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domingo, 31 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27171: Felizmente ainda há verão em 2025 (28): A "política de terra queimada": a guerra peninsular (1807-1814) e a guerra colonial no CTIG (1963/74) - Parte I




Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca ) > Subsector de Xime >Madina Colhido > Fevereiro de 1970 > Sinais de queimadas (das NT ou do IN)... Proporcionavam a criação de clareiras onde era mais fácil os nossos helicópteros pousar...Como foi o caso do dia 9 de Fevereiro de 1970: 

(i) por volta das 5 e tal da manhã, o 1º cabo Galvão, da 3º Gr Comb / CCAÇ 12, ficou ferido  (torceu um pé) na cambança do Rio Buruntoni (havia uma tosca ponte feita pelo IN  de troncos de árvores);

 (ii) ás 13h00 as NT sofreram uma violenta emboscada em Gundagué Beafada, de que  resultariam uma série de baixas entre as NT (CART 2520, Pel CAç Nat 63 e CCAÇ 12), incluindo o 1º cabo Galvão que ia nesse momento em padiola improvisada e foi alvejado a tiro;

 (iii) a helievacuação dos feridos deu-se já em Madina Colhido  (um local de trágica memória e o fotógrafo estava lá...):

 (iv) em dezembro de 1975 seriam fuzilados, neste local,  pelo PAIGC ( no poder)  alguns antigos militares que haviam combatido  ao nosso lado, incluindo o nosso antigo soldado arvorado, futa-fula, o gigante Abibo Jau, do 1o. Gr Comb (que entretanto  ingressara em 1973/74 na CCAÇ 21);

Fotos: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados. Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.




Arlindo Teixeira Roda: ex-fur mil at inf, 3º Pelotão, CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71); o melhor fotógrafo da CCAÇ 12 e de Bambadinca, juntamente com o Humberto Reis;  no passado 25 de janeiro de 2025 em Coimbra, foi-lhe atribuída a designação de Presidente Emérito da Federação Portuguesa de Damas, tendo em conta a sua ação na criação da Federação e, também, a condução do organismo nos últimos 12 anos. 




1.  Felizmente que ainda há verão em 2025... 

Felizmente que  a Tabanca Grande também tem (e mantém) a sua "universidade sénior de verão"...

 Felizmente que a gente ainda vai tendo paciência, tempo e pachorra para ir blogando, escrevendo, lendo, comentando o nosso blogue (que fará 22 anos de existência em 23 de abril de 2026, se lá chegar, se lá chegarmos com vida e saúde)...

 Felizmente que o meu camarada da CCAÇ 2590 /  CCAÇ 12 (fomos juntos no T/T Niassa em 24/5/69 e regressamos juntos no T/T Uige em 17/3/71), o Arlindo Roda, natural de Pousos,Leiria, deu sinais de vida, ao fim de mais de 30 anos (!), telefonando-me na sexta feira passada... (Vive em Setúbal, reformado de professor do ensino técnico, desde os...57 anos!).

A propósito de "fogos florestais" (*)...

Na Guiné-Bissau, antes da guerra colonial, era tradicional fazerem-se grandes queimadas no tempo seco. Era uma prática generalizada para se obter novas terra e pastagens, se bem que à custa da destruição da floresta e da degração dos solos.

Durante a guerra colonial, até 1974, ambos os combatentes (PAIGC e Exército Português), recorreram a política de "terra queimada": 

  • os bombardeamentos e o fogo posto (no capim) causavam incêndios, de maior ou menor proporção, abrindo vastas clareiras na savana arbustiva;
  • uso de balas  incendiárias nos ataques às nossas tabancas (fulas);
  • por sua vez, o abate indiscriminado de gado e a destruição dos "stocks" de arroz e outros víveres foram uma forma de usar a "fome" contra o IN na guerra de contrassubversão;
  • um exemplo da política de terra queimada foi a Op Lança Afiada (Sector L1, Bambadinca, 8-18 de março de 1969), comandada pelo cor inf Hélio Felgas (mais tarde, maj - gen, ref., 1920-2008 
 Iremos, na segunda parte deste poste, falar da alegada  "política de terra queimada" na Guiné, exemplificada pela Op Lança Afiada... 

De qualquer modo, há outros exemplos históricos do recurso à "política da terra queimada", como estratégia militar para devastar territórios, privando o inimigo de recursos  (alimentos,  abrigo...).


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Batalha do Buçaço (1810). Gravura da época.
Fonte: Arquivo Histórico-
Milityar | Wikipedia

2. Para não irmos mais longe, cite-se o caso da guerra peninsular (1807-1814): durante as invasões napoleónicas, as tropas luso-britâncias aplicaram a política de terra queimada para atrasar o avanço das tropas francesas e privá-las de recursos alimentares.

A política de terra queimada envolveu a evacuação das populações, e a destruição de searas, pomares,  moinhos, pontões , casas e e demais bens que não podiam ser transportados. 

Essa tática foi utilizada especialmente durante a terceira invasão francesa (1810-1811), comandada por Massena, após a batalha do Buçaco (27 de setembro de 1810)  e durante o avanço e recuo para as Linhas de Torres Vedras. 

Tanto as  tropas luso-britânicas como a guerrilha portuguesa também recorriam à destruição de gado, alimentos e outros víveres para causar fome e dificultar a subsistência dos invasores.


(i) A dupla estratégia de Wellington: As Linhas de Torres e a política de "Terra Queimada" que puseram fim às invasões napoleónicas

Durante a terceira e última invasão francesa de Portugal, em 1810, o General Arthur Wellesley, futuro Duque de Wellington, engendrou uma brilhante e implacável estratégia defensiva que se revelaria decisiva para a derrota e  expulsão das tropas napoleónicas. 

Esta estratégia assentava em dois pilares fundamentais e interdependentes: 

  • a construção das monumentais e secretas Linhas de Torres Vedras;
  • a aplicação de uma rigorosa política de terra queimada.


