I. é uma pequena homenagem do nosso blogue ao camarada maj pil av ref António Lobato (Melgaço, 1938 - Lisboa, 2024) (**). Reunimos aqui alguns excertos do seu livro "Liberdade ou Evasão: o mais longo cativeiro da guerra", que teve pelo menos 5 edições (entre 1995 e 2014). A maior parte dos nossos leitores nunca o leu.
O nosso crítico literário, Mário Beja Santos, recenbseou aqui a 2ª (1996) e a 5ª edição (2014). Reunimos, entretanto, o essencial das suas notas de leitura: P20534, P20555, P20577 (com a devida vénia...)
(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos e itálicos: LG)
1. A narrativa do major pil av António Lobato melhora de edição para edição, estou consciente que este aprimoramento vem da reflexão a que ele tem procedido, o que dá um caráter mais intimista à história do seu cativeiro. E, no entanto, somos agarrados sem qualquer possibilidade de despegar a nossa atenção tão avassaladora, veja-se logo aquela aterragem que lhe salva a vida em condições excecionais:
"O ponto de contacto com o solo confirma-me a justeza do planeamento, mas surge um imprevisto que do ar foi impossível de detectar - o terreno não é totalmente liso; sulcos profundos, espaçados metro a metro, cortam-no de lés a lés. É uma bolanha, terreno preparado para a cultura do arroz.
"Ao intradorso das asas do T-6 estão suspensas duas metralhadoras Browning, saliências que, ao entrar nos sulcos da bolanha, oferecem uma forte resistência ao deslizar do avião no solo. Atendendo a que este tipo de aterragem é feito com o trem recolhido, o entrar das metralhadoras num dos sulcos teve o efeito de arrancar instantaneamente as asas à aeronave. Fico sentado dentro de um charuto que rebola agora dentro de si mesmo, ao longo do terreno".
2. (...) No prólogo das diferentes edições do seu livro, dá-nos uma síntese dos acontecimentos e da situação que viveu, nestes termos precisos:
“Em 1963, no céu português da Guiné, dois aviões da Força Aérea colidem na sequência de uma missão de ataque ao solo e após um deles ter sido atingido por projécteis inimigos.
"Um dos aparelhos despenha-se em plena selva e o piloto morre; o outro, aterra de emergência numa bolanha e o piloto, depois de agredido à catanada pela população local é capturado por guerrilheiros do PAIGC e conduzido à vizinha República da Guiné Conacri. Aí, é-lhe facultado optar entre e deserção e a cadeia.
"Optando pela fidelidade aos princípios do seu povo, é encarcerado na temível Maison de Force de Kindia, com o rótulo de criminoso de guerra.
"Durante sete anos e meio é submetido a maus-tratos, subnutrição, isolamento e contínuas ameaças de morte pelos agentes de um governo pró-soviético chefiado por um dos maiores tiranos da África Ocidental – Sékou Touré.
"Tenta três vezes a evasão, mas só na última consegue respirar, durante uma semana, o ar fresco da liberdade. Percorre cerca de noventa quilómetros em plena selva, atravessando a cadeia montanhosa do Futa Djalon em direção à Guiné Portuguesa. Ao sexto dia, é recapturado e reconduzido à prisão de onde partira.
"Ao cabo de mês e meio de total isolamento, é transferido de prisão e libertado, tempos depois, durante a Operação Mar Verde, chefiada pelo Comandante Alpoim Calvão.
"É por instâncias de familiares e amigos, por dever de cidadania e para comemorar os vinte e cinco anos do regresso à liberdade que hoje se propõe condensar em curtas páginas, não apenas os horrores, mas sobretudo algumas das vias possíveis de sobrevivência no meio hostil e o consequente enriquecimento da pessoa humana, quando, perante situações-limite, consegue vencer-se a si próprio”. (...)
Não se irá aqui cotejar as inúmeras alterações introduzidas de edição para edição. O que se pretende relevar é a melhoria substancial da qualidade literária e a introdução de um processo intimista, em edição recente, António Lobato revela as estratégias de que se socorreu para que a tremenda solidão da clausura não o destruísse, pelo menos moral e psicologicamente.
