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quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Guiné 61/74 - P25889: Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar: uma visão pessoal (Excertos) (Jaime Silva) - Parte VII: Depoimento 3. Albino Von Doellinger vê morrer o seu conterrâneo e amigo Artur da Costa Neves.



Guião do BART 3881, "Bravos e Sempre Leais" (que inblui, além do comando e CCAS, as CART 3538, 3539 e 3540  (Angola, 1972/74) (Cortesia da sua página do Facebook)



SILVA, Jaime Bonifácio da - Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar : uma visão pessoal.

In:  Artur Ferreira Coimbra... [et al.]; "O concelho de Fafe e a Guerra Colonial : 1961-1974 : contributos para a sua história". [Fafe] : Núcleo de Artes e Letras de Fafe, 2014, pp. 23-84.


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Jaime Bonifácio Marques da Silva (n. 1946): 

(i) foi alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72); (ii) tem uma cruz de guerra por feitos em combate; (iii) viveu em Angola até 1974; (iv) licenciatura em Ciências do Desporto (UTL/ISEF) e pós-graduação em Envelhecimento, Atividade Física e Autonomia Funcional (UL/FMH); (v) professor de educação física reformado, no ensino secundário e no ensino superior ; (vi) autarca em Fafe, em dois mandatos (1987/97), com o pelouro de desporto e cultura; (vii) vive atualmente entre a Lourinhã, donde é natural, e o Norte; (viii) é membro da nossa Tabanca Grande desde 31/1/2014; (ix) tem 85 referências no nosso blogue.

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1. Estamos a reproduzir, por cortesia do autor (e com algumas correções de pormenor), excertos do extenso estudo do nosso camarada e amigo Jaime Silva, sobre os 41 mortos do concelho de Fafe, na guerra do ultramar / guerra colonial. A última parte do capítulo é dedicada a testemunhpos e depoimentos recolhos pelo autor (pp. 67/82).


Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar – Uma visão pessoal [Excertos] (pp.  74/75)


Parte VII: Depoimento 3. Albino Doellinger vê morrer o seu conterrâneo e amigo Artur.



O 1.º cabo Albino Mendes Von Doellinger vê morrer o seu conterrâneo e amigo, o soldado Artur da Costa Neves, natural da freguesia de Fafe, filho de Manuel Pereira Neves e Rosa da Costa Pimenta, que faleceu em 7 de julho de 1972, afogado no rio Luanguinga, no Leste de Angola. Ambos pertenciam à CART 3538 / BART  3881 (1972/74), com sede no Lucusse.

Recolhi o seu depoimento no dia 18.11.2013, durante o qual me relatou que o acidente ocorreu no destacamento sediado no Luanguinga, onde ambos prestavam serviço. 

O Albino era cozinheiro e o Artur estava destacado num grupo de combate que fazia proteção à Junta Autónoma das Estradas de Angola e que estava a abrir uma estrada perto do aquartelamento. 

Como sempre, o pessoal operário da Junta Autónoma precisava de proteção militar para poder efetuar os trabalhos. Nesse dia 7 de julho de 1972, pelas 11.15 horas, um mês depois do início da Comissão, o grupo do Artur foi destacado para ir ao quartel buscar o almoço. 

Às 12.15 horas, conta o Albino, saíram do quartel com o almoço para os colegas que estavam na picada a fazer a proteção e regressaram, de novo, pelas 14.30 horas para levar o jantar. 

É nessa altura que o Artur pede ao Albino para trocar a sua faca de mato, ajudando este a transportar e a lavar as panelas no rio, como era habitual, situado em frente à cozinha e mais ou menos a 100 metros. É neste preciso momento que, estando o Artur com os pés metidos dentro da água e de costas para o caudal do rio a lavar as panelas, desmaia, cai para trás (talvez com uma congestão, diz o Albino) e é arrastado pela forte corrente do rio, vindo a ser recuperado vinte minutos depois junto a uma ponte.

Conta o Albino, que a família não teve direito a receber a concessão da pensão de sobrevivência, em virtude de a morte não ter sido considerada em combate.

Perguntamos nós:

- Que país é este que obrigou um jovem, que era o ganha-pão dos pais, a servi-lo na Guerra, vindo a morrer no cumprimento do seu dever, ao executar uma das tarefas próprias de apoio à manutenção da guerra, e, depois, este mesmo país vem dizer aos pais: O acidente não foi considerado em combate. Se ele era o vosso sustento, amanhem-se como quiserem. Isto não é nada connosco. Azar dele!

Comentários?! …


(Continua)

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos, itálicos: LG)

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sábado, 18 de novembro de 2023

Guiné 61/74 - P24860: (In)citações (259): Depois da "mina A/P" que me atirou, em 29/10/2023, para um leito de hospital, com o fémur partido, estou de regresso à vida, à luta, a escrita, enquanto a a recuperação prossegue (José Saúde, Beja)


Beja > Hospital distrital > Outubro de 2023  > O Zé Saúde no "estaleiro!... E a agradecer aos amigos e camaradas que se têm interessado pelo seu estado de saúde... Ele, um "ranger", de rija têmpera, está de volta à vida, à luta, à escrita...

Foto (e legenda): © José Saúde (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego / Gabu, 1973/74), natural da Aldeia Nova de São Bento , Serpa; a viver en Beja; jornalista e escritor; tem página no Facebook):

Data - quarta, 8/11/2023, 17:30

Assunto - Recortes do meu acidente

Camaradas,

Eis o franco e imprescindível ânimo deste antigo combatente por terras vermelhas da Guiné, cotejando, por isso, que um impedimento casual jamais derrubará este vosso velho camarada. Partirei um dia para um outro lugar, mas até lá vou passando por entre ventos e tempestades e não abicando de princípios legados pelos meus antepassados.

Aliás, o percurso da minha vida até ao dia 27 de julho de 2006, data esta encaixada com a visita do meu AVC, um mal que veio para ficar, instalando-se “envergonhadamente” neste já débil corpinho, um corpinho que tinha sido até aí pautado por um viver isento de “malazengas”, sendo que no presente foi o rebentar de uma “granada antipessoal” que me atirou para o leito hospitalar.

Neste profícuo caminhar ao cimo do planeta chamado Terra, e sempre com a missão no exercer o equilíbrio físico que a vida obviamente nos impõe, aconteceu que fui apanhado numa “emboscada” que me levou ao caminhar sobre uma ténue linha, mas onde ânsia do momento supera o nosso evidente acreditar.

Aqui vos deixo camaradas um texto que oportunamente subscrevi, tendo dele recebido centenas de profícuas opiniões.

Uf, que horror…

E o inesperado, um acontecimento sempre distante dos nossos pensamentos, aconteceu! Domingo, 29 de outubro de 2023, cerca das 11h30, dirigia-me a um encontro/convívio com amigos, porém, ao descer do carro cai e desde logo me apercebi que o impacto com a velha pedra lusitana me teria provocado irreparáveis danos.

