Pesquisar neste blogue

Mostrar mensagens com a etiqueta Bissorã. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Bissorã. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Guiné 61/74 - P27494: Aviões que serviram na guerra colonial na Guiné, e os do tempo da CCAÇ 816 (1965/67) (Rui Silva, ex-2.º Sarg Mil)

1. Trabalho enviado ao blogue pelo nosso camarada Rui Silva, ex-2.º Sarg Mil da CCAÇ 816 (Bissorã, Olossato e Mansoa, 1965/67) que ele elaborou e publicou no facebook privado da CCAÇ 816.


AVIÕES QUE SERVIRAM NA GUERRA COLONIAL NA GUINÉ, E OS DO NOSSO TEMPO (1965-1967)

- Nota: algumas destas aeronaves estiveram na Guiné antes de nós ali chegarmos e outras estiveram posteriormente

Os 9 primeiros conhecemo-los bem e, pessoalmente, mais ainda a avioneta DORNIER DO 27, o avião DAKOTA DC-6 e os helicópteros ALOUETTE II e o ALOUETTE III, estes 2 últimos no transporte de feridos do mato para o Hospital Militar de Bissau, nomeadamente nas operações a Iracunda (23Jun/65 e 7Mai/66), Biambi (10Jul/65), na limpeza da estrada Olossato-Farim (1 Ago/65) e na célebre operação a Morés (20Fev/66) aqui mais no transporte de evacuados por insolação e do material capturado levado para o Olossato:

A última foto mostra o avião civil (não militar) o quadrimotor “Super. Constellation” da TAP, no aeroporto de Bissau, que nos trazia para férias na metrópole. A viagem demorava cerca de 8 horas de Bissau para Lisboa e era direta. O regresso fazia-se com escala na ilha do Sal em Cabo Verde.


********************

Bombardeiro bem nosso conhecido, muitas vezes atuaram em operações nossas com realce para a atuação na célebre emboscada na bolanha de Joboiá (estrada Olossato-Farim) naquele domingo em 1 de Agosto de 1965 onde os bombardeiros tiveram uma ação preponderante e decisiva, sem esquecer a nossa valentia.arvard.
O T-6 foi um dos mais famosos aviões monomotores de hélice, conhecido por nomes como Texan, Harvard, Yale, Wirraway, Mosquito, Boomerang e Tomcat, conforme o país que o usava.
Foi adoptado na Força Aérea de 55 países, desde avião de treino de pilotos a bombardeiro.
Criado em 1935 pela North American, começou a ser utilizado em força em 1940, sendo introduzido em Portugal em 1946.
O T-6,avião convertido em caça-bombardeiro ligeiro, equipado com metralhadoras, mísseis, bombas convencionais ou de napalm debaixo das asas ou a actuar como avião de reconhecimento.

Caraterísticas do avião:
Monomotor de propulsão a hélice
Envergadura de 12,81m
Potência: 600 CV
Veloc. máx.: 335 km/h
Voo até 7400 metros de altura
Veloc. de subida: 6,1 metros por segundo

Equipamento de combate do T6:
4 metralhadoras Browning 7,7 mm (duas em cada asa)
2 bombas de 50 kg
6 bombas de 15 kg
Contentores de napalm (alternativa)
1 mira de pontaria


********************

Caça-bombardeiro monomotor turbo-jato também bem nosso conhecido.
Com 8,56 metros de envergadura, atingia a velocidade máxima de 1090 km/h; tinha um raio de acção de 1850 km; com tecto de serviço de 13.260 m.
Era armado com quatro metralhadoras Browning 12,7 mm ou dois canhões DEFA de 30 mm para além de 3 câmaras fotográficas Vinten, 1 frontal e 2 laterais.
Em Março de 1966, foram embarcados oito FIAT G.91R/4 que iriam constituir a Esquadra 21 "Tigres" na Base Aérea n.º 12 em Bissalanca, ex-Guiné Portuguesa, a qual se tornou operacional em finais de Junho do mesmo ano.
Regressaram a Portugal em 1974, após mais de 14.000 horas de voo em missões de combate.
Na Guiné foram abatidos ou destruidos por acidente 7 Fiat, 6 abatidos pelo inimigo, 3 deles por mísseis Strela; 1 por acidente com bomba, tendo morrido 1 piloto num dos aviões abatidos.


********************

Esta avioneta foi utilizada na Guiné em missões de observação e sobretudo para transporte de mantimentos, evacuação de feridos, etc. dadas as suas capacidades de descolar e aterrar em espaços muito curtos.
No Olossato, aquando das primeiras vezes que lá fomos antes de nos instalarmos definitivamente, ainda deu para ver os destroços de um junto à messe dos Furrieis.
Aeronave monomotor de trem de aterragem convencional fixo com roda de cauda, monoplano de asas altas, totalmente revestido a tela.
Tripulação: 1 piloto.
Capacidade de carga: 2 passageiros.
160 CV de potência.
Envergadura 10,97 metros
Velocidade máxima 211 km/h
Tecto de serviço 3900 metros.
Esta avioneta viria a ser substituida pelos Dornier, ainda dentro do nosso tempo


********************

Muitos de nós andaram nesta avioneta e logo começou nos primeiros tempos com o transporte por evacuação de Bissorã para o Hospital Militar de Bissau, do “Maravilhas” acidentado com arma de fogo.
O DO 27 é um avião monomotor, asa alta, trem de aterragem convencional fixo, com a capacidade de transportar seis passageiros ou o equivalente em carga.