Fala-nos da sua juventude em Paderne, como se alistou jovem na Força Aérea, depois temos o curso de pilotagem em S. Jacinto, a fase básica na Base Aérea n.º 1 em Sintra, em 22 de maio de 1958, um acidente quase que o ia matando, após dois meses de imobilização, e ao fim de cerca de oito meses de treino intensivo, ei-lo pronto para voar mais alto. Tem 21 anos e é-lhe confiada a tarefa e a responsabilidade de ensinar outros a voar. E, como ele escreve, em 1960 rebenta a guerra colonial.
A Força Aérea não possui na Guiné qualquer tipo de estrutura. Em julho de 1961, em companhia de um outro camarada, seguirá para a Guiné em missão de soberania.
Não é despiciendo observar como naquela região do Tombali há população afeta ao PAIGC e os guerrilheiros movimentam-se com certo à-vontade. A guerrilha tinha capturado um barco da Sociedade Comercial Ultramarina, de nome Bandim, transportará Lobato para o cativeiro.
(...) “Entramos num hexágono aberto para o céu, com duas portas em cada um dos seis lados. Encaminham-me para a direita e indicam-me uma dessas portas, em ferro maciço, com o número 7 ao centro, encimada por uma grelha, feita em varão de diâmetro não inferior a 3 centímetros.
Segue-se a descrição do dia-a-dia, ele é o prisioneiro da cela n.º 7, falam-nos do currículo de Sékou Touré e como ele mantém o seu regime de terror; vamos saber como é a sua cela, a degradação a que vai ser sujeito, o início da sua luta para se manter corajoso.
(...) “Porque não como uma boa parte das magras refeições, sinto que vou perdendo, lenta mas seguramente, toda a pujança da juventude; porque não me é fornecido qualquer tipo de medicamento, começa a ter fortes ataques de paludismo; porque a alimentação é pobre demais, a cárie dentária torna-se num flagelo; porque permaneço imóvel horas sem fim, começo a ter problemas de bexiga, a urinar pus e a sentir dores de barriga e cólicas insuportáveis.
Começam as peripécias, com todos os riscos: escreve à família, dá a sua localização, várias vezes procura a evasão, sempre sem sucesso. A liberdade irá chegar a 22 de novembro de 1970, no decurso da Operação Mar Verde.
Não se entende como esta obra não encontrou um editor comercial, é um testemunho único. Vamos agora à edição de 2014, o agora Major Lobato remexeu na obra, deu-lhe outra palpitação sem renegar o escopo inicial. Esta edição catapulta o testemunho de Lobato para o patamar das grandes obras da literatura da guerra da Guiné.
4. Estamos a seguir de perto a edição de 1995, mais tarde tomar-se-á em conta as edições introduzidas na 5.ª edição, de janeiro de 2014, ver-se-á como o testemunho do Sargento Lobato ganhou em vibração literária, em intimismo, em vigor sobre a reflexão de um cativeiro. Ele é o preso da cela n.º 7, em Kindia, Guiné Conacri.
(...) “A minha cabeça está dorida e muito sensível. O simples toque dos dedos nos cabelos parece fazê-los enterrar-se, como espinhos, pelo crânio dentro. Este voltar do meu interesse para o corpo diz-me que continuo consciente da realidade vulgar, mas alerta-me também para outra realidade, muito mais real: é que bastou um simples avivar de sentimentos, provocado por um olhar para o firmamento, para desfazer a ilusão em que sempre tenho vivido de que o corpo sou Eu”. (...)
Põe os ouvidos à escuta, adapta-se às rotinas da prisão, às orações dos muçulmanos, toma consciência de que perde tónus, surgiu a cárie dentária, há momentos de grande desânimo:
(...) “Há cerca de três meses que oscilo entre o ser e o nada. Ou enlouqueço, ou me anulo, ou faço qualquer coisa para sobreviver até onde for fisicamente possível. Este estado caótico dentro de mim chegou ao limite do suportável. Isto que agora me tritura a alma, deve chamar-se desespero”. (...)
Dá luta aos percevejos, vai descobrindo a resiliência, tudo faz para se manter lúcido, doseia a plena atenção com o entorpecimento:
(...) “Quando o coração já não é mais que uma chaga e nem sequer reage aos golpes do punhal da lembrança; quando já não posso mais porque o cérebro, extenuado, se recusa a pensar por mais tempo e a evocar ou a lembrar-se; então a besta reclama, atiro-me para cima do catre e adormeço profundamente.