As Linhas  deTores. Fonte: Wikipedia





Longe de serem uma mera barreira física, as Linhas de Torres Vedras eram um complexo e sofisticado sistema defensivo que se estendia por dezenas de quilómetros, desde o Tejo até ao Oceano Atlântico, protegendo a capital, Lisboa.

(ii) As Linhas de Torres Vedras: uma fortaleza impenetrável

A sua construção, iniciada em segredo em novembro de 1809, um ano antes da chegada do exército francês, foi uma obra de engenharia militar, genial,  sem precedentes.

O sistema era composto por três linhas defensivas principais, aproveitando as elevações naturais do terreno. Eram constituídas por uma rede de mais de 150 fortes, redutos, postos de artilharia (mais de 6 centenas de bocas de fogo), estradas militares e outros obstáculos, guarnecidos por dezenas de milhares de soldados portugueses e britânicos (cerca de 40 mil)  

A primeira linha, a mais exterior e fortemente fortificada, foi concebida para deter o avanço inicial do inimigo. 

A segunda linha oferecia uma posição de recuo, enquanto a terceira, mais próxima de Lisboa, visava proteger uma eventual evacuação das tropas britânicas por mar, um cenário que Wellington sempre considerou.

O grande trunfo das Linhas de Torres residia no facto de serem praticamente desconhecidas do exército invasor, comandado pelo Marechal André Massena. E mesmo dos seus construtores (cada um  só conhecia a sua seção, ou local; quem tinha a visão do conjunto era o próprio Wellington e o seu engenheiro militar, o coronel Richard Fletcher.

Ao chegar às suas imediações, em outubro de 1810, após a Batalha do Buçaco, Massena deparou-se com uma barreira formidável e inesperada, que se revelaria intransponível.

(Imagem à direita: Arthur Wellesley (1769-1852), 1º duque de Welington. Fonte: Wukipedia)


(iii) A política de Terra Queimada: a fome como arma...de dois gumes


Complementar à defesa estática proporcionada pelas Linhas de Torres, Wellington implementou uma brutal, mas eficaz, política de terra queimada. 

À medida que o exército anglo-luso se retirava estrategicamente para o refúgio das Linhas, foi dada ordem para que a população civil abandonasse as suas terras, levando consigo todos os bens e gado que conseguisse transportar.

Tudo o que não podia ser levado era sistematicamente destruído: colheitas foram queimadas, moinhos desmantelados, pontes derrubadas e celeiros esvaziados. 

O objetivo era criar um vasto deserto à frente das Linhas, privando o exército francês de qualquer meio de subsistência. A proclamação de Wellington foi clara: nada deveria ser deixado para trás que pudesse ser utilizado pelo inimigo.

Esta política teve consequências devastadoras para a população portuguesa, que sofreu enormes privações, fome e doenças. (No entanto, do ponto de vista militar, foi um golpe de mestre:  o exército de Massena, que dependia da requisição de mantimentos no terreno para se abastecer, viu-se rapidamente a braços com uma crise logística insustentável.)


(iv) O desfecho da invasão: a vitória da estratégia das Linhas de Torres e da  "política de terra queimada"

Enquanto o exército anglo-luso se encontrava seguro e bem abastecido dentro das Linhas, com o porto de Lisboa a garantir o fornecimento contínuo de homens e provisões, as forças francesas definhavam do lado de fora. 

Durante meses, Massena manteve as suas tropas (3 exércitos, 65 mil homens) em frente às Linhas, na esperança de que Wellington saísse para uma batalha em campo aberto, o que nunca aconteceu.

A fome, as doenças e o constante assédio por parte das milícias portuguesas foram dizimando o exército francês. Sem esperança de receber reforços ou mantimentos e confrontado com a aproximação do inverno, Massena foi forçado a ordenar a retirada em março de 1811.

 A perseguição movida pelas tropas de Wellington transformou a retirada francesa num pesadelo e num desastre, culminando na sua expulsão definitiva de Portugal.

A combinação genial das Linhas de Torres Vedras com a política de terra queimada demonstrou a visão estratégica de Wellington e a resiliência do povo português. 

Esta dupla abordagem não só salvou Portugal da ocupação napoleónica (e partilha do território, que seria dividido em três partes), como também marcou um ponto de viragem na Guerra Peninsular, contribuindo decisivamente para o eventual colapso do império de Napoleão Bonaparte.

Claro, há o reverso da medalha: resultou em enormes sofrimentos para a população portuguesa, incluindo assassinatos e maus-tratos, ruína agrícola, saques e incêndios em cidades, vilas e aldeias. 

Muitas aldeias foram evacuadas e transformadas em territórios desérticos, levando à fome,  a epidemias e à escalada dos preços dos géneros alimentícios. O sacrifício da terra queimada, embora essencial para travar os franceses, empobreceu grandemente o país, justificando-se pelo objetivo de proteger a independência nacional.

(v) Um rasto de morte e  desolação

As Invasões Napoleónicas, que assolaram Portugal entre 1807 e 1814, deixaram um profundo rasto de morte e destruição.

É  extremamente difícil apurar o número exato de vítimas, as estimativas apontam para uma perda demográfica significativa, que terá ultrapassado as 200 mil  pessoas, podendo mesmo aproximar-se das 300.000, entre civis e militares.

Este valor representa uma quebra demográfica considerável para um país que, no início do século XIX, contava com uma população total de aproximadamente 2,9 a 3 milhões de habitantes. (E que só duplicaria 100 anos depois, 6 milhões em 1910.)

A contagem precisa das vítimas é dificultada pela natureza do conflito, que não se limitou a batalhas campais. A fome, as epidemias e os massacres perpetrados sobre a população civil foram responsáveis pela grande maioria das mortes. 

A terceira invasão, liderada pelo marechal Massena em 1810-1811, é consensualmente considerada a mais brutal e devastadora para os portugueses.