Na Guiné tinha a missão de transporte de passageiros, evacuação de feridos, militares para consultas no Hospital Militar em Bissau, reconhecimento aéreo e transporte de correio a nossa avioneta do coração.
Esta avioneta transportou muitos elementos da Companhia para Bissau para férias ou ali em trânsito para férias na Metrópole.
Era também a avioneta do correio e muito exaltávamos quando a víamos no ar no dia certo.
Esporadicamente foram utilizados em missões de apoio utilizando foguetes montados sob as asas.
Avioneta com uma envergadura de 12 metros; uma velocidade máxima de 250 km/h e um teto máximo de 5,5 km.


********************

Avião bimotor, operava em missões de carga e transporte de passageiros. Durante a Guerra do Ultramar nas três frentes executaram missões de reconhecimento aéreo, lançamento de paraquedistas (principalmente), transporte de feridos, busca e salvamento e até serviu de bombardeamento.
Tripulação: 4 (piloto, co-piloto, navegador e operador de rádio)
Passageiros: (paraquedistas e outros) 28
Envergadura: 29,41m
Potência: 1200 CV
Velocidade máxima: 360 km/h
Teto máximo: 8045m


********************

Avião dos evacuados para os Hospitais da metrópole; o avião que me trouxe como evacuado (Jan1966), e ao “Doutor" e ao Alferes Costa em outras datas.
Eram aviões quadrimotores, construídos no final da II Guerra Mundial para missões de transporte de longa distância. A Força Aérea utilizou os DC-6 nos Transportes Aéreos Militares (TAM) que ligavam a Metrópole a Bissau, Luanda e Beira. Serviram frequentes vezes para evacuar os feridos dos teatros de operações para o Hospital Militar Principal em Lisboa. Podiam transportar além de uma tripulação de 4 pessoas também cerca de 55 passageiros, a uma velocidade de 500 quilómetros por hora.
16 horas de voo com escala (45 minutos) em Las Palmas, de Bissau a Lisboa.
Avião com uma envergadura de 35,81 m
Teto máximo 7600 m


********************

Avião bimotor de dupla cauda e de asa alta, com 2 motores em estrela e um peso máximo de descolagem de 21 mil kg. Visualização de manobras aéreas com salto de paraquedistas.
Intrigavamo-nos quando víamos passar aquele avião com duas fuselagens. Único no género, que víssemos.
Usados em Tancos para treino de paraquedistas e, nas colónias, conjuntamente com os Douglas (Dakotas), deram suporte aéreo nas áreas de comunicação, lançamento de paraquedistas e transporte de feridos.
Com uma envergadura de 32,5m
Velocidade máxima: 405 Km/h
Tecto de serviço: 7100 m
Distância máxima de voo: 2500 Km
Capacidade de transporte: 32 passageiros ou carga até 5800 Kg
Tripulação: 5 (2 pilotos, mecânico, navegador e operador de rádio).


********************

O helicóptero que transportava os feridos em macas suspensas do lado de fora da aeronave. Bem nosso conhecido pois, logo de princípio víamo-los passar por cima do quartel de Brá onde estivemos nos primeiros 15 dias de Guiné, já bem baixos e a caminho do Hospital Militar mais adiante e ali perto.
Intrigávamo-nos porque eles levavam um ou duas (uma de cada lado) o que pareciam macas suspensas do lado de fora da aeronave. Deduzimos que só podia ser para servirem ao transporte de feridos (ou mortos) e assim era.
Alguns militares da CCAÇ 816 chegaram a utilizá-los pelos piores motivos (feridos), nomeadamente em consequência das operações a Iracunda (23Jun65 - 2 feridos), a Biambi (10Jul65 – a única operação que atuamos em conjunto com a CCAÇ 818 –1 ferido) e na estrada Olossato-Farim (1Ago65 -3 feridos graves +1 morto, este o Furriel Silva que não chegou a sair do Olossato onde esteve em câmara ardente). Aqueles 3 feridos transportados também para o Hospital Militar de Bissau.
Os Alouette II começaram a ser substituídos em Novembro de 65 (tínhamos meio ano de Guiné) pelos Alouette III que se mantinham em operacionalidade quando regressamos à então Metrópole.
O Alouette II foi o primeiro helicóptero do mundo, motorizado com turbina a gás a ser certificado para voo.
Diâmetro do rótor principal: 10,20m
Potência: 530 CV
Velocidade máx: 185 km/h
Tecto máximo: 2300m
Capacidade de transporte: Piloto e co-piloto, e cinco passageiros ou peso equivalente de carga; ou então duas macas e assistente.


********************

O Alouette III veio substituir o II por ser mais rápido, mais ampla cabine de pilotagem e com capacidade para mais pessoas no interior; os feridos eram transportados no seu interior. O Alouette III tinha também uma mais ampla capacidade de voo, mais veloz e mais teto.
É um desenvolvimento do Alouette II, tendo um tamanho maior e uma maior capacidade de carga. O Alouette III era reconhecido pelas suas capacidades de operação em grandes altitudes, sendo o ideal para o salvamento em áreas montanhosas, o que na Guiné não era o caso.
Em Novembro de 1965 ocorreu o primeiro voo de Alouette III na Guiné, sendo colocados na BA 12 - Bissalanca.
Estes helicópteros foram introduzidos em Portugal em 1963, primeiro em Angola e depois na Guiné. Portugal terá sido o primeiro país que os usou em combate, em missões diversas, desde transporte de feridos ou por evacuação, mormente por insolação, até ao apoio no combate ou até escolta.
O Alouette III evacuou 3 feridos da CCAÇ 816 e outros evacuados por desidratação e ainda na envolvência de transportes de armamento militar capturado ao inimigo na célebre operação “Castor” em 20 de Fevereiro de 1966. Aqui foram 6 helicópteros a atuar, pela celeridade da operação, e num vai-e-vem constante. Mais tarde, aquando de nova operação a Iracunda, em 7 de maio 1966, transportou 1 ferido grave, o saudoso Tiago Manso, que viria a falecer uns dias mais tarde no Hospital Militar de Bissau. (RIP Tiago).
Tripulação: piloto e co-piloto + 5 passageiros
Diâmetro do rotor horizontal: 11,02m
Velocidade máxima: 220 km/h
Potência: 870 CV
Teto máx.: 3200 m


