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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Guiné 63/74 - P12213: (In)citações (56): Os nossos pais acreditavam na solução luso-africana proposta por homens como Calvet de Magalhães e António Spínola (Cherno Baldé)



Guiné > s/d (c. 1916) > Circunscrição do Geba > Bambadinca > Ponte-cais, no rio Geba Estreito.


"O relatório de Vasco Calvet de Magalhães, administrador da Circuncrição de Geba, datado de [1916] é, a diferentes títulos, um documento excepcional: afoita-se por domínios até então inexplorados ou mal ventilados; propõe estradas e fala do respectivo traçado; queixa-se e denuncia funcionários corruptos;abalança-se a falar da origem dos fulas,apresenta soluções para o assoreamento do Geba,é uma incursão com pretensões literárias e algumas ambições políticas.Foi neste documento que encontrei esta preciosidade,um porto de Bambadinca que nenhum de nós conheceu..." (BS)

Referência bibliográfica: 

MAGALHÃES, Vasco de Sousa Calvet de - Província da Guiné : relatório.  Porto: Progresso, 1916, 106, [2] p., gravuras, il.


Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do Cherno Baldé [, foto à esquerda, quando jovem estudante em Kichinev, Moldávia, ex-URSS, Dezembro de 1985,] em resposta aos comentários deixados no poste P12200 (*):

Amigo e irmão Luis Graça,

Obrigado pelas tuas/vossas  palavras de conforto (*). Acontece que os nossos pais/tios, embora fossem tidos como ambiciosos (na óptica do regime português da altura), acreditavam profundamente na solução luso-africana proposta por grandes homens como [Vasco de Sousa] Calvet de Magalhaes (1878 - ?)(**)  e continuada depois por Spínola, porque na verdade, os territórios do leste da Guiné,  já nessa altura, experimentavam uma colonização do tipo "indirecta",  onde os poderes tradicionais tinham um peso importante. (***)

Para esta geração que agora terminou, a ideia Cabralista de uma independência total não fazia qualquer sentido para a Guiné, um território enclave com um mosaico multiétnico no meio de um perigosos jogo de influências das grandes potências do mundo de então. Nao acreditavam que uma Guiné totalmente independente pudesse ter êxito e hoje os factos parecem confirmar os receios e as dúvidas de então.

Ao Cabral, que segundo algumas fontes é filho de uma mulher fula de Geba, os homens grandes fulas disseram: Deixa os Portugueses onde estão, porque sem eles nos nunca nos entenderemos. Claro que depois pagaram por isso, porque os portugueses depois fizeram tudo ao contrário.



Um abraço amigo, Cherno Baldé (***)

____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de outubro de 2013 > 25 de outubro de 2013 > Guiné 63/74 - P12200: Memória dos lugares (247): Fajonquito em Festa (1971) (Cherno Baldé)

(...) NOTA: Faleceu na noite do dia 19 Outubro, em Bissau, o nosso pai e tio, Sidi Baldé, que exercia a função honorifica de Régulo, o último dos príncipes de Sancorlã do período da guerra colonial, ex-Alferes e comandante de pelotão de milícias em Sare Uali e Sumbundo (área de Fajonquito).

Com um abraço amigo,
Cherno Baldé

(i) Comentário do editor Carlos Vinhal:

Em nome dos editores e da tertúlia, apresento ao nosso amigo Cherno Baldé, assim como à sua família, o nosso pesar pela morte do seu tio Sidi Baldé, Régulo e Príncipe de Sancorlã, ex-Alferes, CMDT de Pelotão de Milícias. Mais um camarada e amigo que lutou a nosso lado e que nos deixou no dia 19 de Outubro. Paz à sua alma. Honremos a sua memória. Carlos Vinhal

Outros comentários deixados na caixa de comentários do poste:

(ii) Luís Graça:

Meu caro Cherno, meu amigo, meu irmãozinho:  A perda dos nossos amigos e parentes, por morte, é sempre uma perda, uma morte, de uma parte de nós.  Tu já aqui escrevestes páginas notáveis, de antologia, sobre a tua família e a tua gesta familiar... Perdes agora um tio que é também pai, segundo o vosso (mais complexo do que o nosso) sistema de parentesco.

Quero-te, daqui de Lisboa e do nosso blogue, mandar-te uma palavra de conforto. A tua família é já, também, de algum modo um bocadinho da nossa família. Um abraço grande, afetuoso, fraterno. Luís Graça

(iii) Hélder Sousa:

Caro Cherno: Antes de mais deixa-me que subscreva as palavras do Luís e que através delas também te leve alguma solidariedade, a ti e família.