Depois de um ano de isolamento, é-lhe facultada uma hora de recreio todos os dias, pode agora observar seres humanos e aperceber-se melhor de tudo quanto se passa dentro da prisão. Encontra leprosos, tuberculosos, sifilíticos, gente que vai morrer.
(...) “Durante toda esta ausência que tanto nos faz sofrer, neste abismo de miséria que submerge, nas horas que tudo me abandona, a fé inclusive, é sempre a tua imagem que me ajuda a flutuar, que me impede do naufrágio irreparável”. (....)
E em 22 de novembro de 1970, acontece a liberdade. Durante a Operação Mar Verde, um grupo assalta a prisão e liberta os 23 cidadãos portugueses, prisioneiros de guerra. Atravessam Conacri e embarcam num vaso da Armada, Lobato é apresentado a Alpoim Calvão, este está inquieto, teme que os aviões MIG, que não tinham sido destruídos, possam vir no alcance dos navios da Armada. Mas nada acontece, o contingente regressa até à ilha de Soga, daqui Lobato é transportado para Bissalanca.
Em 26 de novembro, todos os prisioneiros de guerra aterram na Portela e vão no autocarro para o Forte de Catalazete, estão oito dias consecutivos trancados numa sala com luz artificial e guardados por dois inspetores da DGS.
Finalmente vai encontrar-se com a família, segue com a mulher e os pais para Melgaço, onde é recebido apoteoticamente.
(...) “A partir do instante em que há passagem do ponto crítico com luz à reconciliação, acede-se a um estado de paz interior, a uma lucidez parente próxima da clarividência, a um racionalismo em que nada existe de insignificante. O que ainda resta da emotividade, reflete-se apenas em esporádicas euforias provenientes de um sentir, revelador da aquisição de qualquer coisa nova que nos sobredimensiona e que Mounier (filósofo francês, criador do personalismo cristão) exprime melhor do que ninguém:
- ‘Falta uma dimensão ao homem que não conheceu a prisão’.” (...)
5. Na última parte iremos abordar as adições que acabam por valorizar este testemunho e tornar o depoimento de Lobato uma das memórias mais impressivas de toda a guerra colonial que os portugueses viveram entre 1961 e 1975.
António Lobato mexe e remexe no seu poderoso testemunho, de edição para edição:
6. (...) Temos agora uma narrativa ainda mais vigorosa e em muitos pontos ganhou intimismo, espelhando os altos e baixos de um cativo que descobre força anímica para acreditar em si próprio e tentar escapar ao degredo.
A primeira descrição relaciona-se com o acidente aéreo, tem mais detalhe, dinâmica, a clara perceção do risco, a mestria da operação para aterrar em condições excecionalmente hostis:
(...) “O meu avião continua a vibrar como que sacudido por uma peneira gigante, devido ao desequilíbrio provocado pelo hélice todo torcido. Nestes casos, o procedimento para evitar o descontrolo total é parar o motor e saltar em paraquedas, ou então tentar uma aterragem de emergência sem motor.
"Num relance de olhos para o exterior, vejo uma clareira no meio da mata onde me parece que sou capaz de meter o avião. Como o motor está parado, sei que tenho de guardar uma velocidade tal que me permita manter o avião a voar como um planador e fazer uma avaliação muito correta de aproximação ao início da clareira, tão baixa quanto possível, mas sem bater nas árvores que a circundam.
"A quem não está familiarizado com os assuntos de aerodinâmica e pensa que a um avião com o motor parado só resta cair, devo esclarecer que, enquanto houver altitude suficiente para descer e manter uma velocidade de planeio, este voa normalmente até chegar ao solo.
"Perante a rapidez de decisão que a situação exige, o afluxo de adrenalina é tal que todas as faculdades passam a ter uma acuidade várias vezes superior ao normal. Todas as mnemónicas aprendidas há cinco anos atrás, ainda na fase da formação, para fixar procedimentos de emergência, afluem à memória com um rigor e uma fidelidade alucinantes.
"Nos escassos segundos que me separam do contacto com o solo, enquanto vigio e controlo com a cabeça, com as mãos e com os pés, não só o valor sagrado daquela velocidade mínima que ainda permite voar, mas também a altitude, a direção e as manobras de glissagem, perigosas mas necessárias para encaixar o avião no início da exígua clareira, vou simultaneamente executando os restantes procedimentos que contribuem para o sucesso de uma aterragem de emergência, tais como: apertar cintos, abrir cabine, desligar combustível, mistura e magnetos, desligar bateria e assumir uma atitude de corpo e alma bem encostados à cadeira.