********************

Avião caça-bombardeiro, com motor turbo jato, monomotor e monoplano.
Foram fornecidos aos aliados dos EUA, nomeadamente Bélgica, Dinamarca, França, Itália, Holanda, Noruega, Portugal, Turquia e Republica da China (Taiwan) e a países não alinhados como o Irão, Tailândia, e Jugoslávia. Portugal seria o último país a abater os seus F-84G ao serviço operacional da sua força aérea, em 1976, depois de os utilizar de forma intensa na guerra de independência das suas colónias em África, em particular em Angola, onde equipou a esquadra 93.
Este caça terá atuado fugazmente na Guiné
Velocidade máxima: 1020 km/h
Teto de serviço: 12350 m
Taxa de subida: 19,1 m/s


********************

Avião caça transónico, com motor turbojato, monomotor, monoplano.
Primeiros caças na Guiné como aviões de reconhecimento antes da guerra eclodir.
Quando aquela começou estes caças transformaram-se em bombardeiros e equiparam-se com seis metralhadoras Browning Colt TM3, calibre 12,7 mm, e podiam transportar vários tipos de armamento, como os foguetes de 2,75”, bombas GP de 50 e 250 kg e tanques de napalm de 350 L.
Os Sabre foram, ainda em 1963, substituídos pelos T6 Havard que nós tão bem viemos a conhecer e a tê-los em companhia em diversas operações.
Tripulação: 1 piloto
Envergadura de 11,31m
Veloc. máx.: 995 km/h
Teto de serviço: 14600 metros


********************

O Lockeed PV2 Harpoon era um bombardeiro médio, bimotor. Transportava bombas no compartimento central e nas asas, podendo ser instaladas até oito metralhadoras 12,7 mm na proa.
Utilizado na Guiné também como se fosse um caça-bombardeiro.
Atingia a velocidade de 450km/h


********************

O C-54 Skymaster é um avião movido a hélice de quatro motores, desenvolvido pela Douglas Aircraft Company. Operou durante a Segunda Guerra Mundial e no transporte aéreo em Berlim. A partir de 1945, muitas companhias aéreas civis operavam com esta aeronave em todo o mundo.
Úteis em tarefas de transporte, lançamento de paraquedistas, como avião-hospital, etc.
O C-54 Skymaster foi usado na Guerra Colonial inclusivamente na Guiné
Envergadura: 35,8 m
Potência: 1450 CV
Velocidade máxima: 442 km/h
Teto máximo: 6800 m


********************

O avião Douglas Invader B-26 foi um avião bimotor desenvolvido pelos Estados Unidos como uma aeronave de ataque e bombardeiro leve durante a Segunda Guerra Mundial,
O trem de aterragem era triciclo, com comando da roda de proa a partir do “cockpit”.
3 tripulantes (piloto, mecânico de voo e operador de rádio)
Equipava metralhadoras, foguetes e bombas.
Envergadura: 21,34 m
Potência (por motor): 2000 CV
Velocidade máxima: 570 km/h
Teto máximo: 6700m


********************

Avioneta de fabrico francês utilizada em reconhecimento, transporte ligeiro, evacuação, etc. Avioneta parecida com a Auster e a Dornier, já acima referidas e que passou fugazmente pela Guiné.
Os franceses utilizaram os Broussard na luta contra os guerrilheiros argelinos, utilizando um canhão móvel que disparava através da porta traseira, situada no lado esquerdo.


********************

Aeronave bimotor terrestre de trem de aterragem convencional retrátil, monoplano de asa baixa, duplo estabilizador vertical, revestimento metálico, cabina integrada na fuselagem, destinado a transporte ligeiro, patrulhamento, reconhecimento e instrução de navegação.
Envergadura: 14,5 m
Velocidade máxima: 352 km/h
Teto de serviço: 5548 m
Tripulação: piloto e co-piloto


********************

Em 1970, (já passados 3 anos do regresso da CCAÇ 816) a Força Aérea Portuguesa adquiriu 13 helicópteros Puma, devido à necessidade de maior capacidade de transporte durante a Guerra do Ultramar.
Com uma tripulação de 2 pilotos e podendo transportar 18/20 homens com o seu equipamento habitual (paraquedistas), um número bastante superior aos 5 passageiros possíveis com os Alouette III, o que aumentou significativamente a mobilidade do Exército Português.
Considerado um helicóptero médio com capacidade para voar com todo o tempo. Estava equipado com 2 turbinas “Turbomeca” com 1900 CV de potência, tinha um peso máximo à descolagem de 3770 kg e uma velocidade máxima de 258 km/hora, possuindo uma autonomia de 5 horas. Podia ser equipado com armamento: 1 canhão de 20 mm, 2 metralhadoras coaxiais de 7,62 mm ou mísseis.
Também possuía um guincho para recolha de pessoas a partir do chão ou do mar, radar e piloto automático que lhe permitia fazer estacionário automaticamente.


********************

Foram 2 destes aviões que vieram a substituir os Dakota DC-6 que desde 1961 vinham mantendo a ligação da metrópole com Angola, Guiné e Moçambique.
O Boeing 707 é um avião comercial a jato quadrimotor de porte médio e fuselagem estreita desenvolvido e produzido pela Boeing entre os anos de 1958 e 1979.
Foram os aviões quadrireactores que passaram a transportar as tropas entre a Metrópole e as 3 colónias em guerra, substituindo os navios.
No nosso tempo a pista do aeroporto de Bissau não reunia condições para estes aviões a jato nem sequer estes existiam na frota portuguesa da TAP.
Tripulação: piloto, co-piloto e engenheiro de bordo
Capacidade para 202 passageiros
Envergadura 44,42m
Velocidade (de cruzeiro) 815 km/h

********************

Avião monomotor de asas fixas e baixas com um piloto e até 6 passageiros.
Avioneta com caraterísticas semelhantes às “Dornier”.
Possuía uma envergadura de 10 metros e uma potencia de 300CV, com uma velocidade máxima 280 km/h e com um teto de serviço de 4950m.