Mesmo assim, a minha força física e mental, levou-me a pedir auxílio, sendo então socorrido por um amigo que me transportou para o interior do carro, seguindo-se a condução, não obstante as dores sentidas, para junto à residência, onde habito, casa própria do meu genro, Paulo Paixão e da minha filha Rita Saúde, sucedendo o meu pedido de socorro para o 112. Aí, e sem me poder mexer, acompanhou-me o meu cunhado, Joaquim Lança.

Depois telefonei à minha filha Marta e as preocupações logo se fizeram sentir, ouviu-se o sinal de alerta. Veio a ida para o hospital, o internamento e a operação ao fémur. Tive alta na passada sexta-feira, encontro-me em convalescença e aguardam-me dias de uma certeza recuperação.

Camaradas, a recuperação prossegue.
José Saúde
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Nota do editor:

Último poste da série > 20 de agosto de 2023 > Guiné 61/74 - P24570: (In)citações (258): Reflexão extemporânea entre dois copos (Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887, Canquelifá e Bigene, 1966/68)

sábado, 2 de setembro de 2023

Guiné 61/74 - P24609: Por onde andam os nossos fotógrafos ? (8): ex-alf mil cav Jaime Machado, cmdt Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70) - Parte IV: a morte à saída da Missão do Sono em Bambadinca, na madrugada do dia 1 de janeiro de 1970


Foto nº 19 > Guiné > Zona leste > Região de Bafatá >  Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  1 de janeiro de 1970 > O fotógrafo estava lá!... Uma enfermeira paraquedista prepara o moribundo Uam Sambu para a evacuação para o HM 241...  O camarada, de costas, com o camuflado todo ensanguentado é o Mário Beja Santos, comandante do Pel Caç Nat  52, de acordo com a identificação feita pelo fotógrafo, o Jaime Machado.  À saída da Missão do Sono, em Bambadincazinho, reordenamento a  escassas centenas de metros do quartel de Bambadinca, o Sambu foi vítima de um grave acidente com arma de fogo que lhe custou a vida.  


Foto nº 19A  > Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  1 de janeiro de 1970 > Não conseguimos identificar a enfermeira paraquedista que, nessa manhã, a do primeiro dia do novo ano de 1970, veio de DO 27 para tentar salvar o Sambu... Em vão, ele irá morrer na viagem... Vamos continuar a tentar saber quem era a enfermeira... (que tanto pode ter sido a Maria Ivone como a Rosa Serra, que nesse dia estava de serviço).


Foto nº 19B >Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  1 de janeiro de 1970 > Quem seria a enfermeira paraquedista que, nessa manhã, a do primeiro dia do novo ano de 1970, veio de DO 27 para tentar salvar o Sambu ?  Tanto pode ter sido a Maria Ivone como a Rosa Serra, que nesse dia estava de serviço mas, que nos informou, nunca usou pulseira (para mais na mão esquerda).


Foto nº 20 > Guiné > Zona leste > Setor L1 > Região de Bafatá > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  1 de janeiro de 1970 >  A DO 27 que no primeiro dia do novo ano de 1970, logo de manhã cedo, veio fazer evacuação do Sambu. Do lado esquerdo, de perfil, vê-se o piloto, com "cara de puto", alferes...


Foto nº 20A  > Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  1 de janeiro de 1970 >  Outro pormenor dos primeiros socorros que foram prestados ao Sambu antes de ser evacuado. Era médico do batalhão o Vidal Saraiva. À esquerda do Beja Santos, sob a asa do DO 27, com a mão direita à cintura, em pose expectante, parece-se ser o fur mil enf da CCAÇ 12, o meu amigo João Carreiro Martins. Ao fundo estão camaradas do infortunado Sambu, do Pel Caç Nat 52.



Foto nº 21 > Guiné > Zona leste > Região de Bafatá: Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  1 de janeiro de 1970 >  Um DO 27 a levantar voo, de regresso a Bissau... Pode ser a mesma da foto anterior, como pode ser outra... Tudo indica que esta foto tenha sido tirada noutra altura e noutro lugar. Parece-me ser a pista de Bafatá, a avaliar pelo casario ao fundo... (O Jaime Machado diz-me que é Bambadinca e vem na sequência das fotos anteriores,,,).  (LG)

Fotos: © Jaime Machado (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Continuação da publicação de uma seleção das melhores fotos  do álbum do nosso camarada Jaime Machado, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70) (*), que vive na Senhora da Hora, Matosinhos [foto atual à direita], e foi contemporâneo do Mário Beja Santos (cmdt do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com uma pequena  diferença de meses. Eu também estive com eles, lá, na mesma altura, desde julho de 1969... O Jaime saiu em fevereiro de 1970, e o Mário, dois meses depois, em abril de 1970, se não erro.

Ao ver estas fotos, tive um arrepio, quando o Jaime Machado me disse que o camarada com o camuflado ensanguentado era o Beja Santos, o nosso "Tigre de Missirá"...  

Lembrei-me imediatamente deste trágico acidente que ceifou a vida ao Uam Sambú. Fui pesquisar os escritos do Mário Beja Santos. Aqui vai um excerto do poste P2540, de 15/2/2008 (**)

(...) O Setúbal já nos tinha avisado que viria o Xabregas [condutor]  ao amanhecer, eu que não estivesse preocupado. Assim que clareou, todos de pé, arrumadas as mantas, satisfeitas as necessidades mais prementes nas redondezas, esperámos a tiritar a aproximação dos faróis do Unimog, procurando desentorpecer os músculos. Assim foi naquele amanhecer de 1 de Janeiro de 1970. O Xabregas trouxe um burrinho, o que significava dez militares sentados, 20 a pé. Dez não, um outro saltava para o lado do condutor, mais um outro encavalitava-se junto do alferes. Uam Sambu senta-se ao pé de mim e diz a Quebá Sissé:
- Sobe,  Doutor, dá cá a mão!

Vejo o riso feliz e sempre aberto de Quebá Sissé, segue-se o estrondo inusitado de uma rajada de G3, procuro levantar-me, oiço gritos de aflição, imprecações, um coro desorientado de protestos, e é nisto que Uam me cai nos braços,  enterrando-me no assento:
- Alferes, estou morto!

Com Uam no meu colo, vejo o seu peito esburacado, os lábios num esgar de dor, o olhar a esmorecer, o sangue passa para a minha farda em abundância. O burrinho corre em poucos minutos nas mãos expeditas do Xabregas até à enfermaria. Vou a correr tirar da cama o [alf mil médico] Vidal Saraiva que se debruça atarantado sobre Uam com o peito tracejado por diferentes perfurações. 

Cá fora, desenrola-se uma outra tragédia, há quem ameace o Doutor, ouve-se a palavra assassino, ouvem-se as expressões impensadas do costume. Ora, tinha sido o mais estúpido dos acidentes, o malogrado Doutor ao subir metera o dedo no gatilho e fulminara Uam, o Doutor era a alma mais pacífica do 52, ninguém lhe conhecia azedume, aguentara estoicamente todos os comentários ao seu trabalho de cozinheiro. Percebendo que era necessário pôr termo àquela ira dementada, disse ao Domingos:
- Não quero aqui ninguém, tudo para a tabanca, tu desces imediatamente com eles e explicas que foi um acidente, quem tocar no Doutor tramo-lhe a vida.