Temos depois as fotos de Fanjonquito. Olhando daqui, destes cerca de 40 anos passados, fica-se com uma certa nostalgia desses tempos e dessas vivências, que nos mostram como era possível conviver e trabalhar em conjunto pelo progresso e melhoria do bem-estar do povo da Guiné.

É certo que ainda há tempo (haverá sempre, embora noutras circunstâncias) mas já se desbaratou muito, muita energia, muita vontade.

(iv) Manuel Carvalho:

Caro Cherno: Sempre desejado, saúdo este teu reaparecimento que me alenta a alma e mitiga a saudade de um tempo tão distante e tão próximo do coração. Daqui subscrevo as palavras de condolências do Luís Graça pela perda do teu pai e nosso camarada.
Um grande abraço, Carvalho de Mampatá

(v) Adriano Moreira:

Caro Cherno: Lamento profundamente a tua perda e mando-te um grande abraço de solidariedade extensivo à tua família.

 (vi) José Manuel Paula 

Saudades de Fajonquito, parece impossível, não é? Mas é o que tenho, um misto terrível daquilo que vivi. Escusado explicar. A minha Companhia, a 1685, os "Insaciáveis", esteve sediada em Fajonquito de julho de 1967 a Novembro de 1968, um ano e picos de tantas "coisas". Orgulho-me de ter deixado muitos amigos e de,  na Páscoa de 68 juntamente com alguns camaradas,  reabrir a fronteira de Cambajú num encontro com as autoridades do Senegal.
Ex. Furriel Mil José Manuel Paula

(vii) Manuel Joaquim

Um grande e afectuoso abraço, meu caro Cherno


(**) Alguns dos nossos postes onde há referências ao Calvet de Magalhães, administrador da circuncrição do Geba nos primeiros anos da I República,

17 de novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5288: Memória dos lugares (55): Pontes do Rio Corubal (Carlos Silva)

(...) Assim não me conformando com as informações obtidas, foi por intermédio do meu amigo Rui Fernandes, Médico, também tertuliano, que falei com a D Fátima Calvet Magalhães que se encontrava em Portugal, filha da D. Helena Calvet Magalhães, [falecida] ex-proprietária do Aldeamento Turístico “Chez Hellene” de Varela, por sua vez filha de Vasco de Sousa Calvet de Magalhães.

(...) Nessa conversa telefónica com a D Fátima, ela informou-me que a construção da Ponte Carmona era da autoria ou foi construída por determinação do seu avô materno e que tinha sido concluída e que as pessoas passavam por lá para se deslocarem para Buba e que não havia dúvidas sobre tal facto. (...)



(...) A admiração de Juvenal Cabral [, pai de Amílcar Cabral,] pelo administrador Calvet de Magalhães era quase ilimitada. Exalta-o nas suas memórias como trabalhador incasável, homem de sociedade e acção que sobrepunha o interesse do serviço público ao seu próprio bem-estar. Calvet lançou-se em obras de fomento como a construção da ponte sobre o rio Colufi, e depois o mercado em estilo árabe, ao gosto dos muçulmanos. Juvenal Cabral confessa que Bafatá foi uma verdadeira escola para ele. Era professor oficial e subdelegado do Procurador da República. (...)


(...) Os relatórios daquele tempo primavam por uma linguagem informal, faziam ressaltar a categoria cultural do seu autor e até os seus dotes literários. Teixeira Pinto assim procede com a operação do Oio. Começa por ir a Bafatá conversar com o administrador Vasco de Calvet de Magalhães, em Bolama prepara uma expedição, assentando-se que se deveria estabelecer um posto em Porto Mansoa e fechar o cerco à região do Oio. Disfarçou-se de inspector comercial e percorreu em Janeiro de 1913 toda a região entre Mansoa e Farim, atravessando o Oio (...)


