sábado, 16 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25278: Os nossos seres, saberes e lazeres (619): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (146): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (6) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Novembro de 2023:

Queridos amigos,
Folheio uma obra de Túlio Espanca sobre a cidade de Évora e fica-me o ressaibo de indisfarçada amargura de amanhã partir de regresso a casa sem visitar o antigo quartel dos Dragões de Évora, o Palácio de D. Manuel (ou o que dele resta), passear-me no Aqueduto da Água da Prata, ver o mirante da Casa Cordovil e algumas igrejas que são tesouros, como a Igreja de S. Francisco. Fica para a próxima. Deu-me enorme prazer sair do Centro de Arte e Cultura da Fundação Eugénio de Almeida e ver outros empreendimentos da Fundação como a coleção de carruagens e o Páteo de S. Miguel e o Paço dos Condes de Basto, visitas que a todos se recomenda quando vierem à princesa do Alentejo, estou pronto a regressar, e sem demora.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (146):
Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (6)

Mário Beja Santos

Os fotógrafos de smartphone, com os quais alinho, têm o dever de ir eliminando imagens da câmara para que não chegue o pesadelo da lentidão da máquina. Estava a proceder a essa filtragem quando fiquei um tanto embasbacado quando descobri que não tinha incluído este magnífico presépio, imagem captada no Museu Nacional de Évora, no episódio apropriado, correspondente à dita visita. Por o achar muito belo, entendi que o leitor perdoaria o dislate e podia ver com agrado um vistoso presépio de que nos podemos orgulhar ter uma vastíssima coleção de obras únicas que não se confinam aos trabalhos portentosos de Machado Castro, dispomos de peças de rara sensibilidade por museus e templos religiosos e até casas particulares. Aqui fica o registo.
Presépio esplendoroso, de uma espantosa riqueza figurativa na sua organização

Visitado que foi o Centro de Arte e Cultura, havia que visitar um outro tesouro da Fundação Eugénio de Almeida, a coleção de carruagens, assente no antigo celeiro do Cabido da Sé de Évora. O edifício foi adquirido em 1959 por Vasco Eugénio de Almeida com o objetivo de integrar o conjunto edificado do pátio de S. Miguel. Abriu ao público em 1998 e foi alvo de requalificação entre 2008 e 2011, temos aqui uma coleção de carruagens que reúne os atrelados e utilitários de viagem que estiveram ao serviço da Casa Eugénio de Almeida entre a segunda metade do século XIX e os primeiros anos do século XX. A exposição não deixa de mencionar que com os primeiros anos do século XX as carruagens entraram progressivamente em desuso. A família Eugénio de Almeida começou a ter carros a partir de 1907, houve que adaptar as cocheiras do Parque de Santa Gertrudes. Décadas depois, quando as carruagens não passavam de relíquias, vieram expeditas por caminho de ferro até Évora. Mas veio o racionamento da Segunda Guerra Mundial, as velhas carruagens não tardaram a ser resgatadas e postas ao serviço, até que terminou a guerra. São estas as carruagens de família e outras peças adquiridas em leilões, caso da cadeirinha que podemos ver com imensa satisfação.
Imagens recolhidas na coleção de carruagens
Já muito se passeou e o palato pede uma açorda com muito coentro e uns cubos bem olorosos de carne de porco. É nesse ínterim que se percorrem as arcadas da Praça do Giraldo e dá-se conta que numa intervenção foi encontrado um fresco e ali ficou mantido em estado de boa conservação para nos recordarmos de outras eras em que seguramente estas arcadas, já de si garbosas, possuíam frescos.

É a última deambulação do dia, a visita ao Palácio dos Condes de Basto ou Paço de São Miguel, a sorte favorece os audazes, esta tarde o Paço é visitável, coisa que raramente acontece. Diz o guia de Évora que a origem deste palácio remonta, pelo menos, ao período muçulmano. Conheceu-se sucessivas modificações, não falta no seu interior o estilo manuelino e mudéjar. Assenta sobre troços da muralha medieval (e romana) e tem uma aparência exterior fortificada. A elegâncias das reformas manuelinas traduz-se nas janelas geminadas e nos arcos ultrapassados de um dos corpos principais, o conjunto é discreto e funde-se com a malha urbana da cidade. Só penetrando no páteo é que se começa a vislumbrar a extensão do palácio. O corpo adjacente situado a poente é mais moderno, teve obras entre 1570 e 1573. É aqui que encontramos três salas ornamentadas por programas fresquistas. Deve-se a Vasco Eugénio de Almeida, no século XX, a profunda intervenção de conservação e restauro de todo o complexo de edifícios do Páteo de São Miguel. O Paço está classificado desde 1922 como Monumento Nacional.

A Sala Oval é coberta por uma abóbada artesoada preenchida por uma copa de árvores cujos ramos e vegetação se encontram entrançados; entre estes ramos brincam crianças colhendo frutos, num ambiente de fortuna e prazer, rodeados das oitos ninfas segundo as Metamorfoses de Ovídio. A Sala da Tomada de La Goleta é coberta por 22 painéis com frescos cuja temática é a abundância.
Sala de bilhar
Um encantador sinal da arte mudéjar.

Aviso o leitor que vamos prolongar esta visita. Enquanto por aqui se deambulava, uma amável cicerone indicou uma sala onde se podia ver como era o Páteo de São Miguel antes das obras, fica-se de boca aberta com o estado de degradação, de completo abandono em que se encontravam grande parte das instalações adjacentes ao Paço. Houve a preocupação de ler Túlio Espanca antes de vir a Évora. Ele refere a importância da cidade na História de Portugal, refere mesmo a arquitetura civil manuelina e não esquece o Paço dos Condes de Basto. Este importante divulgador cultural refere a sua história e fala do edifício do seu interior desta maneira:
“Edifício de grande caráter e acentuada diversidade arquitetónica, assenta na torre e muralha mediévicas, em cujo flanco oriental rompe a hoje obstruída Porta da Traição e no maior bloco se ergue o imponente pavilhão de telhados de quatro águas, rasgado por janelas minadas, de arcos de ferradura, de ladrilho e delicada capitelação de pedra regional. No interior, disposto em majestosas salas, subsistem curiosas pinturas murais do estilo renascentista e outras maneiristas, de temática mitológica ou histórica.”

Vamos a seguir concluir a visita a tão impressionante conjunto de edifícios.

(continua)

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Nota do editor

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