Dita a bazófia, acerquei-me da marquesa onde o Vidal Saraiva me avisou:
- Só por milagre se salva, tem os órgãos vitais atingidos, veja o sangue aos cantos da boca, pulmões e rins têm lesões que presumo serem irreversíveis. Vamos ver como é que ele se aguenta até Bissau.

 O DO [27] chegou rapidamente e lá fomos todos a acompanhar o moribundo até à pista de aviação, Binta, a mulher do Uam, gritava o seu desespero, o Pel Caç Nat 52 assistia ao transporte de Uam num silêncio total, estarrecido. Dispersámos, o Vidal Saraiva era o mais acabrunhado entre nós. (...) 
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terça-feira, 25 de julho de 2023

Guiné 61/74 - P24503: Facebook...ando (32): Vítimas de "fogo amigo", quando, à noite, em emboscadas das NT saíam do grupo para "satisfazer as necessidades sem avisar ninguém"

1. Quantos camaradas nossos não terão morrido, "vítimas de fogo amigo", no TO da Guiné  ? E, nomeadamente à noite, quando saíam do seu grupo de combate, emboscado no mato, para "satifazer as necessidades", e sem avisar ninguém ?!... 

Recordemos alguns casos... Felizmente não terão sido muitos, mas aconteceram... Não há registos, públicos e notórios.. Estes casos eram classificados como "acidentes com arma de fogo", tais como os homicídios, os suicídios, as automutilações, e os acidentes propriamente ditos, por "falha técnica" ou "erro humano",,, 

Parafraseando o nosso camarada, hoje ten gen pilav ref, António Martins de Matos, infelizmente à noite todos os gatos são pardos...

"Blue on blue" é uma expressão eufemística, inglesa,  para descrever um caso de "fogo amigo",   quando um militar, no teatro de operações,  é acidentamente alvejado,  e morto ou ferido, pelos seus camaradas (*).


(i) Luís Graça:

(...) O Neves ainda voltou a um um outro convívio da companhia, já no virar do milénio... E num deles reencontrou o capitão, então já coronel, na situação de reforma. Ter-se-á emocionado, o antigo capitão, quando evocou as trágicas circunstàncias em que foi morto o primeiro homem da Companhia, logo nos dois primeiros meses de Guiné... 

Estavam emboscados, de noite, quando há um militar que sai da sua secção para ir "arriar o calhau" (sic), sem dizer nada a ninguém e quebrando a rigorosa disciplina imposta... No regresso, ao ouvir restolhar o capim, o capitão instintivamente disparou uma rajada... Teve uma agonia horrorosa, o pobre soldado, durante quase uma hora, sem possibilidades de ser helievacuado...(...) (**)

(ii) José Gouveia / Tabanca Grande Luís Graça, 23 de julho de 2023, 13;01

(...) Será que ninguém o viu sair? Esquisito.


(iii) Tabanca Grande Luís Graça

(...) Infelizmente, não terá sido caso único. Aconteceu, por exemplo, com a CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63), quando era comandada pelo então cap inf José Curto... (Segunda a versão de um dos seus graduados, nada disto vem na história das unidades.) (...)


(iv) Tabanca Grande Luís Graça

Um outro caso, vítima de "fogo amigo", foi passado com a 1ª CCmds Africanos, em meados de 1970, no subsetor de Bajocunda, conforme relatado pelo nosso saudoso Amadu Djaló (1940-2015) 
(***):

(...) "Numa das primeiras saídas, entre 25 e 26 de junho de 1970, numa emboscada em Sare Aliu, junto à linha da fronteira na área de Bajocunda, o soldado Nicolau (...) foi satisfazer as necessidades e não avisou ninguém. Era uma noite escura e quando regressava para junto do grupo perdeu a orientação e entrou pelo outro lado da emboscada. Ninguém o reconheceu, nem deu tempo para fazer perguntas." (...)  (****)
________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 3 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14215: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (30): "Blue on Blue" - Querem ver que acertei nos nossos? (António Marins de Matos, TGen Pilav Ref)

terça-feira, 27 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24434: S(C)em comentários (10): eu vi morrer na IAO, no CIM de Bolama, em 10/7/1972, no treino de dilagrama, o alferes Carlos Figueiredo e o soldado José Mata (António Carvalho, ex-fur mil enf, CART 6520/72, Mampatá, 1972/74)

1. Comentário ao poste P24433 (*), que decidimos transformar em poste para a série "S(C)em comentários" (**). 

O autor é o nosso querido amigo e camarada António Carvalho, mais popularmente conhecido como o Carvalho de Mampatá, ex-fur mil enf,  CART 6250/72, "Os Unidos de Mampatá" (Mampatá, 1972/74), escritor, autor de "Um caminho de Quatro Passos", Rio Tinto: Lugar da Palavra Editora, 2021, 218 pp., vive em Medas, Gondomar;  tem 76 referências no nosso blogue; é membro da Tabanca Grande desde 13/9/2008.


Caro Luís: Sinto-me grato por nos trazeres (mais uma vez) a narração sentida de uma das tuas páginas do "livro" das coisas imorredoiras do nosso tempo da Guiné. 

O modo como contas a morte "matada" de dois azarados, ainda por cima resultante de um misto de negligência e jactância de um pretenso guerreiro, leva-me a uma profunda reflexão que me permitem agora os meus setenta e três anos. 

Houve, estou certo, muitos acidentes decorrentes da formação militar feita à pressa e da graduação atribuída a jovens de 21 anos, no meu ponto de vista, sem a maturidade exigível a comandantes. Mas a guerra obrigava a distinguir com galões os mais aptos fisicamente. 

Eu vi morrer na IAO, na ilha de Bolama, ao 13º dia de Guiné, no treino de dilagrama, o alferes Figueiredo,  de S. Pedro do Sul,  e o Mata,  de Pinhel. (***) Não vou aqui culpar nenhum deles, aliás, presumo que o acidente se deveu a uma deficiência do grampo que segura a alavanca. 

Mas foi muito perturbador para mim e para todos os presentes a morte, no dia 10 de Julho de 1972,  desses dois jovens, sendo o comandante um ano ou dois mais velho que o comandado. 

A guerra, sendo primordial (como bem dizes), ela é a opção mais imbecil do ser humano, porque resulta da desistência do diálogo e da reflexão sobre a singularidade da condição humana, bem distinta da relação primária entre os outros seres vivos.


Carvalho de Mampatá |
27 de junho de 2023 às 17:24 

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de junho de 2023 > Guiné 61/74 - P24433: Contos com mural ao fundo (Luís Graça) (2): Que Alá te proteja dos teus amigos, que dos inimigos cuidas tu!

(i)  Carlos Manuel Moreira de Almeida Figueiredo, natural de São Pedro do Sul, alf mil art , CCS/BART 6520/72, CIM Bolama, 10/7/1972; porto pro acidente com arma de fogo: 

(ii) José António Mata, natural de Pinhel, sold at, CART 6520/72, CIM Bolama, 
 10/7/1972; porto pro acidente com arma de fogo: 


A CART 6250/72 fez a IAO no CIM Bolama, entre 10 de junho e 26 de julho de 1972.