27 de fevereiro de  2013 > Guiné 63/74 - P11166: Para que a memória não se perca (3): Histórias da dobragem do século XIX para o século XX (José Martins)

1 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11785: Notas de leitura (496): O Império Africano 1890-1930, coordenação do Prof. Oliveira Marques (Mário Beja Santos)

(...) A Guiné conheceu transformações enormes: separou-se de Cabo Verde, foram definidas as suas fronteiras, a exploração agrícola substituiu o comércio negreiro. A grande falta são os colonizadores, a província desligada de Cabo Verde assenta numa orgânica administrativa que seria uma quase ficção caso não houvessem efetivos militares. Todas as divisões administrativas acabavam por ser ineficazes, os administradores não possuíam meios para as percorrer, não podiam garantir a lei nem arrecadar os tributos. Foi preciso esperar pela pacificação para desenvolverem as comunicações, cujo expoente foi dado pela abertura da estrada Bafatá-Bambadinca, ao tempo do administrador de Geba Calvet Magalhães.

(***) Vd. artigo do nosso grã-tabanqueiro, etnólogo, Eduardo Costa Dias (ISCTE, Lisboa): Regulado do Gabu (1900-1930): a difícil compatibilização entre legitimidades tradicionais e a reorganização do espaço colonial. "Africana Studia". nº 9, 2006, pp. 99-125 (Edição do CEAUP - Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto) [Consult em 28/10/2013]. Disponível em http://www.africanos.eu/ceaup/uploads/AS09_099.pdf

 (***) Vd. poste de 30 de setembro de 2013  Guiné 63/74 - P12103: (In)citações (55): Eu desejo acreditar na Guiné-Bissau, nos seus jovens, mulheres e homens de boa vontade, que trabalham nas bolanhas, nas matas, nos rios e no mar... (Paulo Salgado, ex-alf mil, cav, op esp, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72; cooperante)

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Guin é 63/74 - P10478: Tabanca Grande (364): Júlio Madaleno, tocador de guitarra, feicebuqueiro e agora grã-tabanqueiro, nº 582, ex-fur mil, CCAÇ 1685 (Fajonquito) e CCAÇ 2317 (Gandembel) (1967/69)

1. Mensagem de ontem, enviada pelo Júlio Madaleno [, foto atual à esquerda]:

Data: 3 de Outubro de 2012 19:27

Assunto: Ex-fur mil Júlio T S Madaleno,  Guiné 1967/69

Caro Luís Graça

Desde há 1 ano que intervenho no blogue mas parece-me que ainda estou despercebido, embora não ache que isso tenha grande importância.

Localizo uma minha primeira intervenção com uma referência vossa P9104, Agenda cultural (172) (*) e outra vossa, do Luís Graça para o GG (30/11/2011) (**).

Daí em diante faço umas visitas ao blogue e como tenho conta no facebook subscrevi a vossa da Tabanca e recebo as atualizações todas.

Quando o Idálio Reis apresentou o livro sobre Gandembel, intervi e ele até dialogou comigo por e-mail, pois que não nos víamos desde a Guiné. Também já descrevi o meu percurso militar nas CCAÇ 1685 e 2317 e uma tragédia cá, uns anos após a desmobilização, que me voltou a perturbar o sono.

Se for possível torna-me também tabanqueiro. Quero continuar ligado aos meus antigos camaradas de armas.

Um abraço do Júlio Madaleno, o tal que gosta de tocar guitarra,
______________

(*) Comentário de Júlio Madaleno, de 29 de novembro de 2011, ao poste P9104:

 (...) Dois dos [três] F [Fátima, futebol e fado], um respeito-o, outro causa-me ansiedade clubística. Quanto ao terceiro, amigos...ah quanto nos fazia reviver o que nos era querido e estava longe. Na altura tinha lá uma viola que nos ajudava nesses bocadinhos de nostalgia. Hoje sou intérprete de guitarra portuguesa. 

Só lamento não conseguir encontrar-me com rapaziada das 2 CCAÇ por onde passei, a 1685 e a 2317. 

Abraço a todos e viva o que os 3 F  ainda hoje simbolizam.


(**) O Júlio Madaleno deixou o seguinte comentário, com data de 10 de abril de 2012, ao poste P9726 (*):

Velhos companheiros:

Certamente não vos lembrais de mim porque fiz uma efémera passagem pela [CCAÇ] 2317 quando quis o destino que fosse substituir o fur mil Alves devido à infelicidade que o vitimou.

O meu nome é Júlio Madaleno e operei o tal morteiro 120 que lá foi colocado e estava instalado na parte de trás do abrigo da Browning. Pelas frequentes consultas que faço ao blogue estou informado do livro do amigo Idálio Reis e do almoço programado para 9 de junho [, data do convívio do pessoal da CCAÇ 2317, em Paredes ], onde vou tentar estar presente para rever antigos camaradas de armas.

