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sábado, 3 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24363: In Memoriam (478): Mário Vargas Cardoso, cor inf ref (1935-2023), ex-cap inf, CCAÇ 2402 / BCAÇ 2851 (Có, Mansabá e Olossato, 1968/70) e ex-cmdt do BCAÇ 3884 (Bafatá, 1972/74) (João Bonifácio, ex-fur mil SAM, CCAÇ 2402, 1968/70, a viver no Canadá); Manuel Oliveira Pereira, ex-fur mil at inf, CCAÇ 3547, Contuboel, 1972/74)



Guiné > Região do Oio > Có > CCAC 2402 (1968/70) > s/d > De pé: alf mil Francisco Henriques da Silva, alf mil Raul Albino (1945-2020) e Cap Vargas Cardoso (*)


Amadora > RI 1 > 1968 > CCAÇ 2402, em formação > Da esquerda para a direita, o primeiro é o Raul Albino (19945-2020), o segundo é o Francisco [Henriques da] Silva e a seguir o Medeiros Ferreira. Só falta nesta fotografia de grupo o Beja Santos. Também aqui falta o comandante da companhia, cap imnf Vargas Cardoso (1935-2023).  O Medeiros Ferreira, o histórico dirigente estudantil da crise académica de 1962,  não compareceu no embarque, a 24 de julho de 1968, no N/M "Uíge", com destino ao  CTIG, desertando para a Suiça; por seu turno, o Beja Santos iria um mês depois, em rendição individual, comandar o Pel Caç Nat 52 (Missirá e Bambadinca, 1968/70). Acabou por ser uma cruz pesada, sobretudo  para o futuro alf mil at inf MA Raul Albino, que teve que lidar, no início da comissão, com duas baixas de vulto dos seus amigos e camaradas, Beja Santos e Medeiros Ferreira (**)

Fotos (e legendas): © Raul Albino (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso camarada John Bonifácio, a viver no Canadá:

Data - quinta, 1/06/2023, 04:00
Assunto - Mais uma baixa na CCAÇ 2402  / BCAÇ 2852  (Có, Mansabá e Olossato, 1968/70)

Este e-mail serve para informar todos os militares que conviveram em Angola e Guiné com o nosso querido amigo Coronel Ref Mário Vargas Cardoso.(***)

Fiz parte da sua CCAÇ 2402 e entre 1968/70 tivemos a oportunidade de servir Portugal. Informo todos que o nosso Capitão de então, deixou esta madrugada de 31 de Maio de fazer parte da nossa família militar. O sr Coronel Vargas Cardoso faleceu. 

Quero em meu nome pessoal e de todos os camaradas da 2402, enviar à sua esposa e toda a restante família, as mais sinceras condolências. O Sr. Coronel Vargas foi um militar de carreira que tudo fez para que todos os seus militares se pudessem sentir jovens válidos e orgulhosos. Poderia testemunhar muitos episódios que, como Furriel Milicino do SAM do seu comando, ambos vivemos uma camaradagem própria e que, om todo o desempenho do resto de Companhia, foi um passo importante para o sucesso da nossa 2402.

Amigo Luís, fico muito grato por esta publicação. Paz à sua alma e um etermo descanso.
Por tudo o que nos ensinou, a nossa saudade.

João G Bonifácio
Ex-Furriel Mil do SAM
CCAÇ 2402/BCAÇ 2851 
Oshawa, Ontario, Canadá

2. Poste de Manuel Oliveira Pereira na página do Facebook da Tabanca Grande, 31 de maio, 13h39:

A noticia que não gostaria de dar...

O meu ex-comandante de Batalhão (BCAÇ 3884, Bafatá, 1972/74), na Guiné, Coronel Mário José Vargas Cardoso, e meu particular amigo, partiu para outra dimensão. Fica o adeus, já com imensa saudade, do "Mano novo para o Mano velho" (forma carinhosa como nos tratamos). 

Descansa em paz "Mano velho"!...
____________

Notas do editor:

(**) Vd. poste de 8 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21622: In Memoriam (376): Raul Albino (1945-2020): recordando as peripécias da formação e partida da CCAÇ 2402 / BCAÇ 2851, com menos duas baixas de vulto, à chegada a Bissau

sábado, 26 de fevereiro de 2022

Guiné 61/74 - P23034: Companhias e outras subunidades sem representantes na Tabanca Grande (3): CART 2411 (Mansoa, Porto Gole, Bissá, Enxalé, Bissau, 1968/70)


Companhia de Artilharia nº 2411


1. Mais uma subunidade que não tem, até à data, nenhum representante na Tabanca Grande. São também muito escassas as referências no blogue, contrariamente à CART 2410 e à CART 2412.  Tem, todavia, uma página no Facebook (, criada em 2011, inativa desde finais de 2019). Tem poucas fotos.

Daí justificar-se esta ficha de unidade. O brasão, que se reproduz ao lado, com a devida vénia, é da coleção de © Carlos Coutinho (2011).

Identificação: CArt 2411

Unidade Mob: GACA 2 - Torres Novas

Cmdt: Cap Mil Art Manuel da Silva Frasco | Cap Mil Art António Dias Lopes | Cap Mil Art Virgílio Graça Pereira Saganha

Divisa: "Velando em toda a parte"

Partida: Embarque em 11Ag068; desembarque em 16Ag068 | Regresso: Embarque em 18Abr70


Guine > Região do Oio > Sector de Mansoa > Bissá > O António Rodrigues, ex-1º Cabo Aux Enf, CCAÇ 2587 / BCAÇ 2885 (Mansoa 1969/71), em Bissá, junto do monumento da CART 2411 (1968/70). Foto do álbum do  seu blogue BCAÇ 2885, Guiné, 1969/71,  

Foto (e legenda): © António Rodrigues (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 


Síntese da Actividade Operacional

Em 26Ag068, seguiu para Aldeia Formosa, a fim de efectuar o treino operacional sob orientação do BCaç 2834, o qual foi interrompido e continuado em Mansoa, a partir de 04Set68 até 26Set68, então sob orientação do BCaç 1912.

Depois a companhia permaneceu temporariamente em Mansoa, em reforço do BCaç 1912, a fim de tomar parte em operações realizadas nas áreas de Changalana, Inquida, Polibaque e Bindoro, tendo um pelotão sido colocado no destacamento de Bissá, a partir de 22Set68; de 310ut68 a 02N ov68, participou ainda numa operação realizada na região do Morés, sob controlo operacional do BCaç 2851.

Em 07Nov68, rendendo a CArt 1661, assumiu a responsabilidade do subsector de Porto Gole, com destacamentos em Bissá e Enxalé (este até à sua passagem para a zona de acção do BCaç 2852, em 290ut69) e ficando integrada no dispositivo e manobra do BCaç 1912 e depois do BCaç 2885.

Em 14Mar70, foi rendida no subsector de Porto Gole pela CCaç 2587, sendo colocada em Bissau, onde substituíu a CCaç 2382 no dispositivo do BArt 2866, com vista à segurança e protecção das instalações e das populações da área; destacou ainda um pelotão para o subsector de Nhacra, que se instalou em Safim e João Landim.

Em 16Abr70, foi substituída, temporariamente, no subsector de Bissau por dois pelotões da CArt 2412, a fim de efectuar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n." 118 - 2.ª Div/4.ª Sec. do AHM).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas das Unidades: Tomo II - Guiné - 1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002, pág 464.
________

Nota do editor

Último poste da série > 22 de janeiro de 2022 > Guiné 61/74 - P22931: Companhias e outras subunidades sem representantes na Tabanca Grande (2): CART 2338, "Os Incansáveis" (Fá Mandinga, Nova Lamego, Canjadude, Cheche, Buruntuma, Pirada e Paiunca, 1968/1969)

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21622: In Memoriam (376): Raul Albino (1945-2020): recordando as peripécias da formação e partida da CCAÇ 2402 / BCAÇ 2851, com menos duas baixas de vulto, à chegada a Bissau




Amadora > RI 1 > 1968 > CCAÇ 2402, em formação > Da esquerda para a direita, o primeiro é o Raul Albino, o segundo é o Francisco [Henriques da] Silva e a seguir o Medeiros Ferreira. Só falta nesta fotografia de grupo o Beja Santos. Também aqui falta o Comandante da Companhia, Capitão Vargas Cardoso.  O Medeiros Ferreira iria desertar antes do embarque para o CTIG; o Beja Santos iria, em rendição individual, comandar o Pel Caç Nat 52 (Missirá e Bambadinca, 1968/70).