"O ponto de contato com o solo confirma-me a justeza do planeamento, mas surge um imprevisto que do ar foi impossível detetar – o terreno não é totalmente liso; sulcos profundos, espaçados metro a metro, cortam-no de lés a lés. É uma bolanha.
"Atendendo a que este tipo de aterragem é feito com o trem recolhido, o entrar das metralhadoras num dos sulcos teve o efeito de arrancar instantaneamente as asas à aeronave. Fico sentado dentro de um charuto que rebola agora sobre si mesmo, ao longo do terreno”.(...)
E é com esta chave explicativa, em pleno clímax, que Lobato sai incólume e vai ser capturado, ao princípio ainda acredita que quem com ele vem dialogar o ajudará a percorrer as duas dezenas de quilómetros para chegar a Catió, é brutalmente ferido, o calvário vai começar.
Vai-nos contar o início do dia nessa cadeia de segurança onde jazem inimigos de Sékou Touré:
(...) “Não resisto à curiosidade de ver o que se passa no exterior e penduro-me nas barras de reforço da porta para elevar a cabeça a uma altura que me faculte uns metros de horizonte.
O que vejo aterroriza-me! O pátio é hexagonal, um espaço a céu aberto para onde se abrem quatro portas de ferro, totalmente opacas, bem mais baixas que a minha e sem grades a encimá-las, vai-se enchendo de negros de todas as idades, descalços e quase nus, manifestamente subalimentados, que saem por aquelas portas como rebanhos escorraçados por uma fera invisível que os persegue.
"No centro do pátio, chicote em riste e porta de carrasco, um guarda sem expressão facial, tão ameaçador quanto esquelético, orienta para o grande portão de saída aquela enxurrada de negros totalmente desprotegidos, distribuindo chicotadas à direita e à esquerda, vociferando insultos apenas intercalados por nojentas cuspidelas num chão de cimento muito irregular.
"Junto ao portão de saída para o exterior, alinhadas ao lado de cada uma das ombreiras, duas colunas de homens armados. Nos pés trazem sandálias de plástico coloridas pela terra avermelhada dos caminhos que percorrem. Vestem calças engelhadas, de um caqui esverdeado, e uma camisa sem mangas, do mesmo tipo de tecido. À medida que os prisioneiros saem para as GMC que os esperam à porta, vão sendo contados pelos soldados.
"Terminada a tarefa do embarque para trabalhos forçados, os grandes portões fecham-se e tem início outra tarefa, atribuída aos inaptos para o trabalho no exterior e àqueles que alguma vez tentaram a fuga.
"De cada uma daquelas quatro portas opacas, ainda abertas, saem agora pequenos grupos que se movem com alguma dificuldade. Uns são leprosos a que já faltam partes do corpo, sobretudo das mãos e dos pés; outros tossem convulsivamente e expelem escarros amarelos para aquele chão meio desfeito; outros, ainda, apoiam-se às paredes para não tombar e arrastam-se com dificuldade em direção a uma outra porta que entretanto se abriu e dá acesso a uma área de recreio.
"Os menos afetados por doença ou caducidade sustentam nos braços metades de bidões de duzentos litros que transbordam de fezes e outros dejetos. Acompanhados por um guarda, saem pela porta principal. Minutos depois, oiço-os nas traseiras da minha cela a despejar os imundos recipientes.
"Todos os dias, após esta operação, o mau cheiro engrossa como se de coisa sólida se tratasse e põe a prisão a transbordar de nojo. O trágico amanhecer não fica por aqui. O encetar de uma terceira operação obriga-me a descer do meu posto de vigia, mas ainda bem que isso acontece, porque já tenho os braços dormentes de estar tanto tempo suspenso.
"O guarda começa a abrir as portas das sete celas que também dão para o pátio hexagonal. Dois negros estropiados retiram do interior de cada cela um balde de zinco que a seguir despejam num bidão colocado para o efeito num dos ângulos do pátio.
"Também eu tenho aqui dois baldes, sendo um deles substituto da sanita e outro servindo de contentor de água para todos os fins, isto é, para beber, para lavar e para substituir o papel higiénico que por estas paragens é desconhecido”. (...)
