1. Um diário de guerra, para mais escrito como este com base em documentos pessoais da época, e publicado, sem censuras nem rasuras, em 2007, é um "livro aberto", um documento com maior ou menor interesse em termos de informação e conhecimento sobre o autor e a sua circunstância, neste caso o Teatro de Operações da Guiné, entre meados de 1972 e as vésperas do 25 de abril de 1974, visto por um alferes miliciano, não operacional, de um CAOP (Comando de Agrupamento Operacional), ligeiramente mais velho do que a generalidade dos milicianos (que integravam as unidades combatentes), e para mais com formação universitária.
No seu diário, o António Graça de
Abreu (nascido em 1947, no Porto, ex-Alf
Mil do CAOP1, 1972/74) dá-nos notícias do que se passa nas guarnições onde esteve (Canchungo, Mansoa, Cufar) assim como das informações, classificadas, a que tem acesso privilegiado, sobre o IN e sobre as NT...
Falámos também dele, das suas preferências, dos seus gostos, dos seus amores, das suas leituras... Falá-nos da metropóle e do que lá se passa, da repressão estudantil, dos seus sonhos e projetos futuros... Fala-nos também da PIDE/DGS, do seu papel, e da relutância que alguns de nós tinham em relacionar-se com os seus agentes no TO da Guiné... Enfim, fala-nos dos tempos que estão a mudar e inquieta-o, também, o futuro da sua/nossa querida pátria, a propósito da publicação do livro do gen António Spínola, Portugal e o Futuro...
Com a devida vénia, ficam aqui mais alguns excertos do seu Diário da Guiné, 1972/74, de que temos um ficheiro em word, o
mesmo que serviu de base à edição do seu livro Diário da Guiné: Lama, Sangue
e Água Pura (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp)
(*). (LG)
___________________
(…) Canchungo, 13 de Julho de 1972
Recebi carta do Bolhé da Silva, um dos meus alunos de Português nas aulas para adultos que dei quase até embarcar para a Guiné na Cooperativa Vis, no bairro do Bosque, Amadora. Escrevera para lá um aerograma perguntando como haviam corrido os exames. Estes meus ex-alunos de Português são quase todos alentejanos e operários da Sorefame. Voltaram a estudar para concluir o ciclo. Fiquei satisfeito por saber que a maioria deles dispensou às orais.
O meu trabalho e o dos outros professores, todos a dar aulas sem ganhar um tostão, não foi em vão. Tive gosto em ensinar, em aprender. Mas continuo convencido que vim parar à Guiné por causa destas aulas. Há dois meses a PIDE/DGS foi visitar a Cooperativa – que creio ter relações clandestinas com o Partido Comunista – e pediu o nome e profissão de todos os professores dos cursos do Ciclo Preparatório. Três semanas depois, já com quase dois anos de tropa em Portugal, fui estranhamente mobilizado para a Guiné.
[ Nota de rodapé: A polícia política seguia os meus passos desde Outubro de 1967. É curioso o meu processo consultado só agora em 2006: Arquivo Nacional da Torre do Tombo, PIDE/DGS, Procº. 9175 C7 (2) – NT 7555.]
(...) Teixeira Pinto ou Canchungo, 26 de Julho de 1972
Abro muito os olhos e os ouvidos, meto tudo dentro de mim, falo pouquíssimo, quase não reajo, não demonstro nada. Mas sinto que em Portugal é que o PAIGC vai ganhar a guerra, aqui não a perde e no terreno não a consegue ganhar.
No labor quotidiano no Comando de Operações, passam pelas minhas mãos documentos fundamentais para se entender a guerra na Guiné. Chegam de Bissau e são as informações diárias e semanais, os relatórios mensais de operações com todos os dados, bombardeamentos, flagelações, ataques, emboscadas, os números dos milhares de quilos de bombas lançadas pelos nossos aviões, o número de mortos e feridos, NT e IN, dias, horas, particularidades dos ataques, etc.
Esta documentação tem a classificação de confidencial e secreta. Vêm também as informações da PIDE/DGS com dados sobre a movimentação dos guerrilheiros, natureza dos acampamentos IN e outros elementos. Um exemplo, pela PIDE de Canchungo soubemos que neste momento estão dentro da Guiné sete jornalistas de nacionalidade checa, búlgara e russa. Entraram, vindos do Senegal, pela fronteira junto a S. Domingos, uns oitenta quilómetros a norte daqui.
O meu major P. não gosta muito do Sr. Costa, o agente da PIDE/DGS em Canchungo, que tem uma vivenda aqui na avenida. O major diz que o Costa, para mostrar serviço, de vez em quando inventa factos e notícias. Parece-me bem possível. Estive em casa dele a semana passada e, no desempenho de funções, tive de lhe apertar a mão. Coisas impensáveis em Lisboa. (…)
Dia 3 de Agosto vai ser data quente na Guiné. É o aniversário do PAIGC e por isso estão planeadas para esse dia diversas acções de guerrilha, encontrando-se Canchungo no rol das terras a atacar. A informação chegou pela PIDE/DGS de Bissau.
No caso de um ataque, já estive a preparar a minha defesa. Como não sou operacional, fico no meu aposento (se estiver lá no momento da flagelação!) e vou para o pequeno quarto de banho que é interior e tem paredes duplas de tijolos. O problema é o tecto que é de lusalite e não resiste a um impacto, de cima para baixo, de um foguetão ou granadas de grande calibre, mas o quarto de banho resiste ao resto. E é altamente improvável que o fogo do IN vá logo acertar nos três metros quadrados de telhado do meu quarto de banho.
Ainda estou virgem quanto a flagelações, emboscadas, bombardeamentos. Vou perder a virgindade em breve, tenho a certeza.
(…) Canchungo, 5 de Agosto de 1972
Canchungo não foi atacada, a informação do tipo da PIDE/DGS de Bissau era falsa.
Mas foram outros aquartelamentos NT. Leio os relatórios quotidianos das acções na Guiné e vejo os lugares onde os militares portugueses levaram (e deram) porrada. Os guerrilheiros fazem o que têm a fazer, eu compreendo, é a luta deles. Mas também é verdade que não gosto de ver as NT serem flageladas. Eu estou deste lado da barricada, com os homens iguais a mim expatriados nesta pequena África suja e quente. São meus amigos, é a minha gente. Não merecemos ser atacados, nenhum de nós merece sofrer, morrer por uma causa que quase ninguém sente.
(...) Mansoa, 1 de Maio de 1973
Não sei quem é que disse que “cada português traz um polícia dentro de si”. E além dos polícias “dentro” existem muitos “fora”, à nossa volta. (…)
Mansoa, 8 de Maio de 1973
Leio na Presse, um boletim informativo para militares que nos chega de Bissau, que houve zaragatas entre estudantes e polícia na Cidade Universitária, em Lisboa. Desta vez os polícias não foram nada meigos, dispararam mesmo mas, segundo a Presse, dispararam para o ar. Curioso terem atingido um estudante que voava. (…)
(...) Cufar, 22 de Fevereiro de 1974
Regressei no Nordatlas, na viagem certinha até cá abaixo. Tudo calmo em Cufar. No nordeste da Guiné, em Copá junto à fronteira, é que tudo vai mal. Mal para as NT, bem para o IN. Ouvi falar num ataque com cem foguetões, valha-lhes Deus! Começa a ser insustentável aguentar Copá.
Em Portugal as coisas também aquecem, com manifestações contra a carestia de vida organizadas pelos maoístas do MRPP. Houve pancadaria da grossa, três polícias feridos, um deles levou uma pedrada na cabeça. O povo não anda bom.
Em Bissau rebentou uma bomba no quartel-general. E que dizer do novo livro de António de Spínola Portugal e o Futuro? O antigo Caco Baldé, meu ex-comandante-em-chefe, propõe soluções federalistas para a resolução dos conflitos do Ultramar. O livro vai ter sucesso entre os liberais, o grupo do Balsemão e do Expresso, e também entre alguma da Oposição. Abençoadamente, agitará os espíritos de muitos portugueses.
O Marcello Caetano começa a ficar exasperado. No essencial, o mestre de Direito limitou-se a dar continuidade à política de Salazar e não sabe, ou esqueceu-se, como diz o Bob Dylan que “the times, they are a’changin”. O general Spínola aponta caminhos enviesados, é verdade, mas indica possíveis saídas para o pântano fétido em que vivemos.
Que futuro para Portugal? (…)
_________________
Nota do editor:
(*) Vd. último poste da série > 25 de fevereiro de 2012 > Guiné
63/74 - P9531: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo,
Mansoa e Cufar, 1972/74) (10): As vozes da nova música popular portuguesa
(incluindo o Zeca Afonso) que chegavam ao CAOP1 através das ondas hertzianas da
rádio
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 10 de março de 2012
Guiné 63/74 - P9593: Álbum fotográfico de João Martins (ex-Alf Mil Art, BAC1, Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/69) (1): Viagem de Bissau a Piche, pelo Geba e pela picada, com 3 peças de arilharia 11.4, em setembro de 1968
Foto nº 63/199 > Setembro de 1968 > LDG 101, no cais de Bissau
Foto nº 64/199 > Setembro de 1968 > Cais de embarque, em Bissau
Foto nº 68/199 > Setembro de 1968 > A bordo da LDG (ou LDM ?)... Inclino-me mais para a LDG (não sei como se metem 3 peças 11.4 numa LDM mais a tralha toda de um Pel Art)... Contudo, também não imagino como ela, a LDG, podia subir o Geba Estreito e chegar a Bambadinca (mesmo na maré-cheia)...
Foto nº 72/199 > Setembro de 1968 > No Rio Geba, aproximando-se do Xime ou de Bambadinca (?)... Parece estarmos no Geba Estreito, que era navegável até Bambadinca, pelo menos [No meu tempo, 1969/71, as LDG ficavam no Xime, as LDM conseguiam navegar no Geba Estreito: também não tenho a certeza se este navio, que transportava o Pel Art, é uma LDG ou uma LDM. De qualquer modo, a embarcação prepara-se para atracar e o sítio não é seguramente o Xime, parece mais ser o porto de Bambadinca. Aliás, o Martins não faz referência ao Xime]
Foto nº 76/199 > Setembro de 1968 > Em Bafatá, com as peças 11.4 à espera de prosseguirem, em coluna auto, até Piche, via Nova Lamego.