Vd. também poste de 5 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21517: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (10): Relembrando a morte, por acidente com um dilagrama, no CIM de Bolama, em 10/7/1972, do alf mil Carlos Figueiredo


(...) Caro camarada Barros

Subscrevendo o que disse o meu irmão mais velho (combatente na Guiné) Manuel Carvalho, não posso deixar de acrescentar mais alguma coisa sobre esse terrível acidente ocorrido em 10 de julho de 1972, no décimo terceiro dia após a nossa chegada, porque assisti a toda aquela cena e ao que se lhe seguiu. 

A minha companhia, a  CArt 6250, do RAP 2, cumpriu a sua missão em Mampatá, sector de Aldeia Formosa, mas fez a IAO convosco. 

Depois da tragédia, ambos os corpos foram postos junto dos bancos laterais de um Unimog, procurando os soldados sentados nesses bancos ocultá-los com as pernas. Dali foram para a capela do cemitério de Bolama. Coube-me,  bem como a mais alguns voluntários, limpar e vestir esses corpos mutilados. Dispenso-me de mais pormenores. O Mata, da minha companhia,  está sepultado na aldeia de Valbom, concelho de Pinhel, o Figueiredo está sepultado no cemitério de S. Pedro do Sul, num jazigo tipo capela, junto ao passeio do lado esquerdo, em relação ao portão principal. Sempre que passo por essas terras visito esses cemitérios. Porquê ? Não sei. (...)

António Carvalho ex-Fur Enf da CART 6250 (Carvalho de Mampatá)
6 de novembro de 2020 às 20:40

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22447: Efemérides (351): Ainda e sempre o naufrágio no rio Geba, em 10/8/1972, em que perdemos três camaradas (Jorge Araújo, ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494 / BART 3873, Xime e Mansambo, 1972/1974; agora em férias prolongadas nas "Arábias")


 

Foto (e legenda): © Jorge Araújo (2014). Todos os direitos reservados. (Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné).





1. Mensagem enviada hoje, às 9h09, pelo nosso coeditor Jorge Araújo  (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), e agora de férias prolongadas nas "Arábias" 


 

Caros Camaradas,

Os meus Bons Dias desde as «Arábias».

Faz hoje quarenta e nove anos (1972.08.10-2021.08.10) que vários elementos do contingente militar da CART 3494, a terceira unidade de quadrícula do BART 3873, tiveram de “mergulhar”, sem o desejarem, nas águas revoltas, escuras e lodosas do Rio Geba, na região do Xime/Bambadinca (Sector L1), 
onde, por efeito da falta de bom senso mesclado com alguma improvisação, perderam a vida três jovens milicianos, naquele que ficou gravado como o «Naufrágio do Geba».

Ao recuperar esta horrenda efeméride que a todos marcou, naturalmente mais aos que viveram e sobreviveram à experiência, quero prestar a minha sentida homenagem aos que pereceram naquele acidente náutico: 

José Maria da Silva Sousa
Manuel Salgado Antunes
Abraão Moreira Rosa.

Para compreender a trágica ocorrência devem-se ler os postes:

Com um abraço de amizade e muita saúde,
Jorge Araújo

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Nota do editor:

Último poste da série > 1 de agosto de 2021 > Guiné 61/74 - P22421: Efemérides (350): Fez 55 anos, em 30/7/1966, que parti para o CTIG, no T/T Uíge, para ir formar em Bolama o Pel Caç Nat 54... Estive depois em Mansabá, Enxalé, Missirá, Porto Gole, Ilha das Cobras e Ilha das Galinhas (José António Viegas, fur mil art, 30/7/1966 - 22/9/1968)

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Guiné 61/74 - P21847: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (16): O regresso dos lagostins... à bolanha



Guiné > Zona Leste >  Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 > 1969  

Na tasca do Zé Maria, comendo lagostins do Rio Geba e bebendo umas "bazucas"  da esquerda para a direita, o alf mil cav José António G. Rodrigues (já falecido, há uns anos largos) e os fur mil Tony Levezinho e Humberto Reis, meus queridos amigos e membros desta Tabanca Grande. A "chapa" foi batida por mim, membro assíduo desta tertúlia gastronómica.

Os lagostins do rio Geba, apanhados em zona sujeita ao movimento das marés,  eram muito apreciados. Não tinham nada a ver com o lagostim-vermelho-da-Louisiana ("Procambarus clarkii"), nativo do sul dos EUA e no nordeste mexicano, o terrível predador que invadiu, em 1979,  os nossos rios, lagoas e demais zonas húmidas como os arrozais, transformando-se num grave problema ecológico.

O barqueiro do Enxalé, celebrizado por Spínola, apanhava estes magníficos lagostins do rio do Geba, em "zona vermelha", que depois o Zé Maria comprava e cozinhava e que a gente pagava a peso de ouro (50 pesos o quilo!)... O preço era justificado pelo risco... (50 pesos era o equivalente a dois dias de alimentação de um militar na Guiné, ou  a uma garrafa de uísque novo...).

Foto (e legenda): © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné Portuguesa > Bilhete postal > Pescadora (Papel). Edição: Agência-Geral do Ultramar. s/d. Enviado pelo nosso camarada Beja Santos. Digitalizado por L.G.

Foto (e legenda): © Beja Santos (2006). Todos os direitos reservados, [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mais uma pequena história do
Carlos Barros:

(i) ex-fur mil, 2ª C/BART 6520/72 (Bolama, Bissau, Tite, Nova Sintra, Gampará, 1972/74), "Os Mais de Nova Sintra", os últimos a ocupar o aquartelamento de Nova Sintra antes da sua transferência para o PAIGC em 17/7/1974;

(ii) membro da Tabanca Grande nº 815, tem 2 dezenas de referências no nosso blogue; vive em Esposende, é professor reformado.
 

 

O regresso dos lagostins... à bolanha

por Carlos Barros


O 3º grupo de combate do 2ª CART / BART 6520, com quartel em  Nova Sintra, esteve de serviço de segurança à estrada de Tite -Enxudé e, como habitualmente, os soldados foram transportados em viaturas Berliet, ocupando cada grupo de dois soldados as suas posições ao longo da estrada, ladeada por extensas bolanhas onde abundavam muitos lagostins e camarões, por sinal saborosos.

Num desses dia, um condutor ia buscar o almoço à cozinha de Tite, e na viagem deu boleia, o que era proibido, a uma jovem africana que andava na apanha desse marisco e já tinha um enorme cesto cheio de lagostins. 



Guiné > Região de Quínara > Mapa de Tite (1955) > Escala 1/50 mil

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2020)


Aconteceu então algo de inesperado, que poderia ter trágicas consequências. O condutor, com a jovem ao lado, despistou-se com o Unimog e foi tombar na bolanha, tendo-se virado o cesto com os lagostins que rapidamente ficaram no seu “habitat” aquático…

O furriel soube do sucedido e,  depois de ouvir o condutor, reflectiu sobre a situação e “branqueou” o acidente, não chegando ao conhecimento do capitão, o que, a acontecer, teria consequências, com castigo grave para o soldado. Neste acidente, milagrosamente, não se registaram feridos e foi apenas um grande susto!






