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quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19215: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (61): os reordenamentos no desenvolvimento sócio-económico das populações, brochura da Repartição de Assuntos Civis e Acção Psicológica [ACAP], do QG / CCFAG - III (e última) Parte


Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 ( Bambadinca) > Xime > Cais fluvial do Xime >1970 > 2º Gr Comb da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) >  Ao centro, em segundo plano, de óculos escuros e boné azul (da FAP),  o fur mil op esp Humberto Reis, cujo grupo de combate estava encarregue de escoltar o transporte de milhares de rachas de cibe, desembarcadas no cais do Xime, e destinadas ao reordenamento de Nhabijões, um dos maiores da época (iniciado com o BCAÇ 2852, 1968/70, e continuado com o BART 2917, 1970/72)... 

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luis Graça & Camaradas da Guiné]


Já não nos lembramos quantas rachas de cibe levava uma casa... Só a estrutura do telhado, com cobertura de folha de zinco, deveria levar pelo menos umas 20... Mais outro lado, para suportar o telhado ao longo do varandim a toda a volta.. O total de casas em construção era de 350, fora os equipamentos coletivos ou sociais...  Na altura falava-se que cada racha de cibe ficava ao exército em 7$50 (sete pesos e meio)... Um total de 15 mil rachas de cibe,  é nossa estimativa do material transportado do Xime para Nhabijões, com um custo direto de mais 100 contos.  (A preços de hoje, seria qualquer coisa como 30 mil euros)... Fora as chapas de zinco, as portas e janelas, as ferragens, o cimento... O resto, a mão de obra (civil e militar), os transportes, a segurança, etc.  era de borla. Tudo em nome de uma "Guiné Melhor"... Ao que consta, o sucessor de Spínola não terá tido a mesma abundância de dinheiro para continuar a fazer a "psico"... 

O PAIGC não gostou da brincadeira: em 13 de janeiro de 1971, as NT acciona duas potentes minas A/C à saída do reordenamento, de que resultaram 1 morto e bastantes feridos graves... Em outubro de 1973,  ela primeira vez na história da guerra, o grande reordenamento de Nhabijões, de maioria balanta, foi flagelado, ao mesmo tempo que o destacamento do Mato Cão;

Nhabijões, no subsetor de Bambadinca, era então um importante aglomerado habitado por gente com parentes no "mato", e que era tradicionalmente considerado, antes do reordenamento,. como um conjunto de núcleos habitacionais ribeirinhos "sob duplo controlo".  Só a CCAÇ12 (, baseada em soldados do recrutamento), deu 1 alferes, 1 furriel e 1 cabo (metropolitanos) e 1 soldado (guineense) para integrar a equipa técnica do reordenamento de Nhabijões... E destacava periodicamente militares para a sua defesa... E os Nhabijões foram "regados com o nosso sangue"...

Estima-se que, entre 1969 e 1974, as Forças Armadas no CTIG tenham construidos 8 mil casas, no total das tabancas reordenadas... Admitindo que cada casa, com chapa de zinco, levasse pelo menos 50 rachas de cibe, temos um total de 400 mil rachas de cibe, com um custo de 3 mil contos (a preços de 1972  representariam hoje mais de 700 mil euros...).  Os ministros da Defesa, do Ultramar e das Finanças tramaram a política spinolista "Por Uma Guiné Melhor"...

Quer se goste ou não, há uma Guiné antes e depois de Spínola... Quando ele chega em meados de 1968, o território tinha 60 quilómetros de estrada alcatroada... Cinco anos depois, são 550 km. No ano escolar de 1970/71, a tropa administra 127 das 298 escolas primárias do território, ou seja cerca de 43%., O resto eram as escolas oficiais , como a de Bambadinca (30%)  e as escolas das Missões Católicas (27%)... 

Spínola deixa o território com uma criança em cada três, em idade escolar, a frequentar a escola... O despotismo iluminado de Spínola foi uma ameaça série ao PAIGC... Mas homens como Spínola ou Sarmento Rodrigues foram exceções na história da administração do império colonial português...





Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CCAÇ 2769 (Gadamael e Quinhamel, de janeiro de 1971 a outubro de 1972) > Vista aérea de Gadamael Porto ( reordenamento, com o quartel à direita, em primeiro plano) nos finais do ano de 1971. Foto do cor art ref António Carlos Morais da Silva, e por ele gentilmente cedida ao nosso camarada Manuel Vaz (*)

Foto: © Morais da Silva (2012) Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Guiné > Região de Tombali > Cufar > Matofarroba > Tabanca > 1973 > O alf mil inf Luís Mourato Oliveira, da CCAÇ 4740 (Cufar, 1973) (à direita do condutor)  e o alf mil médico (, o condutor do jipe,  e cuja identidade desconhecemos) em visita ao reordenamento feito pelas NT e pela população.  Matofarroba ficava nas proximidades de Cufar, a cerca de 2/3 km.

Foto: © Luís Mourato Oliveira  (2016) Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Capa da brochura "Os reordenamentos no desenvolvimento sócio-económico das populações". Província da Guiné, Bissau: QG/CCFAG [Quartel General do Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné]. Repartição AC/AP [, Assuntos Civis e Acção Psicológica]. s/d.

Foto: © A. Marques Lopes / António Pimentel (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Na sequência do poste P19196 (**), decidimos reproduzir o documento supracitado, que nos chegou, em tempos, pela mão dos nossos camaradas António Pimentel e A. Marques Lopes, e que já foi publicado, no nosso blogue em 2007 (***) , com revisão e fixação de texto do nosso coeditor Virgínio Briote.  

Esta é a III (e última) Parte (****). Esperamos que o A. Marques Lopes que nos confirme: 

(i) o número de páginas da brochura (em princípio, 9 páginas); 

e (ii) se o texto foi publicado na íntegra na altura. 

Uma ou outra palavra está ilegível. A resolução da imagem dos mapas (nºs 1 e 2) precisa de ser melhorada.

Por outro lado, estamos a  pedir aos nossos leitores, amigos e camaradas da Guiné, que nos disponibilizem textos, fotografias e outros documentos sobre os reordenamentos populacionais. Tanto quanto sabemos, não há trabalhos académicos publicados sobre este tópico. Muitos de nós estiveram envolvidos, direta ou indiretamente, nos reordenamentos populacionais no TO da Guiné, nomeadamente no tempo do Com-Chefe e Governador Geral António Spínola (1968-1973).

Gostávamos de poder fazer um levantamento de todos os reordenamentos populacionais realizados ma Guiné, durante toda a guerra. E idenficar os nossos camaradas que integraram as equipas técnicas dos reordenamentos (graduados e praças) (, caso. por exemplo, do Luís R. Moreira) e que no BENG 447 planearam, coordenaram, apoiaram e/ou supervisionaram a construação de reordenamentos (caso,. pro exemplo, do Fernando Valente Magro).


Reprodução do documento [Revisão e fixação de texto: VB / LG].
   
IMPORTÂNCIA SOCIAL E ECONÓMICA DOS REORDENAMENTOS

 (pag. 6/9) (Continuação)


5. Não devendo em princípio existir um carácter de obrigatoriedade quanto à deslocação das populações das suas tabancas para um aldeamento, a não ser que o interesse comunitário superiormente o determine, há que empregar meios persuasivos quando se encontre alguma resistência. Para se criar ...[ilegível]

Esquematicamente vemos, assim:

Antes da construção:

  • auscultação das populações (indirecta, directa); 
  • auscultação e elucidação do Chefe da Tabanca; 
  • auscultação e elucidação do Guarda de Irã;
  • auscultação e elucidação das autoridades religiosas islâmicas.

Durante a construção:

  • garantir a autoridade constituída; 
  • garantir, tanto quanto possível, os interesses da localização dos aglomerados correspondentes às antigas tabancas, dentro do plano urbanístico; 
  • respeitar os usos e costumes das populações;
  • colaborar no transporte de todos os haveres das populações deslocadas;
  • interessar as populações na construção das casas, escolas, postos sanitários, etc., permitindo e desenvolvendo o sentimento de posse. 

6. A forma mais prática de se assegurar o deslocamento das populações para os reordenamentos é criar nelas a necessidade desse reordenamento. Para isso é necessário elucidá-las dos benefícios que vão auferir e garantir os seus desejos quanto a aspectos respeitantes aos seus usos e costumes. Será de toda a conveniência o conhecimento das suas motivações religiosas e étnicas. 

Nos quadros anteriores já foi feito um esquema suficientemente desenvolvido. Em novo quadro, indicar-se-ão as principais motivações a explorar para um útil e efectivo trabalho de consciencialização das populações.

1.BENEFíCIOS SOCIAIS

  • melhores casas;
  • escolas;
  • postos de socorros; 
  • assistência médica; 
  • água.