Um grande abraço do ex-fur mil J M
juliomadaleno@gmail.com

(No Facebook,  identificável em foto com guitarra).

2. Comentário de L.G.:

Júlio:  Que a tua vontade seja cumprida: "Se for possível torna-me também tabanqueiro. Quero continuar ligado aos meus antigos camaradas de armas"...

Sê bem vindo, camarada, mais uma e outra vez!... Já há tempos, em 12 de agosto de 2009, nos apareceu aqui a filha, Lídia Gonçalves,  de um camarada teu, e nosso, que esteve contigo na CCAÇ 1685 (Os insaciáveis), nos anos de 1967/69. O seu nome era José Manuel Costa Gonçalves, 1º cabo mecânico auto rodas. É provável que não te lembres... Havia 150 homens numa companhia...

A outra (e última) referência que temos à tua antiga companhia, a CCAÇ 1685, reza assim: 

(...) CCaç 1685, comandada pelo Cap Inf Alcino de Jesus Raiano, unidade orgânica do BCaç 1912, e mobilizada em Évora no RI 16: assumiu a responsabilidade do subsector de Fajonquito, rendendo a CCaç 1501, em 19 de Setembro de 1967, e vindo a ser substituída pela CCaç 2435 em 14 de Dezembro de 1968. (...). 

Certo ? Confirmas ? Acontece que não temos  cá ninguém desta companhia, se não erro... Tu serás pois o primeiro e digno representante dos Insaciáveis. Quanto à CCAÇ 2317, já é mais familiar aos nossos leitores, devido ao seu heróico comportamento em Gandembel e em Balana, e ao livro do Idálio Reis.

O que é que te falta para cumprir as NEP do blogue ?... Manda uma ou mais fotos do antigamente e conta um pequena história... Precisamos de saber mais umas coisas sobre as tuas andanças pelo TO da Guiné.... Quanto à guitarra, um dia destes temos que ouvi-la!,,, 

Passas a ser o grã-tabanqueiro nº 582. Parabéns!

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4839: O Nosso Livro de Visitas (67): Lídia Gonçalves, filha do nosso camarada José Manuel Costa Gonçalves

1. Mensagem de Lídia Mateus, filha de um nosso camarada falecido recentemente, com data de 12 de Agosto de 2009:

O meu nome é Lídia Gonçalves, sou filha de um camarada vosso, que esteve na Guiné-Bissau nos anos de 1967/69.

O seu nome era José Manuel Costa Gonçalves. Era cabo mecânico auto rodas (acho que era assim a denominação). Fazia parte da CCaç 1685 (Os insaciáveis).

Gostaria que, a título póstumo, (o mesmo faleceu no passado dia 25/07/2009), publicassem as fotografias que irei enviar mais tarde. O meu pai sempre que falava da Guiné e do tempo que lá passou, ficava com um brilhozinho nos olhos.

Gostava de contar como tinha recebido um louvor do seu comandante por ter conseguido fazer omeletes sem ovos, tendo a frota de carros sempre pronta a funcionar, e orgulhava-se em exibir a sua caderneta militar. Também gostava de contar como dava de comer a tanta gente que não tinha o que comer! (Sempre foi amigo do conhecido e do desconhecido!).

Lembro-me que cresci a ouvir contar histórias de África, de tal modo minucioso, que me via a mim, naqueles locais que o meu pai contava e descrevia.
Só lamento não ter descoberto a Tabanca mais cedo, para que ele também pudesse partilhar convosco desta tertúlia.

Obrigado por ajudarem a manter viva a história de Portugal, sem preconceitos de qualquer tipo!

Um grande bem haja a todos!


2. Comentário de CV:

Cara amiga Lídia
Muito obrigado por se ter dirigido a nós e pelas palavras enviadas que adivinhamos serem sentidas.

Lamentamos profundamente a morte recente do senhor seu pai e mais ainda por ser nosso camarada. Mais um pedaço de nós que a inexorável lei da morte não poupou. Aceite os nossos mais sentidos pêsames, extensívos a toda a família.

Com respeito às fotos e estórias de seu pai, estamos abertos a recebê-las e publicá-las. Temos pena que não possamos considerar o seu pai como nosso tertuliano, mas se quiser, pode a Lídia ficar a pertencer ao grupo dos nossos amigos já que é filha de um dos nossos camaradas. Como diz o nosso tertuliano José Martins, os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são.