Foi um momento infeliz do condutor que pediu imensa desculpa pelo sucedido, assumindo plenamente a culpa e livrando-se de um processo que traria vários dissabores para o condutor (por sinal, não me recordo presentemente do seu nome…). Prometeu futuramente não transportar mais civis na sua viatura.

O Furriel Barros que se encontrava de serviço com este seu grupo, deu uma “ajudazinha ao condutor” porque a guerra propiciava estas aventuras, por vezes pouco reflectidas, e que eram fruto da irreverência da juventude.

Naturalmente, após estes longos anos afastado da guerra, pude descrever, em liberdade, esta história , com um cunho muito real...

O Barros só teve pena do lagostim que se perdeu nas águas da bolanha mas podem acreditar que, no fundo do cesto, ainda ficaram alguns que tiveram o destino que os leitores estão a pensar…


Tite 1972 Nova |  Sintra 1974. 

Revisto, Esposende 1 de fevereiro de 2021

Carlos M. de Lima Barros
Ex.fur mil Barros, 2ª C/BART 6520/72 (Nova Sintra, 1972/74)
__________

Nota do editor:

Último poste de 26 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21694: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (15): Os pobres pelicanos...

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21517: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (10): Relembrando a morte, por acidente com um dilagrama, no CIM de Bolama, em 10/7/1972, do alf mil Carlos Figueiredo


Guiné > Arquipélago dos Bijagós > Bolama >  c. jun/jul 1973 > O jardim colonial,  com a estátua em bronze de Ulysses S. Grant (1822-1885), o presidente norte-americano que em 21 de abril de 1870 resolveu, por sentença arbitral, a questão da soberania de Bolama, disputada entre Portugal e a Grã-Bretanha... 

A estátua em bronze desapareceu em 2007, sendo mais recentemente substituída por uma em cimento, A foto é do nosso camarada Luís Mourato Oliveira, que em meados de 1973 fez um estágio,  de preparação para o comando de subunidades africanas, no Centro de Instrução Militar (CIM)  de Bolama. Um ano antes, estiveram  aqui o Carlos Barros e a sua 2ª CART / BART 6520/72 a fazer a IAO.

 Foto (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Carlos Barros, Esposende


1. Mais uma pequena história do Carlos Barros [, um de "Os Mais de Nova Sintra", 2ª C/BART 6520/72 (Bolama, Bissau, Tite, Nova Sintra, Gampará, 1972/74), os últimos a ocupar o aquartelamento de Nova Sintra antes da sua transferência para o PAIGC em 17/7/1974; membro da Tabanca Grande nº 815; vive em Esposende, é professor reformado]

Recorde-se que o BART 6520/72 foi mobilizado pelo RAL 5 (Penafiel), tendo embarcado em 23 de junho de 1972 (Cmd, CCS e 2ª Companhia )... Após a realização da IAO, com as suas companhias, de 30 de junho de 1972 a 26 de julho de 19l72, no CIM, em Bolama, seguiu, em 28 de julho de 1972 ara o sector de Tite, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com o BArt 2924.

Em 20 de agosto de 1972, assumiu a responsabilidade do Sector SI, com sede em Tite e englobando os subsectores de Tite, Jabadá, Nova Sintra e Fulacunda, este até 4 de janeiro de 1973, por transferência para a zona de acção do COP 7. Em 19 de junho de 1973, por extinção do COP 7, a zona de acção do batalhão foi alargada com os subsectores de Fulacunda e Ganjauará.

Desenvolveu intensa actividade operacional, orientada para a realização de patrulhamentos, emboscadas, reconhecimentos ofensivos e acções sobre os grupos inimigos instalados na área, além de garantir a segurança e protecção das populações e a reacção contra flagelações efectuadas sobre os aquartelamentos e aldeamentos.

Dentre o material capturado mais significativo destacam-se: 1 metralhadora ligeira, 2 pistolas-metralhadoras, 8 espingardas, 1 lança-granadas foguete e a detecção e levantamento de 38 minas.

Após ter coordenado a desactivação e entrega do subsector de Nova Sintra ao PAIGC, em 17 de julho de 1974, recolheu em 20 de agisto de 1074 a Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso, tendo as subunidades dos restantes subsectores assumido a responsabilidade das medidas de desactivação e entrega dos aquartelamentos respectivos: Jabadá (1º Companhia), Nova Sintra (2ª Companhia) e Fulacunda (3ª) Companhia.
 

Relembrando a morte, por acidente com  um dilagrama, no CIM de Bolama, em  10/7/1972, do alf mil Carlos Figueiredo  (CCS/BART 652o/72)

 por Carlos Barros (**)


Em Bolama, quando os militares da 2ª CART/BART 6520/72 estavam a fazer a IAO, uma pré –preparação militar para nos ambientar à guerra, a carreira de tiro era o local onde treinávamos com o material de guerra: G3, bazucas, dilagramas, morteiros 60...

Foi um mês [. junho / julho de 1972,] de intenso treino com “fogo real”…

O furriel Barros tinha estado, no quartel,
perto do rio Geba, não longe do destacamento dos dos fuzileiros, com o seu amigo, alferes Carlos [Manuel Moreira de Almeida]  Figueiredo, da CCS [, natural de São Pedro do Sul,] e, numa conversa amena, este tinha-lhe confessado que estava farto da carreira de tiro e que ia pedir ao comandante para o deixar descansar.

O Barros ouviu o seu desabafo do seu amigo e concordou com a ideia do Alferes, seu amigo, porque não era fácil ouvir tanto tiro, tanto rebentamento, durante semanas “a fio”!

No dia seguinte, o pelotão do Barros estava no mato em exercícios militares e vê uma urna a ser transportada numa viatura militar. Perguntou a si mesmo, o que teria acontecido? ...

Naquele momento, uma grande e mortífera cobra passou por ele... O Barros não fez qualquer movimento e ela seguiu o seu caminho…

Em pleno treino, na carreira de tiro, no lançamento de um dilagrama, com defeito de fabrico, uma granada deflagrou-se inesperadamente, e atingiu mortalmente um cabo de outra companhia (talvez de Empada) e o Alferes Figueiredo, ficando os dois irreconhecíveis.

À noite, o Barros e outros camaradas foram jantar num designado Hotel, mas não conseguiram jantar, e os pratos encheram-se de lágrimas de dor!

Perdeu-se um amigo num insólito acidente e  o Barros pensava:

Ao fim de quinze dias de  Guiné, já temos dois mortos!...

Foram noites sem dormir, e foi este o primeiro “banho de tragédia e sofrimento” que ele sentiu.

Meus Deus, dizia ele para os botões do seu camuflado:

 Irei resistir a isto?

Com muita sorte, o pessoal da companhia resistiu em 24 meses e 48 dias de guerra, tendo regressado à Metrópole, no dia 10 de agosto,

 Talvez o dia mais feliz da minha vida!...− exclamou ele.