2. BENEFíCIOS ECONÓMICOS

  • melhores lavras;
  • celeiros colectivos;
  • mercado para escoamento da produção; 
  • lojas.

ISLAMIZADOS

Fulas

  • construção de mesquitas;
  • difundir a religião; 
  • os régulos governarão melhor com toda a população junta; 
  • os fulas têm de voltar a ser senhores dos seu "chão" que o IN quer roubar;
  • os antepassados foram valentes. 

Mandingas

  • construção de mesquitas;
  • difundir a religião; 
  • os chefes poderão dirigir melhor; 
  • as novas tabancas poderão ter lojas e fazerem comércio para terem riqueza; 
  • os antigos foram valentes e têm de os saber imitar.

ANIMISTAS

Balantas

  • terão maior protecção dos Irãs; 
  • o Balanta terá a liberdade na tabanca e no mato, que o IN impede; 
  • o Balanta vai deixar de ser escravo do IN; 
  • os Balantas juntos têm força para exterminar o IN;
  • haverá sempre muita fartura. 

Manjacos

  • terão maior protecção dos Irãs; 
  • juntos terão muita força;
  • impedirão o roubo de mulheres quando estiverem juntos; 
  • poderão fazer comércio;
  • cada família poderá ter os seu Irã. 

Brames
  • terão maior protecção dos Irãs; 
  • o régulo governará melhor; 
  • vão ter mais vacas para estrumar as terras e para o choro; 
  • os Brames não terão necessidade de emigrar porque nada lhes faltará; 
  • o IN quer escravizá-los e não o poderá fazer estando todos juntos.

[Fim do documento, de 9 páginas]
_________

Notas do editor:


(*) Vd. poste de 22 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9936: Memórias da CCAÇ 798 (Manuel Vaz) (9): Uma perspectiva a partir de Gadamael Porto - 65/67 - VII Parte - Evolução da situação militar - Anexo IV

(**) Vd. poste de 5 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19196: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (58): os reordenamentos populacionais (Francesca Vita, doutoranda em arquitetura, Faculdade de Arquitetura, Universidade do Porto)

(***) Vd. postes de:
12 de setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2100: A Política da Guiné Melhor: os reordenamentos das populações (1) (A. Marques Lopes / António Pimentel)

16 de setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2108: A Política da Guiné Melhor: os reordenamentos das populações (2) (A. Marques Lopes / António Pimentel)

(****) Últimos dois postes da série:

20 de novembro de 2018 > Guiiné 61/74 - P19213: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (59): os reordenamentos no desenvolvimento sócio-económico das populações, brochura da Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológioco [ACAP], do QG / CCFAG - Parte I

21 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19214: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (60): os reordenamentos no desenvolvimento sócio-económico das populações, brochura da Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológioco [ACAP], do QG / CCFAG - Parte II

terça-feira, 6 de dezembro de 2005

Guné 63/74 - P324: Antologia (31): Socioantropologia dos povos da Guiné (1971) (Sousa de Castro)

Guiné > Xime > 1972: O Sousa de Castro no seu posto de trabalho, operando o Rádio AN-GRC 9.

"O AN-GRC 9 foi o rádio com que trabalhei durante toda a comissão na Guiné em grafia... Não é para me gabar, mas eu achava-me um craque nesta matéria, trabalhar em código morse era comigo, ou não tivesse na minha caderneta a menção de TE (telegrafista especial)" (1)

© Sousa de Castro (2005)

Texto seleccionado sobre o "aspecto humano" da Guiné e enviado pelo Sousa de Castro (ex-1º cabo de transmissões, CART 3494 / BART 3873, Xime e Mansambo, Sector L1, Zona Leste, 1972/74).

Deixem-me dizer-vos que eu tenho um especial carinho pelo Castro: é o sócio-fundador desta tertúlia (2)... Sinto que às vezes não lhe dou a devida atenção! Castro, desculpa lá qualquer coisinha! L.G.

Alguns dados curiosos retirados da monografia da Guiné editados em 1971 pelo Estado-Maior do Exército com o título MISSÃO NA GUINÉ . Composto e impresso nas Oficinas Gráficas da SPEME. Sousa de Castro

O Rádio AN-GRC-9. Foto gentilmente disponibilizada pelo nosso camarada Afonso M. F. Sousa, que vive actualmente em Maceda, Ovar, ex-Furriel Miliciano de Transmissões da CART 2412; esteve na região do Cacheu (Bigene, Binta, Guidage e Barro), entre Agosto de 1968 e Maio de 1970.