Foto nº 81/199 > Setembro de 1968 > Partida de Bafatá
Foto nº 81/199 > Setembro de 1988 > Picada a caminho de Nova Lamego (nesta data ainda não havia estrada alcatroada, Bafatá-Nova Lamego)
Foto nº 82/199 > Setembro de 1968 > Chegada da coluna a Nova Lamego
Foto nº 84/199 > Setembro de 1968 > Agora a caminho de Piche, a última viatura (onde ia o Alf Mil Art Martins) teve um furo e ficou separada da coluna...
Foto nº 89/199 > Setembro de 1968 > A caminho de Piche, observando a paisagem...
Foto nº 92/199 > Setembro de 1968 > Chegada da coluna ao seu destino, em segurança
Foto nº 94/199 > Setembro de 1968 > Finalmente as peças em posição e com bidões de proteção
Foto nº 95/199 > Setembro de 1068 > O régulo de Piche veio, em nome da população, dar as boas vindas ao Pel Art e ao seu comandante, o Alf Mil Art Martins. Fim da jornada. (Não sei quantos dias levou...).
Fotos: © João José Alves Martins (2012). Todos os direitos reservados. (Fotos editadas por L.G.; legendas do autor das fotos e do editor).
1. O João José Alves Martins foi Alf Mil Art do BAC 1 (Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/69). Entrou para a Tabanca Grande em 12 de Fevereiro de 2012.
Na sua página, no Facebook, tem um notável álbum fotográfico, com 199 imagens, obtidas a partir de diapositivos, relativas à sua comissão de serviço no TO da Guiné. Parecem estar ordenadas cronologicamente e uma boa parte delas estão legendadas. O que nos permite, por exemplo, seguir o o nosso camarada e o seu Pel Art, ao longo da viagem do BAC 1, em Bissau, até Piche em setembro de 1968.
Recorde-se que ele chega a Bissau em 19 de dezembro de 1967 (e só regressará à metrópole nos princípios de janeiro de 1970).
Pertence à Bataria de Artilharia de Campanha [BAC] nº 1, unidade de recrutamento da província com cerca de 25 pelotões de soldados de todas as etnias, espalhados por muitos dos aquartelamentos do território da Guiné.
É colocado em Bissum, com o seu Pel Art (três obuses 8.8). E, no regresso das férias, em julho de 1968, é enviado para Piche, juntamente com três peças de artilharia 11.4 (vulgarmente confundidas pelos infantes com os obuses 14). É essa longa viagem - primeiro de LDG até Bambadinca, e depois por estrada, já na época das chuvas - que estas fotos pretendem ilustrar:
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Nota do editor:
Vd postes anteriores:
30 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9291: Facebook...ando (14): João José Alves Martins, ex-Alf Mil PCT (BAC1, Bissau, Bissum-Naga, Piche, Bedanda, Gadamael, Guileje, Bigene, Ingoré, 1967/70)
16 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9493: Tabanca Grande (321): João José Alves Martins, ex-Alf Mil Art, BAC 1 (Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/70)
sexta-feira, 9 de março de 2012
Guiné 63/74 - P9592: O Nosso Livro de Visitas (128): José Faia Pires Correia, Cor Art Ref, último comandante do GA7 (Bissau, 1974)
Guiné > Bissau > Finais de 1967 > Messe de oficiais da BAC 1 (Bateria de Artilharia de Campanha nº 1). Foto nº 21/199, do álbum do ex-Alf Mil Art, João José Alves Martins (BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Guileje, 1967/70).
Foto: © João José Alves Martins (2012). Todos os direitos reservados.
1. Comentário do nosso leitor (e camarada) que se assina por Zé do Fratel ao poste P4201:
Por mero acaso vim aqui parar, com alguma surpresa e não menos emoção, diga-se, porque fui o último Comandante do GA7, depois de ter sido 2º. Comandante.
Anteriormente, estive como oficial de operações num Batalhão de Artilharia em Bambadinca [, o BART 3873].
São raros os contactos que mantenho com camaradas do GA7 ou do BART [3873], até porque já morreram os dois oficiais que comigo partilharam os últimos meses no Grupo e com os quais mantinha grande ligação: Tenente-Coronel Jaime Simões da Silva e Coronel Alberto Jorge Ribeiro Amaral (este foi Comandante da Bateria de Comando e Serviços e, depois de promovido a Major, foi o último 2º. Comandante)
José Faia Pires Correia
Cor Art Ref
2. Comentário de L.G.:
Caro camarada Zé do Fratel: está cientificamente provado que estar inserido num grupo de autoajuda é bom para a saúde, a qualidade de vida e a esperança de vida... A Tabanca Grande, ou melhor, a comunidade virtual, aqui representada no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, é também isso mesmo, um grupo de autoajuda, que todos os dias pratica a técnica da blogoterapia: partilhamos memórias e afetos, choramos os nossos mortos, celebramos o milagre da vida, cultivamos a amizade e a camaradagem...
Camarada (, deixa-me tratar-te por tu, como é timbre e norma dos camaradas da Guiné): não fiques na sala de visitas, senta-te aqui, à sombra do nosso poilão, e deixa a tua memória fluir... Tens recordações de Bambadinca (onde eu vivi, sofri, combati, nos anos 69/71), tens lembranças de Bissau, tens seguramente saudade(s) da rapaziada da artilharia, tens documentos, tens fotos... Ainda és capaz de te emocionar ao visitar um blogue como este!... Bom sinal, sinal de que estás vivo, e que a Guiné - mesmo sendo tu um oficial de carreira - mexeu contigo.
Se quiseres estar mais perto de nós, ex-combatentes de todas as armas, de todas as especialidades, de todos os postos, de todos os lugares, de todos os anos..., manda-me duas fotos, uma do antigamente e outra mais atual... E fala um pouco mais de ti, de Bambadinca, do GA7, e por isso fora... Serás recebido de braços abertos, por estes bravos soldados da terra, do ar e do mar que partilham este espaço... Boa saúde, camarada. Aparece. Escreve para: luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com.
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Nota do editor:
Último poste da série > 22 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9519: O Nosso Livro de Visitas (127): Carlos Alberto Morais dos Santos, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAV 1749 (Mansabá, 1967/69)
Guiné 63/74 - P9591: Notas de leitura (340): Guerra Colonial & Guerra de Libertação Nacional 1950-1974: O Caso da Guiné-Bissau, de Leopoldo Amado (4) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Fevereiro de 2012:
Queridos amigos,
Faltaria à verdade se não dissesse que este documento oferece uma leitura aliciante e polémica. Tem por detrás uma laboriosa e séria investigação, dentro dos parâmetros do que é uma tese de doutoramento. É nos alvores do nacionalismo, na identificação dos grupos, na evolução da guerra que esta leitura oferece, em condições ímpares, uma interpretação lógica e cronologicamente coerente. É controversa quanto à gama de presunções em torno das chamadas contradições e lutas internas dentro do PAIGC, como se dirá mais adiante, a interpretação do assassinato de Cabral refere a responsabilidade moral da PIDE/DGS, facto comprovado, e alude a um conjunto de maquinações e círculos concêntricos da conspiração que, por falta de fundamento histórico, são inadmissíveis em documentos desta natureza.
Um abraço do
Mário
Guerra Colonial versus Guerra de Libertação Nacional:
O caso da Guiné-Bissau (4)
Beja Santos
“Guerra Colonial versus Guerra de Libertação Nacional – O Caso da Guiné-Bissau” é a publicação em livro dos conteúdos mais significativos da tese de doutoramento do nosso confrade Leopoldo Amado (IPAD, 2011). É, como se tem insistido, um documento de referência para todas as investigações que doravante venham a ter lugar, incluindo os trabalhos que cruzem as atividades das Forças Armadas portuguesas, neste teatro de operações, para as quais já se possuem importantes elementos oficiais publicados e estudos ou documentos dos diferentes ramos das Forças Armadas. Até agora, tem-se procurado resumir os dados fundamentais que orientam os quatro pilares em que se estrutura a obra, com destaque para: conceitos ideológicos, caracterologia do teatro de operações, ideologia colonial e conceitos de guerras revolucionárias e contra-subversão; apresentação das forças nacionalistas e deflagração da luta armada; evolução e consolidação da guerrilha, tendo como parâmetros o Congresso de Cassacá, o incremento das ações militares e a definição do termo de áreas libertadas, a presença cubana junto do PAIGC, as guerras de contrainformação e a infiltração do PAIGC pela PIDE/DGS; a era de Spínola, o 25 de Abril, o legado político de Amílcar Cabral e conclusões.
Nesta recensão o enfoque prende-se com os anos da governação Spínola. Ele chega à Guiné em Maio de 1968 e manda imediatamente proceder à elaboração de estudos que irão durar cinco meses, será partir daí que ele traçará a sua linha de ação “Por uma Guiné melhor”, um plano orientado para a captação das populações, dando prioridade à promoção económica e social, colocando uma boa parte do dispositivo das Forças Armadas ao serviço da realização dos serviços provinciais e, no setor estritamente militar, revendo a implantação desse dispositivo e criando uma nova toada ofensiva. Arrancam ou continuam a construção de estradas de asfalto, a criação de centro materno-infantis, maternidades e dispensários, apetrecha-se uma escola de formação de professores, tudo sob o lema “viver em paz, trabalhando para uma vida melhor, ou viver na intranquilidade da guerra e na vã esperança de uma independência que conduzirá ao desaparecimento da Guiné e a uma vida pior”. O objetivo é retirar ao PAIGC a possibilidade de controlar certas populações, reagrupando-as em aldeamentos. Para dar um sinal de magnanimidade e benevolência, mandou restituir à liberdade um elevado número de presos políticos que estavam na colónia penal das Ilhas das Galinhas. No ano seguinte, em 3 de Agosto, haverá um cerimonial em que Rafael Barbosa tomará a palavra e se revelará arrependido. A guerra psicológica irá refinar-se com o uso da radiodifusão, a profusão de cartazes, as próprias diretivas que determinam aos militares ações psicológicas em torno do bem-estar e do conforto das populações. Leopoldo Amado enumera algumas dessas iniciativas envolvendo programas radiofónicos, entre outros.