Carlos Barros

Furriel Miliciano

Guiné 1972/74

Nova Sintra, 26 de junho de 1973 
 ______________



28 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21398: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (8): os meus livros de bolso, da RTP, oferecidos pelo MNF, em 25/1/1973, deixei-os a alguns guerrilheiros do PAIGC, em 17/7/1974... E comigo trouxe "farrapos" da nossa bandeira, e ainda os guardo, como símbolo do nosso sofrimento e coragem

19 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21371: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (7): os craques da bola...

14 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21358: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (6): a evaporação das cervejas

12 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21349: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (5): A visita da Cilinha ao destacamento de Nova Sintra, em 1973...

7 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21332: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (4): A cabrinha Inha...

4 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21325: Guiné 61/74 - P21319: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (3): As ratazanas (e o PAIGC) ao ataque em Gampará

3 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21319: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (2): A fuga da 'beijuda

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21453: (Ex)citações (375): recordando mais trágicos acidentes com minas e armadilhas (Joaquim Sabido, advogado, Évora; ex-alf mil art, 3.ª CART / BART 6520/73 e CCAÇ 4641/73, Jemberém, Mansoa e Bissau, 1974)

1. Comentário (*) de  Joaquim Sabido [, ex-alf mil art, 3.ª CART / BART 6520/73 e CCaç 4641/73, JemberémMansoa e Bissau, 1974); hoje, advogado, a viver em Évora; é nosso grã-tabanqueiro desde 24/8/2010; tem 13 referências no nosso blogue; foto à direita]


Ao ler sobre esta temática das M/A [Minas e Armadilhas] (*), veio-me a memória a recordação de um Amigo que, sendo ele já Alferes Miliciano no Regimento de Cavalaria 3, em Estremoz (cidade onde passei a minha infância e adolescência), não seria já mobilizado.
 
Foi em Estremoz, como digo, que tive a honra de o ter conhecido e o gosto por termos sido Amigos. Talvez pelo ano de 1967 ou 1968, o Morgado, era o instrutor do Regimento em M/A. Dando instrução nesta matéria aos pelotões que compunham os Batalhões e as Companhias que por ali Iam sendo mobilizamos para as várias colónias ou PU, como queiram.

Junto à ribeira de Tera, perto da cidade, instrução de M/A a um ou dois pelotões, o pessoal disposto em círculo e um dos cabos miliciamos de M/A, inadvertidamente ou por inexperiência, espoletou a mina A/C que servia de modelo, segundo o relatado posteriormente por quem lá estava,

Quando aquele meu Amigo se apercebeu do erro do instrutor, atirou-se para cima da mina e, com esta sua acção minimizou os danos abafando o engenho com o seu corpo, e houve feridos, não me recordando já se mais alguém morreu, para além dele, que ficou em pedacinhos.

Para mim foi e sempre será um verdadeiro e saudoso Herói. Creio que, com toda a justiça, o nome dele figura no memorial existente na parada principal do RC3. Mas irei confirmar um destes dias. Será que algum Camarada se recorda deste episódio? Seria aquela instrução dirigida a pessoal a caminho do CTIG?

Já quando eu estava na EPA em 1973, salvo erro, aqui em Évora, no RAL 3, ocorreu um erro idêntico que teve um desfecho bem mais fatídico: 7 ou 8 mortos e uns quantos feridos. Instrução de M/A no interior de uma sala. Pasme-se.

Com amizade e camaradagem. Joaquim Sabido, Évora (**)

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21430: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (75): procuro mais notas biográficas sobre o cor pilav Gualdino Moura Pinto, dado erradamente como morto no acidente do avião da TAP, TP425, no Funchal, em 19/11/1977 (Santiago Garrido, jornalista, "La Voz de Galicia")



Gualdino Moura Pinto, cor pilav, 
Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, 
Comandante da Base Aérea nº 12, em 1973
(Fotografia de Arnaldo Sousa, quando se despediu da Guiné
 como Comandante da Zona Aérea e Piloto, junto de pessoal 
que compunha a linha da frente dos Fiat... Com a devida vénia...) (*)


1. Mensagem de Santiago Garrido Rial, jornalista de "La Voz de Galicia":


De: Santiago Garrido Rial <santiago.garrido@lavoz.es>
Date: terça, 22/09/2020 à(s) 18:34
Subject: Galicia 

Estimado Luís

Soy Santiago Garrido, periodista de La Voz de Galicia. Le escribo en castellano porque lamentablemente no sé hacerlo en portugués (sí en gallego, si le resulta más cómodo). En caso de no entender algunas palabras o frases, se las traduciré.

He llegado hasta su página buscando información sobre el comandante Gualdino Moura Pinto, del que leí un artículo sobre su fallecimiento en el accidente de la TAP en Funchal en 1977. Y muchos más de sus numerosos méritos.

Cuando era joven, con apenas 25 años, en 1950, tuvo que realizar un aterrizaje forzoso en una finca de labranza de Ponteceso (Provincia de A Coruña). Fue un hecho muy comentado, ya que no le pasó nada, ni a él, ni al avión. Había salido de Bragança y, por diversas circunstancias, llegó a este punto de Galicia.

Me gustaría reconstruír algún dato sobre él, tal vez hablando con su hijo, que veo que también es aviador en el Ejército del Aire. O alguna foto... No sé si usted podría ayudarme.

En todo caso, muchas gracias por su atención. (**)

Santiago Garrido Rial
La Voz de Galicia, Redacción Carballo
981704210, 606 968 683
@santiagogrial




Título de caixa alta do Diário de Lisboa, de 21 de novembro de 1977. Cortesia de Fundação Mário Soares, Casa Comum, Documentos Ruella Ramos.

Citação:
(1977), "Diário de Lisboa", nº 19511, Ano 57, Segunda, 21 de Novembro de 1977, Fundação Mário Soares / DRR - Documentos Ruella Ramos, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_22565 (2020-10-7)

2. Resposta do editor Luís Graça:

Sugerimos ao Santiago Garrido Rial que explore o blogue Especialistas da Base Aérea 12 Guiné 65/74 onde há mais informação sobre o cor pilav Gualdino Moura Pinto, que era Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, e Comandante da Base Aérea nº 12, Bissalanca, em 1973.

No nosso blogue não temos muito mais informação sobre ele. Pode ser que algum dos nossos leitores possa ajudar. Boa sorte nas pesquisas e nos contactos. Sabemos que, em 2016, o filho, António Gualdino Ventura Moura Pinto, era Coronel de Infantaria, mas de quem, infelizmente, não temos o contacto.

3. Correção à nossa inf0rmação inicial:

O cor pilav Moura Pinto não morreu nesse acidente aéreo, mas sim de doença, em data, que não podemos precisar. 

Houve uma lamentável troca de identidades, numa notícica dada pela APTCA- Associação do Pessoal Tripulação e Cabine, ao referir a Homenagem aos Tripulantes e Passageiros vitimados no acidente da TAP, 30 anos após, por iniciativa do SNPVAC - Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil... Na lista dos tripulantes mortos vinha o "técnico de voo" Gualdino Maria Moura Pinto... Ora o técnico de voo (TV) que morreu no Funchal, era de apelido Encarnação. Este assunto está, de há muito,  esclarecido no blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74.