ASPECTO HUMANO

População

A população da Guiné era, segundo o censo de 1960, de 544.184 habitantes o que representava um aumento de 33.407 habitantes em relação ao censo de 1950. É característica na Província a diversidade étnica dos seus habitantes (3).

Não falando já dos não autóctones – brancos, mestiços, cabo-verdianos e libaneses, na sua grande maioria – num total aproximado de 15.000, a população autóctone (nativa) guineense apresenta uma grande variedade de tipos, correspondentes a diferentes grupos étnicos (tribos), entre as quais as principais são:

- Balantas (quantitativo referido a 1962 – 150 000).

Habitam entre os rios Geba e Cacheu, com uma ramificação importante na região de Catió-Bedanda, no Sul da Província.

Dotados de boa condição física, são trabalhadores, valentes, enérgicos, com grande força de vontade e viva inteligência.

Bons agricultores, vão buscar à terra, principalmente às regiões alagadas («bolanhas»), os meios de subsistência de que necessitam. Alimentam-se de arroz, azeite de palma, milho e mandioca; apreciam muito a carne, o peixe e os mariscos.

O gado bovino que possuem destinam-no às cerimónias de sacrifício dos ritos que acompanham os funerais («choros»).

Guiné > Cacheu > Barro > CCAÇ 3 > 1968> Militares, de origem balanta, pertecentes à CCAÇ 3.

© A. Marques Lopes (2005)

Condenam o celibato. Extremamente supersticiosos, acreditam na transfiguração da alma, atribuindo à feitiçaria todas as suas desgraças.

Praticam o roubo, em especial de gado, com a consciência de um acto não criminoso, mas sim revelador da perícia própria da tribo. São animistas.

- Fulas (Fulas-Forros e Fulas-Pretos) (120 000).

Povoam o Nordeste da Guiné, a região do Gabu, Bafatá e Forreá.

Os primeiros fulas a entrar na Província foram os fulas-forros, que subjugaram e escravizaram grande número de mandingas, a quem designaram por fulas-pretos.
De um modo geral, são hospitaleiros, considerando mesmo a hospitalidade como um dever sagrado.

Apesar da influência que o islamismo tem entre eles, praticam também o animismo.
Dedicam-se ao cultivo do arroz, sem grande entusiasmo, milho e amendoim e à pesca, à linha ou por envenenamento das águas.

Do gado que criam, considerando como um sinal de prestígio apenas aproveitam o leite para sua alimentação.

- Futa-Fulas (10 000).

Povoam grande parte da região do Boé.

Nos futa-fulas, originários do Futa Djalon, donde lhes veio o nome, não existe unidade de tipo, apresentando as mais diversas características, e, normalmente, a face marcada pr dupla incisão vertical que faz lembrar o n.º 11.

Consideram-se, em tudo, superiores aos restantes fulas.

De elevada estatura, argutos e inteligentes, dedicam-se à agricultura, à criação de gado e ao comércio ambulante. Alimentam-se de arroz, de «fundo» (tipo de cereal semelhante à alpista) e de toda a variedade de frutos. Comem carne, com excepção da do porco, e não bebem vinho por a sua religião (o islamismo) o não permitir.

São polígamos, embora predominem os casamentos com uma só mulher. São islamizados.

- Manjacos (65 000).

Habitam a região compreendida entre o rio Cacheu e a ria de Mansoa e as ilhas de Jeta e de Pecixe.

Um balanta (Kumba Alà) e um papel (Nino Vieira, recentemente regressado do exílio e logo a seguir eleito Presidente da República).

Foto: Blogue Africanidades, do nosso amigo © Jorge Neto (2005)

São curiosos, astutos, dedicados, hospitaleiros, com perfeita compreensão dos princípios morais e de justiça, preocupando-se em adquirir hábitos civilizados.
Têm certa tendência para o comércio e aptidão para as tarefas marítimas.

Dedicam-se ao cultivo do arroz, exploração de palmares, pesca e extracção do sal.

São animistas.

- Mandingas (60 000).

Habitam na região de Farim, Óio, Bafatá e Gabú.

São sóbrios, inteligentes, observadores, aguerridos, alegres e comunicativos.

Com preceitos morais que os colocam acima das outras tribos, admitem o regime de castas (nobres, ferreiros – com uma importância muito especial -, ourives, sapateiros, etc.). As profissões passam obrigatoriamente de pais para filhos e os casamentos só se realizam entre membros de famílias de nobres, ferreiros, ourives, sapateiros, etc.