O dispositivo militar também se reconfigurará. Spínola elevará a parada em Lisboa pedindo cada vez mais apoios necessários para a continuação da guerra. Logo em Novembro de 1968 irá fazer uma exposição no Conselho Superior de Defesa Nacional onde apontará a possibilidade de derrocada e acusando os chefes militares que o antecederam de não terem posto o problema com verdade. O autor observa: “Data desta reunião a cisão nítida entre Spínola e a maior parte dos altos comandos das Forças Armadas, os quais passam a tê-lo por vaidoso, ambicioso e fanfarrão, ao passo que o novo comandante da Guiné não se coíbe de manifestar o desprezo que sentia pela incompetência que neles verificava”. A relação com Marcello Caetano parece ser idílica, as suas declarações estão manifestamente em consonância. Na Guiné, os três ramos das Forças Armadas confluem para o Comando-Chefe, este passa a ser o centro nevrálgico de toda a atividade operacional. Com a libertação de espaços, irão intensificar-se os bombardeamentos, haverá mesmo zonas exclusivas de intervenção do Comando-Chefe. Igualmente haverá uma africanização da guerra, mais Companhias de Caçadores, de Comandos, de Fuzileiros. Para Leopoldo Amado, enquanto se procura o equilíbrio militar, começa a haver notícias de dissensões no seio do PAIGC, sobretudo entre os dirigentes máximos guineenses e cabo-verdianos, teria havido mesmo desentendimentos entre Amílcar Cabral e Osvaldo Vieira. O PAIGC parecia capaz de anular os efeitos devastadores da ação psicológica da era Spínola mas estava permeável ao trabalho de infiltração da PIDE/DGS em estreita articulação com os Serviços e Informação e Ação Psicológica. Em Maio de 1970, alguns dirigentes do PAIGC irão ser presos e comprovadamente acusados de colaborar com a polícia política.
Leopoldo Amado repertoria a evolução da guerra. Consolida-se, por parte do PAIGC, a utilização de corredores a partir do Senegal e da Guiné-Conacri. O PAIGC reorganizou-se, o Comité Central transformou-se no Conselho Superior da Luta, mantém-se o Conselho de Guerra do qual dependem os Corpos do Exército e as Frentes Militares. Entrou-se num período de reconhecimento internacional e reassumiu-se o potencial de combate e mobilização. Em 1970 tem lugar o Congresso dos Povos da Guiné, no “chão manjaco” uma vasta operação desencadeada para neutralizar o PAIGC na área acaba num massacre de oficiais. Num esforço para sair do impasse, e com a anuência de Marcello Caetano, tem lugar a operação “Mar Verde”, irá saldar-se num desaire diplomático. A recuperação da supremacia militar, por parte do PAIGC, é notória em 1971, Amílcar Cabral consegue mais apoios, Spínola procura reagir com um programa de progressiva autonomia da Guiné, assim se chega a conversações com Senghor, é admissível que Spínola tenha procurado uma iniciativa no quadro do anúncio da revisão constitucional de 1971. Recorde-se que recrudesceram a partir de 1972 os violentos ataques aos centros urbanos. Logo em Janeiro, Bafatá, depois um ataque-surpresa ao aeroporto de Catió. Refere o autor que a rivalidades e as contradições dentro do PAIGC, por essa época, também subiam de tom. Na contrainformação, foi lançado o boato de que Osvaldo Vieira teria assumido as funções de secretário-geral do PAIGC, os filhos da Guiné estavam descontentes porque Amílcar Cabral só os mandava para o mato enquanto os cabo-verdianos ocupam funções de comandantes. Um outro boato referia que Rafael Barbosa tencionava eleger um governo provisório. É nesse contexto que uma missão da ONU se desloca à Guiné e o seu relatório era bastante favorável ao trabalho do PAIGC. O ano acaba com o princípio da deterioração no relacionamento entre Caetano e Spínola, este sentiu-se preterido por não ter sido indigitado como candidato à presidência da República.
Estamos perante um documento de intenso labor, com uma recolha impressionam-te de informação. O próximo e último texto será dedicado às teses sobre o assassinato de Amílcar Cabral, a independência da Guiné-Bissau, a leitura de Leopoldo Amado faz da herança política e ideológica de Cabral e as respetivas conclusões.
(Continua)
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9560: Notas de leitura (339): Guerra Colonial & Guerra de Libertação Nacional 1950-1974: O Caso da Guiné-Bissau, de Leopoldo Amado (3) (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Faltaria à verdade se não dissesse que este documento oferece uma leitura aliciante e polémica. Tem por detrás uma laboriosa e séria investigação, dentro dos parâmetros do que é uma tese de doutoramento. É nos alvores do nacionalismo, na identificação dos grupos, na evolução da guerra que esta leitura oferece, em condições ímpares, uma interpretação lógica e cronologicamente coerente. É controversa quanto à gama de presunções em torno das chamadas contradições e lutas internas dentro do PAIGC, como se dirá mais adiante, a interpretação do assassinato de Cabral refere a responsabilidade moral da PIDE/DGS, facto comprovado, e alude a um conjunto de maquinações e círculos concêntricos da conspiração que, por falta de fundamento histórico, são inadmissíveis em documentos desta natureza.
Um abraço do
Mário
Guerra Colonial versus Guerra de Libertação Nacional:
O caso da Guiné-Bissau (4)
Beja Santos
“Guerra Colonial versus Guerra de Libertação Nacional – O Caso da Guiné-Bissau” é a publicação em livro dos conteúdos mais significativos da tese de doutoramento do nosso confrade Leopoldo Amado (IPAD, 2011). É, como se tem insistido, um documento de referência para todas as investigações que doravante venham a ter lugar, incluindo os trabalhos que cruzem as atividades das Forças Armadas portuguesas, neste teatro de operações, para as quais já se possuem importantes elementos oficiais publicados e estudos ou documentos dos diferentes ramos das Forças Armadas. Até agora, tem-se procurado resumir os dados fundamentais que orientam os quatro pilares em que se estrutura a obra, com destaque para: conceitos ideológicos, caracterologia do teatro de operações, ideologia colonial e conceitos de guerras revolucionárias e contra-subversão; apresentação das forças nacionalistas e deflagração da luta armada; evolução e consolidação da guerrilha, tendo como parâmetros o Congresso de Cassacá, o incremento das ações militares e a definição do termo de áreas libertadas, a presença cubana junto do PAIGC, as guerras de contrainformação e a infiltração do PAIGC pela PIDE/DGS; a era de Spínola, o 25 de Abril, o legado político de Amílcar Cabral e conclusões.
Nesta recensão o enfoque prende-se com os anos da governação Spínola. Ele chega à Guiné em Maio de 1968 e manda imediatamente proceder à elaboração de estudos que irão durar cinco meses, será partir daí que ele traçará a sua linha de ação “Por uma Guiné melhor”, um plano orientado para a captação das populações, dando prioridade à promoção económica e social, colocando uma boa parte do dispositivo das Forças Armadas ao serviço da realização dos serviços provinciais e, no setor estritamente militar, revendo a implantação desse dispositivo e criando uma nova toada ofensiva. Arrancam ou continuam a construção de estradas de asfalto, a criação de centro materno-infantis, maternidades e dispensários, apetrecha-se uma escola de formação de professores, tudo sob o lema “viver em paz, trabalhando para uma vida melhor, ou viver na intranquilidade da guerra e na vã esperança de uma independência que conduzirá ao desaparecimento da Guiné e a uma vida pior”. O objetivo é retirar ao PAIGC a possibilidade de controlar certas populações, reagrupando-as em aldeamentos. Para dar um sinal de magnanimidade e benevolência, mandou restituir à liberdade um elevado número de presos políticos que estavam na colónia penal das Ilhas das Galinhas. No ano seguinte, em 3 de Agosto, haverá um cerimonial em que Rafael Barbosa tomará a palavra e se revelará arrependido. A guerra psicológica irá refinar-se com o uso da radiodifusão, a profusão de cartazes, as próprias diretivas que determinam aos militares ações psicológicas em torno do bem-estar e do conforto das populações. Leopoldo Amado enumera algumas dessas iniciativas envolvendo programas radiofónicos, entre outros.
O dispositivo militar também se reconfigurará. Spínola elevará a parada em Lisboa pedindo cada vez mais apoios necessários para a continuação da guerra. Logo em Novembro de 1968 irá fazer uma exposição no Conselho Superior de Defesa Nacional onde apontará a possibilidade de derrocada e acusando os chefes militares que o antecederam de não terem posto o problema com verdade. O autor observa: “Data desta reunião a cisão nítida entre Spínola e a maior parte dos altos comandos das Forças Armadas, os quais passam a tê-lo por vaidoso, ambicioso e fanfarrão, ao passo que o novo comandante da Guiné não se coíbe de manifestar o desprezo que sentia pela incompetência que neles verificava”. A relação com Marcello Caetano parece ser idílica, as suas declarações estão manifestamente em consonância. Na Guiné, os três ramos das Forças Armadas confluem para o Comando-Chefe, este passa a ser o centro nevrálgico de toda a atividade operacional. Com a libertação de espaços, irão intensificar-se os bombardeamentos, haverá mesmo zonas exclusivas de intervenção do Comando-Chefe. Igualmente haverá uma africanização da guerra, mais Companhias de Caçadores, de Comandos, de Fuzileiros. Para Leopoldo Amado, enquanto se procura o equilíbrio militar, começa a haver notícias de dissensões no seio do PAIGC, sobretudo entre os dirigentes máximos guineenses e cabo-verdianos, teria havido mesmo desentendimentos entre Amílcar Cabral e Osvaldo Vieira. O PAIGC parecia capaz de anular os efeitos devastadores da ação psicológica da era Spínola mas estava permeável ao trabalho de infiltração da PIDE/DGS em estreita articulação com os Serviços e Informação e Ação Psicológica. Em Maio de 1970, alguns dirigentes do PAIGC irão ser presos e comprovadamente acusados de colaborar com a polícia política.