Fica então combinado que mandará as fotos de seu pai quando entender para nós darmos notícia no nosso Blogue.

Em nome dos tertulianos, ex-combatentes da Guiné, envio-lhe um beijinho.
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 16 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4695: O Nosso Livro de Visitas (66): Manuel Seixas da CCAÇ 1422/BCAÇ 1858 (K3/Saliquinhedim, 1965/67)

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4646: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (5): A família extensa, reunida em Fajonquito, em 1968

1. Quinta e última parte das memórias de infância do nosso amigo Cherno Baldé (aqui, na foto, à esquerda, o Engº Cherno Baldé, no seu gabinete de trabalho, no Ministério das Infraestruturas, Transportes e Comunicações onde exerce as funções de director do gabinete de estudos e planeamento; em Cambajú e Fajonquito, era simplesmente o Chico, menino e moço, nado e criado no meio das tropas portuguesas) (*).

As crónicas do Cherno têm tido, entre os leitores do nosso blogue, um grande sucesso, pelço seu cunho espontâneo e autêntico, bem como pela qualidade da sua escrita. Fazemos votos para que ele dê continuidade a esta série, nomeadamente com as memórias do tempo que passou em Fajonquito (de 1968 até ao final da guerra e primeiros meses da independência) (LG)


FAJONQUITO: Terra da minha adolescência
por Cherno Baldé


Em 1968, [ e não 1958, como por lapso escreve o autor ], o meu pai foi transferido para Fajonquito e com ele toda a nossa família. Todavia, o meu pai não estava satisfeito com a transferência porque ela tinha provocado a separação com o seu irmão Dembaro, cuja família não podia sair de lá naquela época de rigoroso controlo do movimento de pessoas, por parte das autoridades tradicionais fortemente empenhadas na guerra, sem um pretexto muito forte.

A nossa família, sobretudo, era muito suspeita após a fuga espectacular de Sambagaia, com quem [as autoridades tradicionais] tinham contas a ajustar. Durante mais de um ano, o meu pai esteve à procura de uma maneira de tirar de Cambajú o seu irmão mais velho ao qual tinha jurado fidelidade e assistência.

Finalmente, um ano após a nossa vinda chegou a outra metade da família com Dembaro à testa, para alívio e alegria do meu pai. Este me contaria, mais tarde, que tinha conseguido [isso], graças à ajuda e cumplicidade do Capitão da Companhia que estava colocado em Fajonquito (Cap Carvalho?) e que enviava regularmente um destacamento de 20 dos seus homens para Cambajú. Através de amigos, conseguiu falar com o capitão, explicando-lhe todo o melindre da situação. Este não deu muita importância ao caso e esperou até a altura de proceder à troca de destacamentos e disse ao meu pai para transmitir ao irmão de que devia estar preparado a qualquer momento para embarcar na coluna que traria de volta o destacamento que se encontrava em Cambajú. (**)

E foi assim que, de forma rápida e inesperada, o Dembaro e a família viajaram num camião GMC militar para Fajonquito, colocando tudo e todos perante o facto consumado e granjeando ainda o respeito devido aos amigos do Capitão da Companhia que detinha um poder enorme nas redondezas e, aparentemente, suplantava mesmo as autoridades civis.

Fajonquito, naquela altura, era enorme, devido à concentração das famílias que aqui encontraram refúgio depois dos ataques às suas aldeias ou por imposição das autoridades locais.

Em Fajonquito nasceram os meus irmãos mais novos: Barbosa, Aissatú e Cántaba; e, mais tarde, os filhos da segunda mulher do meu pai, Assiatu Embalo: Umo, Rosa, Mariama e Mamadu-Bobo.


Cherno Abdulai Baldé, Chico
Natural de Fajonquito,
Sector de Contuboel,
Região de Bafatá.

____________________

Notas de L.G.:


(*) Vd. postes anteriores:

18 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4550: Tabanca Grande (153): Cherno Baldé (n. 1960), rafeiro de Fajonquito, hoje engenheiro em Bissau...

(...) Chamo-me Cherno Abdulai Baldé, nasci por volta de 1959/60. No quartel de Fajonquito chamavam-me Chico (de Francisco) e tinha amigos soldados que, na sua maioria, eram condutores ou mecânicos-auto. Tive as minhas primeiras aulas com oficiais Portugueses, em Cambajú e Fajonquito. (...)