********************

O P2V5 Neptuno, equipados com meios sofisticados electrónicos principalmente para a detecção e o combate a submarinos.
A Força Aérea fez deslocar rapidamente vários meios aéreos para os chamados territórios ultramarinos e os P2V-5 passam também a ser usados nas colónias portuguesas em missões de natureza diversa.
O P2V5 Neptuno é um avião bimotor, asa média, de trem de pouso retráctil,
Aeronave de patrulha marítima e anti-submarina, com motores radiais a pistão e motor turbojato, bimotor monoplano, para uso civil e militar
Velocidade máxima: 515 km/h
Envergadura: 30,48m
Estavam equipados com oito suportes de rockets em cada asa


********************
_____________

terça-feira, 26 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27152: (De) Caras (238): o senhor Michel Ajouz, o comerciante libanês de Bissorã, cristão maronita, amante do bom uísque (Manuel Joaquim / Rogério Freire)



Guiné > 1956 >  Anúnico da casa comercial de Michel Ajouz, um sírio-libanês ou descendente . Fonte: Turismo - Revista de Arte, Paisagem e Costumes Portugueses, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2.




Ferreira do Alentejo > Figueira de Cavaleiros > 25 de Setembro de 2010 > Jantar em casa do Jacinto Cristina > Rótulo, já muito deteriorado, de uma garrafa de uísque trazida da Guiné... Buchanan's, from Scotland, for the Portuguese Armed Forces... with love...

 Esta foi comprada em Bissau, em junho de 1974, e aberta no nosso primeiro encontro, na festa de anos da filha do Jacinto Cristina, em março de 2010


Foto (e legenda): © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Garça & Camaradas da Guiné]

1. Na Guiné, aprendemos a distinguir o bom "scotch whisky" do "uísque marado de Sacavém" que se bebia nas noites de Lisboa e arredores (Reboleira, etc.) nos anos 60/70, nos primeiros bares de alterne que apareceram... 

Os comerciantes libaneses (ou de origem sírio-libanesa) também gostavam do bom uísque... E cultivavam a arte de bem receber. Como era o caso de Michel Ajouz, comerciante com loja em Bissorã, cristão maronita. (Haveria também libaneses, muçulmanos xiitas: será que também bebiam uísque com água de Perrier ou Vichy ?)

O Michel Ajouz, sobre o qual se publica dois testemunhos, devia ser cristão maronita: celebrava o natal cristão, recebia em sua casa os militares estacionados em Bissorã e tinha uísque do bom para oferecer às visitas. Infelizmente não temos nenhuma foto dele,.

Diz o Manuel Joaquim, que o conheceu em 1965, no Natal desse ano, e que era o mais idoso, o decano, dos comerciantes libaneses de Bissorã. Em comentário ao poste P13403 (*). acrescenta: 

(...) No P10966 deste blogue, o Pepito dá-o como um dos pequenos comerciantes libaneses localizados no chamado "Bissau Velho" em 1952, aquando do regresso de Amílcar Cabral à Guiné.

Pelo que me lembro de lhe ter ouvido, os seus negócios devem ter crescido muito nos anos seguintes. As referências que fazia à sua facilidade nos contactos com certas personagens "graúdas", do regime, e de certos meios económicos, e a ambientes luxuosos que teria frequentado em Portugal,  seriam só "garganta"? Acho que não.

Em 1966, a sua actividade comercial em Bissorã era reduzida mas percebia-se que o não teria sido antes. 

(...) Do meu tempo em Bissorã, como ligação económica da tropa com a comunidade libanesa, só me lembro do fornecimento do pão. Não convivi com a comunidade libanesa de Bissorã, a não ser neste caso que referi no meu poste (*). Melhor dizendo, não tive qualquer tipo de relação com a comunidade comerciante local, libanesa ou outra. Mas sei que outros meus camaradas mantinham contactos, alguns destes de carácter muito chegado.

(...) Quanto ao juizo de "em todas as guerras os comerciantes são peritos em tirar partido da situação, procurando estar bem com os dois lados", não está longe do que eu penso mas creio não se aplicar ao Michel  Ajouz. 

Curiosamente, fui eu quem, em 1966, prendeu um dos comerciantes locais, por sinal um dos que eu via todos os dias por seu meu vizinho e passar à sua porta quando me dirigia ao quartel. Ainda hoje estou para saber a razão de ter sido encarregado de tal acto. Experimentarem-me politicamente? (...) (Manuel Joaquim, quarta-feira, 16 de julho de 2014 às 06:20:04 WEST).

Anos mais tarde, em 1969/70, o Armando Pires (ex-fur mil enf, CCS/BCAÇ 2861 (Bula e Bissorã, 1969/70), também conheceu o  Michel Ajouz: 

(...) "As recordações com que ficámos um do outro não são famosas. Mas é conversa que não é para aqui chamada." (O Armando não quis partilhar connosco este segredo, alegando que havia protagonistas ainda vivos)... Não seria o caso do Michel Ajouz, que já em 1965/66 era o decano dos comerciantes de Bissorã. 

O Rogério Cardoso (ex-fur mil, CART 643/BART 645, Bissorã, 1964/66 também conviveu com o Michel Azjouz, "um velhote libanês de óptimo trato, grande sabedor de Bridge".