Leopoldo Amado repertoria a evolução da guerra. Consolida-se, por parte do PAIGC, a utilização de corredores a partir do Senegal e da Guiné-Conacri. O PAIGC reorganizou-se, o Comité Central transformou-se no Conselho Superior da Luta, mantém-se o Conselho de Guerra do qual dependem os Corpos do Exército e as Frentes Militares. Entrou-se num período de reconhecimento internacional e reassumiu-se o potencial de combate e mobilização. Em 1970 tem lugar o Congresso dos Povos da Guiné, no “chão manjaco” uma vasta operação desencadeada para neutralizar o PAIGC na área acaba num massacre de oficiais. Num esforço para sair do impasse, e com a anuência de Marcello Caetano, tem lugar a operação “Mar Verde”, irá saldar-se num desaire diplomático. A recuperação da supremacia militar, por parte do PAIGC, é notória em 1971, Amílcar Cabral consegue mais apoios, Spínola procura reagir com um programa de progressiva autonomia da Guiné, assim se chega a conversações com Senghor, é admissível que Spínola tenha procurado uma iniciativa no quadro do anúncio da revisão constitucional de 1971. Recorde-se que recrudesceram a partir de 1972 os violentos ataques aos centros urbanos. Logo em Janeiro, Bafatá, depois um ataque-surpresa ao aeroporto de Catió. Refere o autor que a rivalidades e as contradições dentro do PAIGC, por essa época, também subiam de tom. Na contrainformação, foi lançado o boato de que Osvaldo Vieira teria assumido as funções de secretário-geral do PAIGC, os filhos da Guiné estavam descontentes porque Amílcar Cabral só os mandava para o mato enquanto os cabo-verdianos ocupam funções de comandantes. Um outro boato referia que Rafael Barbosa tencionava eleger um governo provisório. É nesse contexto que uma missão da ONU se desloca à Guiné e o seu relatório era bastante favorável ao trabalho do PAIGC. O ano acaba com o princípio da deterioração no relacionamento entre Caetano e Spínola, este sentiu-se preterido por não ter sido indigitado como candidato à presidência da República.
Estamos perante um documento de intenso labor, com uma recolha impressionam-te de informação. O próximo e último texto será dedicado às teses sobre o assassinato de Amílcar Cabral, a independência da Guiné-Bissau, a leitura de Leopoldo Amado faz da herança política e ideológica de Cabral e as respetivas conclusões.
(Continua)
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9560: Notas de leitura (339): Guerra Colonial & Guerra de Libertação Nacional 1950-1974: O Caso da Guiné-Bissau, de Leopoldo Amado (3) (Mário Beja Santos)
Guiné 63/74 - P9590: Fotos à procura de... uma legenda (19): Imagem enviada pelo José Saúde (ex-Fur Mil Op Esp, CCS / BART 6523, Nova Lamego, 1973/74)
1. O José Saúde (ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523, Nova Lamego, 1973/74) mandou-nos há dias um conjunto de imagens relativas ao TO da Guiné, umas relativas a situações operacionais, outras mostrando aspetos da vida das populações... Não tem data, e a maior parte não tem lugar...
Saltou-me à atenção esta, acima reproduzida, por já a ter visto algures, na capa de uma publicação qualquer, e sobretudo porque não é uma foto qualquer, tem uma certa qualidade estética ou interesse documental, embora a imagem seja tecnicamente má, por fraca resolução... A foto original foi tirada no mato, algures no TO da Guiné (aliás, as únicas indicações que traz, são essas: Guiné - Operações / AM 1)...
Tudo indica que esta imagem fizesse parte de um brochura do Exército ou de alguma revista publicada na época (por ex., a Flama). Desconhece-se o autor da fotografia, possivelmente um repórter fotográfico, civil ou militar... Muito menos se fica a saber onde e quando foi tirada... Talvez em meados dos anos 60. Tudo indica que, em primeiro plano, estão dois operadores de transmissões (ou um operador de transmissões e um graduado, de óculos de lentes escuras, típicos da época, a usar o aparelho: vê-se a antena)... No rosto, sujo, do operador de transmissões pode ler-se alguma tensão, cansaço ou expetativa...
2. O José Saúde não dá muitas pistas, mas também parece sugerir que se pode tratar de cópias de um álbum fotográfico, tendo ele escolhido algumas para publicar no blogue:
(...) "No espólio da minha bagagem trouxe da Guiné um conjunto de fotos retiradas de um armário tido como 'secreto', asseguravam na altura os superiores hierárquicos, sendo que a aproximação ao dito cujo se afigurava quase inacessível tendo em conta todo o conteúdo que o escaparate continha. (...) Não vou trazer à estampa imagens onde o quadro explicitado do horror da guerrilha ditou epílogos impensáveis porque, creio, que a sua visualização feriria por certo susceptibilidades humanas. A meu ver, julgo que os capítulos dos anais da história da guerra ultramarina disso fariam eco, caso a verdade apurada no terreno não fosse sujeita a um esquisito branqueamento." (...).
Fica aqui o desafio ao próprio José Saúde e aos demais leitores do nosso blogue, e sobretudo à malta das transmissões, para completarem a legenda desta imagem...
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Nota do editor:
Último poste da série > 21 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9515: Fotos à procura de uma legenda (18): A ecomesa de snooker... em África!
Guiné 63/74 - P9589: O PIFAS, de saudosa memória (8): "Emoções", programa de música, Antena 1, sábado, 10 de março, das 5 às 7h da manhã: ouvir a voz do João Paulo Diniz, 40 anos depois...
1. Há dias o antigo locutor do PFA - Programa das Forças Armadas, no CTIG, onde cumpriu serviço militar (de agosto de 1970 a agosto de 1972), João Paulo Diniz, descobriu o nosso blogue e entrou em contacto connosco (vd. poste P9572, de 6 do corrente:
(…) Através de um Amigo que muito prezo, o Joaquim Furtado, soube - há dias - da existência do blogue 'Tabanca Grande', dedicado aos que passaram pela Guiné, como militares. Desde já felicito os seus mentores, não só pela ideia mas também pelo conteúdo, deveras interessante.
Fiquei particularmente feliz pelas referências ao "Programa das Forças Armadas", carinhosamente designado por 'Pifas'. Confesso que, como profissional, foi das experiências mais extraordinárias que tive na minha carreira.
Também fiquei a saber que está previsto um convívio da rapaziada, a ter lugar no dia 21 de Abril, [em Monte Real, Leiria]. Desde já, se me permitem, gostaria de me inscrever. Mas também solicito o favor de que me sejam enviadas, por mail, mais informações acerca da festa, para que possa fazer a sua divulgação no meu programa "Emoções", na Antena-1. (…).
2. Sobre o programa "Emoções" que é pré-gravado (e não tem podcast), sabemos que há camaradas nossos que são fãs, embora ele passe, na Antena 1, aos sábados, a horas pouco sociais, das 5 às 7h da manhã...
Há, aliás, pouca informação sobre o programa, no sítio da RTP:
"Na transição da noite para o dia, entre as 5 e as 7 da manhã de cada sábado, partilhe as Emoções de um programa de Rádio - feito para si. Emoções, com João Paulo Diniz".
GÉNERO: Música
FICHA TÉCNICA:
Realização: João Paulo Diniz
Autoria: João Paulo Diniz
Com: João Paulo Diniz
Antena1
Próximo programa: 2012-03-10
05:07h
CONTACTOS:
emocoes@rtp.pt
3. No próximo sábado, dia 10, o João Paulo Diniz vai falar do blogue e do nosso VII Encontro, segundo a informação que nos deu ao telefone. Já está, de resto, inscrito para o nosso encontro em Monte Real, dia 21 de Abril.
Esperemos nessa altura poder conhecê-lo pessoalmente e partilhar, ao vivo, as "emoções" de um camarada que conheceu por dentro o PIFAS e o ambiente de Bissau, no início dos anos 70. Bem vindo a bordo, camarada!Entretanto, e de acordo com a sondagem, em linha, que temos em curso há dois, e à qual já tinham respondido ao fim da manhã 43 leitores, mais de dois terços (69%) ouvia o PFA, com maior (todos ou quase todos os dias: 37%) ou menor regularidade (32%)... As restantes respostas (31%) distribuíam-se do seguinte modo: (i) não se interesssavam (9%), (ii) não tinham aparelho de rádio ou tinha dificuldade, no mato, em sintonizar o programa (11%); e, por fim, (iii) não eram do tempo do PIFAS (11%).
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ÚLtimo poste da série:
7 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9576: O PIFAS, de saudosa memória (8): Homenagem aos atuais profissionais da rádio Armando Carvalhêda, João Paulo Diniz e Faride Magide, evocados aqui pelo nosso saudoso camarada Daniel Matos (1950-2011)
(…) Através de um Amigo que muito prezo, o Joaquim Furtado, soube - há dias - da existência do blogue 'Tabanca Grande', dedicado aos que passaram pela Guiné, como militares. Desde já felicito os seus mentores, não só pela ideia mas também pelo conteúdo, deveras interessante.
Fiquei particularmente feliz pelas referências ao "Programa das Forças Armadas", carinhosamente designado por 'Pifas'. Confesso que, como profissional, foi das experiências mais extraordinárias que tive na minha carreira.
Também fiquei a saber que está previsto um convívio da rapaziada, a ter lugar no dia 21 de Abril, [em Monte Real, Leiria]. Desde já, se me permitem, gostaria de me inscrever. Mas também solicito o favor de que me sejam enviadas, por mail, mais informações acerca da festa, para que possa fazer a sua divulgação no meu programa "Emoções", na Antena-1. (…).
2. Sobre o programa "Emoções" que é pré-gravado (e não tem podcast), sabemos que há camaradas nossos que são fãs, embora ele passe, na Antena 1, aos sábados, a horas pouco sociais, das 5 às 7h da manhã...
Há, aliás, pouca informação sobre o programa, no sítio da RTP:
"Na transição da noite para o dia, entre as 5 e as 7 da manhã de cada sábado, partilhe as Emoções de um programa de Rádio - feito para si. Emoções, com João Paulo Diniz".
GÉNERO: Música
FICHA TÉCNICA:
Realização: João Paulo Diniz
Autoria: João Paulo Diniz
Com: João Paulo Diniz
Antena1
Próximo programa: 2012-03-10
05:07h
CONTACTOS:
emocoes@rtp.pt
3. No próximo sábado, dia 10, o João Paulo Diniz vai falar do blogue e do nosso VII Encontro, segundo a informação que nos deu ao telefone. Já está, de resto, inscrito para o nosso encontro em Monte Real, dia 21 de Abril.