Foto (e legenda): © Raul Albino (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Em memória de um camarada e amigo, um histórico da nossa Tabanca Grande,  que nos deixa, precocemente, o Raul Albino (1945-2020) (*)...

Para avivar e honrar  a sua memória, não podíamos deixar de voltar a reproduzir aqui este excerto da História da CCAÇ 2402 / BCAÇ 2851, história essa publicada por ele,  no nosso blogue, pelo menos em dezoito postes,  entre 2006 e 2010 (**). 

Em papel, ele organizou e publicou dois volumes com a história dos "Lynces de Có", o segundo dos quais,  em 2008, com a participação especial de Vargas Cardoso (ex-comandante da companhia) e do João Bonifácio, que emigrou para o Canadá (ex-fur mil SAM). E ainda com a coordenação fotográfica do Maurício Esparteiro (ex-1º cabo, o talentoso fotógrafo da companhia). 

Desse segundo volume, com excelente execução gráfica, possuímos uma cópia, que o Raul nos oferecera em tempos.  No prefácio, o antigo comandante, cor inf ref Vargas Cardoso,  fez um grande elogio ao Raul Albino justamente pela sua capacidade de  manter vivo, até então, o espírito da CCAÇ 2402, os "Lynces de Có". Nesse II volume estão documentados os 10 primeiros convívios anuais do pessoal, entre 1982 e 2007.
 

História da CCAÇ 2402 > Uma cruz pesada para o alf mil at inf MA Raul Albino, logo no início da comissão, com duas baixas de vulto, as de Beja Santos e Medeiros Ferreira

por Raul Albino (2006)


Partida para a Guiné


A Companhia de Caçadores 2402 do Batalhão de Caçadores 2851 formou-se no Regimento de Infantaria nº 1, na Amadora.

Embarcou no paquete Uíge a 24 de Julho de 1968, com destino à Guiné. O BCAÇ 2851 (Mansabá e Galomaro, 1968/70]  foi acompanhado na viagem pelo BCAÇ 2852 [, Bambadinca, 1968/70].

Achei imensa graça a esta poesia popular, sentida, do soldado António Maria Veríssimo, militar da nossa companhia, retirada do seu livro de poesia Diversos.


Uíge! Volta para a terra,
Muda de rota, de direcção,
Não nos leves para a guerra.

Por favor! Pára p’ra pensar,
Não corras tanto,
Navega mais devagar.

Somos crianças, que vais deixar
Na guerra do Ultramar.
Porque não queres a rota mudar ?

Uíge! Não sigas p’rá guerra,
Muda de direcção! Muda de rota!
Volta p’rá nossa terra.


A M Veríssimo


[Formação da Companhia]

Mas voltemos um pouco atrás, mais propriamente à altura em que a companhia se formava na Amadora, comandada pelo então Capitão Vargas Cardoso.

Estive inicialmente incluído na formação, em Évora, de uma companhia independente com destino a Timor. A minha felicidade era imensa, como podem calcular. O quartel de preparação da companhia era o RI 16, aquartelamento que na altura mais parecia um museu militar em decadência. Não possuía instalações suficientes, pelo que os oficiais eram convidados a procurar alojamento no exterior. A alimentação também era no exterior, salvo erro, numa unidade de artilharia, que não recordo o nome.

Do que me recordo bem – além da simpatia para connosco das raparigas que estudavam em Évora – era do parque de obstáculos para o treino dos militares:

(i) A Ponte interrompida estava tão interrompida pela podridão das madeiras, que foi considerada vedada ao trânsito;

(ii) A Vala estava seca, o que não seria de estranhar nos tempos actuais com as temperaturas elevadíssimas que temos, mas naquela época só se tinha alguma rotura e como os engenheiros tinham ido para a guerra, as valas tinham virado alfobres, com alguma terra no fundo e ervas a crescer;

(iii) As Paliçadas estavam decadentes, com a madeira apodrecida, não aconselhando a sua utilização sem um seguro contra todos os riscos;

(iv) O Pórtico dava graça de tão baixo que era, parecendo ter-se enterrado no chão com o tempo, mas mantendo-se gloriosamente de pé, com as cordas puídas pendentes;

(v) Lá nos entretínhamos a saltar o Muro e mais algumas brincadeiras. Mesmo o muro, devido à idade avançada, a altura mais alta (1ª), parecia a intermédia (2ª) e a intermédia, devido ao desgaste, estava quase alinhada com a baixa (3ª). Um paraíso portanto. E como eu gostava de lá estar …

Mas foi sol de pouca dura. Ao fim de cerca de três semanas de exercícios, chega uma ordem de dissolução da companhia e redistribuição dos militares. Para mim saiu-me na rifa a rendição individual de um aspirante de uma companhia em preparação na Amadora que iria seguir para a Guiné, a CCAÇ 2402.

Qual pára-quedista, fui cair no meio de um barril de pólvora, que outro nome não se pode dar à composição do quadro de oficiais da companhia em formação. Inicialmente o quadro de oficiais era constituído pelos membros abaixo indicados e eu vi-os, na altura, da seguinte forma:

(i) Capitão Vargas Cardoso

Militar de carreira, de perfil autoritário, muito organizado, com tendência para controlar tudo e todos. Gostava de ser considerado como um pai para todos os seus militares;

(ii) Aspirante Francisco Silva

Formação académica no sector das Letras, politizado tanto quanto a vida académica o permitia, parecia ser um militar apostado em cumprir a sua comissão sem hostilizar ninguém. Para melhor o identificar, ele foi, há poucos anos atrás, Embaixador de Portugal na Guiné-Bissau, além de outros cargos diplomáticos;

(iii) Aspirante Medeiros Ferreira

Formação académica no sector das Letras, altamente politizado, parecia querer levar a comissão até ao fim, mas, se assim era, depressa compreendeu que essa pretensão não era fácil de concretizar. Creio que todos se recordam dele, foi Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal;

(iv) Aspirante Beja Santos

Também oriundo do sector das Letras, politizado, este elemento dispensa apresentação, pois todos o conhecem, pelo menos, como um dos nossos tertulianos mais versáteis na arte de bem escrever, como o Tigre de Missirá, ou pela sua cruzada em defesa do consumidor;

(v) Aspirante Raul Albino

Resto eu, com formação Contabilística e não politizado. Esta minha formação permitiu-me ser inicialmente seleccionado para o CSM [, Curso de Sargentos Milicianos], a especialidade de Contabilidade e Pagadoria, o que me tornou no mais feliz dos militares ao cimo da terra. 

Mais uma vez a sorte me foi madrasta, pois acabei – não sei como – por ser reclassificado para o COM [, Curso de Oficiais Milicianos], nas especialidades de Atirador Especial e Minas e Armadilhas. Será que viram em mim a capacidade de disparar números e armadilhar escritas?

Viria a crescer posteriormente com a Informática, ao longo de 30 anos na IBM, na especialização de grandes e médios sistemas. Os micro sistemas têm sido para mim um hóbi de velho, que tem a virtude de me manter afectiva e minimamente ligado aos tempos do pioneirismo informático da minha juventude.

– Mas – dirão vocês – onde está o barril de pólvora?

Pois, o barril consistia no clima explosivo que se tinha criado no relacionamento entre o Capitão e os seus Aspirantes.

Quando eu chego ao grupo, vejo o Capitão preocupado com a circunstância de levar para a Guiné a dupla Medeiros Ferreira/Beja Santos, sobre os quais não conseguia ter o controlo pretendido e com a perspectiva do relacionamento vir a degradar-se ainda mais com o passar do tempo.

Quanto ao Francisco Silva, não o vi preocupado em sua relação, talvez pensando que ele seria mais fácil de controlar. Algum tempo após a minha chegada, confidencia-me ele (por estas palavras ou semelhantes):

- Sabes? Creio que temos letrados a mais na companhia! – ao que eu lhe retorqui:

- Bem, para compensar, agora tem-me a mim que não sou de Letras, sou de Números!

Depressa me apercebi ao longo desta conversa, por sinal bastante infeliz, que não era mais que uma tentativa de aliciamento da minha pessoa para a sua causa. Tentativa semelhante ter-me-á feito o Medeiros Ferreira. Tentativas inúteis, porque eu era um indivíduo convictamente independente, avesso a alinhamentos e não politizado. Além disto era ingénuo, porque julgava que me podia manter neutral, com o equilíbrio existente a manter-se ao longo da comissão.