Dedicam-se à cultura do milho, mas comercialmente o produto mais importante é a mancarra.

O islamismo não fez desaparecer entre eles as práticas animistas.

- Papéis (40 000).

Povoam a ilha de Bissau.

São aguerridos, enérgicos, decididos, desconfiados e nadas expansivos. Tal como os manjacos, têm certa aptidão para as práticas marítimas. Alimentam-se de arroz, mandioca, batata-doce, milho, «fundo» e peixe seco.

Dedicam-se à agricultura (arroz mancarra, em especial) e ao trabalho de carregador nos centros urbanos. São animistas.

- Beafadas (13 500).

Habitam a região de Quinara. Embora robustos, são indolentes por natureza. Progressivamente islamizados, mantêm-se, ainda, agarrados às práticas animistas.

- Brames (ou Mancanhas) 12 500.

Vivem nos regulados do Có e Bula, na ilha de Bissau, na ilha de Bolama e na região continental fronteira a esta ultima ilha.

Têm grandes afinidades com os mandingas e fulas, de quem descendem por cruzamento.
São inteligentes e assimilam com facilidade os usos e costumes dos europeus.

Consideram como delitos de somenos importância, quando não mesmo louváveis, o falso testemunho, as ofensas corporais, o estupro, a violação e o adultério. Veneram o «Irã».

Dedicam-se, sobretudo, à cultura do milho e da mancarra.

- Bijagós (12 500).

Povoam o arquipélago de Bijagós. São tímidos, belicosos e desconfiados. Vivendo constantemente no mar, são excelentes marinheiros.

Em questões de namoro e de casamento, a escolha é feita pela mulher, que os bijagós têm na conta de um ser superior.

São hábeis artistas na escultura da madeira e dedicam-se à pesca e à extracção do sal.

- Felupes (6000).

Habitam na região de Varela e Susana.

São fortes e ágeis, praticantes entusiastas do exercício físico. Bons atiradores de azagaia e flechas, cujas pontas envenenam, dedicam-se à caça. São animistas.

Consideram falta muito grave a união da mulher felupe com um nativo de tribo diferente (4).

- Baiotes (5500).

Habitam ao norte do rio Cacheu, no extremo ocidental da Província. Têm grandes afinidades com os felupes, pois constituem com eles o grupo étnico dos diolas. A diferençá-los apenas existe um dialecto diferente e a sua distribuição geográfica.

São animistas.

- Nalus (5500).

Habitam as regiões do Tombali e de Cacine.

São pouco robustos e de estatura média. Muito individualistas, recusam-se a manter relações com as tribos vizinhas. Têm um conceito perfeito da justiça. Encontram-se em grande parte islamizados.

- Sossos (2000).

Constituem um ramo dos mandingas. São islamizados e têm grandes afinidades com as populações fronteiriças.

Todos os grupos étnicos da Guiné praticam a poligamia, embora existam em maior percentagem lares monógamos. O maior número de lares monógamos encontra-se nos Felupes, Cassangas e Futa-Fulas, que atingem uma percentagem superior a 70%. As menores percentagens de lares monógamos encontram-se entre os Beafadas e os Mandingas.

A poligamia praticada incide na bigamia. São insignificantes as percentagens de lares com mais de 4 esposas.

Entre as tribos guineenses existem para cima de 20 línguas e dialectos diferentes.
Introduzido pelos primeiros colonos e aceite facilmente pelos nativos, fala-se também o crioulo, que não é mais que uma mistura de palavras portuguesas (algumas muito antigas) e palavras das línguas e dialectos locais.

O crioulo permite aos nativos entenderem-se entre si.

O povoamento da Guiné é muito irregular, verificando-se serem regiões do litoral e as regiões vizinhas de Farim e Bafatá (os dois principais centros de comunicação da Província) as mais habitadas, e as do Boé e do sueste do Óio as menos habitadas.
________

Notas de L.G.

(1) Vd post de 2 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - XCIV: Um alfa bravo para os nossos Op TRMS (1)

(2) Vd. post de 20 de Abril de 2005 > Guiné 69/71 - V: Convívio de antigos camaradas de armas de Bambadinca. Eis um excerto do que então escrevi:

"Sei que o BART 2917 [Bambadinca, 1970/72] e as respectivas companhias de quadrícula[Xime, Mansambo e Xitole] foram rendidas em Janeiro de 1972. Ainda ontem recebi um e-mail de um camarada dessa época (que obviamente não conheci, já que regressei a casa em Março de 1971). Trata-se do Xime [e depois em Mansambo]. O meu Batalhão estava em Bambadinca, BART 3873 (CCS), com a CART 3494 no Xime, a CART 3493 em Mansambo e a CART 3492 no Xitole.