2. E a propósito dos  cristãos maronitas, recorde-se que  são uma das comunidades mais antigas e influentes do cristianismo oriental, com forte presença histórica no martirizado Líbano, dilacerado pelos conflitos político-militares e étnico-religiosos.

Qual é a sua origem ? O maronitismo deriva de um movimento monástico do séc. IV/V em torno de São Maron, eremita da região da Síria (c. 350–410). A comunidade consolidou-se nos montes do Líbano, preservando autonomia e identidade próprias,  mesmo durante os domínios bizantino, árabe, mameluco e otomano. Ou seja, até à I Grande Guerra (1914/18), em que colapsou o império otomano, e depois o Líbano tornou-se um protetorado francês.

A Igreja Maronita é uma igreja autónoma (sui iuris) dentro da Igreja Católica, mas em plena comunhão com Roma. Segue, todavia, a liturgia antioquena-siríaca. 

Os maronitas são a maior comunidade cristã do Líbano. Estima-se que constituem cerca de 20% a 30%  da população libanesa (o último recenseamento oficial é de 1932, por isso os números são sempre aproximados). O Líbano tera  hoje cerca de 6 milhões de habitantes (com c. 10,5 mil km2 de superfície).  A Igreja Maronita desempenhou um papel central na história e identidade do Líbano. 

Numericamente ainda mais significativos são os maronistas da diáspora (sobretudo Brasil, América do Norte e Austrália). Não há estatísticas exatas, mas estima-se que os maronistas no Mundo inteiro sejam  3 a 4 milhões. E no Líbano entre 1 e 1,5 milhões. Na Guiné-Bissau, o seu número é residual.
  

(i) Manuel Joaquim (ex-dur mil arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (*)

Na noite de Natal de 65, o decano dos comerciantes libaneses, o sr. Michel,  acho que era este o seu nome, preparou uma recepção na sua casa, para a qual convidou os comandantes das companhias alocadas em Bissorã, CART  643 e CCAÇ  1419, seus oficiais e 1.ºs sargentos e sendo o restante pessoal militar representado por um furriel e por um praça de cada uma das companhias. 

Posso estar enganado,  mas é a ideia que tenho.

Da CCAÇ 1419 fui eu o furriel escolhido. Não sei se “de motu proprio” ou cumprindo decisão superior, o 1º sargento  da companhia fez-me o convite que eu aceitei, algo contrariado, após alguma insistência.





Imagem:  Cartaz publicitário da extinta Casa Africana, uma loja emblemática da Rua Augusta, em Lisboa. S/ indicação da origem. Cortesia de Manuel Joaquim.


Para a ocasião vesti o meu fato “de ir à missa” comprado na  então famosa casa de moda da Baixa lisboeta, a Casa Africana, uns dias antes de embarcar. “Ótimo para usar em África”, disse-me o vendedor em resposta à minha inicial informação de que estava prestes a embarcar para a Guiné e precisava de um fato para levar.

E lá fui de fatinho azul-ténue, muito leve, com risquinhas verticais pretas e muito finas. A confraternização correu bem. Houve “comes e bebes” e muita conversa, geral e particular, entre os convidados e o dono da casa.

Recordo bem a qualidade do uísque, uma maravilha, do resto tenho noção vaga duma conversa do anfitrião discorrendo sobre as suas relações com personagens conhecidas na política e na sociedade empresarial, tanto na Guiné como em Portugal (no Continente, como então se dizia).

Não sei que idade teria o sr. Michel mas para mim era um homem já idoso, um senhor culto, bem viajado, bom conversador e de óptimo trato. Penso que teria sido, antes da guerra, um grande comerciante. Em 1965 a sua actividade comercial já estava muito reduzida.

Havia música mas não havia “garotas”! A animação não foi muita mas deve ter havido alguma já que o evento durou umas boas horas. O certo é que não me lembro dela. Talvez por causa do meu estado de espírito naquela altura como se pode adivinhar pela breve referência que fiz ao assunto num aerograma enviado à namorada:

(…) “Há por aqui umas famílias de emigrantes libaneses que nos proporcionaram umas festazinhas agradáveis na quadra que passou há pouco. Mas o sofrimento cá anda roendo a alma. E para muitos de nós a bebedeira foi a fuga. O whisky aqui é barato. Assim a bebedeira fica barata também.” (…)

Uma nota final: interessante o lembrar-me ainda hoje da qualidade do uísque do sr. Michel e não me lembrar de muitas outras coisas mais importantes. Pensando bem, compreendo. Pois para quem andava afogando mágoas, eu por exemplo, curtindo alegrias e lavando o estômago com VAT69, J. Walker red label e outros deste género, encontrar e saborear o uísque do velho libanês foi um momento inolvidável. Aquilo não era uísque, aquilo é que era whisky! (...)


 
(ii) Rogério Freire (ex-alf mil art, minas e armadilhas, CART 1525, Bissorã, 1966/67) (**)

(...) Vi a referência ao Michel Ajouz e ao meu nome e não posso deixar de contar uma história do "arco da velha".

Depois de regressar da Guiné, Bissorã, em finais de 1967, iniciei a minha atividade profissional como Delegado de Informação Médica (Propaganda Médica,  à moda antiga).

Uma das minhas zonas de trabalho era a região de Leiria. Num belo dia, creio que de 1971 ou 72, ao sair de Monte Real através do pinhal de Leiria a caminho da Marinha Grande, viajando a 80/90 km à hora, passo por um homem só,  que caminhava em direção a Monte Real e veio-me à memória o Sr. Michel Ajouz.

Fiquei de tal maneira incomodado com a visão que, passados uns bons 5 a 6 Km,  decidi voltar atrás e,  surpresa das surpresas, era mesmo... o Michel Ajouz!... Em pleno Pinhal de Leiria,  a fazer o seu passeio matinal.