Ainda hoje uma dúvida me afecta a alma. Terá a minha resistência a alinhamentos, – comunicada ao Medeiros Ferreira – influenciado de algum modo o desenrolar dos acontecimentos que se seguiram no seio do grupo?

Duas a três semanas antes da partida da companhia, eu era enviado com um sargento, em avião militar, para a Guiné, com a missão de preparar a chegada da companhia em termos de material e equipamento. O que se terá passado durante esse período de tempo, escapou-me, na altura, ao meu conhecimento pessoal, razão pelo qual não o abordo aqui (...).

A minha surpresa não teve descrição, ao constatar que a companhia chegava à Guiné com duas baixas no quadro de Oficiais: o Medeiros Ferreira (**) e o Beja Santos. 

O capitão tinha ganho a primeira batalha (pessoal), mesmo antes de chegar ao teatro de guerra. Senti a minha cruz começar a ficar mais pesada...

Raul Albino

[Revisão e fixação de texto para efeitos de edição neste blogue:  LG]
___________

Notas do editor:



(**) Vd. postes de:


19 de setembro de  2010 Guiné 63/74 - P7010: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (18): Terceiro ataque ao Olossato

(***) José Medeiros Ferreira (Ponta Delgada, 1942 - Lisboa, 2014) destacou-se na crise estudantil de 1962, foi desertor da guerra colonial (1968), vuiveu na Suiça, onde se licenciou em História, pela Universidade de Genebra (1972). Depois do 25 de abril,   foi eleito deputado à Assembleia Constituinte (1975), pelo Partido Socialista, e exerceu o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros do I Governo Constitucional (1976–1978), chefido por Mário Soares. Foi professor universitário (Faculdade de Ciências Sociais, Universidade NOVA de Lisboa).

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14545: Bibliografia de uma guerra (71): E agora? O que é que vou fazer?, do livro "Guerra na Bolanha", de Francisco Henriques da Silva, Âncora Editora, Lisboa, Março de 2015

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70; ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999), com data de 18 de Abril de 2015:

Meus caros Luís Graça, Carlos Vinhal e todos os camaradas e amigos desta tertúlia,
Na sequência da minha anterior correspondência é com o maior prazer que vos envio mais um excerto da minha obra “Guerra na Bolanha - de estudante, a militar e diplomata” (Âncora Editora, Lisboa, Março de 2015).
Desta feita, reporto-me a um tema pouco abordado - o regresso de África e a correspondente reinserção na sociedade portuguesa de então, a que dediquei toda a 3.ª parte do livro e de que aqui fica apenas, digamos um pequeno “aperitivo”.
Trata-se, obviamente, de uma perspectiva muito pessoal. O que aqui refiro consta das páginas 228 a 230 da obra.
A foto fui-a buscar à Net e é apenas ilustrativa de um embarque ou desembarque de tropas no cais de Alcântara.
Permito-me relembrar que o lançamento oficial foi efectuado em 17 de Março em Oeiras, mas está prevista uma sessão de apresentação em Lisboa, na Sociedade Histórica da Independência de Portugal em 5 de Maio, pelas 18 horas, para a qual está todos convidados e de que oportunamente enviarei para estas mesmas páginas um lembrete.

Saudações amigas
Francisco Henriques da Silva
(ex-Alferes miliciano de infantaria da C.Caç. 2402 e ex-embaixador em Bissau 1997-1999)


E agora? O que é que vou fazer?

Finalmente livre da monotonia verde azeitona das fardas militares, olhei para o espelho e vi-me, tal como era: vinte e poucos anos, sem curso, sem emprego, sem namorada e, principalmente, sem saber como organizar a minha vida no imediato. Tinha de encontrar saídas e dar resposta à magna questão: que fazer? Tinha de encontrar solução para todos estes problemas, uns pequenos, outros grandes, mas que se inscreviam na pergunta soberana que pairava sempre no ar e que prevalecia sobre tudo o mais: que fazer?

Tinham-me roubado a minha juventude, preciosos anos de vida quando estava na sua plenitude, o curso que queria terminar, uma carreira profissional que queria encetar. Sentia um vazio muito grande, mas não desesperei, não havia lugar para choro, nem ranger de dentes. Não podia verter lágrimas sobre o azeite derramado, nem à boa maneira lusitana culpabilizar a situação, as circunstâncias, o Outro ou os outros ou seja, lá quem for e o que for. Sim, porque, nos parâmetros da mentalidade tuga, no mau sentido da palavra, a culpa nunca era nossa. Tinha, pois, de reagir. Tinha de avançar. Tinha de ser eu a dar a resposta certa.

E assim o fiz, talvez com hesitações, desvios, opções duvidosas, caminhos ínvios, reflexões sem rumo definido, mas bem no íntimo sentia que podia seguir em frente e que tudo dependia de mim. Tinha de fazer. Tinha de assumir uma atitude pró-activa.

Em primeiro lugar, estava firmemente disposto a completar a universidade. Com a célebre “reforma Veiga Simão,” assim chamada em nome do Ministro da Educação da época (que em várias reencarnações acabou por servir diversos regimes políticos), o meu curso havia sido reestruturado e tinha ficado com cadeiras dispersas por todos os anos e nenhum completo ou próximo disso. Podia, agora, se quisesse, chegar a bacharel, ou seja, fazendo cadeiras por atacado, como aluno-militar. O bacharelato, na altura, constituía uma novidade, uma hipótese simpática que abria as portas a uma carreira no ensino, sobretudo para quem frequentasse cursos das faculdades de Letras e de Ciências. Era uma questão de tempo, de vontade e de algum sacrifício. Mas o meu grande objectivo final consistia em ingressar na carreira diplomática, um sonho que acalentava desde miúdo. Todavia, tratava-se de um alvo de difícil alcance e demoraria anos a lá chegar. Antes do mais, teria de completar o curso e de me sujeitar a um concurso de entrada no MNE, que não era propriamente “canja”, diziam. Mas retomando o fio à meada, que diabo, já estava nos vinte e tais, não podia viver das magras economias feitas, cujas limitações eram conhecidas, nem das sopas paternas ou, melhor, maternas. Tinha de fazer alguma coisa e, como atrás, referia aproveitar o estatuto de aluno-militar que me permitia dar saltos de canguru na faculdade.

Em segundo lugar, queria encontrar um emprego, em tempo inteiro ou em “part time”, para me poder sustentar, para as minhas fantasias e, enfim, para poder juntar os tostões com que se compram os melões. Esta era uma segunda prioridade, mas que se situava quase ao nível da primeira, pois não podia andar à boa vida.

Em terceiro lugar, depois dos namoros, pseudo-namoros, ou meros “flirts” tinha de arranjar, de algum modo, uma companhia feminina certa e não andar de candeia acesa à procura da bela adormecida no bosque ou feito lobo predador a emboscar a menina do capuchinho vermelho e todas as demais, na perspectiva de que tudo o que vem à rede é peixe, como alegadamente fazia ou, pelo menos, alardeava a maioria dos jovens machos lusitanos. A sexualidade tinha de ter os seus escapes, mas eu procurava sobretudo a estabilidade - apesar dos devaneios, sentia que era monógamo por natureza.

Em quarto lugar, tinha de descansar, viajar, passear, recarregar baterias, reavivar velhas amizades, satisfazer alguns sonhos do passado até aqui incumpridos. Em suma, viver e sentir que estava vivo, bem vivo e com vontade de pontapear. Havia uma certa urgência nisto, na medida em que, apesar de jovem, o tempo ia passando e, como rezava uma velha canção da época, não voltava para trás, apesar de querermos à viva força mudar-lhe o rumo.