"No meu tempo o Xime continuava muito complicado. Como descreve no seu blogue, nas estórias de um tuga, continuamos com esta terra na cabeça, nunca mais nos sai e eu continuo buscando algo sobre aquele tempo passado relacionado com a guerra. Tenho reenviado a sua estória para colegas que estiveram na Guiné e é uma forma de dizermos que estamos vivos. Bem haja. Cumprimentos, Sousa de Castro".

"O Sousa de Castro e todos os periquitos que estiveram em Bambadinca, Xime, Mansambo ou Xitole, entre Janeiro de 1972 e Abril de 1974, serão bem vindos à nossa [CCAÇ 12 e BCAÇ 2852] festa, no dia 11 de Junho, em Faro, na Ria Formosa. Eles terão muito para nos contar: afinal, andámos todos pelos sítios, picadas, rios e bolanhas do Sector L1 da Zona Leste, desde 1968 a 1974... E quer queiramos quer não, aquela terra marcou-nos a todos, a ferro e fogo, no corpo e na alma"...

(3) Vd. Guinée-Bissau.net > le site officiel des amoureux de la Guinée-Bissau e, em especial, a página dedicada aos seus grupos étnicos (em francês) .

(4) Sobre os felupes e os balantas, ver a opinião (qaulificada) do nosso camarada Carlos Fortunato, na sua página sobre a CCAÇ 13 - Os Leões Negros (ele não esconde a sua admiração tanto por uns como por outros, mas noutra ocasião, por e-mail, referiu-me que em provas físicas, na luta corpo-a-corpo, nunca viu um balanta ganhar a um felupe):

"Adversários temíveis, os felupes possuem elevada estatura e grande robustez física. São referidos como praticantes do canibalismo no passado, são coleccionadores de cabeças dos seus inimigos que entregam ao feiticeiro e usam com extraordinária perícia arcos com setas envenenadas.

"Embora se assegure que o canibalismo pertence ao passado, não era essa a opinião das restantes etnias, as quais referem igualmente que estes fazem os seus funerais à meia noite, pendurando caveiras nas copas das árvores, e dançando debaixo delas. O felupe é conhecido como pouco hospitaleiro para com as restantes etnias, pelo que existe da parte destas um misto de animosidade e desconhecimento.

"Os felupes são igualmente grandes lutadores, fazendo da luta a sua paixão. Este desporto tão vulgarizado nesta etnia, prende-o, empolga-o, constituindo o mais desejado espectáculo.

"Este grupo de felupes é famoso pela sua combatividade, a qual não conhece fronteiras, fazendo incursões frequentes no Senegal. As notícias que chegaram depois da independência é que foram todos mortos pelo PAIGC.

"Os balantas são a principal etnia da Guiné, sendo igualmente grandes soldados, trazem consigo uma grande experiência e o conhecimento do terreno, muitos deles foram milícias durante muitos anos, outros foram carregadores, outros ainda lutaram ou lutavam no PAIGC. Possuem contudo um sentimento de lealdade e solidariedade que faz com que assumam uma posição e a mantenham, a palavra traição nunca fez parte do seu vocabulário.

"Os balantas são trabalhadores rurais, que usam enxadas em forma de de remo, são conhecidos pela sua habilidade como ladrões, actividade que faz parte da sua cultura.

"Roubar não é um crime para o balanta, mas uma prova de destreza, que todo o adulto que se preza deve fazer pelo menus uma vez na vida, e se for uma vaca é sem dúvida uma grande proeza.

"O que mais surpreende nestas pessoas, é algumas das suas capacidades, pois possuem sentidos muito desenvolvidos, tais como o cheiro, a visão e o ouvido.

"Penso que foi graças às qualidades e conhecimentos dos balantas que foi possível, conseguirmos fazer o que fizemos, com tão poucas baixas. O inimigo aqui nunca foi menosprezado.

"As capacidades dos balantas permitem-lhes fazer coisas difíceis de acreditar. Um dos casos ocorreu já em Bissorã, quando numa das operações ao Queré, um soldado acordou 2 horas depois da companhia já ter saído para o mato e conseguiu segui-la e encontrá-la, numa noite escura, tendo esta passado por mato cerrado, água, etc".