No início do século XIX, a população portuguesa rondava os 3 milhões de pessoas;

  • dados mais específicos indicam que em 1801 a população era de 2.931.930 habitantes;
  • durante o período das invasões, nomeadamente em 1811, registou-se uma diminuição para 2.876.602 habitantes, um reflexo direto do impacto da guerra, da fome e das doenças na demografia do país.

As múltiplas ( e interligadas) causas da elevada morbimortalidade  

  • Ações militares: as batalhas, escaramuças e cercos ao longo dos sete anos de conflito resultaram num número significativo de baixas militares, tanto do exército regular como das milícias e ordenanças que se opunham aos invasores; as tropas regulares portuguesas (cerca de 20 a 30 mil homens mobilizados) sofreram baixas consideráveis: os números variam, mas as estimativas apontam para  em 10 a 15 mil mortos em combate ou por doença, sem contar desertores e incapacitados.

  • Massacres e violência sobre civis: as tropas francesas (Junot, Soult e Massena), e por vezes também as aliadas, cometeram diversas atrocidades contra a população civil; vilas e aldeias foram pilhadas e queimadas, e os seus habitantes massacrados; a violência fazia parte da tática de intimidação e retaliação contra a resistência popular; há relatos contemporâneos que falam em dezenas de milhares de civis mortos diretamente (talvez 40 a 60 mil ao longo das campanhas.

  • Fome generalizada: a política de "terra queimada", adotada tanto pelas tropas em retirada como pela resistência para dificultar o avanço inimigo, levou à destruição de colheitas e à requisição forçada de alimentos; o episódio mais devastador foi a política de terra queimada durante a 3.ª Invasão (1810-11): populações inteiras do norte e centro foram obrigadas a abandonar casas e colheitas para dificultar a progressão de Masséna.

  • Epidemias:  a subnutrição, as más condições de saúde e higiene, a deslocação de populações, a concentração de refugiados e tropas criaram o ambiente ideal para a propagação de doenças como o tifo, a disenteria e a varíola, que ceifaram milhares de vidas.
Vários historiadores (como Oliveira Martins) falam que Portugal terá perdido perto de 300 mil pessoas no total das invasões.

A combinação destes fatores resultou numa catástrofe demográfica que marcou profundamente a sociedade portuguesa. A perda de vidas, aliada à destruição de infraestruturas e à desorganização social e  económica, deixou o país exaurido e contribuiu para a instabilidade política e social que se seguiu ao fim do conflito.

A perda de quase um décimo da sua população  (cerca de 300 mil num total de 3 milhões em 1801), num período de sete anos (1807/14) representou uma catástrofe demográfica de enormes proporções para Portugal e marcou um dos períodos mais mortíferos da sua história.

Com a fuga da corte para o Brasil (donde só regressará em 1821), as invasões napoleónicas e a crescente influência inglesa na vida política nacional, assiste-se, por outro aldo, à destruição do incipiente desenvolvimento do capitalismo industrial em Portugal, iniciado em meados do séc XVIII, sobretudo com o pombalismo.

A política de terra queimada (sobretudo na 3ª invasão, 1810/11) ficou marcada na memória popular portuguesa, especialmente nas regiões centro e norte do país, como uma das mais severas provações já enfrentadas pela população civil. Foram relatados casos extremos de devastação onde até estradas e casas foram destruídas para impedir o acesso dos franceses a qualquer recurso útil.

A expressão "ir p'ró maneta" vem dessa época. O "maneta" era a alcunha do Louis Henri Loison (1771-1816): perdera um braço num episódio de caça, foi  talvez  o mais sanguinário e rapace dos generais franceses de Napoleão, participou nas três invasões franceses (facto a comprovar)... 

O seu nome inspirava terror e horror, pela sua crueldade e pela forma como torturava e executava os prisioneiros, e especialmente os guerrilheiros portugueses.

Em resumo, a política de terra queimada (a par das Linhas de Torres) foi um dos instrumentos mais importantes na resistência às invasões francesas em Portugal, com consequências profundas para o território e para o povo português. (**)

(Continua)

(Pesquisa: LG | Assistente de IA / Gemini, Perplexity, ChatGPT)

(Para saber mais: Centro de Interpretação das Linhas de Torres | CM Sobral de Monte Agraço)

(Revisão / Fixação de texto, negritos, itálicos, subtítulos: LG)

Quinta de Candoz, 31 de agosto de 2025, 18:00

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Notas do editor LG:

(*) Vd. comentários de António Rosinha e Fernando Ribeiro. Poste de 30 de agosto de 2025 Guiné 61/74 - P27166: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (9): Secas e fomes levaram ao longo do séc. XX à morte de mais de 100 mil pessoas

(...) António Rosinha:

(...) "Eram os tempos da sardinha para 3 (ou 4), e em que não havia incêndios, embora houvesse piromaníacos e incendiários como haverá sempre, mas os resíduos das florestas eram poucos para aquecer as lareiras e defumar os enchidos.

sábado, 30 de agosto de 2025 às 12:27:00 WEST

(...) Fernando Ribeiro:

(...)  Antº Rosinha, em Portugal sempre existiram incêndios e sempre existirão, porque são uma forma de a Natureza se renovar. Não há volta a dar-lhe. O que não existia, era tantos eucaliptos e tantos pinheiros bravos, que ardem como palha, nem tanto despovoamento do interior. Em 1966, concretamente, morreram 25 militares no combate a um incêndio ocorrido na serra de Sintra. (...)

quarta-feira, 30 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27070: Humor de caserna (208): As duas gloriosas malucas das máquinas voadoras, a Zulmira e a Maria Arminda, enfermeiras pqdt a quem o "Pombinho" meteu na cabeça que haveriam de aprender a pilotar o Dornier DO-27


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Pista de Bambadinca... Ao fundo, o muro do cemitério... Uma DO-27 na pista... 