Finalmente, via-me coagido a esquecer o passado próximo, as memórias que o tempo afinal não apaga e ultrapassar, se é que os tinha, alguns traumas de guerra. Porém as imagens não me abandonavam, via claramente e numa base diária, as tabancas, a mata, as bolanhas, as fardas, os corpos semi-nús dos soldados, as armas; ouvia distintamente os rebentamentos dos morteiros e dos “rockets”, o matraquear das costureirinhas, o guinchar dos macacos, o grasnar de certas aves tropicais, as falas de fulas, mandingas e balantas; sentia os cheiros fétidos de algumas bolanhas, o odor das plantas estranhas que a humidade fazia sobressair, a comida do “rancho” – ou do que pomposamente se chamava messe - pouco variada e insípida, o cheiro do capim e do mato queimado na estação seca; na boca, sentia o uísque que se bebia ao fim do dia, ou a cerveja morna; o gosto da manga verde roída devagar atrás do poilão, a enjoativa ração de combate e por aí fora. Enfim, imagens, sons, aromas e paladares que não me abandonavam, mas, planando por cima de tudo, aquela impressão durável, mas indefinível, quando se pressentia que íamos entrar em combate dentro de instantes: o nó na garganta, o gosto esquisito na boca, os suores quentes e frios, as borboletas no estômago. Como esquecer, então, se ainda hoje me lembro como se fosse ontem?

Cais da Rocha Conde de Óbidos - Lisboa
Foto: © Fernando Chapouto (2006). Todos os direitos reservados.
 ____________

Nota do editor

Vd. poste anterior de 28 de Abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14536: Bibliografia de uma guerra (70): A Mina, do livro "Guerra na Bolanha", de Francisco Henriques da Silva, Âncora Editora, Lisboa, Março de 2015

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14541: Convívios (670): Almoço Convívio do BCAÇ 2851, dia 6 de Junho (António Pimentel)



1. O nosso Camarada António Pimentel, ex-Alf Mil do Rec Inf do BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70), solicitou-nos a publicação do seguinte convite para a festa do convívio anual da sua Unidade:

Caro Luís Graça,

Para conhecimento de todos os que estiveram envolvidos com a nossa ação na Guiné e queiram compartilhar connosco este ALMOÇO ANUAL.

O nosso almoço anual é sempre no primeiro sábado de Junho, dia 6. 



Um abraço,
António Pimentel 
Alf Mil do Rec Inf do BCAÇ 2851
___________ 
Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13858: Memórias de Mansabá (34): As amêndoas da Páscoa de 1969 (Francisco Henriques da Silva)

Vista aérea do quartel de Mansabá
Foto: © Carlos Vinhal


1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70; ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999), com data de 1 de Novembro de 2014:

Meu caros camaradas e amigos,
Por razões várias, tenho prestado uma colaboração muito irregular a este blogue (mea culpa!) que, aliás, leio sempre com interesse e debato os “posts” aí publicados com os meus amigos e ex-camaradas de armas Mário Beja Santos e Raul Albino.
Junto vos envio uma descrição de um grande ataque a Mansabá, em 3 de Abril de 1969, poucas semanas depois da minha companhia se ter instalado naquela localidade, para participar na protecção aos trabalhos da construção da estrada Mansabá-K3-Farim.
Não disponho de qualquer fotografia de Mansabá no meu arquivo e muito menos do ataque em questão.

 Com um abraço cordial e amigo
Francisco Henriques da Silva
Ex- alferes miliciano de infantaria, C. Caç. 2402 (Có, Mansabé e Olossato), 1968-1970
Ex- embaixador de Portugal em Bissau (1997-1999)


MEMÓRIAS DE MANSABÁ

34 - As amêndoas da Páscoa

A 3 de Abril de 1969, Quinta-feira Santa, pelas 11 da noite, dá-se o grande ataque ao quartel de Mansabá, em que o grupo de combatentes inimigos devia ser superior a 120 elementos, armado com canhões sem recuo, morteiros de 82mm, metralhadoras pesadas, para além do armamento ligeiro habitual (Kalashnikovs, “costureirinhas”, RPG-2 e RPG-7, morteiro de 60mm, etc).(1)

A intensidade de fogo nos primeiros minutos, para além do efeito surpresa, impediu toda e qualquer reacção da nossa parte. Os rebentamentos incessantes faziam-se ouvir por todo o lado e percebia-se que tinham atingido a maioria das instalações militares.

No que me respeita, tinha acabado de fechar a luz, depois de passar os olhos, como era meu hábito, por um livro qualquer, porque no dia seguinte era dia de trabalho (ou seja, de protecção aos trabalhos em curso na estrada Mansabá-Farim), quando começou o fogachal. Encontrava-me num edifício constituído por um renque de pequenos apartamentos térreos, no enfiamento da pista de aviação, portanto num local completamente aberto e exposto ao fogo do inimigo, que estava, na prática, a fazer tiro de pontaria ao casario com, pelo menos, um ou dois canhões sem recuo e duas metralhadoras pesadas, para já não falar dos lança-rockets e das armas ligeiras que disparavam ininterruptamente. A cadência de fogo era, pois, de uma enorme violência. As coisas complicavam-se. As balas sibilavam em várias direcções. Os rebentamentos persistiam. Agarrei na G-3 e nas cartucheiras, vesti apenas a camisa do camuflado. Creio que uma bala terá trespassado a rede de mosquiteiro da janela indo alojar-se na parede. As coisas estavam a ficar feias. De xanatos e, em cuecas, corri para o quarto de banho, uma pequena dependência, nas traseiras, com uma parede de separação. Preparei-me para o pior, porque a violência do tiroteio e das explosões não abrandava. No quarto propriamente dito eu estaria demasiado exposto e o fogo vinha precisamente do fundo da pista, mesmo em frente. As balas de uma “pesada” iam quebrando as telhas do meu quarto mesmo por cima da minha cabeça. Um rebentamento muito próximo – fiquei momentaneamente surdo - dava-me a entender que uma canhoada ou morteirada devia ter destruído um dos apartamentos vizinhos. Se acaso os guerrilheiros tentassem entrar nas instalações, eu dispunha pelo menos da G-3 e de 5 carregadores para me defender. Tive a nítida sensação de que podiam tentá-lo. Não se atreveriam a tanto, ficava para a próxima... Quem sabe?

 Quartel de Mansabá - 1-Quartos dos Oficiais; 2-Edifífo do Comando: 3-Messe dos Oficiais

Será que tive medo? Não, creio que não tive, ou seja, o medo emocionalmente paralisante e que inibe o raciocínio, a decisão e a acção, mas também não podia iludir o sentimento de espanto, bem como, a veemência inicial do ataque, que atingiu proporções inusitadas. Por outro lado, também não terei tido aquela sensação habitual da entrada em combate, aquele nó na garganta, a boca seca com um gosto amargo, aquela sensação indizível de que ia começar um jogo incerto, mas que de algum modo o podia controlar, pelo menos na parte que me tocava Aqui não, estava só, literalmente só. Valia apenas por mim. Era tudo.

Entretanto, o fogo inimigo abrandou, enquanto se encetava a resposta do nosso lado, tímida e lenta, primeiro na base de morteiro 81 e uns largos minutos depois com as peças de artilharia. O tempo de reacção da nossa parte foi demasiado arrastado, o que permitiu ao IN actuar com total à-vontade. Tendo o fogo do exterior abrandado, corri para um abrigo situado na extremidade da fiada de apartamentos. Ouvi uma mulher a chorar e também o que me parecia ser o choro de uma criança. Devia ser família de algum dos engenheiros civis. Passei em corrida. Trazer mulheres e crianças para a guerra!?! Francamente...

Bati à porta, energicamente e com alguma impaciência.

- Oh, minha senhora, saia daí. É melhor refugiar-se no abrigo. É mais seguro – gritei-lhe cá de fora, agachado junto a um pequeno muro de resguardo, que a bem dizer não protegia nada, porque choviam balas tracejantes por todos os lados que iam iluminando o céu estrelado.

Noutro apartamento ao lado, alguém acendeu uma luz. Crispado, já com os nervos à flor da pele, vociferei não sei muito bem para quem:

- Desligue lá essa m... imediatamente, senão ficamos aqui todos! Não vê que isso chama a atenção?

No final da fiada de casas, lá estava o abrigo. Entro e ponho logo os pés numa quantidade infinda de fezes humanas, os meus xanatos de quarto para nada serviram. Fiquei sujo quase até aos joelhos. Os nossos bravos soldados, jamais prevendo que pudessem ser alvo de um ataque, tinham transformado o abrigo em retrete colectiva!