Esperemos nessa altura poder conhecê-lo pessoalmente e partilhar, ao vivo, as "emoções" de um camarada que conheceu por dentro o PIFAS e o ambiente de Bissau, no início dos anos 70. Bem vindo a bordo, camarada!Entretanto, e de acordo com a sondagem, em linha, que temos em curso há dois, e à qual já tinham respondido ao fim da manhã 43 leitores, mais de dois terços (69%) ouvia o PFA, com maior (todos ou quase todos os dias: 37%) ou menor regularidade (32%)... As restantes respostas (31%) distribuíam-se do seguinte modo: (i) não se interesssavam (9%), (ii) não tinham aparelho de rádio ou tinha dificuldade, no mato, em sintonizar o programa (11%); e, por fim, (iii) não eram do tempo do PIFAS (11%).
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ÚLtimo poste da série:
7 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9576: O PIFAS, de saudosa memória (8): Homenagem aos atuais profissionais da rádio Armando Carvalhêda, João Paulo Diniz e Faride Magide, evocados aqui pelo nosso saudoso camarada Daniel Matos (1950-2011)
Guiné 63/74 – P9588: Convívios (400): Pessoal da CCS/BCAÇ 1861, dia 21 de Abril de 2012 em Ansião - Leiria (Júlio César)
Realiza-se no próximo dia 21 de Abril, no Restaurante Tia Matilde, em Ansião – Leiria, o 13º Almoço/Convívio da CCS do Batalhão de Caçadores 1861, que esteve na Guiné em 1965/1967.
Os interessados em participar deste Almoço/Convívio devem contactar:
Boaventura Alves Videira
Telemóvel: 964 534 332
Um Alfa Bravo
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Notas de CV:
- Emblema do BCAÇ 1861 da colecção do nosso camarada Carlos Coutinho
Vd. último poste da série de 6 de Março de 2012 > Guiné 63/74 – P9570: Convívios (320): Caldeirada na Tabanca de Setúbal, ou do Sado (Miguel Pessoa / Hélder Sousa)
Guiné 63/74 - P9587: Contraponto (Alberto Branquinho) (43): Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos Depois
1. Em mensagem do dia 8 de Março de 2012, o nosso camarada Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos mais um "Contraponto", desta feita uma crítica à Exposição sobre a Guerra Colonial levada a efeito pela SPA.
CONTRAPONTO (43)
“GUERRA COLONIAL – TARRAFAL 50 ANOS DEPOIS”
Aconselho uma visita à exposição acima indicada (v. POST 9573* de 7 de Março de 2012) – Sociedade Portuguesa de Autores – Rua Gonçalves Crespo, 62 – Lisboa.
Poderão verificar como se podem “enlatar” 13 – anos de guerra colonial – 13, factos e protagonistas, no espaço de duas paredes mais três terços de parede de uma sala pequena.
Mas, onde a exposição é minimalista (até porque foi montada na e pela SPA) é na mostra da produção literária sobre a guerra colonial e… seus arredores. Para além dos “costumes”… diz nada.
Nada mostra da qualidade e da coragem que houve em publicar e desconhece em absoluto o que foi publicado nos últimos dez/doze anos. Será que a razão está no facto de os autores não serem sócios da SPA?
A mostra de livros está em quatro pequenas vitrinas, no meio da sala (quarenta livros?) e nada mais.
Uma nota simpática – está lá o livro “Vindimas no Capim” do José Brás.
Bastava terem-se socorrido das listagens existentes em “sites” e “blogues” e terem ajuizado da sua qualidade.
Alberto Branquinho
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 7 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9573: Agenda Cultural (187): Inauguração da exposição Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos depois - CONVITE
Vd. último poste da série de 7 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9575: Contraponto (Alberto Branquinho) (42): Às voltas com Gandembel
CONTRAPONTO (43)
“GUERRA COLONIAL – TARRAFAL 50 ANOS DEPOIS”
Aconselho uma visita à exposição acima indicada (v. POST 9573* de 7 de Março de 2012) – Sociedade Portuguesa de Autores – Rua Gonçalves Crespo, 62 – Lisboa.
Poderão verificar como se podem “enlatar” 13 – anos de guerra colonial – 13, factos e protagonistas, no espaço de duas paredes mais três terços de parede de uma sala pequena.
Mas, onde a exposição é minimalista (até porque foi montada na e pela SPA) é na mostra da produção literária sobre a guerra colonial e… seus arredores. Para além dos “costumes”… diz nada.
Nada mostra da qualidade e da coragem que houve em publicar e desconhece em absoluto o que foi publicado nos últimos dez/doze anos. Será que a razão está no facto de os autores não serem sócios da SPA?
A mostra de livros está em quatro pequenas vitrinas, no meio da sala (quarenta livros?) e nada mais.
Uma nota simpática – está lá o livro “Vindimas no Capim” do José Brás.
Bastava terem-se socorrido das listagens existentes em “sites” e “blogues” e terem ajuizado da sua qualidade.
Alberto Branquinho
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 7 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9573: Agenda Cultural (187): Inauguração da exposição Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos depois - CONVITE
Vd. último poste da série de 7 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9575: Contraponto (Alberto Branquinho) (42): Às voltas com Gandembel
quinta-feira, 8 de março de 2012
Guiné 63/74 - P9586: Blogpoesia (182): Mulher - Esposa e Mãe (Juvenal Amado)
1. Em mensagem de hoje, o nosso camarada Juvenal Amado* (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), enviou-nos este poema:
Mulher
No teu colo depositei o meu amor
Dos teus lábios recebi mel
Do teu peito um suspiro
Nas tuas mãos descansei a cabeça
Nos teus braços combati a insónia
No teu olhar vi o futuro
No teu ventre cresceu o nosso fruto
Do teu grito nasceu uma flor
Flor que nos mistura
Que me acalma
Que nos conforta e completa
Nada que diga hoje, chegará para te agradecer
A não ser companheira que,
Os anos foram fáceis de caminhar ao teu lado.
Juvenal Amado
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 9 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9466: (Ex)citações (175): Contraditório, troca de ideias em liberdade (Juvenal Amado)
Vd. último poste da série de 8 de Masrço de 2012 > Guiné 63/74 - P9583: Blogpoesia (181): Pois que vivam os poetas, eles e elas, parqueados ou não! ... (Luís Graça)
Mulher
No teu colo depositei o meu amor
Dos teus lábios recebi mel
Do teu peito um suspiro
Nas tuas mãos descansei a cabeça
Nos teus braços combati a insónia
No teu olhar vi o futuro
No teu ventre cresceu o nosso fruto
Do teu grito nasceu uma flor
Flor que nos mistura
Que me acalma
Que nos conforta e completa
Nada que diga hoje, chegará para te agradecer
A não ser companheira que,
Os anos foram fáceis de caminhar ao teu lado.
Juvenal Amado
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 9 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9466: (Ex)citações (175): Contraditório, troca de ideias em liberdade (Juvenal Amado)
Vd. último poste da série de 8 de Masrço de 2012 > Guiné 63/74 - P9583: Blogpoesia (181): Pois que vivam os poetas, eles e elas, parqueados ou não! ... (Luís Graça)
Guiné 63/74 – P9585: Memórias de Gabú (José Saúde) (23): Fotos retiradas de um armário “secreto”
1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabú) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua série.
Fotos
retiradas de um armário “secreto”
No espólio da minha bagagem trouxe da Guiné um conjunto de
fotos retiradas de um armário tido como “secreto”, asseguravam na altura os
superiores hierárquicos, sendo que a aproximação ao dito cujo se afigurava
quase inacessível tendo em conta todo o conteúdo que o escaparate continha.
Certo era também a simbologia de memórias contidas no interior do respectivo
armário e que suscitava, obviamente, a curiosidade daquele(s) a quem
inadvertidamente lhe(s) tinha(m) sido confiada a missão de zelar pelo chamado
gabinete da acção psicológica.
Ora bem, a primeira vez que, à socapa, descobri o
“tesouro”, confesso que debitei pouco tempo a olhar as fotos de uma Guiné em
guerra. As imagens reproduzidas continham efeitos reais do conflito no terreno,
e dos seus efeitos, a par de outras imagens que passavam entretanto ao lado da
guerrilha, sendo disso exemplo os costumes da população civil.
Depois de 25 de Abril de 1974 que ditou o fim da guerra no
Ultramar, lembrei-me, um dia revisitar aquele armário “secreto” e pausadamente,
agora sem o stress antes constatado, deter-me perante as memórias que o tempo
jamais ousará esquecer. Fi-lo convicto de que tal legado poderia,
eventualmente, apresentar-se importante sempre que à tona da memória surgem
imagens de uma guerra que teimava em não dar tréguas ao mais incauto militar.
Não vou trazer à estampa imagens onde o quadro explicitado do horror da guerrilha ditou epílogos impensáveis porque, creio, que a sua visualização feriria por certo susceptibilidades humanas. A meu ver, julgo que os capítulos dos anais da história da guerra ultramarina disso fariam eco, caso a verdade apurada no terreno não fosse sujeita a um esquisito branqueamento.
Todavia, resta-me a consolação de manter no meu baú memórias inolvidáveis que continuam a fazer parte integrante do meu espólio guineense, reconhecendo porém que as fotos apresentadas foram retiradas (não digo furtadas) do arquivo de um Quartel – Gabu - que se preparava para ser entregue às forças do PAIGC.
Aqui ficam pois no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné imagens (poucas) do tempo da guerra na Guiné, condenadas a ficarem pálidas algures num qualquer esconderijo sem retorno. Camaradas, contemplem as fotografias, opinem sobre a temática visualizada e assumam que fomos de facto irreversíveis protagonistas em cenários que teimam acossar as nossas mentes.
Não vou trazer à estampa imagens onde o quadro explicitado do horror da guerrilha ditou epílogos impensáveis porque, creio, que a sua visualização feriria por certo susceptibilidades humanas. A meu ver, julgo que os capítulos dos anais da história da guerra ultramarina disso fariam eco, caso a verdade apurada no terreno não fosse sujeita a um esquisito branqueamento.
Todavia, resta-me a consolação de manter no meu baú memórias inolvidáveis que continuam a fazer parte integrante do meu espólio guineense, reconhecendo porém que as fotos apresentadas foram retiradas (não digo furtadas) do arquivo de um Quartel – Gabu - que se preparava para ser entregue às forças do PAIGC.
Aqui ficam pois no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné imagens (poucas) do tempo da guerra na Guiné, condenadas a ficarem pálidas algures num qualquer esconderijo sem retorno. Camaradas, contemplem as fotografias, opinem sobre a temática visualizada e assumam que fomos de facto irreversíveis protagonistas em cenários que teimam acossar as nossas mentes.