Era uma aeronave que  adorávamos  quando nos trazia de Bissau os frescos e a mala do correio ou, no regresso, nos dava boleia até Bissau, para apanharmos o avião da TAP e ir de férias... 

Era uma aeronave preciosa nas evacuações (dos nossos feridos ou doentes, militares e  civis)... 

Era um "pássaro" lindo a voar nos céus da Guiné, quando ainda não havia o Strela...

Em contrapartida, tínhamos-lhe, nós, os "infantes",  a "tropa-macaca", um "ódio de morte" (sic) quando se transformava em PCV (posto de comando volante) e o tenente-coronel, comandante do batalhão, ou o segundo comandante,  ou o major de operações,  ia ao lado do piloto, a "policiar" a nossa progressão no mato... e a denunciar a nossa posição no terreno!

Quando nos "apanhavam" e ficavam à nossa vertical, era ver os infantes (incluindo os nossos "queridos nharros") a falar, grosso, à moda do Norte, com expressões que eram capazes de fazer corar a Maria Turra:

"Cabr*es..., filhos da p*ta..., vão lá gozar pró car*lho..., daqui a um bocado estamos a embrulhar e a levar nos c*rnos!...".

Também os nossos comandantes operacionais (capitães QP ou milicianos) não gostavam nada do "abelhudo" do PCV, em operações no mato...

Foto do álbum de Arlindo T. Roda, ex-fur mil da CCAÇ 12 (1969/71).

Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > s/l > c. 1972/74 > O comandante Pombo aos comandos de um Cessna dos  TAGP (Transportes Aéreos da Guiné Portuguesa) (era uma aeronave muito melhor, equipada com instrumentos de navegação,  do que a DO-27)

Foto (e legenda): © Álvaro Basto (2008). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1º srgt Pombo, piloto de F-86-F Sabre,
BA 5, Monte Real, 1961.
Cortesia de José Cabeleira (2011)
1. É uma história, mal conhecdia, mas bem humorada (*). Deve-se ter passado na primeira comissão da Maria Arminda, em 1962/63, no TO da Guiné: ela passou primeiro por Angola (1961/62), depois Guiné (1962/63) e novamente na Guiné (1965/66)... E nesse intervalo, em 1963/64, terá estado em Tancos a formar novas enfermeiras paraquedistas. (Pelo telefone, confirmou que a história passa-se em 1963; pedi-lhe desculpa, estava ela a fazer fisioterapia...)

Por sua vez, o outro interveniente nesta hstória, é o saudoso cap pil José Luís Pombo Rodrigues (1934-2017),  o  Comandante Pombo dos TAGP do meu tempo (1969),  um orgulhoso sobrevivente da “Operação Atlas”, a primeira (e única) travessia Monte Real – Bissalanca, feita pela Esquadra 51/201 (BA 5), constituída por aviões F-86F “Sabre”, realizada em agosto de 1961… 

Era ele então um jovem 1º sargento
piloto... O "Pombinho", como lhe chamavam 
a Zulmira e a Maria Arminda. Terá feito 4 comissões na Guiné. Esteve na FAP, e nos TAGP, acabando por ser piloto particular, ao serviço de Luís Cabral e depois do 'Nino' Vieira, até partir para outras paragens (Congo ex-Belga, Brasil...). Regressou a Pátria para morrer...

O Comandante Pombo tem 25 referências no nosso blogue. Conheci-o pessoalmente num  dos nossos convívios da Magnífica Tabanca da Linha. Entrou para a Tabanca Grande, a título póstumo, em 5 de setembro de 2017.


As duas gloriosas malucas das máquinas voadoras,   a Zulmira e a Maria Arminha, enfermeiras pqdt,  a quem  o "Pombinho"   meteu na cabeça que haveriam de aprender a pilotar o Dornier  DO-27

por Maria Arminda

(...) Em nenhum dos muitos locais onde trabalhei (incluindo hospitais), senti um ambiente de tão forte coesão e solidariedade entre todos os que me rodeavam, e em que a palavra "amizade" tivesse uma expressão tão forte e fosse tão marcante para a vida, como o ambiente em que vivi na Guiné. 

(...) Quando os nossos camaradas homens nos viam "em baixo", inventavam processos para nos animar e fazer esquecer as agruras "daquela vida". E nós assim íamos sobrevivendo e cumprindo as nossas missões 

Naqueles nossos momentos "baixos", eles inventavam as mais diversas formas de nos levantar o "astral"... Como, por exemplo, ensinarem -nos a pilotar!



Maria Zulmira André Pereira
(1931-2010)
Naquele tempo, na Base Aérea nº 12, havia um piloto de jatos, que eu penso ainda eram os F-86, de sua graça Pombo Rodrigues, a quem nós chamávamos de Pombinho. 

Ele era como um irmão, muito nosso amigo,  e então meteu na cabeça que a Zu (como tratávamos a Zulmira) e eu, iríamos aprender a pilotar o avião Dornier DO-27., que ele tão bem pilotava, e em que nós fazíamos as evacuações.

Combinou connosco que, sempre que ele estivesse de alerta ao transporte de feridos e saísse com uma de nós as duas, começaria a dar-nos a instrução, mesmo nos DO-27 só com  um só manche, caso não estivesse operacional o que lá havia com dois comandos, que ele procurava sempre utilizar nesses dias da nossa "instrução.

Se bem o pensou, melhor o fez, e a nossa aprendizagem começou com algumas aulas teóricas, primeiro no bar dos pilotos, depois no interior do avião, mas no solo, e depois já no ar, em aulas práticas, nas idas aos locais para onde éramos chamadas, e apenas nas idas, porque no regresso, como se  depreende, a nossa ocupação já era outra.

"A juventude é ousada e por vezes louca", por isso as aulas continuaram por algum tempo, e penso que só os três é que sabíamos destes factos. 

Eu cheguei a levar o avião da Base até à pista de Farim, no DO que tinha os dois manches, e ele disse-me que tinha sido eu a tocar com as rodas no chão, o que não acreditei.