19 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4553: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (1): A primeira visão, aterradora, de um helicanhão

(...) Foi naquela época que, na idade de 4 ou 5 anos, aconteceu a minha primeira visão de uma máquina voadora, que terá sido, provavelmente em meados de 1964, precisamente na altura em que estávamos em Samagaia, pouco tempo antes do ataque à zona que nos obrigaria a deixar a aldeia para nos refugiarmos em Cambajú, onde o meu pai já se encontrava a trabalhar alguns anos antes. (...)

24 de Junho de 2009 > Guine 63/74 - P4567: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (2): Cambajú, uma janela para o mundo

(...) Em Cambajú, pequeno centro comercial, começou o despertar da minha infância, altura em que, saído da pequeníssima aldeia de Sintchã Samagaya, fundada por meus pais, aterrei-me numa aldeia de muito maior concentração de moranças e de gente. Cambaju estava situada mesmo na linha da fronteira com o Senegal, o que lhe emprestava um certo ar cosmopolita onde se cruzavam pessoas de várias origens e destinos e um certo movimento de vaivém de pessoas e mercadorias com as suas três ou quatro casas comerciais, algumas pequenas boutiques e o contrabando pra cá e pra lá das duas fronteiras. (...)

25 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4580: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (3): A chegada dos primeiros homens brancos a Cambajú em 1965: terror e fascínio

(...) No ano de 1965, altura em que a guerra para a independência se alastrava rapidamente e aterroriza as aldeias daquela área e obrigava a uma concentração maior da população em certos locais com algumas garantias de defesa e protecção militar, Contuboel, Saré-Bacar, Cambajú e Fajonquito constituíam as praças-fortes da área. Em Cambajú foi estacionado um destacamento de milícias que assegurava a defesa da localidade e que mais tarde foi reforçado com um destacamento de tropas portuguesas. Pela primeira vez na minha vida ainda jovem, via pessoas de uma raça diferente. Foi um choque tremendo. (...)

30 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4611: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (4): O ataque dos meus primos a Cambajú e o meu pai que foi um herói

(...) Ainda hoje, a nossa mãe está convencida que este ataque foi obra dos primos do meu pai que viviam do outro lado da fronteira, não muito longe de Cambajú. Aconteceu que, no dia anterior ao ataque, o meu pai tinha recebido uma grande quantidade de mercadorias e, por coincidência, no mesmo dia tinha-se despedido uma pessoa que estava hospedada em casa para tratamento e que voltara junto dos tais primos da outra banda. Assim, nesse dia do ano de 1966, na calada da noite, pouco depois das quatro horas de madrugada, ouvimos tiros. Primeiro os disparos se fizeram ouvir a oeste para os lados do quartel, fazendo pensar que o objectivo era militar, depois se espalharam rapidamente contornando a aldeia. (...)


(**) Pode tratar-se da CCAÇ 2435, comandada pelo Cap Inf José António Rodrigues de Carvalho e, posteriormente, pelo Cap Inf Raul Afonso Reis, unidade orgânica do BCaç 2856, mobilizada em Abrantes no Regimento de Infantaria n.º 2, que assumiu a responsabilidade do subsector de Fajonquito, rendendo a CCaç 1685, em 7 de Dezembro de 1968, e vindo a ser substituída pela CCaç 2436, em 20 de Abril de 1970.

Ou então, mais provavelmente, trata-se da CCaç 1685, comandada pelo Cap Inf Alcino de Jesus Raiano, unidade orgânica do BCaç 1912, e mobilizada em Évora no RI 16: assumiu a responsabilidade do subsector de Fajonquito, rendendo a CCaç 1501, em 19 de Setembro de 1967, e vindo a ser substituída pela CCaç 2435 em 14 de Dezembro de 1968.

No entanto, o Chico diz-nos que "quando a minha familia se transferiu para Fajonquito, a companhia 1501 já estava no fim ou já tinha terminado a sua comissão mas, na memória de todos, em Fajonquito, tinham ficado gravadas estas insígnias em forma de números que perduraram no tempo. No meu caso, não sei explicar as razões, ainda era muito pequeno, mas a insígnia ficou para sempre"...

Recorde-se que CCAÇ 1501, comandada pelo Cap Inf Rui Antunes Tomaz, era uma unidade orgânica do BCAÇ 1877, mobilizada em Tomar no RI 15, tendo assumido a responsabilidade do subsector de Fajonquito e rendido a CCaç 1497, em 26 de Janeiro de 1967. Veio a ser substituída pela CCaç 1685, em 19 de Setembro de 1967.