Não estava ali viv’alma. Enfim, para que é serviam os abrigos? Boa pergunta. Uma metralhadora lá para o fundo da pista ainda estava activa. Disparei inutilmente três ou quatro tiros, naquela direcção, porém sem qualquer convicção. O certo é que não estava a fazer nada e, entretanto, o fogo tinha amainado consideravelmente, ouvindo-se apenas tiros isolados e uma ou outra rajada. Passei pelo quarto, vesti uns calções, corri então para a parada em direcção a um dos barracões onde estavam instalados os meus homens. De caminho, vi 3 ou 4 feridos, de outras unidades, um jazia numa poça de sangue a contorcer-se com dores, um outro coxeava e tinha um braço ensanguentado, mais longe perto do abrigo do morteiro 81 alguém jazia prostrado no solo, sem dar sinal de vida (Morto? Ferido? Sei lá...). Enfim, não parei. Havia gente a correr por todos os lados e ainda se respondia ao fogo.

Entro no barracão, onde estariam os meus homens e gente da minha companhia. Pergunto de chofre:
- Temos muitos mortos e feridos?

Não era um dos meus soldados, mas pertencia à C.Caç. Respondeu-me:
- Feridos há alguns, meu alferes. Mortos creio que não, mas nas outras companhias parece que morreu gente.

Os enfermeiros e maqueiros corriam de um lado para o outro. Alguns feridos pareciam necessitar de evacuação urgente, porque aparentavam ferimentos graves. Com grande parte dos edifícios atingidos (quase todos), foi um milagre não se terem verificado mais vítimas. Para tal bastaria uma canhoada em cheio numa das casernas. Procurei o nosso capitão. Estava de serviço, mas não o encontrei.

Num abrigo de pequenas dimensões, perto da messe de oficiais e da torre de transmissões, vi o comandante de batalhão, deitado numa cama a olhar para o tecto, com um ar inquieto.

- Há muitos feridos e mortos? – perguntou-me.
- Alguns, meu comandante, alguns, ainda não se sabe ao certo quantos.
- Então, têm de ser evacuados – concluiu
- A esta hora e nestas condições não creio que seja possível - repliquei.
- Você está todo enlameado – interrompeu ele, mudando de assunto e olhando para as minhas pernas.
- Não é bem lama, meu comandante. Como sabe, estamos na estação seca. É outra coisa. Com sua licença...

Dei meia volta. Creio que não se apercebeu, nem sequer pelo olfacto, do meu estado real de sujidade, nem, tão-pouco, das razões para tal.

Foto 1 > Mansabá > Alguns dos feridos esperando evacuação para Bissau

O capitão que encontrei um pouco mais tarde disse-me que o comandante de batalhão havia solicitado apoio aéreo, o que era uma asneira, pois a aviação já nada podia fazer àquela hora, uma vez que a “guerra” tinha, de facto, acabado, nem actuava em plena escuridão. Seguiu-se uma noite sem pregar olho a cuidar dos feridos, a contabilizar os homens, a verificar os estragos e à espera de ordens. A população civil da tabanca e os trabalhadores da obra tinham sido duramente atingidos, mais do que a própria tropa, e registavam-se vários mortos e feridos entre eles, para além de inúmeras moranças incendiadas.

Os comandos lá conferenciaram entre si e deram-me por missão, bem como a outros grupos de combate da minha companhia, de efectuar um reconhecimento, logo ao raiar do dia, pelos presumíveis locais de instalação do inimigo, designadamente pela pista de aviação e região circunvizinha. Verificámos dois ou três factos curiosos: antes do mais, era extremamente difícil, à primeira vista, determinar os ditos locais, uma vez que, contrariamente ao que era usual, não se viam invólucros pelo chão; em segundo lugar, os trilhos de aproximação tinham sido apagados com ramos de árvores, que nos impediam de determinar com algum grau de certeza os rodados das armas pesadas (muitas, como viemos a saber mais tarde, foram previamente desmontadas e transportadas a ombro por carregadores – técnica que era também utilizada, como se sabe, na guerra do Vietname) e as próprias pegadas do grupo inimigo; em terceiro lugar, as posições dos canhões sem recuo e dos lança-rockets só se conseguiam detectar pelas ervas queimadas ou pelos vestígios de pólvora no solo; finalmente, o terreno, vasculhado a pente fino, não estava minado, o que, felizmente, contrariava as nossas piores expectativas.

Na Sexta-feira Santa, pouco depois de terminado o nosso reconhecimento no terreno, desembarcado do helicóptero para se inteirar do que se havia passado e dar algum alento às tropas, lá estava o inefável “Caco” Baldé. Uma das alcunhas porque era conhecido, à época, António de Spínola, Governador e Comandante-Chefe da Guiné. Baldé é um nome comum entre as etnias fula e mandinga e “caco” pelo facto de usar monóculo. Mostrou-se insatisfeito com o comportamento do comandante de batalhão.

Foto 3 > Mansabá > Um dos edifícios atingidos
Fotos: © Raul Albino

Uns dias mais tarde, por ordem do “hómi garandi da Bissau”, é lançada uma grande operação de retaliação na mata do Morés com pára-quedistas que, para além de terem infligido algumas baixas ao inimigo e de capturarem numeroso material de guerra, descobriram um mapa com a localização exacta das instalações militares e civis de Mansabá, com as medições em passos aferidos da localização das diferentes construções existentes e com indicação precisa das actividades que ali se desenvolviam. Ora, aí estava uma das explicações para a constante fuga de capinadores e de trabalhadores que, aliás, continuavam a circular, como sempre, sem quaisquer restrições, dentro do quartel. As deficiências da nossa intelligence foram mais que notórias, sem falar, evidentemente, das patentes falhas da segurança, que carecem de adjectivação adicional e que, aliás, continuavam.

Depois disto, Spínola, incumbiu-nos de nova missão: o Olossato, do outro lado da mata do Morés, onde iríamos terminar a nossa comissão de serviço.
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Notas do editor:

(1) Vd. poste de 24 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3146: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (12): Ataque a Mansabá

Vd. último poste da série de 2 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13457: Memórias de Mansabá (33): No dia em que morri (Carlos Vinhal, ex-Fur Mil Art MA)

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13677: Inquérito online: Sim, fomos o exército do desenrascanço (António Pimentel, ex-alf mil rec info, CCS/BCAÇ 2851, Mansabá e Galomaro (1968/70)

1. Resposta do António Pimentel, grã-tabanqueiro da primeira hora, ao desafio lançado, em 29 de setembro,  pelos nossos editores: "Sem querer abusar da vossa paciência... 'Desenrasço' no TO da Guiné... é mesmo qualidade ? Ou é treta ?"


[António Pimentel, natural da Figueira da Foz, a viver no Porto; ex-alf mil rec info, CCS/BCAÇ 2851, Mansabá e Galomaro, 1968/70; foto de L.G., tirada no Palace Hotel Monte Real, em 8 de junho de 2013, por ocasião do VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande]


Data: 30 de Setembro de 2014 às 16:28

Assunto: Sondagem: Fomos o exército do desenrascanço ?


Olá, Luís,

Eu acho que quase toda a nossa atividade militar durante a guerra colonial, não passava de uma série de desenrascanços (*).

A minha experiência é disso exemplo.

Como aspofmil [aspirante a oficial miliciano,], com a especialidade de reconhecimento e informações, e colocado no RI 6, no Porto, fui, em Dezembro de 1967, simultaneamente mobilizado para ir para a Guiné e convocado para seguir para Lamego para,  no CIOE, fazer o curso de Ranger.

Logo aqui se nota uma gritante falta de planeamento, já que atendendo à gritante falta de oficiais subalternos, me pareceu um desperdício fazer dois cursos em vez de um.

Além disso, sendo o teatro de operações em terras de África, não me pareceu ajustado fazer o dito curso em clima extremamente frio, como foi esse 1º trimestre de 1968.

Mas acabado o curso o que fui eu fazer?

Pois mandaram-me de volta para o RI 6 para dar instrução de reconhecimento a praças.

Mas eu não estava já mobilizado? Claro que estava, e o meu batalhão, que eu não sabia qual era, deveria estar em formação e instrução em qualquer sítio...

E eu a dar instrução a uma dúzia de rapazes que nunca mais vi, nem me lembro já quem eram. Isto a decorrer, até que recebo ordens para me juntar ao meu Batalhão, o BCAÇ 2851, no RI 1, na Amadora, pouquíssimos dias antes do embarque no T/T Uíge rumo à Guiné!