No entanto, ele punha tanta força e empenhamento na nossa "instrução", que me fez ter confiança e esperança de poder vir um dia a saber pilotar aquele avião. Pena foi que daí a algum tempo, eu tivesse sido mandada paar Tancos, a fim de acompanhar um curso para formação de novas enfermeiras "páras".

As minhas lições de pilotagem foram aí, entáo, interrompidas e, infelizmente, para sempre. (...)

Fonte: Excertos de "Nós, enfermeiras paraquedistas", 2ª ed., org. Rosa Serra, prefácio do Prof. Adriano Moreira (Porto: Fronteira do Caos, 2014), pp. 374-376  (com a devida vénia...).

(Seleção, revisão / fixação de texto, título: LG)
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sexta-feira, 6 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26891: S(C)em Comentários (71): Liberdade teve o grande Cherno Rachide que preferiu partir desta para melhor para não ter que aturar com a brutalidade do partido "libertador" (Cgherno Baldé, Bidssau)


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) >   c. 10 de janeiro de 1970 > O Cherno Rachide em visita religosa a Bambadinca. A personagem central, vestida de branco e "gorro" preto, que parece estar a presidir a uma cerimónia religiosa islâmica,  é sem dúvida o Cherno Rachide que eu conheci em Bambadinca... (A foto do leiriense António T. Roda, meu camarada da CCAÇ 12, campeão nacional de damas, dirigente federativo, que vive em Setúbal,  não traz legenda: ampliando-a, parece que o imã está a contar notas e moedas que recebeu, oferta dos crentes, a par de nozes de cola.)

Recordo-me de o comando do batalhão, na altura sediado em Bambadinca, o BCAÇ 2852 (1968/70), ter  mandado armar uma tenda, com tapetes e almofadões, na parada do aquartelamento (a localidade era um importante posto administrativo e porto fluvial), para receber condignamente não só as autoridades locais, civis e militares, como também os seus fiéis...  

Ele virá a falecer, em Aldeia Formosa, em setembro de 1973, em  dia que não podemos precisar (nem com a juda do assistente da IA...), mas seguramente antes do 24 de setembro (em que o PAIGG, diz-se, terá proclamado unilateralmente a independência do território... em "Madina do Boé"!). 

O comando do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) organizou uma coluna de transporte  para os seus fiéis do regulado de Badora poderem ir prestar-lhe a última homenagem em Aldeia Formosa (Quebo)...  No meu tempo, em 1969, o troço Saltinho-Aldeia Formosa estava interdito... Hoje, por estrada alcatroada, são 87 km, mas na época (1969) só havia o troço alcatroado Bambadinca-Bafatá.

 
Foto: © Arlindo Roda (2010). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Tombali >  Aldeia Formosa (Quebo) > Janeiro de 1973 > Tabaski ou festa do carneiro > O Cherno Rachide, acompanhado de um dos seus filhos (possivelmente o seu sucessos, Aliu),  presidiu à cerimónia, ele próprio degolou (ou ajudou a degolar) o carneiro. Por detrás de si,  o cap mil (e nosso grão-tabanqueiro) Vasco da Gama, cmdt da CCAV 8351, "Os Tigres do Cumbijã", Cumbijã, 1972/74). 

Foto (e legenda): © Vasco da Gama (2008). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]





Cherno Baldé (Bissau)



1. Comentário do nosso colaborador permanente, Cherno Baldé (Bissau),  ao poste P26880 (*)


A morte do Imã a que se refere o Carlos Filipe Gpnçalves,  é a do bem conhecido chefe religioso de Quebo (Aldeia Formosa), Cherno Rachide, que morreu em setembro de 1973 e não no Gabu, como ele refere. 

E, ao contrario do que muitos militares portugueses da época pensavam,  ele nunca foi um agente duplo, era sim um prestigiado sábio muçulmano, versado em letras corânicas,  entre outros conhecimentos esotéricos. Assim como não era o chefe hierárquico de nenhuma comunidade de religiosos,  como acontece em outras confissões religiosas, pois nesta religião existe uma reconhecida descentralização que faz de cada comunidade e de cada mesquita uma entidade quase autónoma, sendo que é a força da sua dinâmica em movimento em permanência,  assim como é a sua grande fraqueza enquanto entidade que deveria ser unida e coesa no seu todo, o que não acontece no seu caso,  dai a  diversidade e pluralidade nas tomadas de decisões que muitas vezes a afetam e dividem, contrariamente a muitas outras confissões monoteístas.

Dizem que o Cherno Rachide morreu em 1973 para não assistir ao advento da independência com o PAIGC como poder dominante no país. Sorte foi a sua que teve essa visão reservada só aos sábios e visionários, também eu,  se tivesse dom e essa capacidade,  preferiria morrer a assistir a essa "heresia" que, na Guiné-Bissau, chamaram de libertação nacional. 

Liberdade teve o grande Cherno Rachide que preferiu partir desta para melhor para não ter que aturar com a brutalidade do partido "libertador". E foi um bom amigo do General Spinola, embora a sua familia fosse originária do Futa-Djalon.

Um abraço amigo,

Cherno AB (**)

(Seleção, revisão / fixação de texto: LG)

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Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 4 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26880: Recordações de um furriel miliciano amanuense (Chefia dos Serviços de Intendência, QG/CTIG, Bissau, 1973/74) (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo) - Parte VII: Os "turras" têm agora um míssil que abate aviões e helicópteros

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

Guiné 61/74 - P26493: Para bom observador, meia palavra basta (7): O que têm em comum estas fotos do obus 10.5 ?... Haja um "professor de artilharia" que explique aos "infantes"...



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L1 > Xime > CART 2520 (1969/70) > 20º Pel Art / BAC 1 > O obus 10.5... Na imagem, o fur mil at inf Arlindo Roda, da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71).

Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]





Guiné > Zona leste > Região de Bafatã _ Setor L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > O alf mil Torcato Mendonça (1944-2021) junto ao obus 10,5


Foto: (e legenda): © Torcato Mendonça (2007). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona Oeste > Sector 05 (Teixeira Pinto) > Bachile > CCAÇ 16 > s/d (c. 1972/73) > O Zeca Romão junto a um obus 10,5, do 21º Pel Art

Fotos (e legendas): © José Romão (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482 > Espaldão do obus 10.5. Foto do álbum de Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7, Bissau, 1969/71; foi comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda (1969/70)-

Foto (e legenda): © Domingos Robalo (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Quínara > Gampará > CCAÇ 4142 (1972/74) > O sold cozinheiro Joviano Teixeira junto ao obus 10.5...

Foto: © Joviano Teixeira (2015). Todos os direitos reservadoss. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Cacheu > Teixeira Pinto > Bachile > CCAÇ 16 > O 1º cabo António Branco, junto ao obus 10,5 com a mascote da companhia, um menino do "mato", Augusto Martins Caboiana, que todos os camaradas da CCAÇ 16 adoptaram e ajudaram a crescer...

Fotos: © António Branco (2010). Todos os direitos reservadoss. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª C/BART 6520/72, 1972/74) > Obus 10, 5 ( em 10/4/1974, 2 º Pel Art que guarnecia este aquartelamento)

Foto: © José Claudino da Silva (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]


1. O que têm estas fotos em comum ? São poses da malta junto ao obus 10.5 cm, de fabrico alemão, "restos de coleção", do tempo da II Guerra Mundial... 

Toda a gente gostava de mandar para casa uma foto destas, para tranquilizar a família: "Com este eu estou bem protegido, fiquem descansados, mas continuem a rezar por mim"... 

Para a namorada  e para os amigos também se mandavam umas chapas com este brinquedo...falocrático. 

No mato ou no quartel, a gente sentia-se, pelo menos psicologicamente, mais seguro, ao ouvir elas (as "bojardas", os "supositórios", as "ameixas"...) a passar por cima das nossasa cabeças... e a baterem as posições inimigas... 

Parece que há outras marcas ou modelos de obus 10.5... Por que razão é que no CTIG só se usava, este tipo de obus (dentro do calibibre 10.5)... (Nos últimos anos os Pel Art começaram a a ser equipados com o obus 14, de maior alcance, e o início da guerra, o que se usava era o 8.8).

 Haja um "professor de artilharia" que explique isso aos infantes...

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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26175: Para bom observador, meia palavra basta (6): O fortim de Cabedu

sexta-feira, 15 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26157: Casos: A verdade sobre... (49): Os "djubis" da CART 11 e da CCAÇ 12, que foram soldados... (Luís Graça)



Umaru Baldé (c. 1953- c.2004, Bambadinca, meados de 1970
Foto: Benjamim Durães (2010)



Umaru Baldé (c. 1953-c. 2004), recruta do CIM Contuboel,
 c. março de 1969 

Foto: Valdemar Queiroz (2014)


1. Resposta do editor LG ao Valdemar Queiroz (*): 

Valdemar, obrigado pela tua preciosa "lembrança"... Reconheço estes putos ou pelo menos três, os que pertenceram à CCAÇ 12, e que fizeram a guerra comigo (*)...

Quanto ao Umaru Baldé (c. 1953- c. 2004), o "menino de sua mãe", tens aqui  duas fotos dele (uma é do teu álbum, o recruta Baldé, no CIM de Contuboel, com cara e corpo de "djubi"; a outra, um ano mais tarde,  de meados de 1970, tirada em Bambadinca, já com o BART 2917).

Vamos pô-lo a nascer por volta de 1953 para salvar a "honra do convento", isto é, para que a NT não sejam acusadas de recrutar crianças para a guerra, como acontecia com o PAIGC...

Soldado do recrutamento local, nº 82115869, o Umaru tirou a recruta   (com a CART 11) e a especialidade (com a CCAÇ 12), no CIM de Contuboel (um um um "oásis de paz", como eu lhe chamei, em junho de 1969). 

Foi exímio apontador de morteiro 60, soldado arvorado e depois 1º cabo at inf  da CCAÇ 2590 /  CCAÇ 12 (1969-1972), no 4º Gr Comb,  3ª secção [comandada inicialmente pelo fur mil 11941567 António Fernando R. Marques: DFA, vive hoje em Cascais, empresário reformado, membro da nossa Tabanca Grande].

O Umaru Baldé, que era de Dembataco (ou Demba Taco),  cresceu com a guerra: Demba Taco pertencia ao subsetor do Xime, um dos primeiros a conhecer a crueldade da guerra.  Foi recrutado em 12/3/1969,  como ele conta em carta pungente que te escreveu, trinta anos depois, já a viver na Amadora. 

Tirou a recruta no CIM Contuboel e fez o juramento de bandeira em Bissau, em cerimónia a que assistiu o gen Spínola.  Em junho e julho de 1969 fez a especialidade, já com os graduados da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 como instrutores... Juntos formamos companhia e fizemos a IAO.  Em 18 de julho de 1969 ficámos à ordem do comando do sector L1, e fomos colocados em Bambadinca.  Seis dias depois tivemos o batismo de fogo em Madina Xaquili, que será abandonada, dois meses e tal depois, em outubro.

O Umaru Baldé fez a guerra  entre meados de 1969 e 1972,  foi depois colocado, nesse ano,  em Santa Luzia, Bissau, no quartel do Serviço de Transmissões, onde ficou até ao fim da guerra.  (Julgo que depois de ter sido ferido em combate, ainda na CCAÇ 12, que entretanto passará a unidade de quadrícula, colocada no Xime em março de 1973.)