A transcrição destes dois textos é um convite para que se releia António Lobato, um jovem sargento piloto-aviador capturado no Tombali, em maio de 1963 e libertado durante a “Operação Mar Verde”, em novembro de 1970.
Foi considerado herói nacional e voltou ao ativo até ter passado à reserva em 1981. Exerceu outros cargos, posteriormente.
É um dos mais impressionantes documentos de vida em cativeiro, senão mesmo o mais impressionante de todos. De leitura obrigatória.
11 comentários:
E chocante saber que Portugal, o Estado, a diplomacia portuguesa, durante anos nada fez para reconhecer e a minorár a miserável existència do nosso camarada, enterrado na cela 7 da prisão de Kindia, Guiné-Conacri.
Para o Portugal de Salazar não havia "prisioneioros de guerra". Foi a família,a esposa e a Cruz Vermelha que o ajudaram, além do prisioneiro Chambord. Onde esteve a Cecília Supico Pinto e o seu Movimento Nacional Feminino ?...
Tenho que reler o livro, para perceber melhor a relação que o António Lobato conseguiu estahelecver com o exterior.
Ler no "Observador"... Há confidências que vale a pena conhecer:
(...) "Foi por isso mesmo que, em 1999, quando o então Presidente guineense Nino Vieira o convidou para almoçar, António Lobato não pensou duas vezes. Ao longo de um par de horas, conversaram e recordaram os tempos em que um tinha estado à guarda do outro. Dias depois, quando fez check-out do Hotel 24 de Setembro, a funcionar no local onde décadas antes tinha sido a messe dos oficiais portugueses em Bissau, o piloto descobriu que a sua estadia já tinha sido paga — nada menos do que pelo primeiro Presidente da República da Guiné Bissau.
“Depois, quando perdeu o mandato, fugiu da Guiné e veio para Portugal, os jornalistas perguntaram-lhe se tinha cá alguém conhecido e ele respondeu: ‘Tenho um amigo, o Lobato!’”, continua a recordar. “Isto não cabe na cabeça de ninguém, mas para ele eu era um amigo, um conhecido.” (...)
https://observador.pt/especiais/voar-escrever-e-abracar-os-antigos-carcereiros-o-resto-da-vida-do-piloto-antonio-lobato-depois-de-7-anos-e-meio-em-cativeiro/
Não sabia que tinha trabalhado na avião civil, em Cabo Verde, até 1975:
(...) Em 1973, de cabelo cortado, já este estado de graça tinha acabado, António Lobato aceitou um convite para fazer uma comissão civil nos Transportes Aéreos de Cabo Verde, voltou ao continente africano — e experimentou, pela primeira e última vez, a aviação comercial, que, continua a dizer, “não é bem voar”.
"Em Cabo Verde, onde viveu até 1975 com Maria dos Anjos, reencontrou-se com alguns dos guerrilheiros do PAIGC que anos antes o tinham mantido prisioneiro. “Em 1975, já eu tinha os miúdos, um com 1 ano, outro com 6 meses, certo dia, na Cidade da Praia, na avenida principal, aparece um grupo de cinco ou seis pessoas. Olhámos uns para os outros e reconhecemo-nos logo, eram chefes da guerrilha, só me lembro do nome de um deles, era o Xuxo. Abraçámo-nos todos e ainda estivemos um bocado à conversa”, revela o piloto.
“Os civis dificilmente entenderão que dois contendores em guerra, um de um lado da barricada, outro do outro, são inimigos naquele momento e matam-se uns aos outros, mas depois de aquilo acabar podem até tornar-se grandes amigos. Porque ambos conheceram os males da guerra”, tenta explicar. “Eles não se mataram por serem inimigos uns dos outros, mataram-se a cumprir um determinado dever que lhes incutiram. Mas, depois de as guerras acabarem, não se odeiam. A gente na guerra não odeia o inimigo. Não é por ódio… É isso que é muito difícil de entender.” (---)
https://observador.pt/especiais/voar-escrever-e-abracar-os-antigos-carcereiros-o-resto-da-vida-do-piloto-antonio-lobato-depois-de-7-anos-e-meio-em-cativeiro/
São surpreendentes estas revelações do Lobato sobre a sua vida a seguir à libertação e sobretudo a "reconciliação" com os antigos inimigos... Já no livro há referências senão "elogiosas" pelo menos "condescendentes" sobre alguns dirigentes que o visitam na prisão: o Turpin, o Fidelis e até o próprio Amílcar Cabral...