________________

Notas do editor:


(**) Último poste da série > 9 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21242: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (74): Canábis - II (e última) Parte : Efeitos psicoativos, imediatos e a longo prazo

quarta-feira, 8 de julho de 2020

Guiné 61/74 - P21151: Memórias cruzadas nas 'matas' da região do Óio-Morés em 1963: o caso da queda do T6 FAP 1694 em 14 de outubro de 1963 (Jorge Araújo) - Parte I


Foto 1 - exemplo de um T-6 (matrícula 1688).
(com a devida vénia)



Foto 2 - exemplo de uma parelha (ou esquadrilha) de T-6 (matrículas: 1620 e 1661 …) In: http://riodosbonssinais.blogspot.com/2014/09/ 
( com a devida vénia)




O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger,
CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior; vive em, Almada, está atualmente nos Emiratos Árabes Unidos; tem cerca de 260 registos no nosso blogue.


MEMÓRIAS CRUZADAS
NAS 'MATAS' DA REGIÃO DO ÓIO-MORÉS EM 1963
- O CASO DA QUEDA DO «T-6 FAP 1694» EM 14OUT63 -
PARTE I




Mapa da região do Óio-Morés com infografia da queda do «T-6 FAP 1694», pilotado pelo Cap Pilav João Cardoso de Carvalho Rebelo Valente, ocorrida em 14Out1963. Identificam-se, com pontos a azul, três das bases existentes naquela região: Maqué, Fajonquito e Morés. Quartéis das NT mais próximos: Olossato e Mansabá.



1.   - INTRODUÇÃO

A quantidade de documentação histórica que continua em silêncio nos arquivos é de tal monta que será difícil, a cada um de nós, dela ter conhecimento e, quiçá, encontrar respostas às dúvidas que persistem… teimosamente!

É dessa teimosia, que se traduz em revisões continuadas do trabalho histórico, emergente da "pesquisa" e do seu estudo, que às vezes faz-se "luz", e, por acumulações de verdades parciais, conseguimos ir mais longe na objectividade histórica, pois esta deverá ser consistente.

Em novo regresso "às matas da região do Óio-Morés" (*),  o Lourenço Gomes e eu, através de «Memórias Cruzadas» de há cinquenta e sete anos, foi possível reconstruir uma parte do nosso «puzzle» da "guerra", que continua incompleto, mas ao qual lhe adicionamos mais algumas peças, retirando as que não encaixavam correctamente, como procuramos provar ao longo das duas partes em que foi dividida esta narrativa.    

2.   - VISITA A BASES DO NORTE DA GUINÉ: - MISSÃO ATRIBUÍDA A LOURENÇO GOMES, EM OUTUBRO DE 1963

Três meses depois da entrada dos primeiros grupos de guerrilheiros do PAIGC em território da Guiné – Frente Norte – para início da sua acção de guerrilha contra as forças militares portuguesas (europeias e do recrutamento local), Lourenço Gomes, o versátil operacional em território do Senegal, responsável pela "gestão" de problemas logísticos (recursos e informação) dos dois lados dessa fronteira, com particular relevância para os cuidados de saúde, onde se incluíam os primeiros socorros e transporte dos feridos em combate resgatados do interior, foi incumbido de realizar mais uma "missão", esta agendada para o período entre 08 e 18 de Outubro de 1963, cujo objectivo era o contacto com algumas das bases da Região do Óio-Morés.

Eis o que deixou escrito sobre esta sua "missão":

2.1 – RELATÓRIO (elaborado por Lourenço Gomes)

Dakar, 24 de Outubro de 1963 (data em que assinou o documento dactilografado)

Visita ao interior (Bases)

Parti de Samine (Senegal) no dia 8 deste mês (Outubro'63), (3.ª feira), para uma visita ao interior. Cheguei à base do camarada Ambrósio Djassi [Osvaldo Vieira; 1938-1974], no dia 09-10-63 (4.ª feira). 

Visitei três bases do Óio [Morés (Central), Fajonquito e Maqué; bases assinaladas a azul na infografia acima].

Pude fazer a visita das bases de dia sem qualquer perigo. Só causa aos camaradas um pouco de preocupação os aviões portugueses. Vi as armas que vieram e são muito boas. A moral dos camaradas é excelente. Estão animados de uma vontade extraordinária. Visitei todos os sítios onde foram abatidos os aviões portugueses. Contei 16 restos de aviões abatidos.

◙ No dia 14-10-63 (2.ª feira) = 

Na minha presença, os aviões portugueses tentaram atacar a base [Central do Morés] do Ambrósio Djassi [Osvaldo Vieira]. Os camaradas abateram três aviões inimigos [apenas um: o «T-6 FAP 1694», do Cap Pilav João Rebelo Valente]. 

Nós tivemos nove mortos e oito feridos. Esses feridos deviam ser transferidos comigo para Samine [no Senegal], mas tiveram que voltar para o Óio, porque os portugueses descobriram uma cambança por onde deveríamos passar e tentaram apanhar-nos nesse mesmo sítio.

# «MC» ▼ A informação do Lourenço Gomes, sobre os "três aviões abatidos no Morés", é extramente relevante para a historiografia militar relacionada com a "Guerra do Ultramar", em particular os "acidentes da aviação militar" no CTIGuiné.

De facto, em nome da verdade, não foram três os "aviões abatidos", como ele refere. Somente o «T-6, matrícula FAP 1694», pilotado pelo Cap Pilav João Cardoso de Carvalho Rebelo Valente, caiu naquela região na data por ele indicada, e que se confirma.

Seria igualmente relevante saber se esta aeronave era a única que estava em "missão", naquele momento, ou se, porventura, fazia parte de uma parelha ou esquadrilha? uma vez que Lourenço Gomes refere-se a três unidades.

Já anteriormente esta ocorrência tinha merecido o meu interesse no seu aprofundamento, como, aliás, deixei expresso na narrativa publicada em 25 de Julho de 2019 – P20010 – a que dei o nome de «O T-6G FAP 1694 e o Cap Pilav João Rebelo Valente, desaparecido em 14/10/1963, na região do Óio-Morés».

O "mistério" ou o "conflito histórico" nascera da discrepância observada entre as fontes consultadas, em que, no primeiro caso, a causa foi consequência de "voo de experiência do avião, embatendo no solo ao fazer acrobacia a baixa altitude", conforme registo abaixo: 




No segundo caso, o acidente é descrito que a mesma aeronave "ao colidir com o solo após manobra acrobática, em Olossato, provocou a morte do Capitão Piloto aviador João Cardoso de Carvalho Rebelo Valente, facto que pode ser comprovado com a informação seguinte:



A recuperação das duas imagens, que se apresentam abaixo, servem para testemunhar que a aeronave «T-6 FAP 1694» se despenhou na região do Óio e, segundo Pedro Pires (1934-), "muito próximo da base [Central] do Osvaldo Vieira, perto da tabanca de Morés".

Perante a violência das imagens observadas ao estado em que ficou a aeronave, onde só se vêm ferros retorcidos, é aceitável considerar-se que durante o movimento da queda ou após o seu embate com o solo, o avião se tenha incendiado, e o corpo do piloto carbonizado.