Foi uma grande alegria, ele lembrava-se perfeitamente de mim e da CART 1525 bem como dos outros alferes, o Rui, o Oliveira e o Silva bem como do Capitão Mourão [ Jorge Manuel Piçarra Mourão]  que era ocasionalmente seu parceiro de bridge.

Fiquei a saber na altura que vinha às Termas de Monte Real à procura de alívio para as suas maleitas. E depois de um grande abraço nos separámos.

Foi um daqueles acasos ... em pleno Pinhal de Leiria quem me diria vir-me a encontrar com o Michel Ajouz, de Bissorã,  5 a 6 anos depois?  (***)

(Revisão / fixação de texto, itálicos e negritos, título: LG)

______________

Notas do editor LG:




(***) Último poste da série > 2 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27079: (De)Caras (237): Ercília Ribeiro Pedro, ex-enfermeira paraquedista, do 2º curso (1962), reconhecida pela Maria Arminda em foto de grupo, tirada no Brasil, em 2012, e pertença do álbum do cor art ref Morais da Silva

domingo, 3 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27083: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (4): Alfredo Manuel Martins Félix (1948-1970), sold at inf, CART 2673, "Leões de Empada" (Empada e Brá, 1970/71), natural de Toxofal de Baixo; vítima de acidente de viação em Bissorã



Alfredo Manuel Martins Félix 
(Toxofal de Baixo, Lourinhã, 18/11/1948 - Bissorã, Guiné 26/04/1970)

Soldado atirador infantaria nº 096848/69, CART 2673, "Leões de Empada" (Brá e Empada,  1970/71) 

Local da sepultura - Cemitério Municipal da Lourinhã


A. Continuamos a reproduzir, com a devida vénia, alguns excertos do livro recente do Jaime Bonifácio Marques da Silva, "Não esquecemos os jovens militares do concelho da Lourinhã mortos na guerra colonial" (Lourinhã: Câmara Municipal de Lourinhã, 2025, 235 pp., ISBN: 978-989-95787-9-1).


Dos vinte militares louirnhanesnse que morreream em Ãfrica, seis foram no TO da Guiné. O Alfreod Manuel Martins Félizx é o quarto da lista (pp. 183/184)


1. REGISTO DE NASCIMENTO

Alfredo Manuel Martins Félix nasceu a 18 de novembro de 1948, às 12 horas, no lugar do Toxofal de Baixo. 

Era filho legítimo de Joaquim Martins Félix, de 29 anos, casado e com a profissão de fazendeiro, e de Maria do Rosário de 22 anos de idade, casada, doméstica, ambos naturais da freguesia e concelho de Lourinhã e domiciliados no lugar de Toxofal de Baixo. Neto paterno de Daniel Félix e de Alice do Rosário Félix . e materno de Joaquim Maria (à data já falecido) e Diana da Anunciação.

O registo de nascimento teve como testemunhas Manuel Félix, solteiro, maior, empregado no comércio, residente no Toxofal de Baixo, e Armando Ferreira, maior, cantoneiro e residente na vila de Lourinhã.

O registo foi assinado pelas testemunhas e não assinado pelo declarante por não saber escrever. Registo efetuado a 15 de dezembro de 1948 na conservatória do Registo Civil da Lourinhã.

2. REGISTO MILITAR

Recenseamento: recenseado pelo concelho e freguesia de Lourinhã sob o nº 4 em 1968. Era solteiro, com a profissão de empregado de mesa, tinha como habilitações literárias a 4ª classe e morava em Toxofal de Baixo.

Inspeção militar: alistado em 31 de maio de 1968 com o número mecanográfico nº E 096848/69. Media 1.62 m de altura, cabelo castanho, olhos castanhos, pesava 67 quilos. Foi apurado para Todo o Serviço.

Colocação durante o serviço: foi incorporado em 29 de julho de 1969, como recrutado, no RI 7 em Leiria. Pronto da Escola de Recrutas a 16.11.1969.

Especialidade: soldado Atirador

Unidades onde prestou serviço: RI 7 Leiria, 29.07.60;  e GACA 2 Torres Novas, 27.09.70


2.1. Comissão de serviço no ultramar, Guiné

Mobilização: mobilizado nos termos da alínea c) do artº 3º do Dec. 42937, de 22.04.1960, para servir no ultramar, no CTI da Guiné, pelo Grupo de Artilharia Contra Aeronaves  (GACA) nº 2 – Torres Novas. Recebeu 500$00 de abono de embarque (172 euros, a preços de hoje, de acordo o simulador de inmflação da Pordata).

Embarque: Lisboa a 31 de janeiro de 1970 a bordo do navio “Uíge”, fazendo parte da CART 2673.

Desembarque: em Bissau a 06.02.1970 desde quando aumenta 100% ao tempo de serviço.

Data do falecimento: 26.04.1970

Causa da morte: acidente de viação

Local do acidente: Bissorâ,

Abatido ao efetivo: 26 de abril de 1970

2.2. Registo disciplinar: condecorações e louvores

Louvor: por ter cedido sangue a título gracioso em benefício dos doentes assistidos pela Liga Portuguesa contra o Cancro manifestando com o seu gesto sentimentos de humanidade dignos de apreço (OS 220 de 18 set. 69 do RI 7).

3 . PROCESSO DE AVERIGUAÇÕES AO ACIDENTE: ANOTAÇÕES E CONTEXTO

(No seu processo, consultado no Arquivo Geral do Exército, não consta o Auto de Averiguações ao acidente que lhe provocou a morte.)