Aeroporto de Bissau
Em operações
Desembarque de tropas de um helicóptero
Em operações
Elementos de uma povoação organizada em autodefesa
Elementos das milícias nativas penetrando na mata
Islamizados na festa do ramadão
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
Fotos, de autor desconhecido, enviadas pelo José Saúde (Beja).
Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
28 DE JANEIRO DE 2012 > Guiné 63/74 – P9410: Memórias de Gabú (José Saúde) (22): Jovens da tabanca
Guiné 63/74 – P9584: (Ex)citações (176): Aristides Pereira e os MIGs - revelações ineditas (Nelson Herbert)
1. Mensagem do nosso tertuliano Nelson Herbert*, jornalista na Voz da América, enviada ao nosso Blogue no dia 6 de Março de 2012:
Caros Editores
Ainda na linha do debate sobre a tal "estória" dos MIGs... se existiam ou não... se estariam a caminho... em anexo envio estas duas paginas do livro "Aristides Pereira, Nossa Historia, Minha Vida" do jornalista cabo-verdiano, José Vicente Lopes, recentemente lançado em Cabo Verde. O livro (em estilo entrevista aquele líder nacionalista) resulta de meses de conversa entre o autor e Aristides Pereira, versando por assim dizer praticamente todas as zonas até há bem pouco, "sombras" da luta pela independência e pela afirmação da Guiné e Cabo Verde como estados soberanos... nomeadamente das contradições internas do PAIGC, do assassinato de Amílcar Cabral a ruptura do processo de Unidade entre os dois países.
E Aristides Pereira fê-lo de forma desabrida... quiçá para muitos de forma inconveniente. Mas diria finalmente fez-se luz sobre alguns dos controversos momentos e episódios do pré e pós independência da Guiné e Cabo Verde!
Mas voltando à "estória" dos Migs, eis o que vem registado no livro:
"JVL: - Ainda a propósito do 25 de Abril, vendo documentos portugueses dessa altura e até mesmo alguns depoimentos - caso do Salgueiro Maia, por exemplo - havia um grande temor: que o PAIGC conseguisse a aviação. Havia essa possibilidade?
Aristides Pereira: - Sim. Aliás na altura da proclamação da independência, já estavam estudantes nossos a formarem-se para pilotos de MIG e helicópteros. Tanto assim que, logo após a nossa entrada em Bissau, esses jovens regressaram e fizeram demonstrações (com Migs). Portanto já eram pilotos. Com a independência, mais tarde, esses pilotos foram desviados para a aviação civil"
Quanto ao resto, nomeadamente o incremento do apoio bélico soviético aquela guerrilha independentista (os blindados e os mísseis strela) e o que se pode ler nas páginas 212/213 da obra que envio anexadas !!!
Uma obra a todos os níveis e vertentes desse capitulo da história comum entre Portugal e essas suas duas colónias africanas, de leitura obrigatória !!!
Mantenhas
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 10 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9470: Notas de leitura (332): Quatro obras de autores africanos com interesse para a história recente de Cabo Verde e da Guiné-Bissau (Nelson Herbert)
Vd. último poste da série de 28 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 – P9546: (Ex)citações (175): Não canto loas ao inimigo para apoucar os meus (António J. P. Costa)
Caros Editores
Ainda na linha do debate sobre a tal "estória" dos MIGs... se existiam ou não... se estariam a caminho... em anexo envio estas duas paginas do livro "Aristides Pereira, Nossa Historia, Minha Vida" do jornalista cabo-verdiano, José Vicente Lopes, recentemente lançado em Cabo Verde. O livro (em estilo entrevista aquele líder nacionalista) resulta de meses de conversa entre o autor e Aristides Pereira, versando por assim dizer praticamente todas as zonas até há bem pouco, "sombras" da luta pela independência e pela afirmação da Guiné e Cabo Verde como estados soberanos... nomeadamente das contradições internas do PAIGC, do assassinato de Amílcar Cabral a ruptura do processo de Unidade entre os dois países.
E Aristides Pereira fê-lo de forma desabrida... quiçá para muitos de forma inconveniente. Mas diria finalmente fez-se luz sobre alguns dos controversos momentos e episódios do pré e pós independência da Guiné e Cabo Verde!
Mas voltando à "estória" dos Migs, eis o que vem registado no livro:
"JVL: - Ainda a propósito do 25 de Abril, vendo documentos portugueses dessa altura e até mesmo alguns depoimentos - caso do Salgueiro Maia, por exemplo - havia um grande temor: que o PAIGC conseguisse a aviação. Havia essa possibilidade?
Aristides Pereira: - Sim. Aliás na altura da proclamação da independência, já estavam estudantes nossos a formarem-se para pilotos de MIG e helicópteros. Tanto assim que, logo após a nossa entrada em Bissau, esses jovens regressaram e fizeram demonstrações (com Migs). Portanto já eram pilotos. Com a independência, mais tarde, esses pilotos foram desviados para a aviação civil"
Quanto ao resto, nomeadamente o incremento do apoio bélico soviético aquela guerrilha independentista (os blindados e os mísseis strela) e o que se pode ler nas páginas 212/213 da obra que envio anexadas !!!
Uma obra a todos os níveis e vertentes desse capitulo da história comum entre Portugal e essas suas duas colónias africanas, de leitura obrigatória !!!
Mantenhas
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 10 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9470: Notas de leitura (332): Quatro obras de autores africanos com interesse para a história recente de Cabo Verde e da Guiné-Bissau (Nelson Herbert)
Vd. último poste da série de 28 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 – P9546: (Ex)citações (175): Não canto loas ao inimigo para apoucar os meus (António J. P. Costa)
Guiné 63/74 - P9583: Blogpoesia (181): Pois que vivam os poetas, eles e elas, parqueados ou não! ... (Luís Graça)
Revisto, mais uma e outra vez, para eu poder:
(i) dedicar às duas mulheres que eu amo, a Alice e a Joana (e elas sabem porquê);
mas também (ii) assinar o livro de ponto neste dia que, infelizmente, ainda continua a ser, perdido ou não o seu sentido original, o Dia Internacional da Mulher, 8 de março de 2012... LG
Que vivam os/as Poetas do Parque dos Poetas
Poeta é quem tem
Uma estátua do Simões
No Parque dos Poetas
Mas também
As contas em dia
Nos Serviços Municipalizados
De Águas e Saneamento
De Oeiras.
Em questões de género,
Aplique-se, entretanto,
O camartelo
Camarário,
Perdão, o regulamento municipal
Em forma de soneto,
Que manda atribuir quotas
Às senhoras:
- São cotas, senhoras, são cotas!
Para o caso são três, não mais,
Que foi a conta que Deus fez:
Natália, Sophia, Florbela.
- Mas que raio de país é este,
Em que a poesia é coisa de homens!
E onde estão elas, as garças,
Graciosas como as nossas caravelas ?!-
Grita o almoxarife dos SMAS.
As senhoras, meu Deus,
Ficam sempre bem é
Nas quermesses da cidade,
Nos jogos florais,
Nos bazares da caridade,
Nas feiras e mercados,
Na vida e na tela,
Ao télélé,
Nas telenovelas,
Nos lavadouros públicos,
Na vida-de-faz-de-conta,
No passeio das virtudes,
Na despedida dos soldados,
Na partida das naus da Índia,
Nos velórios, funerais e procissões.
Nos comícios.
Nas comixões.
Um século atrás
As nossas queridas poetas
Teriam ficado à porta do parque,
Com botinha de pé alto
E saias de entrefolhos,
Com cliché tirado pelo Joshua Benoliel,
Capa na Ilustração Portuguesa,
E legenda a condizer:
"Não ficam bem as senhoras
Que se metem a doutoras".
Ou: "Freiras e frieiras,
É coçá-las e deixá-las!".
Salvou-se a Natália,
E com ela a honra do gineceu,
Ao trocar a poesia por comida
Que sempre enche a barriga:
"Senhores autarcas, sois a cidade,
E eu a cereja no cimo do bolo serei,
Não há pólis sem o parque
Dos sonhos que vos roubei".
Dantes os poetas, os machos,
De bigode farfalhudo
Ou de pálidas cores andróginas,
Íam para o Olimpo,
Laureados,
Ou para o Aljube,
Agrilhoados,
Ou para o Manicómio
Do Rilhafolhes,
Ferrados e dopados,
Ou para o Tarrafal,
Exilados,
Ou para o Sanatório,
Tuberculizados.
Para a Ilha da Madeira,
Os mais afortunados.
Ou para a Morgue,
Congelados,
Ou até para o Panteão Nacional,
Nacionalizados.
Conforme as vagas que houvesse
E o equilíbrio dos quatro humores
Do Senhor Intendente Geral.
Só a Sophia pediu para voltar,
na inscrição que deixou no Livro Sexto:
"Quando eu morrer voltarei para buscar
Os instantes que não vivi junto do mar"...
Hoje o poeta,
Ladies and Genlemen,
Não sonha nem dorme
Nos bancos de jardim,
Ocupados pelos sem abrigo,
Os desistentes,
Os repetentes,
Ou como se diz agora
Os infoexcluídos...
Hoje o poeta vai directamente
Para o Parque,
De preferência já morto,
E devidamente estatuado.
O Parque dos Poetas.
Das merendas.
Dos velhinhos
Que dão milho aos pombinhos.
Das criancinhas
Da escola, de bibe
Aos quadradinhos.
Dos desempregados
À espera do subsídio de
Desemprego
Ou do emprego virtual,
Do teletrabalho,
Da chamada do call centre,
E dos frutos da flexibilidade
Organizacional.
E a fazer contas
À puta da vida
Que está pela hora da morte.
Em vão, protestou
O Rosa,
O Ramos, o António,
Adjectivando a liberdade:
Mas que coisa horrorosa
Se ela não fosse liberdade... livre!
O Parque dos Poetas
E dos namorados,
Do arco e do balão
E das quadras
Ao Santo António,
Afrodisíaco,
Milagreiro,
Casamenteiro,
Brigão,
Brejeiro!
Porque a Poesia
Quando nasce não é
Para todos,
Terá já dito um estrangeirado,
O Conde de Oeiras
E futuro Marquês de Pombal
(Volta, Marquês, que estás perdoado!).