Chegados a Bissau, já bem de noite, fomos descarregados, é o termo, para um sítio ermo, e sem quaisquer condições, com o clima que bem conhecemos e a companhia de incontáveis mosquitos que nos deram as boas vindas. E assim passámos a primeira noite na Guiné, ao relento e em "boa" companhia. Creio que não é possível aceitar que esta ação de desembarque de tropas tivesse merecido qualquer planeamento. Seria mais lógico deixarem-nos passar a noite a bordo para sairmos de manhã cedo, por exemplo. O responsável por tal devia estar muito bem instalado em Bissau..

A meio da manhã, apareceu a escolta que nos iria levar ao nosso destino, Mansabá. Como eu era o alferes mais classificado, tinha a meu cargo o comando da companhia. Por isso procurei inteirar-me, minimamente, do que nos esperava. Fiquei impressionado, já Mansabá vinha a ser atacada todos os dias e os ataques às colunas eram frequentes, para além das minas, claro.

Então o alf Poças, da CCav 1749, disse-me ainda que não havia armas para nós. Depois as receberíamos em Mansabá... Eu pensei cá para comigo: "Então um gajo vem prá guerra e nem armas tem" ?...


A espingarda automática G3, a quem muitos militares no TO da Guiné chamavam "a minha namorada", por ser também uma arma muitop fiável.


Como já disse, fomos descarregados para um sítio ermo, mas para além de nós, géneros de todo o tipo, vinho, etc., e uns caixotes de dimensões consideráveis que me chamaram à atenção... Como já sabia que não havia armas para ninguém, a minha curiosidade adensou-se, e não demorei muito a abrir um deles, belos, de madeira muito branquinha, caixotes, que não traziam nada que desse para identificar o conteúdo, mas eu estava cá com um "feeling" ...

E não é que acertei?! Ali estavam elas, novas, reluzentes, ainda que desmontadas, as nossas queridas G3...

Mas quem passou pelos Rangers sabe que montar G3, até debaixo de água, se fosse preciso... Quem quis serviu-se... Por estranho que pareça, e a mim ainda hoje me parece muito estranho, as armas estavam sem qualquer vigilância

Munições não faltavam na coluna, claro...

Este foi o meu primeiro desenrascanço na Guiné.

Passados meses apareceu um pedido, muito tímido, a saber se alguém tinha dessas armas. Eu entreguei a minha, sem quaisquer  problema ou consequência, e não estou nada, nada arrependido!

 Felizmente a coluna deslocou-se sem incidentes de maior até Mansabá com passagem por Mansoa. Mas já depois de chegados a Mansabá,  tivemos as "boas-vindas" e a "festa" repetiu-se por quase todos esses dias de 1968!
Um abraço

António Pimentel

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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 28 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13659: Sondagem: "Desenrascanço é uma qualidade nossa. Na Guiné demos boas provas disso"... Falso ou verdadeiro ? Totalmente falso ou totalmente verdadeiro ?


quarta-feira, 12 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12829: O meu baptismo de fogo (26): Có - os primeiros contactos de fogo: um teste para os "piriquitos" (Francisco Henriques da Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70; ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999), com data de 10 de Março de 2014:

Meu caros camaradas e amigos,
Junto vos envio uma descrição do primeiro ataque a Có, em Agosto de 1968, algumas semanas depois de nos instalarmos naquela localidade, recém chegados à Guiné.
A minha descrição não coincide integralmente com a do Raul Albino(*), tal como descrita nas “Memórias de Campanha" pois muito embora estivéssemos presentes quando os factos sucederam tivemos visões e percepções diferentes dos acontecimentos, o que é absolutamente natural.
De qualquer forma, as descrições em larga medida são convergentes.

Não disponho de qualquer fotografia de Có no meu arquivo, de modo que remeto-vos para a foto já publicada neste blogue da CCaç 2402.
Estou a reservar este texto, juntamente com outros, para a publicação, talvez ainda este ano de um livro de memórias.

Com um abraço cordial e amigo
Francisco Henriques da Silva
Ex-Alferes Miliciano de Infantaria,
CCaç 2402
(Có, Mansabá e Olossato), 1968-1970
Ex-embaixador de Portugal em Bissau (1997-1999)


Vista aérea de Có
Foto: © Raul Albino (2006). Direitos reservados


O MEU BAPTISMO DE FOGO

Có - os primeiros contactos de fogo: um teste para os “piriquitos”

Pouco antes da Companhia completar um mês na povoação de Có, no “chão” mancanha, em finais de Agosto, juntamente com o meu grupo de combate, encontrava-me na estrada que contornava o extremo da pista de aviação, umas centenas de metros a Oeste desta última, uma vez que tinha cabido em sorte ao meu grupo efectuar, naquela manhã, a chamada “picagem” da dita pista, para efeito de detecção de minas. Esta operação rotineira e diária, indispensável para garantir a segurança das aeronaves, havia terminado e preparávamo-nos para regressar a penates. Creio que seriam para aí umas seis e meia da manhã. O dia começava a raiar. O IN, com um grupo relativamente pequeno, mas expressivo, talvez 20 a 25 homens no total, ataca o aquartelamento pelo lado norte da referida pista de aviação com armas ligeiras, morteiro de 60mm e RPG-2 (lança-granadas foguete de fabrico soviético). Foi um ataque de curta duração, cerca de um quarto de hora.

Có - Vd. carta de Pelundo 1:50.000

O Comandante manda sair um grupo de combate, o do Raul e, ao mesmo tempo, manda fazer fogo com o morteiro 81, salvo erro, a única arma pesada que a Companhia então dispunha, esquecendo-se de que eu e o meu grupo estávamos já quase numa das extremidades da pista. O grupo de combate do Raul, guiado pelo chefe dos cipaios, abandona o aquartelamento pela porta de armas em direcção à tabanca, ou seja, numa direcção contrária à da pista de aviação, até porque se o fizessem por esse lado estariam a avançar em campo aberto, completamente expostos ao fogo do inimigo, a fim de efectuar uma manobra de envolvimento. Entretanto, o meu próprio grupo movimentava-se rapidamente em direcção ao final da pista, por onde passava uma estradeca de terra batida, internando-se, porém, cautelosamente pelas bermas da via e não directamente por esta, para não se expor de peito aberto ao fogo dos guerrilheiros que batiam o caminho com uma metralhadora de alto calibre. De repente caem, duas ou três granadas de morteiro de 81mm, disparadas do quartel que afocinharam, sem explodir, muito perto de nós, uma delas a cerca de três metros do local onde me encontrava. Um dos cabos que estava ao meu lado, grita-me ao ouvido: “Meu alferes, meu alferes, agache-se! Estão a disparar do quartel na nossa direcção!” Fogo amigo! Sem dúvida... Estas “amizades” é que fazem falta! No meio daquela confusão, lá consigo comunicar por rádio - o que não foi nada fácil, porque estavam quase todos a falar ao mesmo tempo e a inexperiência pesava - e peço que suspendam imediatamente os disparos de morteiro. Agradeço, à Virgem Maria e a todos santinhos a nabice do furriel encarregado das armas pesadas que nos bombardeou com granadas encavilhadas, porque se acaso tivesse actuado com profissionalismo e segundo as regras, eu, muito provavelmente, não estaria aqui para contar a história.

A este ataque inicial e, contra todas as expectativas, após uma curta acalmia, seguiu-se um segundo assalto. Os guerrilheiros reagruparam-se e prepararam-se para nova ofensiva, agora de um ponto diferente e insuspeitado. No fundo, sabiam da nossa inexperiência - era o nosso baptismo de fogo -, dos nossos naturais temores e da nossa possível desorientação. Só que as coisas não lhes correram de feição.

Recomeçou, pois, o tiroteio. Parte do grupo atacante, já muito próximo de nós, a uns escassos 70 ou 80 metros continua a varrer a estrada com a tal metralhadora de tripé que eu e os meus homens vimos claramente, pois aproximávamo-nos cada vez mais. Para lá se dirigiam os tiros das nossas G-3. De forma totalmente inconsciente, sem dizer nada a ninguém, atravesso em passo de corrida a estrada para o outro lado, na tentativa ingénua ou, mesmo, estúpida de fazer uma manobra de envolvimento. O que é que eu sabia de guerra? As balas assobiavam por todos os lados e algumas zuniam, seguidas de embates secos, levantando poeira ao embaterem na terra da estrada, tal como nos filmes made in Hollywood ou então silvavam por cima das nossas cabeças. Zing! Zing! Verifico que estou literalmente sozinho do outro lado do caminho. No meio do tiroteio, ouço a voz de alguém: “O homem é maluco!” e, logo a seguir, um dos meus furriéis adverte-me aos gritos: “Meu alferes, meu alferes, isso aí é muito perigoso. A estrada está a ser batida por uma [metralhadora] pesada.” Como se eu não soubesse. Bom, lá atravesso eu, num ápice, outra vez a estrada para me juntar aos meus homens, com as balas outra vez a baterem por tudo quanto era sítio.