Conheceu, em mais de metade da sua vida, a amargura e a solidão do exílio. Não sei se chegou a ter mulher e filhos.  Percorreu meia África, em busca de liberdade e seguranças. Veio a morrer, aos 50 anos,  em Portugal, no "terminal da morte", que era então o, hoje  já extinto,  Hospital do Barro, Torres Vedras (onde também, por ironia do destino,  viria a morrer Luís Cabral, uns anos depois, em 2009).

O "puto" Umaru,  como sempre o tratámos, contou apenas com o apoio e a ajuda de alguns dos seus antigos camaradas de armas, "tugas",  da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, mas também da CART 11 (como tu, Valdemar Queiroz,  e outros). 

Não posso confirmar, com rigor, o ano em que nasceu e o ano em que morreu. Nunca mais o vi desde que regressei a casa em 17 de março de 1971. Tenho uma foto com e com o Zé Carlos.

 

Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Fevereiro de 1970 >  Região do Xime >   1º  Grupo de Combate, comandado pelo Alf Mil Inf Op Esp Francisco Moreira, no decurso da Op Boga Destemida, uma operação sangrenta...  A CCAÇ 12, que integrava a "nova força africana" (que era a menina dos olhos de Spínola) foi uma subunidade de intervenção, duramente usada e abusada pelo comando dos BCAÇ 2852 (1968/70) e BART 2917 (1970/72) 


Foto: © Arlindo Roda (2010). Todos os direitos reservados 
[Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



2. Aproveito para retomar aqui, com algumas alterações,  um comentário meu que já tem 18 anos sobre  "a lista dos Baldés" da CCAÇ 2590 / 12, e que publicitei, em 2006 (**), depois de ponderar os prós e os contras: eram 100 os "Baldés", que foram integrados na CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12), em Contuboel... Muito poucos deles estariam ainda vivos nessa altura. E hoje já não estará nenhum.

Na altura, podia parecer fastidiosa, inútil, irrelevante... a minha lista de Baldés...    Mais: até imprudente, podendo pôr em risco a liberdade e a segurança dos nossos antigos camaradas guineenses,  os sobreviventes, os que ainda estariam vivos (como, por exemplo, o José Carlos Ussumane Baldé, o único 1º cabo que existia no meu tempo).

Não pensava o mesmo , em 2006: podia ter (ou vir a ter) algum interesse documental, historiográfico, eu sei lá... Podia facilitar a pesquisa de informação, de testemunhos, de depoimentos...E quanto a ajustes de contas, infelizmente já tinham sido feitos sob o regime de Luís Cabral...

Entendia que era um pequeno, modestíssimo, gesto de elementar justiça para com aqueles guineenses que lutaram ao nosso lado, que fizeram parte da CCAÇ 12 e, portanto, da 'nova força africana'  com que sonhou Spínola e que tanto atemorizou o PAIGC (eles e não apenas a "tropa especial", com destaque para os Comandos Africanos).

Infelizmente, uma grande parte deles (quantos, exactamente?) já não estariam vivos em 2006. Uns tinham sido fuzilados, como o Abibo Jau, logo em 1975, outros andaram fugidos, a maior parte terá morrido de morte natural, que a sua esperança de vida era muito menor que a nossa, em 1969...

Eu estava à vontade para publicar essa lista: sempre critiquei a africanização da guerra da Guiné, embora longe de imaginar que, no dia seguinte à nossa retirada, começasse a caça aos "traidores", aos "contra-revolucionários", aos "mercenários", aos "colaboracionistas", aos "cães dos colonialistas", aos "cachorros dos tugas"...

Eu já não estava lá, em agosto de 1974, quando foi extinta a CCAÇ 12 e as demais subunidades da "nova força africana" (incluindo a CCAÇ 11, herdeira da CART 11). E, confesso que, desde que cheguei, em março de 1971, e até ao final da década de 70, pus uma tranca à porta da "memória da guerra". E só no princípio de 1980, comecei a tentar "exorcizar os fantasmas da guerra colonial" (sic) (uma expressão minha, que paga direitos de autor...).

Em 1969, ainda estava vivo o Amílcar Cabral e eu, na metrópole,  admirava-o, em abstrato,  intelectualmente, pelo pouco tinha lido dele (náo tenho pejo em admito-lo hoje). 

Achava que na Guiné, depois da independência, "abadá a guerra e feita a paz", tudo seria diferente, e não aconteceriam os ajustes de contas que se verificaram noutras revoluções ou guerras civis, na Rússia, na China, na Espanha franquista, na França depois da libertação, na Argélia, em Cuba, etc. Pobre de mim, ingénuo...

Mas, por outro lado, também fui cúmplice da integração destes "putos" no nosso exército: mesmo sendo  da especialidade de armas pesadas, e não fazendo  parte formal, organicamente,  de nenhum dos quatro grupos de combate da CCAÇ 12, acabei como vulgar atirador de infantaria, já que a companhia não tinha instalações a defender e  era de intervenção ("uma companhia de nharros, carne de canhão", rosnávamos nós, entre os dentes, sempre que saíamos para o mato...).

Participei, por isso, em muitas das operações em que estes participaram, fui testemunha da sua coragem e do seu medo, dormi com eles nas mais diversas situações, incluindo nas suas tabancas, transportámos às costas os nossos feridos e os nossos mortos... 

Foram meus camaradas, em suma.

Alguns (ou até bastantes) vieram das milícias, a maior parte já tinha alguma experiência de combate. E quanto à sua origem geográfica, os nossos camaradas guineenses da CCAÇ 12 (originalmente, CCAÇ 2590), eram oriundos do chão fula e em especial dos regulados do Xime, Corubal, Badora e Cossé, com exceção de um mancanhe, escolarizado,  oriundo de Bissau (que se fartou de levar "porradas", por ser "reguila" e "indisciplinado").

“Todos falam português mas poucos sabem ler e escrever", lê-se na história da CCAÇ 12. (O que só era verdade 21 meses depois de os termos conhecido e instruído em Contuboel, em junho e julho de 1969: nunca tiveram tempo sequer de ter aulas regimentais, o português que aprenderam, a falar e a escrever foi connosco.)