Homens de letras
Ou de cânones,
Os poetas lusitanos,
Míopes, nos seus fatos
Puídos e castanhos,
Cinzentões.
Só o Jorge Sena
Era engenheiro.
Naval. No papel.
Não consta que
Tivesse construido ou reparado
Embarcações.
O Torga, clínico.
O Régio, místico.
O O'Neil, publicitário,
E claro
O David Mourão-Ferreira,
Doutor de letras,
Universitário,
De capa e batina,
Mas que também escreveu fado.
E que fado!
E o Pessoa, esse, coitado,
Era escriturário comercial.
Marçanos,
Cabouqueiros,
Coveiros,
Limpa-chaminés,
Cantoneiros de limpeza,
Calafates,
Estivadores,
Mineiros,
Calceteiros,
Picheleiros
Almocreves,
Pescadores,
Barbeiros-sangradores,
Construtores civis
Ou outra gente
Dos ofícios mecânicos.
Não há nenhum,
Que se saiba,
Que conste da lista imortal.
Dos poetas imortais
Do Parque do Isaltino.
Minto: há o Alberto Caeiro,
Guardador de rebanhos.
Mas esse não vi lá,
Porque é proibido pisar a relva
E pastar. E sonhar.
E sobretudo apascentar.
Guardador de rebanhos,
Ruminador de pensamentos,
À porta da capital,
Parece mal,
Destoa.
Não dá,
Já não é para turista.
Não rima com coisa boa,
Não rima com Lisboa.
Não casa com a modernice
Da Oeiras futurista.
Quem não viu nada,
Nem assinaria o consentimento informado
Mas que riria
Até às lágrimas,
Se o pernil não tivesse já esticado,
Seria
O caixa d'óculos do O'Neil,
Agora príncipe
Do Reino da Dinamarca.
Imagino-o,
De Ombro na Ombreira,
Polidor de esquinas,
Desnalgando as gajas,
Mesmo não sendo trolha
Da construção
Nem nunca tendo ido
Para o trabalho
De lancheira na mão.
Ou de lancheira na mão
Para o trabalho,
Trocando a mão direita
E a esquerda,
A lancheira e a mão,
Baralhando e dando letras,
Subindo e descendo a Avenida
Da Liberdade
À espera talvez de uma outra vida,
Mais segura,
Ou da dita,
Que só era de nome,
Reza a história,
Por causa da Ditadura,
De má catadura,
De má memória.
Mas que pode a palavra, etérea,
De um poeta,
Surrealista, anarca,
Dizem que genial,
Mas mais que morto
E enterrado,
Contra a palavra, de pedra e cal,
De um senhor autarca,
No seu feudo, no seu horto, no seu olival?
Alguém roubou
Uma pérola do colar
Da Florbela,
Flor sofrida,
Tão excessiva em vida
Como na morte.
Alguma ninfomaníaca
Da tribo gótica,
Algum admirador secreto,
Coleccionador,
Adolescente,
Voyeurista,
Turista,
Visionário,
Cleptómano,
Antiquário,
Violador,
Sexista,
Misógino,
Detective,
Homem aranha.
Ou quiçá
Algum promotor
(I)mobiliário,
O próprio dono da obra,
O empreiteiro,
O engenheiro,
O trolha,
O arquitecto paisagista,
O ajudante do escultor,
O fiscal,
O fisco,
O contabilista,
A mulher da limpeza,
O guarda municipal,
Eu sei lá!,
O homem do lixo
Ou até o morto-vivo da guerra colonial.
Por mim, confesso,
Gostaria de ter sido
Um simples Conservador
Do Registo Predial
Como o Pessanha.
E de ter escrito,
Não a fria Clépsidra,
Mas o Caleidoscópio
Lusotropical
Em mangas de alpaca,
Na Foz do Rio das Pérolas.
Gostaria de ter sido poeta-funcionário,
Da autarquia local,
Ou do ministério da eternidade,
Com cama, mesa e roupa lavada,
Uma tença, mesada ou salário,
E ajudas de custo para poder sonhar
E ter tempo e vagar.
Gostaria de ter feito (e dito)
Um soneto,
Desenhado a letra gótica,
À mão,
À moda antiga,
Com punhos de renda,
Em papel azul, selado.
E de ter tido tempo
Para fumar ópio,
Na época das monções,
Em Macau.
E de imaginar
O eclipse total
Do Império Colonial,
Como um baralho de cartas monumental,
A desmoronar-se,
Do Minho a Timor.
Gostaria ainda de ter sido
Laureado
Pelo Prémio do SNI
Do António Ferro.
Gostaria sobretudo
De ter datilografado,
Em Courier, fonte 12,
Sem o mais pequeno erro
Nem rasura,
O Sentimento de um Ocidental
E de o ter posto no meu currículo
Existencial:
"Nas nossas ruas, ao anoitecer
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer".
Queridos/as poetas:
Em Lisboa
Nem poesia má nem prosa boa,
Dizem os críticos encartados,
Mas prefiro aquele verso,
Mais rasca,
Mais proleta,
Que evoca os construtores da cidade,
Tão bravos quanto boçais,
Às vezes até engraçados,
Vistosos nos seus fatos-macacos,
E que engrossavam as estatísticas
Dos acidentes de trabalho
Mortais:
"Semelham-se a gaiolas, com viveiros,
As edificações somente emadeiradas:
Como morcegos, ao cair das badaladas,
Saltam de viga em viga, os mestres carpinteiros".
Poeta maior da nossa modernidade menor,
Cesário, o Verde,
Não alcançou o Século
Da energia nuclear.
Da viagem à lua.
Do desastre de Cheche, no Corubal
Dos amanhãs que o outro galo cantaria.
Da Festa do Avante.
Do cimento armado.
Do motor de explosão.
Dos tsunamis revolucionários.
Das alegrias dos futebóis.
Do triunfo da ecologia
E da googlização.
Da bomba que brilhou
Mais do que mil sóis
Em Hiroshima, meu amor.
O Século dos chips
E do chispe de porco liofilizado.
Do Spínola, prussiano,
De monóculo e bengalim
Nas bolanhas da Guiné.
Da farsa da história.
Da caixinha que mudou o mundo.
E que mundo!,
Basta puxar o autoclismo
E fazer glu-glu,
Par ires parar aos buracos negros
Do admirável mundo novo virtual.
O Século, e que século!,
O dos vestidos de fru-fru.
Da aspirina e da farinha Amparo.
Da Lili e do Caneco.
Do Taylor e do Ford on the road.
Do terror de Tianannmen.
Da Nossa Senhora de Fátima de Felgueiras.
Do Luís Moita aos microfones da Emissora Nacional:
- Rapazes, não cantem o fado!
O século dos comícios da Fonte Luminosa
Ou do povão do garrafão
No Pontal do Portugal sacroprofano.
O século do Portugal de Salazar,
Prometendo eleições tão livres
Quanto a livre Inglaterra.
E do O'Neil e do Ruy Belo.
E do Millenium BCP.
O Portugal do maneta.
E o Portugal futuro.
Resta-me a Flor Bela,
Chorando a morte de Apeles,
Seu querido mano,
Oficial da Aviação Naval,
Quando os marinheiros tinham asas
E o Tejo das caravelas era um imenso porta-hidroaviões.
Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho país que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.
Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destruí
Por minhas próprias mãos de malfadada!
Se eu sempre fui assim este Mar Morto:
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram!
Caravelas doiradas a bailar...
Ai quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei à vida, e não voltaram!...
Cesário não conheceu a Amália,
Nem a Soror Saudade,
Nem a Mariza que canta a Florbela Espanca,
Nem as mulheres desta Lisboa que eu amo.
Não conheceu o Sá,
Talvez só o Mário,
Não o Soares, mas o Carneiro,
O Sá-Carneiro a fazer o pino.
Não figura por isso
No Parque do Isaltino.
[Há uma outra versão, de 6 de abril de 2008, aqui, em Luís Graça > Blogpoesia]
___________________
Nota do editor:
Último poste da série > 8 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9579: Blogpoesia (180): No Dia Internacional da Mulher, A um modelo de mulher (Felismina Costa)
(i) dedicar às duas mulheres que eu amo, a Alice e a Joana (e elas sabem porquê);
mas também (ii) assinar o livro de ponto neste dia que, infelizmente, ainda continua a ser, perdido ou não o seu sentido original, o Dia Internacional da Mulher, 8 de março de 2012... LG
Que vivam os/as Poetas do Parque dos Poetas
Poeta é quem tem
Uma estátua do Simões
No Parque dos Poetas
Mas também
As contas em dia
Nos Serviços Municipalizados
De Águas e Saneamento
De Oeiras.
Em questões de género,
Aplique-se, entretanto,
O camartelo
Camarário,
Perdão, o regulamento municipal
Em forma de soneto,
Que manda atribuir quotas
Às senhoras:
- São cotas, senhoras, são cotas!
Para o caso são três, não mais,
Que foi a conta que Deus fez:
Natália, Sophia, Florbela.
- Mas que raio de país é este,
Em que a poesia é coisa de homens!
E onde estão elas, as garças,
Graciosas como as nossas caravelas ?!-
Grita o almoxarife dos SMAS.
As senhoras, meu Deus,
Ficam sempre bem é
Nas quermesses da cidade,
Nos jogos florais,
Nos bazares da caridade,
Nas feiras e mercados,
Na vida e na tela,
Ao télélé,
Nas telenovelas,
Nos lavadouros públicos,
Na vida-de-faz-de-conta,
No passeio das virtudes,
Na despedida dos soldados,
Na partida das naus da Índia,
Nos velórios, funerais e procissões.
Nos comícios.
Nas comixões.
Um século atrás
As nossas queridas poetas
Teriam ficado à porta do parque,
Com botinha de pé alto
E saias de entrefolhos,
Com cliché tirado pelo Joshua Benoliel,
Capa na Ilustração Portuguesa,
E legenda a condizer:
"Não ficam bem as senhoras
Que se metem a doutoras".
Ou: "Freiras e frieiras,
É coçá-las e deixá-las!".
Salvou-se a Natália,
E com ela a honra do gineceu,
Ao trocar a poesia por comida
Que sempre enche a barriga:
"Senhores autarcas, sois a cidade,
E eu a cereja no cimo do bolo serei,
Não há pólis sem o parque
Dos sonhos que vos roubei".