O nosso poder de fogo e a nossa superioridade numérica eram muito superiores às dos atacantes. Além disso, estes estavam já a ser envolvidos por fogos cruzados oriundos, quer do meu grupo, quer do do Raul, plenamente operacional e activíssimo que os atacava pelo lado nascente, uma vez que lhes havia seguido as pegadas, bem marcadas na lama do caminho. A metralhadora calou-se, os RPG-2 há muito que estavam silenciosos e só esporadicamente se ouviam tiros isolados de armas ligeiras, até emudecerem de vez.

Ao chegarmos ao local onde estaria a metralhadora, encontrava-se o corpo sem vida de um dos guerrilheiros, com uma farda de caqui e ostentando um pequeno emblema com a foice e o martelo no chapéu de pano amarfanhado e manchado de sangue. A arma, essa, sumiu-se.

Os meus soldados deram valentes mas inúteis pontapés no cadáver inerte do guerrilheiro, até se capacitarem de que estava morto, mas bem morto, da chamada morte matada.

Passado pouco tempo, fizeram-se ouvir novos disparos, mais a Leste era o grupo do Raul que ia em perseguição do IN. Os guerrilheiros terão sido surpreendidos com esta reacção da nossa parte, que não estariam, de todo em todo, à espera, e tiveram de debandar rapidamente, sofrendo mais um morto e um número indiscriminado de feridos.

O cabo dos cipaios, Dayan, no seu português acriolado definiu bem o baptismo de fogo daquele grupo de soldados, jovens e inexperientes nas lides da guerra:
- Companhia “piriquita”, mas boa!

No jargão da época, “piriquitos” eram os neófitos, os novatos, os militares recém-chegados à Guiné, sem experiência de combate.

Ora bem, o certo é que tínhamos passado no exame e logo na primeira chamada.

Francisco Henriques da Silva

De pé: Francisco Silva, Raul Albino e Cap Vargas Cardoso
Foto: © Raul Albino (2006). Direitos reservados
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 2 DE OUTUBRO DE 2008 > Guiné 63/74 - P3265: O meu baptismo de fogo (2): Primeiro ataque ao quartel de Có (Raúl Albino)

Último poste da série de 12 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12282: O meu baptismo de fogo (25): Monte Siai, 10 de Janeiro de 1968 (Abel Santos)

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10983: O nosso livro de visitas (158): António Gonçalves Teixeira procura camaradas de Galomaro, do seu tempo (meados de 1969/abril de 1970), da CCS/BCAÇ 2851

1. Mensagem de António Gonçalves Teixeira [, foto à esquerda], com data de ontem


Assunto: Contactos com antigos combatentes que estiveram em Galomaro


Por acaso ao pesquisar na Net, encontrei a página que tu tens, sobre os camaradas que passaram pelaGuiné, mais concretamente por Galomaro.

Pois,  caro camarada de armas, eu estive em Galomaro, nos meados de 69 até Abril de 70. Fazia parte da CCS do Batalhão de Caçadores 2851.

Fomos nós que o inauguramos [, o quartel de Galomaro]. Quando lá chegamos, não tínhamos luz nem água. A água era transportada por um Unimog conhecido por burro do mato [, 411,], de uma nascente, que ficava uns 600, 700 metros antes de chegarmos ao quartel, na estrada que vinha de Bafatá. 

Sobre a luz, só depois de ai estarmos é que recebemos um gerador, passados uns três a quatro meses. A cantina era de lona. As oficinas eram de cibos de palmeira, e coberta de chapas de bidons e zinco, O refeitório, era feito do mesmo material, igual ao das oficinas. 

Quando isso foi inaugurado só existiam os abrigos e o edifício do comando, que ficava à direita da porta de armas. Penso, pelas fotos que vejo, vocês já tiveram outras condiçoes. Já agora me esquecia de acrescentar, que o nosso banhoera dado debaixo de bidons , que tíhamos em cima de uns troncos de palmeira. Para fazermos as nossas necessidades era numa vala junto ao arame farpado.

Como podes verificar, eram condições "5 Estrelas". As vossas,  se calhar, pouco terão melhorado.

 P.S. - Aproveito para te dizer que sou muito, mas mesmo muito, piriquito nisto da Net. Pois só ando nisto, desde novembro. Até essa data não tinha tocado numa tecla. Mas acho a coisa interessante. Por isso, peço desculpa por alguns erros,e podes contar comigo para fazer parte da Tabanca. Junto deixo o meu contacto (...)

2. Comentário do editor:

Camarada de Galomaro, da CCS/BCAÇ 2851!... Obrigado pela tua visita. Eu também estive na zonta leste, mas no setor L1, em Bambadinca, ao tempo do BCAÇ 2852 que veio convosco para a Guiné em meados de 1968, no mesmo navio, o Uíge... A minha unidade era a independente CCAÇ 2590, mais tarde CCAÇ 12. Passámos algumas vezes por Galomaro. Fazíamos frequentes colunas logísticas para vocês e para a malta do Saltinho.

Sobre o teu batalhão, o BCAÇ 2851, temos aqui umas quinze referências. Temos malta da CCAÇ 2401, da CCAÇ 2402 e da CCAÇ 2403, inscrita na Tabanca Grande. Da tua CCS (a CCS/BCAÇ 2851, Mansabá e Galomaro, 1968/70), temos aqui dois camaradas teus, o Hernâni Acácio Figueiredo (ex-alf mil trms) e o António Pimentel (ex-alf mil pel rec inf). Vais, por certo, ficar feliz por encontrá-los. Vê se os reconheces. É possível que haja mais, mas estes dois já cá estão no nosso  blogue, há uns anos valentes. (Peço desculpa, se omito alguém). Quanto a Galomaro, temos aqui mais de 150 referências...

Bom, registo com agrado o teu pedido de entrada na Tabanca Grande. Já temos uma foto tua, atual, falta-nos uma foto antiga, tua, do tempo de Mansabá ou de Galomaro. Vê se consegues arranjar essa e outras, que tenhas no teu álbum, e queiras partilhar com os teus camaradas. Manda-nos também mais alguma informação (ou até história que tenhas para contar) da tua CCS. 

Dou-te os parabéns pelos teus progressos no uso da Net. À medida que fores praticando, vais ver como te sentes mais confiante. Fico então à espera das tuas fotos, para te poder apresentar à Tabanca Grande. Um Alfa Bravo (ABraço).

PS - Já agora, dá-nos mais elementos sobre ti:  posto, especialidade, local onde moras, etc.

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Nota do editor:

terça-feira, 3 de abril de 2012

Guiné 63/74 – P9694: Tabanca Grande (327): José Carlos Santos Pimentel, ex-Soldado de Transmissões da CCAÇ 2401/BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70)

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano José Carlos Santos Pimentel (ex-Soldado de Transmissões da CCAÇ 2401/BCAÇ 2851, Pirada, Paunca e Buruntuma, 1968/70), com data de 31 de Março de 2012: 

Camarada Carlos Vinhal
Agora vou passar às apresentações:

Sou: José Carlos dos Santos Pimentel
Data de nascimento: 23 de Fevereiro de 1946
Ex-Soldado de Transmissões da Companhia de Caçadores 2401
Vida Civil: Profissional de Seguros numa Companhia de Seguros (42 anos)
Actualmente Reformado por Invalidez desde 12/2000
Estou a morar em: Marisol - Charneca da Caparica
Lugares onde andei na Guiné: Bissau, Contobuel, Nova Lamego, Pirada, (SENEGAL, perdidos) Paunca, Geba, Piche, Buruntuma e, em Operações, por vários locais.

Fotos actuais tipo passe não tenho por agora, quando tiver envio.

Um abraço
Pimentel

2. Seguem-se algumas das fotos recebidas e que farão parte de um álbum a publicar:

5 de Setembro de 1968 > José Carlos Pimentel a bordo do navio Uíge

Paunca, 12 de Agosto de 1969 > José Carlos Pimentel 

José Carlos Pimentel


3. Comentário de CV:

Caro José Carlos Pimentel
Bem-vindo à nossa Tabanca.