(Revisão / fixação de texto: LG)





B. Informação complementar sobre a CART 2673 (Empada e Brá, 1970/71)


(i) foi comandada pelo cap art Adolfo Pereira Marques, que foi substituído pelo cap mil  José Vieira Pedro;

(ii) usou como divisa “Leões de Empada” e a história da unidade encontra-se arquivada na caixa 91, na 2ª Divisão/4ª Secção do AHMM

(iii) do seu percurso no CTIG, refere-se que seguiu para Empada em 4 de fevereiro de 1970, para substituir a CCAÇ 2381 e assumir a responsabilidade do subsector em 26 desse mesmo mês;

(iv) desde 9 de abril, cedeu pelotões para reforço de Nhacra e Buba até 12 de julho de 1970, data em que regressaram a Empada; o subsector de Empada tinha sido alargado com as zonas de acção das áreas das penínsulas de Cubisseca e Pobreza.

(v) foram obtidos excelentes resultados nas operações realizadas pela subunidade nas operações realizadas nas regiões de Caúr, Buduco, Cancumba e Satecuta, entre outras.

(vi) foi rendida no subsector de Empada pela CCAÇ 3373, em 28 de maio de 1971, seguindo para Bissau onde substitui a CCAÇ 2571, na guarnição e defesa dos pontos sensíveis da área.

(vii) a 30 de maio de 1971 assumiu o subsector de Brá, integrando o COMBIS [Comando de Bissau], destacando efectivos para Safim e João Landim, subsector de Nhacra, e para Cumeré, em reforço das guarnições locais, até ser rendida pela CART 2672, para embarcar para a metrópole.


sábado, 19 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27032: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (3): Albino Cláudio (1946-1968), sold at inf, CCAÇ 2368 / BCAÇ 2845 (1968/1970), natural de Ribamar: vítima de acidente com arma de fogo, em Bissorã, em 23/7/1968 - Parte I: nota biográfica e circunstâncias da morte


Albino Cláudio (30.05.1946 – 23.07.1968), sold at inf, CCAÇ 2368 (Cacheu, Bissorã, Teixeira Pinto, 1968-70)

Crachá da CCAÇ 2368 / BCAÇ 2845 "Feras" (Fortes e Altivos")


Localidade do falecimento - Bissorã, Guiné

Soldado atirador infantaria nº 1135736/67

Naturalidade - Ribamar, Lourinhã

Local da sepultura - Cemitério de Santa Bárbara, Marquiteira


_________________

1. REGISTO DE NASCIMENTO


Albino Cláudio nasceu a 30 de maio de 1946, às 8 horas, no lugar de Ribamar, então freguesia de Lourinhã.

Era filho legítimo de Artur Cláudio, de 38 anos, casado e jornaleiro, e de Jacinta da Conceição, 33 anos, casada, doméstica, ambos naturais da freguesia e concelho da Lourinhã e domiciliados no lugar de Ribamar. Neto paterno de Manuel Cláudio e de Maria da Conceição, ambos falecidos, e materno de Januário Feliciano (falecido) e Luzia de Jesus.

O registo de nascimento foi efetuado pelo pai, às onze horas e quinze minutos, de 13 de junho de 1946, teve como testemunhas Manuel Pereira, casado, moleiro, morador em Pregança, e Mateus Baltazar, solteiro, empregado de comércio e residente na Lourinhã, sendo assinado pelas testemunhas e não assinado pelo declarante por não saber escrever.

A importância dos emolumentos foi de seis escudos e a dos selos devidos pela parte de três escudos. Registo de nascimento n.º 272, efetuado a 13 de junho de 1946 na Conservatória do Registo Civil da Lourinhã.


2. REGISTO MILITAR


Recenseamento: recenseado pelo concelho e freguesia de Lourinhã sob o nº 8 em 1966, solteiro, com a profissão de marítimo,  pescador.

Tinha como habilitações literárias o 1º grau (3ª classe) do Ensino Primário Elementar e morava em Santa Bárbara,  Ribamar.

Inspeção militar: alistado em 21 de julho de 1966 com o número mecanográfico nº 113573/67. Media 1.66 m de altura, cabelo castanho, olhos azuis, pesava 67 quilos. Foi apurado para todo o serviço.

Colocação durante o serviço: foi incorporado em 23 de outubro de 1967, como recrutado, no RI 10 (Aveiro) na 1ª Companhia. A 04.12. 67 tomou parte nos exercícios de campo da 8ª semana de Iinstrução Básica (IB) /1º ER/67; 20.12.67 Jurou Bandeira; 23.12.67 termina a IB (Recruta); 02.01.1968 marchou para o BCAÇ 10 (Chaves), sendo aumentado ao efetivo do Batalhão e da 2ª Companhia.

Em 03.02.68 fica Pronto da Especialidade de Atirador.

Unidades onde prestou serviço: RI 10 (Aveiro), 23.10.67. BCAÇ10 (Chaves), 02. 01. 68

2.1. Comissão de serviço no ultramar, Guiné

Mobilizado: em 09. 02. 68 nos termos da alínea e) do artº 3º do Dec. 42937 de 22.04.1960 para servir no ultramar, sendo transferido para a CCAÇ 2368. 


Embarque: em Lisboa a 1 de maio de 1968 com destino ao CTIG, fazendo parte da CCAÇ 2368.


Desembarque: Bissau a 7 de maio 68 desde quando aumenta 100% ao tempo de serviço.


Data do falecimento: 23.07.1968


Causa da morte: acidente com arma de fogo


Local do acidente: Bissorã.


Abatido ao efetivo: nos termos das NEP/Pessoal – III – I Pág. 9 – F. 4a. Da 1ª Rep/QG/CTIG, é abatido ao efetivo desta Subunidade (CCAÇ 2368), desde 23 julho 1968, por morte de acidente com arma de fogo (OS 2 de 27.07.68), desde quando deixa de contar 100% de aumento do tempo de serviço.

2.2. Registo disciplinar: condecorações e louvores:


Medalha: de segunda classe de comportamento (Artº 88.º do RDM) é-lhe atribuída em 25 de outubro de 1967.