Dantes os poetas, os machos,
De bigode farfalhudo
Ou de pálidas cores andróginas,
Íam para o Olimpo,
Laureados,
Ou para o Aljube,
Agrilhoados,
Ou para o Manicómio
Do Rilhafolhes,
Ferrados e dopados,
Ou para o Tarrafal,
Exilados,
Ou para o Sanatório,
Tuberculizados.
Para a Ilha da Madeira,
Os mais afortunados.
Ou para a Morgue,
Congelados,
Ou até para o Panteão Nacional,
Nacionalizados.
Conforme as vagas que houvesse
E o equilíbrio dos quatro humores
Do Senhor Intendente Geral.
Só a Sophia pediu para voltar,
na inscrição que deixou no Livro Sexto:
"Quando eu morrer voltarei para buscar
Os instantes que não vivi junto do mar"...
Hoje o poeta,
Ladies and Genlemen,
Não sonha nem dorme
Nos bancos de jardim,
Ocupados pelos sem abrigo,
Os desistentes,
Os repetentes,
Ou como se diz agora
Os infoexcluídos...
Hoje o poeta vai directamente
Para o Parque,
De preferência já morto,
E devidamente estatuado.
O Parque dos Poetas.
Das merendas.
Dos velhinhos
Que dão milho aos pombinhos.
Das criancinhas
Da escola, de bibe
Aos quadradinhos.
Dos desempregados
À espera do subsídio de
Desemprego
Ou do emprego virtual,
Do teletrabalho,
Da chamada do call centre,
E dos frutos da flexibilidade
Organizacional.
E a fazer contas
À puta da vida
Que está pela hora da morte.
Em vão, protestou
O Rosa,
O Ramos, o António,
Adjectivando a liberdade:
Mas que coisa horrorosa
Se ela não fosse liberdade... livre!
O Parque dos Poetas
E dos namorados,
Do arco e do balão
E das quadras
Ao Santo António,
Afrodisíaco,
Milagreiro,
Casamenteiro,
Brigão,
Brejeiro!
Porque a Poesia
Quando nasce não é
Para todos,
Terá já dito um estrangeirado,
O Conde de Oeiras
E futuro Marquês de Pombal
(Volta, Marquês, que estás perdoado!).
Homens de letras
Ou de cânones,
Os poetas lusitanos,
Míopes, nos seus fatos
Puídos e castanhos,
Cinzentões.
Só o Jorge Sena
Era engenheiro.
Naval. No papel.
Não consta que
Tivesse construido ou reparado
Embarcações.
O Torga, clínico.
O Régio, místico.
O O'Neil, publicitário,
E claro
O David Mourão-Ferreira,
Doutor de letras,
Universitário,
De capa e batina,
Mas que também escreveu fado.
E que fado!
E o Pessoa, esse, coitado,
Era escriturário comercial.
Marçanos,
Cabouqueiros,
Coveiros,
Limpa-chaminés,
Cantoneiros de limpeza,
Calafates,
Estivadores,
Mineiros,
Calceteiros,
Picheleiros
Almocreves,
Pescadores,
Barbeiros-sangradores,
Construtores civis
Ou outra gente
Dos ofícios mecânicos.
Não há nenhum,
Que se saiba,
Que conste da lista imortal.
Dos poetas imortais
Do Parque do Isaltino.
Minto: há o Alberto Caeiro,
Guardador de rebanhos.
Mas esse não vi lá,
Porque é proibido pisar a relva
E pastar. E sonhar.
E sobretudo apascentar.
Guardador de rebanhos,
Ruminador de pensamentos,
À porta da capital,
Parece mal,
Destoa.
Não dá,
Já não é para turista.
Não rima com coisa boa,
Não rima com Lisboa.
Não casa com a modernice
Da Oeiras futurista.
Quem não viu nada,
Nem assinaria o consentimento informado
Mas que riria
Até às lágrimas,
Se o pernil não tivesse já esticado,
Seria
O caixa d'óculos do O'Neil,
Agora príncipe
Do Reino da Dinamarca.
Imagino-o,
De Ombro na Ombreira,
Polidor de esquinas,
Desnalgando as gajas,
Mesmo não sendo trolha
Da construção
Nem nunca tendo ido
Para o trabalho
De lancheira na mão.
Ou de lancheira na mão
Para o trabalho,
Trocando a mão direita
E a esquerda,
A lancheira e a mão,
Baralhando e dando letras,
Subindo e descendo a Avenida
Da Liberdade
À espera talvez de uma outra vida,
Mais segura,
Ou da dita,
Que só era de nome,
Reza a história,
Por causa da Ditadura,
De má catadura,
De má memória.
Mas que pode a palavra, etérea,
De um poeta,
Surrealista, anarca,
Dizem que genial,
Mas mais que morto
E enterrado,
Contra a palavra, de pedra e cal,
De um senhor autarca,
No seu feudo, no seu horto, no seu olival?
Alguém roubou
Uma pérola do colar
Da Florbela,
Flor sofrida,
Tão excessiva em vida
Como na morte.
Alguma ninfomaníaca
Da tribo gótica,
Algum admirador secreto,
Coleccionador,
Adolescente,
Voyeurista,
Turista,
Visionário,
Cleptómano,
Antiquário,
Violador,
Sexista,
Misógino,
Detective,
Homem aranha.
Ou quiçá
Algum promotor
(I)mobiliário,
O próprio dono da obra,
O empreiteiro,
O engenheiro,
O trolha,
O arquitecto paisagista,
O ajudante do escultor,
O fiscal,
O fisco,
O contabilista,
A mulher da limpeza,
O guarda municipal,
Eu sei lá!,
O homem do lixo
Ou até o morto-vivo da guerra colonial.
Por mim, confesso,
Gostaria de ter sido
Um simples Conservador
Do Registo Predial
Como o Pessanha.
E de ter escrito,
Não a fria Clépsidra,
Mas o Caleidoscópio
Lusotropical
Em mangas de alpaca,
Na Foz do Rio das Pérolas.
Gostaria de ter sido poeta-funcionário,
Da autarquia local,
Ou do ministério da eternidade,
Com cama, mesa e roupa lavada,
Uma tença, mesada ou salário,
E ajudas de custo para poder sonhar
E ter tempo e vagar.
Gostaria de ter feito (e dito)
Um soneto,
Desenhado a letra gótica,
À mão,
À moda antiga,
Com punhos de renda,
Em papel azul, selado.
E de ter tido tempo
Para fumar ópio,
Na época das monções,
Em Macau.
E de imaginar
O eclipse total
Do Império Colonial,
Como um baralho de cartas monumental,
A desmoronar-se,
Do Minho a Timor.
Gostaria ainda de ter sido
Laureado
Pelo Prémio do SNI
Do António Ferro.
Gostaria sobretudo
De ter datilografado,
Em Courier, fonte 12,
Sem o mais pequeno erro
Nem rasura,
O Sentimento de um Ocidental
E de o ter posto no meu currículo
Existencial:
"Nas nossas ruas, ao anoitecer
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer".
Queridos/as poetas:
Em Lisboa
Nem poesia má nem prosa boa,
Dizem os críticos encartados,
Mas prefiro aquele verso,
Mais rasca,
Mais proleta,
Que evoca os construtores da cidade,
Tão bravos quanto boçais,
Às vezes até engraçados,
Vistosos nos seus fatos-macacos,
E que engrossavam as estatísticas
Dos acidentes de trabalho
Mortais:
"Semelham-se a gaiolas, com viveiros,
As edificações somente emadeiradas:
Como morcegos, ao cair das badaladas,
Saltam de viga em viga, os mestres carpinteiros".
Poeta maior da nossa modernidade menor,
Cesário, o Verde,
Não alcançou o Século
Da energia nuclear.
Da viagem à lua.
Do desastre de Cheche, no Corubal
Dos amanhãs que o outro galo cantaria.
Da Festa do Avante.
Do cimento armado.
Do motor de explosão.
Dos tsunamis revolucionários.
Das alegrias dos futebóis.
Do triunfo da ecologia
E da googlização.
Da bomba que brilhou
Mais do que mil sóis
Em Hiroshima, meu amor.
O Século dos chips
E do chispe de porco liofilizado.
Do Spínola, prussiano,
De monóculo e bengalim
Nas bolanhas da Guiné.
Da farsa da história.
Da caixinha que mudou o mundo.
E que mundo!,
Basta puxar o autoclismo
E fazer glu-glu,
Par ires parar aos buracos negros
Do admirável mundo novo virtual.
O Século, e que século!,
O dos vestidos de fru-fru.
Da aspirina e da farinha Amparo.
Da Lili e do Caneco.
Do Taylor e do Ford on the road.
Do terror de Tianannmen.
Da Nossa Senhora de Fátima de Felgueiras.
Do Luís Moita aos microfones da Emissora Nacional:
- Rapazes, não cantem o fado!
O século dos comícios da Fonte Luminosa
Ou do povão do garrafão
No Pontal do Portugal sacroprofano.
O século do Portugal de Salazar,
Prometendo eleições tão livres
Quanto a livre Inglaterra.
E do O'Neil e do Ruy Belo.
E do Millenium BCP.
O Portugal do maneta.
E o Portugal futuro.
Resta-me a Flor Bela,
Chorando a morte de Apeles,
Seu querido mano,
Oficial da Aviação Naval,
Quando os marinheiros tinham asas
E o Tejo das caravelas era um imenso porta-hidroaviões.
Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho país que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.
Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destruí
Por minhas próprias mãos de malfadada!
Se eu sempre fui assim este Mar Morto:
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram!
Caravelas doiradas a bailar...
Ai quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei à vida, e não voltaram!...
Cesário não conheceu a Amália,
Nem a Soror Saudade,
Nem a Mariza que canta a Florbela Espanca,
Nem as mulheres desta Lisboa que eu amo.
Não conheceu o Sá,
Talvez só o Mário,
Não o Soares, mas o Carneiro,
O Sá-Carneiro a fazer o pino.
Não figura por isso
No Parque do Isaltino.
[Há uma outra versão, de 6 de abril de 2008, aqui, em Luís Graça > Blogpoesia]
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Nota do editor:
Último poste da série > 8 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9579: Blogpoesia (180): No Dia Internacional da Mulher, A um modelo de mulher (Felismina Costa)
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