Foram incorporados no Exército como "voluntários" (sic), acrescentou o escriba (fui que escrevi a "história da unidade"), para branquear a insustentável (historicamente falando) situação dos jovens fulas, condenados a aliarem-se aos tugas e a pagarem a fatura do "colaboracionismo" no dia a seguir à nossa partida... 

Mas devo acrescentar: mal ou bem, a tropa e a guerra acabaram por ser um "modo de vida" para muitos deles... Teria o Umaru Baldé alguma alternativa ? Seguramente que não. O Salazar, o Tomás, o Caetano queriam-nos,  a todos,  heróis ou... mortos!
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Notas do editor:

(*) Ultimo poste da série : 14 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26153: Casos: A verdade sobre... (48): Os "djubis" da CART 11 e da CCAÇ 12, que foram soldados... (Valdemar Queiroz)

sábado, 27 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25453: Em busca de... (325): O ex-cap inf Manuel Figueiras, CCS/BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70); cor inf ref, morava em Faro em 2005 (Humberto Reis, ex-fir mil op esp, CCAÇ 12, 1969/71)



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > BCAÇ 2852 (1968/70) > c. 1969 > Sessão de projeção de "slides" ou diapositivos... Tudo servia para ajudar a passar o tempo, embora não fosse habitual esta mistura de "classes" (oficiais, sargentos e praças)... Recorde-se que o nosso exército era "classista" e, em aquartelamentos como o Bambadinca, com razoáveis e desafogadas instalações (Para os oficiais e sargentos), a regra era a da estratificação socioespacial, ou seja, nada de misturas...

O artista principal, neste caso, é o alf mil at cav José António G. Rodrigues, natural de Lisboa, e já falecido, comandante do 4.º Gr Comb da CCAÇ 12 (está sentado no topo da mesa de pingue-pongue, com a máquina de projetar e a caixa de "slides"). 

Os "slides" eram do Rodrigues e terá sido ele a apresentá-los e comentá-los. É muito provável que sejam "slides" tirados na metrópole, aquando da sua 1.ª licença de férias...

Em primeiro plano à esquerda, vemos os capitães inf Manuel Maria Pontes Figueiras, comandante da CCS, e Carlos Alberto Machado Brito, comandante da CCAÇ 2590/ CCAÇ 12. Por detrás dos dois, de perfil, o alf mil op esp Francisco Moreira, da CAÇ 12.

Ainda era tudo "periquito", o pessoal da CCAÇ 2590/CCAÇ 12, chegado a Bambadinca em meados de julho de 1969.

Em face disto, esta sessão de "slides" em que aparecem 3 alferes milicianos da então CCAÇ 2590 (CCAÇ 12, a partir de 18/1/1970) só pode ter acontecido em finais de 1969 ou princípios de 1970, ainda no tempo do BCAÇ 2852, rendido em finais de maio de 1970 pelo BART 2917. Os alferes são: (i) José António G. Rodrigues (4.º Gr Comb), (ii) Abel Maria Rodrigues (3.º Gr Comb); e (iii) Francisco Magalhães Moreira (1.º Gr Comb).

O cap inf Manuel Figueiras  veio substituir em setembro de 1969 o cap art António Dias Lopes que por sua vez tinha vindo substituir, um mês antes, o cap inf Eugénio Batista Neves, comandante da CCS/BCAÇ 2852, "transferido por motivos disciplinares", segundo reza a história da unidade).

Foto (e legenda) : © Arlindo T. Roda  (2010). Todo os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Humberto Reis (2011)

1. Mensagem enviada pelo nosso colaborador permanente, Humberto Reis, através do Formulário de Contacto do Blogger (*):


Data - sábado, 13/04/2024, 17:41
 
Boa tarde,
Alguém tem o contacto do antigo capitão em 1969 em Bambadinca, hoje cor na reforma Manuel Maria Pontes Figueira que organizou o almoço de 2005 do pessoal da CCaç 12 , BCaç 2852, etc, em Faro na Ilha Deserta?

Agradeço 
Humberto Reis, telem 918776460

Cumprimentos,
Humberto S Reis | hreis.lda@gmail.com


2. Comentário do nosso camarada Abel [Maria] Rodrigues, ex-alf mil at inf (CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) que vive em Miranda do Douro, sendo bancário reformado:

Olá, Luis!
(...) Em relação à foto, não faço a minima ideia, apenas reconheço também o capitão Figueiras, que está ao lado do Brito e me lembro dele por ser revolucionário e algarvio.

Um grande abraço
Abel Rodrigues (**)


3. Comentário do editor LG:

Humberto, afinal o nome do ex-cap inf Manuel Figueiras, vem na lista dos nossos contactos da malta desse tempo... (Manuel Maria P. Figueiras, cor inf ref, CCS/BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70, com residência em Faro, e n.º de tefefone fixo).

Não sabia que ele tinha estado em Tavira, no teu/nosso tempo... Já agora ficas com o contacto do César Dias (no do nosso tempo de Tavira, e da Guiné, esteve em Mansoa, no BCAÇ 2885, e aparece na lista do genérico do documento "A Conspiração", do António Pedro Vasconcelos: 9 episódios, os próximos, o 3.º e o 4.º; em 1 e 2 de maio):

https://www.rtp.pt/play/p13269/a-conspiracao

Um outro capitão do nosso tempo (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) é o Passos Marques, Gualberto Magno Passos Marques, cap art, cmd CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72); também morava (ou morava) em Faro. Temos o seu telemóvel e o seu email. Pode ser que ele tenha o contacto, mais recente, do Manuel Figueiras.

Comandou a CCS de 15/11/69 a 01/03/71 e de 16/07/71 a 27/03/72. Comandou também interinamente a CART 2915,  de 01/03/71 a 16/07/71. Era major reformado. Tem meia dúzia de referências no nosso blogue. É nosso tabanqueiro. 
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