Lobato precisou de fazer as pazes ou pelo menos de exorcizar os fantasmas do passado. Sendo um homem crente, de formação cristã, deve ter perdoado muita coisa. Só não perdoou ao Sekou Toure...
Pergunto:
Como adquirir o livro.
Agradeço a info. possível.
Abraço.
JLFernandes
Podes comprar através da FNAC ou da WOOK ou da DG Edições, Linda-A-Velha. 5a edição, 2014.
A última edição deve ser mesmo a de 2014. 5a.edição. Mas deve haver exemplares de edições anteriores, a preço de saldo.
No entanto - sendo certo que a 1ª edição da narrativa histórica "Liberdade ou Evasão" foi dada à estampa em Dez1995 -, não deixo de notar ser igualmente «chocante saber que» o proprietário deste 'blog', ao longo de quase duas décadas não tenha dedicado meia-dúzia de publicações/comentários, ao assunto que é, sem sombra de dúvidas, sobre a Guiné.
Agora em casa, depois de um internamento de um mês no Hospital Amadora-Sintra, do SNS, ouvindo música, neste caso a ópera 'Guerra e Paz', de Prokofiev, e lendo os posts, do blog da Tabanca Grande & Camaradas da Guiné, observei :
"Em 26 de novembro, todos os prisioneiros de guerra aterram na Portela e vão no autocarro para o Forte de Catalazete, estão oito dias consecutivos trancados numa sala com luz artificial e guardados por dois inspetores da DGS."
Tivesse acontecido em 1934 ou até em 1940, seriam guardados por patriotas antimarxistas que trocariam impressões sobre a colónia da Guiné.
Saúde da boa
Valdemar Queiroz
26 DE SETEMBRO DE 2008
Guiné 63/74 - P3244: Bibliografia de uma guerra (32): Liberdade ou Evasão, de António Lobato (Carlos Vinhal)
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2008/09/guin-6374-p3244-bibliografia-de-uma.html
(...) Ao falarmos do livro Liberdade ou Evasão , do então (1995) Tenente Piloto da FAP António Lobato (hoje Major), mais não queremos que prestar a nossa homenagem ao militar que, nos limites da impotência, escolheu a prisão em troca da liberdade, que lhe era concedida se traísse os seus princípios e os seus camaradas que lutavam nos céus, nos rios e nos diversos chãos da Guiné. (...)
Ontem, 5ªf 14Mar2024, pelas 13:38, fiz aqui publicado um 'comment' neste mesmo 'post'.
Fiquei, arquivada e a bom recato, com respectiva cópia integral e fidedigna.
Não que seja assunto relevante; mas lá que, pelos vistos e acontecidos, alguém - desagradado - o fez "desaparecer" 'in action', é um facto.
Face ao exposto, repito-o: 'verbatum'.
... «juventude transmontana em Paderne»... ?!
Transmontana?!?!?!
O António Lourenço de Sousa Lobato nasceu em Sante, uma aldeia de Paderne sita no nordeste concelhio de Melgaço, no Alto Minho.
Caramba, tanta cagança literata de recensor... para haver cometido tamanha calinada!
...
Adiante, entra na useira e vezeira cena de "traduttore traditore" e logo lhe escorrega o pezinho p'ró chinelo esquerdola:
- «E, como ele escreve, em 1960 rebenta a guerra colonial.»
Não! O meu recém-finado Amigo Lobato jamais se referiu - mentalmente ou sequer oralmente nem por escrito! -, à nossa Guerra do Ultramar colocando-lhe baias antipatrióticas e marxisantes, adjectivando-a "colonial"... !
Respeito; e tento na língua, sr. Beja dos Santos; até porque há quem já esteja farto das suas patranhas.
(Ah! E queira notar que não foram «23 cidadãos portugueses»: foram, sim, 26 - vinte e seis! - osmilitares portugueses libertados pelas NT dos cárceres da masmorra "A Montanha" de Conacrky na madrugada de 22Nov1970)
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Final de cópia.
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Adenda (em tempo): na Província Ultramarina da Guíne Portuguesa, o terrorismo armado, capitaneado por ACabral, não foi lançado «em 1960»; sim em 1963.
Concisão e rigor histórico, continuam a ser imprescindíveis, mesmo que seja num 'blog'.
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