em momento de poesia com acompanhamento musical.


Foto 5 – Mansambo - Jan/74. Actuação do Grupo de Teatro… onde nasceu uma criança… com chucha e barrete… 


Foto 6 – Mansambo - Jan/74. Actuação do Grupo Musical «Ou Vai ou Racha».


Foto 7 – Mansambo - Jan/74. Idem.


Foto 8 – Mansambo - Jan/74. Idem.


Foto 9 – Mansambo - Jan/74. Em noite de cacimbo com temperatura mais baixa do que o habitual, como prova o vestuário, o ambiente criado pela equipa de animadores em palco, verdadeiros actores/artistas de corpo inteiro, ajudou a dar mais calor aos camaradas presentes na plateia, reforçando o ânimo para o tempo que ainda faltava cumprir.

Eis mais uma pequena peça do puzzle historiográfico da presença do contingente da CART 3494 no CTIGuiné.

Com um fraterno abraço de amizade,
Jorge Araújo.
Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494
___________
Nota de M.R.: 

Vd. Também o último poste desta série em:


quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13540: Os nossos seres, saberes e lazeres (73): Há festa na Tabanca de Candoz, com o grupo de bombos de Santa Eulália, Ariz, Marco de Canaveses...




Vídeo 5' 44''




Vídeo 1' 47''






Marco de Canaveses > Paredes de Viadores e Manhuncelos >  Candoz > Tabanca de Candoz >  26/7/2014.> Grupo de Bombos de Santa Eulália, Ariz, no peditório para a festa em hona de Nossa Senhora do Socorro (que é semopre no último fim de semana de julho)

Fotos e vídeos: © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG)


1. Tinha prometido ao Agostinho que publicava estes vídeos no nosso blogue. Ele é o cantador do Grupo de  Bombos de Santa Eulália, Ariz, Marco de Canaveses. Toca também concertina e caixa. Ele herdou o talento do seu avô que cantava à desgarrada. É uma geração, a do jovem Agostinho,  que, felizmente. já não irá à guerra (esperamo-lo bem!), e que é guardiã e continuadora de tradições desta nobre e valente gente do Douro Litoral.  Estas tradições fazem parte dos "nossos seres, saberes e lazeres" e são acarinhadas pelo pessoal da Tabanca de Candoz... O concelho do Marco de Canaveses pagou um pesado imposto em sangue, suor e lágrimas durante a guerra colonial: 45 dos seus filhos lá morreram, por terras de Angola, Guiné e Moçambique (vd lista nominal no portal Ultramar Terraweb).

Quando chega o verão, há foguetes e alegria no ar. Estes jovens ganham uns cobres acompanhando os mordomos das festas no peditório , casa a casa. Neste caso, o peditória era para a festa da padroeira da freguesia de Paredes de Viadores (e que agora passou taambém a incluir a antuga freguesia de Manhuncelos), a  Nossa Senhora do Socorro, que tem uma  capela que remonta ao séc. XIX, num dos pontos altos do território da freguesia...

O Grupo de Bombos de Santa Eulália de Ariz tem página no Facebook.

2. Diga-se, de passagem, que Ariz, que é sede de freguesia, é hoje conhecida pelo seu carnaval, os seus foliões e cabecudos,  mas também, no seu passado histórico, pela famigerada "forca de Ariz" onde terão sido foram exsecutados (, ficando  dependurados os seus cadáveres, como forma de terror) muitos dos condenados à morte até à extinção da pena capital no nosso país...  mas também alguns dos portugueses, vítimas da guerra civil, fratricida, entre liberais e absolutistas (1828-1834).

Ariz fazia parte, até 1852, do extinto concelho de Bem-Vuver (que ocupava a parte do sul do atual concelho de Marco de Canaveses)... Por estas terras também o lendário herói do "banditismo social", Zé do Telhado ( Castelões de Recesinhos, Penafiel, 1818  / Mucari, Malanje, Angola, 1875). e o seu bando, cujas façanhas ficaram na memória das gentes dos vales do Sousa e Tâmega (onde nasceu Portugal).  Desterrado, Zé do Telhado morreu em Angola (onde a sua memória ainda é, ao que parece, venerada). (LG)