Mesmo tratando-se de fotos "preto e branco", fica-se com a sensação de que o capim e as folhas das árvores se encontram queimadas. É que estas imagens não foram registadas no dia do acidente, mas sim algum tempo depois… certamente!




Foto 3 - Citação: (1963) "Lay Sek junto de um pedaço de um avião português abatido pelo PAIGC", CasaComum.org, Disponível HTTP: 



Foto 4 - Citação: (1963) "População junto de um pedaço de um avião português abatido pelo PAIGC", CasaComum.org, Disponível HTTP: 

Quanto aos nove mortos contabilizados por efeito do bombardeamento, referidos por Lourenço Gomes, este mesmo acontecimento volta a ser abordado por Osvaldo Vieira, no documento que enviou do Óio ao Secretário-Geral, em 10 de Novembro de 1963, relatando: "no dia 14 do mês de Outubro'63 sofremos um bombardeamento na base onde perdemos 13 [treze] camaradas entre eles o 1.º responsável das mulheres do Morés, de nome Joncon Seidi", o que difere dos números avançados por Lourenço Gomes.



Ainda no que concerne a este episódio, nomeadamente em relação às mortes registadas, Amílcar Cabral (1924-1973), em carta dirigida, de Conacri, a Osvaldo Vieira, datada de 31 de Dezembro de 1963, destaca um nome – o de Joncon Seidi.



Citação: (1963), Sem Título, Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_36712, com a devida vénia.

Medicamentos no interior = 

O camarada [enfermeiro] Tiago Lopes já não dispõe de mais medicamentos. Há dias tive de comprar 30.000 francos de medicamentos para o interior. Precisamos de ter em conta que hoje muita gente não pode ir à consulta dos portugueses. Todas as crianças doentes vão ver o Tiago Lopes. 

Gasta-se muito medicamento. Os feridos menos graves têm sido tratados pelo Tiago Lopes. Só têm saído os feridos graves. Hoje necessitamos de muitos medicamentos.

Material de Guerra = 

Segue o camarada Chico Té [Francisco Mendes; 1939-1978], que há-de fazer um relatório completo sobre o que foi discutido e decidido.

Despesas = 

Recebi os cem mil francos pelo Pedro Pires. Esse dinheiro é pouco. Hoje, se não gastamos com a alimentação de camaradas, temos que gastar muito com os feridos. Tenho de comprar medicamentos para mandarmos para o interior e de pagar todos os tratamentos feitos no Hospital de Ziguinchor. O transporte dos feridos são pagos por mim. Há dias gastei 20 mil francos por duas viagens com feridos. 

No Hospital de Ziguinchor temos de pagar tudo. A alimentação dos doentes também é paga. Pago à Carmem 30.000 francos por mês para alimentação dos doentes. Só por esses dados podem ver as despesas que fazemos. Temos de comprar até as ligaduras.

Com os camaradas do interior também temos despesas: compro óleo para as armas, sal, etc.. Tenho comigo uma lista de artigos de necessidade urgente que tenho de mandar, quando voltar a Samine. Peço que avaliem qual é a nossa despesa, hoje, no Norte. Preciso que enviem mais 200 mil francos para despesas até ao fim do mês de Novembro'63. Mas tem de ser urgente, porque estou à espera dos oito feridos do interior e nessa altura terei catorze feridos em Ziguinchor. 

Se vocês não me mandarem a quantia pedida, estou a ver que terei de ir a Conacri para discutir convosco a questão das despesas e arrumar as contas com o Aristides Pereira [1923-2011]. Nestas condições, sairei de Dakar no dia 08 de Novembro'63. Conto que vocês saberão compreender as nossas necessidades actuais e terei a quantia pedida dentro de pouco tempo.

Viatura = 

Novamente tenho de vos falar da questão de uma viatura. Torna-se necessário ter-se uma viatura para transporte dos feridos. Como vocês sabem, Samine é uma vila muito pequena e muitas vezes não há carro nenhum de aluguer aí. Também as despesas de transporte são grandes por isso insisto nesta questão da viatura.

Refugiados Portugueses = 

Vieram de Bissau dois militares portugueses, enviados pelo camarada Zain Lopes [Rafael Barbosa]. Foram conduzidos até à base do Ambrósio Djassi [Osvaldo Vieira] por um camarada do Partido [Biagué]. Tratam-se do alferes miliciano Fernandes Vaz [subtenente Manuel José Fernandes Vaz] e do sargento miliciano Fernando Fontes [ambos militares da marinha].

Quando chegaram a Ziguinchor foram presos pela Polícia de Sureté [Segurança] senegalesa e transferidos para Dakar. Também estive preso com eles em Ziguinchor durante três dias e transferido para Dakar. Em Dakar fui posto em liberdade. 

Os camaradas portugueses encontram-se ainda na polícia a fim de prestarem declarações. A minha prisão em Ziguinchor foi motivada mais pelas intrigas do 'Ndjai Bá, que tive que expulsar do Comité de Ziguinchor porque estava pedindo dinheiro em nome do Partido.

# «MC» ▼ 

Os dois desertores da marinha portuguesa, acima identificados, por terem entrado em território do Senegal, foram detidos pela Polícia de Fronteira e levados para Ziguinchor, onde permaneceram em cativeiro durante três dias. Seguiu-se a sua transferência para Dakar, a fim de concluírem o processo de interrogatório. Após serem postos em liberdade, tomaram a iniciativa de escrever uma carta de agradecimento a Amílcar Cabral, pelo apoio prestado, de cujo conteúdo reproduzimos a parte que segue:



Citação: (1963), Sem título, Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, 

Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_36581, com a devida vénia.

Fico aguardando ou a vossa resposta urgente ou a minha partida para Conacri.
Dakar, 24 de Outubro de 1963.
Lourenço Gomes.



Citação: (1963), "Relatório sobre a visita de Lourenço Gomes à região de Óio", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41412, com a devida vénia.
Continua…
► Fontes consultadas:

Ø  CasaComum, Fundação Mário Soares. Pasta: 07075.147.046. Título: Relatório sobre a visita de Lourenço Gomes à região do Óio. Assunto: Relatório assinado por Lourenço Gomes sobre a sua visita ao interior, região de Óio. Visita aos locais onde foram abatidos os aviões portugueses; ataque à base de Ambrósio Djassi [Osvaldo Vieira]. Necessidade de medicamentos no interior. Material de Guerra. Despesas. Viatura para transporte dos feridos. Envio dos militares portuguesas, Fernandes Vaz e Fernando Fortes, para a base de Abel Djassi. Em anexo documento assinado por Pedro Pires, datado de 21 de Outubro de 1963, com as informações colhidas das declarações de Biagué. Data: Quinta, 24 de Outubro de 1963. Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios XI 1961-1964. Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Documentos.

Ø  Outras: as referidas em cada caso.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
04JUL2020

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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 2 de julho de 2020 > Guiné 61/74 - P21130: Memórias cruzadas nas 'matas' da região do Oio-Morés em 1963/64 (Jorge Araújo) - II (e última) Parte