És mais um elemento da Arma de Transmissões largamente representada na nossa tertúlia, no entanto, se reparares, não temos no nosso Blogue referências à CCAÇ 2401. Como queremos o mais possível que as Unidades que passaram pela Guiné tenham algum registo nas nossas páginas, cabe-te a missão de nos contares, com textos e fotos, a actividade da tua 2401.

Não esqueças que queremos preferencialmente digitalização de fotos que tenhas em teu poder, assim como textos originais ou, quando muito, baseados em relatos e fotos dos teus camaradas de Companhia. Diz-nos sempre a proveniência do material que mandas porque no nosso Blogue tentamos ao máximo respeitar a propriedade intelectual daquilo que publicamos.

Como enviaste uma série de fotografias, vamos começar a publicá-las brevemente.

Como é da praxe, envio-te em nome da tertúlia, e dos editores em particular, um abraço de boas-vindas.

O teu camarada e novo amigo
Carlos Vinhal
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 31 de Março de 2012 > Guiné 63/74 – P9684: Tabanca Grande (326): António Vaz, ex-cap mil CART 1746, Bissorã e Xime, 1967/69

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9519: O Nosso Livro de Visitas (127): Carlos Alberto Morais dos Santos, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAV 1749 (Mansabá, 1967/69)

1. Mensagem do nosso camarada e leitor Carlos Alberto Morais dos Santos, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAV 1749, Mansabá, 1967/69, com data de 17 de Fevereiro de 2012:

Chamo-me Carlos Alberto Morais dos Santos, fiz parte da Companhia de Cavalaria 1749 como Mecânico Auto e estava em Mansabá aquando do ataque na quinta-feira Santa de 1969, que o SR descreve no seu blogue, e que eu costumo ler, recordando tempos passados. Mas uma situação me intriga. O SR apenas faz referencia à sua Companhia e ao Batalhão 2851 então comandado pelo Tenente Coronel César da Luz Mendes, e não fala da actuação da Companhia de Cavalaria 1749, que também sofreu um morto e vários feridos. Porquê? Será por esquecimento? Gostaria de saber.

Carlos Alberto Morais dos Santos


2. Deduzido que o nosso camarada se referia ao Poste 3146* do nosso tertuliano Raul Albino (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70), foi a este pedido o devido esclarecimento.

Recebemos do Raul esta mensagem que foi reencaminhada ao Carlos Santos:

Em relação à observação do nosso ex-combatente Carlos Santos, da CCav 1749, ele tem toda a razão, eu não me refiro à sua Companhia. A razão é muito simples. Se qualquer pessoa ler bem esse post, eu tinha chegado a Mansabá dois dias atrás, vindo de Có acompanhado por mais um grupo de combate, que tinham ficado em Có para reforçar e acompanhar a passagem de testemunho para a Companhia que nos substituiu enquanto a CCaç 2402 (a dois grupos de combate) ia reforçar o contingente de Mansabá.

Eu relato claramente a minha frustração durante esse ataque, por não conhecer o aquartelamento nem o seu plano de defesa e muito menos a composição desse destacamento, ou seja desconhecia a existência da CCav 1749 ou outra qualquer Unidade lá destacada. Conhecia a minha Companhia e o meu Batalhão, como ele muito bem refere. Mais ainda, foi nessa altura que tive o primeiro contacto com o resto do Batalhão, porque tínhamos iniciado a comissão em Có como Companhia independente, reportada ao comando de Bula.

No livro da História do Batalhão, vi que está lá reportado toda a operação a um nível global, com a intervenção de todas as Unidades que responderam a esse ataque inimigo, incluindo as referências às baixas nossas e deles. Como eu só relatei aquilo que vi e que se passou comigo, não era a pessoa mais habilitada para descrever o que se passou com as outras Unidades. Isso é o que essas Unidades terão de fazer para enriquecer a história desse ataque violento, de preferência contado na primeira pessoa. Eu procurei que nos relatos que fiz sobre a CCaç 2402, já compilados em livro, que todos os participantes dessem a sua perspectiva sobre um mesmo acontecimento (ataque, emboscada, etc.), como se se tratasse de um filme com varias câmaras a captar. Nem sempre consegui a participação de vários intervenientes, possivelmente por insegurança quanto à qualidade dos seus textos. Já viram o que seria, por exemplo, a descrição desse ataque a Mansabá, visto de vários ângulos? Dava um filme...

Espero ter esclarecido o nosso bloguista Carlos Santos e sugiro que ele conte aquilo que viu e assistiu na sua campanha na Guiné. Para ele um abraço de amizade, na esperança de nos virmos a encontrar no próximo convívio do blogue.

Um bem haja,
Raul Albino


Novembro de 1971 > Testemunho da passagem da CCAV 1749 por Mansabá.
Foto de Carlos Vinhal


3. Esta foi a reacção do nosso camarada Carlos Santos:

Boa tarde
Pois meu amigo fico muito grato pela sua resposta, e compreendo perfeitamente a razão por que não faz referência à minha Companhia. Para começar a nossa conversa informo-o de que não sou homem de estudos, tenho apenas o nono ano e como tal o meu português é limitado, mas ao contrário da competência escolar, sou grande em experiência de situações vividas. Eu era à data desse ataque apenas 1.º Cabo Mecânico Auto, profissão que desenvolvi por toda a minha vida até à presente data.


Nesse dia estava de Mecânico de Dia ao Batalhão e como tal saí de Mansabá de madrugada a caminho de Bissau acompanhando a coluna. No regresso a Mansabá como saberá parávamos em Mansoa, terra onde também estive nove meses, e aí fomos informados pelo SR Comandante do Agrupamento de que o inimigo tinha sido visto em dois sítios, portanto para irmos com muita atenção porque embora não tivéssemos duas emboscadas, uma íamos ter de certeza.

Eu conduzia nessa tarde um carro civil sem a respectiva autorização, coisas da idade e o dono desse carro, que tinha um estabelecimento em Mansabá, o Sr Amadeu Pereira que tinha a cabeça a prémio ficou em Bissau possivelmente já informado do que iria acontecer e pediu-me para eu levar o carro e entregá-lo à Dona Benvinda, sra. cabo-verdiana que com ele vivia. Comecei então a ter algum receio visto que o carro civil era conhecido, mas chegamos a Mansabá sem que alguém nos perturbasse.

Pelas 11h15 ouviram-se os primeiros rebentamentos que só terminaram à meia-noite e que provocaram tudo quanto o sr descreve e muito mais. Morreu nesse ataque um soldado condutor da CCS do BCAÇ 2851 que tinha saído do hospital nessa tarde, morreu um apontador de morteiro e morreu o soldado José Maria Madeira Lorem da Companhia de Cavaria 1749 à qual eu pertencia, para além de vários civis, incluindo crianças queimadas e os que morreram posteriormente.

Tenho o histórico da minha Companhia e vou procurar mais informação sobre este ataque e vou enviar-lha, assim como as minhas fotos que pede.

Quanto a possível encontro de ex-militares estarei sempre à disposição para recordar, o que apesar de tudo ainda recordo com alguma saudade.

Saudações amigas
Carlos Alberto Soares dos Santos

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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 24 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3146: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (12): Ataque a Mansabá

Em 3 de Abril de 1969, um grupo inimigo estimado em cerca de 100 elementos, atacaram Mansabá de diversas direcções com Canhão sem recuo, Morteiro 82, Lança Granadas Foguete, Metralhadoras Pesadas, Metralhadoras Ligeiras e outras armas automáticas.

O ataque começou cerca das 23,15 horas e durou 45 minutos. As nossas tropas (ao nível do Batalhão) sofreram 1 morto, 10 feridos graves e 23 feridos ligeiros. Segundo o relatório da nossa Companhia, pertencer-nos-ia 3 feridos graves evacuados para o Hospital Militar 241, tendo posteriormente um dos feridos sido evacuado definitivamente para o HMP de Lisboa, além de 16 feridos ligeiros. A população sofreu 7 mortos, 12 feridos graves e 19 feridos ligeiros.[...]


Foto 1 > Mansabá > Alguns dos feridos esperando evacuação para Bissau

Foto © Raul Albino (2008). Direitos reservados.


Vd. último poste da série de 2 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9431: O Nosso Livro de Visitas 126): Fernando Paiva, Pel Caç Nat 57, Mansoa e Bindoro, abril de 1967/abril de 1969