3. PROCESSO DE AVERIGUAÇÕES AO ACIDENTE: ANOTAÇÕES E CONTEXTO

Participação do acidente: no dia 23 de julho de 1968 o Oficial de Dia, de serviço à CCAÇ 2368, pertencente ao BCAÇ 1915, aquartelado em Bissorã, participa ao seu Comandante de Companhia as circunstâncias do acidente: 


- Que “pelas 7.00 horas da manhã quando me encontrava a assistir à primeira refeição na qualidade de Oficial de Dia, ouvi uma detonação na caserna e acorri lá imediatamente tendo deparado com o soldado nº 113573 67, Albino Cláudio, caído à entrada da caserna e com o sangue a sair abundantemente por uma ferida no peito, o que me levou a chamar prontamente o médico e alertar o Comandante de Companhia ao mesmo tempo que providenciava o seu transporte para o Posto de Socorros.


São testemunhas da ocorrência o soldado nº 11485267, Joaquim da Cunha Moreira e o soldado nº 11699667, Cipriano Martins da Silva”.



A 24 de julho de 68, o Comandante do BCAV 1915 ordena que o alf mil António de Matos de Almeida proceda ao respetivo processo por acidente com arma de fogo.


-A 25.07.68 o alf mil  Almeida interroga as duas testemunhas mencionadas que declaram para os autos:


1.ª testemunha, o 1º cabo Atirador Cipriano Martins Silva, casado, de 22 anos de idade, natural de Oliveira Santa Maria, concelho de Famalicão, após juramento, declarou:


“Que no dia 23.07.68, uns dez minutos antes das 7.00 horas, vira o sinistrado a limpar a arma, pois iria entrar de serviço às sete horas, que não viu o acidente porque foi para o refeitório tomar a primeira refeição, que, quando se deu o tiro, viu o oficial de serviço correr para a caserna e fazer transportar o sinistrado para o posto de socorros, onde foi assistido pelo médico, em vão, pois que acabou por morrer.


O sinistrado tinha dito algumas vezes aos amigos que, logo que passasse à disponibilidade,  se casaria e construiria uma casa com o dinheiro que já tinha no banco, pelo que pensa que o sinistrado não se tivesse suicidado”.


2.ª testemunha, o soldado atirador de infantaria, Joaquim Moreira, solteiro, de 21 anos de idade, natural da freguesia e concelho de Penafiel, após juramento, disse:


“que estava à porta da caserna quando ouviu um tiro dentro da caserna, que, entrando lá dentro, viu o sinistrado caído no chão com a arma ao lado e com muito sangue a sair-lhe do peito, que vira momentos antes o sinistrado a limpar arma. 


Disse ainda que pensa que o sinistrado não se matou propositadamente porque lhe parecia uma pessoa pacata e sem problemas”.


Certidão de óbito: a 23.07.68 no quartel de Bissorâ, o médico da Companhia confirma que “a causa principal da morte foi o ferimento perfurante na caixa torácica”.


Espólio:  relação de fardamento, calçado e outros haveres, pertencentes ao soldado Albino Cláudio: o comandante de companhia, capitão de infantaria Manuel Joaquim Sampaio Cerveira assina, em 27.07.68, a relação dos haveres elaborada pelo alferes António Matos e pelas testemunhas, furriel mil, António Pimenta Rodrigues e 1º cabo Victor Manuel da Costa.

Entre os diversos pertencentes, consta: “01 fio de prata contendo uma pequena medalha. Por declaração de camarada da praça falecida, soube-se que este em situação operacional declarara, se viesse a falecer em combate, que apenas desejava que o fio em prata que contém a pequena medalha,  fosse entregue à sua namorada”.


Dúvidas do Comando Territorial Independente da Guiné:


A 14 e 28 de agosto o Comando Territorial Independente da Guiné envia dois ofícios aos Comandantes do BCAÇ 1915 e da CCAÇ 2368 no sentido de se clarificar que: 

(i) “o Processo instaurado ao soldado Albino Claúdio é por desastre em serviço e não por acidente por arma de fogo”.

(ii)  (…) “e que além das provas testemunhais deve ficar bem esclarecido no Processo se a morte foi por acidente ou suicídio”.


Conclusão do Processo e despacho final do Comando Militar da Guine “Serviço da República, Ministério do Exército, Comando Territorial Independente da Guiné, Quartel General – 1ª Repartição, Processo – Por desastre em serviço


Mostra o Processo:


- Que em 23 julho 68, este soldado ao limpar a sua arma em virtude de ir entrar de serviço, disparou involuntariamente um tiro que o atingiu mortalmente;


- Que o certificado de óbito revela como causa da morte “ferimento perfurante na caixa torácica”;


-  Que segundo se investigou não há indícios de se ter suicidado;


-  Que está demonstrado o nexo desastre-serviço;


 O Processo foi organizado nos termos da Determinação 6ª da O.E. nº 8 – 1ª Série – 1965;


 Em face do exposto é parecer desta Repartição:


a) que o desastre deve ser considerado em serviço; 


b) dado que para o sinistrado adveio a morte, deve o processo, depois de despachado nos termos da Determinação 3º da O.E. nº 6 – 1ª Série 1966, ser enviado à RSP/DSP/ME-


Quartel General em Bissau 10 de dezembro de 1968; O Chefe da 1ª Repartição; Carlos Beirão, ten cor inf c/ CGEM.


DESPACHO: "Sou de parecer que deve ser considerado ocorrido por motivo de serviço o desastre sofrido por este militar e que motivou a sua morte, em 23 julho 68. O Comandante Militar”.

_________________


Nota do editor LG:


Último poste da série > 9 de julho de 2025 > Guiné 61/74 - P26998: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (2): José Henriques Mateus (1944-1966), sold at inf, CCAV 1484 (Catió, 1964/1966) - II (e última) Parte: testemunhos de camaradas