Londres > A nossa Doutora Paula Salgado, membro da nossa Tabanca Grande, desde Outubro de 2005... Filha do Paulo e da Conceição, logo nossa filha também, porque os filhos dos nossos camaradas... nossos filhos são!
1. Mensagem do nosso camarada Paulo Salgado (a viver em Angola):
Data: 23 de Abril de 2010 14:41
Assunto: Paula Salgado
Luís e Carlos
A Paula está em Londres. Pediu-me que vos mandasse a mensagem e a foto, que nos remeteu. Eu fiquei muito emocionado por ela "estar" connosco.
É que ela estava com o computador ocupado nas estrutura das proteínas…
Um abraço tertuliano, Paulo Salgado
Segue o endereço dela: aula.salgado@btopenworld.com
Guiné > Região Oio > Olossato > CCAV 2712 (1970/72) > Um patrulhamento 'à maneira', segundo o Paulo Salgado, ex-Alf Mil Cav.
Foto: © Paulo Salgado (2005). Direitos reservados
2. Mensagem da Paula Salgada, membro da nossa Tabanca Grande, juntamente com os seus pais, Paulo e Conceição Salgado:
Amigos do Blogue (*),
O meu pai (Paulo Salgado) esteve na guerra. O meu pai sempre nos falava, a seu jeito – a mim e ao meu irmão – das suas experiências. Recordo-me dos almoços-convívio em que nós, miúdos, brincávamos ao sol, enquanto os nossos pais (re) viviam as emoções e as recordações. Conforme crescíamos, fomos ouvindo as outras histórias – as do medo, da incerteza, do perigo.
O meu pai regressou à Guiné-Bissau como cooperante, em 1990 (**). "Arrastou" a minha mãe e a mim também. Tinha dezasseis anos. Lembro-me da primeira vez que saímos de Bissau, num inadequado Fiat Punto, e regressávamos já de noite, pelas picadas. Lembro-me de pensar como teria sido para o meu pai, para todos vós, com poucos mais anos do que eu tinha, "cair de pára-quedas" no meio daquele mato. Pela primeira vez, comecei a entender o que ficava por dizer nas histórias que ouvi em criança.
Para uma adolescente, viver num país como a Guiné-Bissau dos anos 90 foi uma experiência emocionante, rica. Convivi com os meus colegas guineenses no Colégio, tive aulas com professores de Matemática, Física e Biologia que tinham vindo do Leste, e com o Padre Macedo – um herói com mais de 50 anos de Guiné que me ensinou muito sobre o que é a língua Portuguesa e como a influência dos povos além-Europa que a falam só a enriquece e enaltece.
Guiné-Bissau > Rio Farim > 2006 > Cambança do rio... Observação do barqueiro: "A bos portuguisis? Pai di nôs".[ Vocês, portugueses ? Então, pais de nós!]
Foto: © Paulo & Conceição Salgado (2006).
E fui ao Olossato, e fui a Farim e fui ao Saltinho, a Bambadinca, Bafatá, corremos a Guiné toda… e fui…ao Morés, o célebre Morés! Ali, a conversa entre um professor do internato, um ex-combatente do PAIGC e o meu pai, partilhando as suas histórias, de lados opostos das barricadas, foi tão mágica que eu e a minha mãe ficámos em silêncio, apreciando o simples facto de presenciarmos um momento tão único, tão fraterno.
A Guiné tinha-me conquistado. O regresso, em 2001, um prémio que pedi aos meus Pais pelo doutoramento, foi doloroso, como são dolorosas as notícias do sofrimento pelo qual aquele povo, que é da nossa família também, passou e passa.
Pode ser que eu traga aqui, a esta tertúlia tão interessante e onde vós, de alguma forma, fazeis a catarse, outras historias desta vivência.
Para todos vós, valentes (ainda que com medos que ainda guardais no vosso subconsciente) eu envio daqui, de Londres, um abraço de admiração e parabéns pelo aniversário do vosso blogue.
Paula Salgado
Doutora em Bioquímica / Investigadora
Londres, 23/04/2010
[ Revisão / fixação de texto / bold / título: L.G.]
________________
Notas de L.G.:
(*) Vd. último poste da série > 23 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6223: O 6º aniversário do nosso blogue (18): Ensinamento de vida (Joaquim Mexia Alves)
(**) Vd. poste, da I Série > 13 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXL: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (2)
(...) Texto do Paulo Salgado que vive em Bissau (...) e que submete à aprovação da tertúlia a admissão da Paula Salgado, sua filha, mais guineia que muito guinéu...
Eu cá, por mim, terei muita honra em apadrinhar a nova tertuliana, a nossa doutoranda Paula, mas aqui quem mais ordena é o colectivo dos tertulianos: no nosso tempo as mulheres não entravam nas casernas, mas isso foi no século passado... Bom, não quero influenciar o resultado da consulta tertuliana. Limito-me a dar a minha opinião. E já agora, cá para mim não entrava só uma camariga, entravam duas, a filha e a mãe, neste caso a Maria da Conceição, a mulher do Paulo... Mais: respeito o silêncio (ou o pudor) do Paulo que tem uma cópia da história da companhia dele mas que não quer escarrapachá-la aqui no blogue, assim, sem mais nem menos, as folhas todas abertas... Respeito e concordo, desde que o bombolom do Paulo vá trazendo notícias e estórias da Guiné-Bissau de ontem e de hoje. Hoje publica-se, a seguir, "mais uma parte do Capítulo I". Até à próxima Paulo e Maria, gente de cepa rija, que não desanima facilmente com o macaréu da desgraça... LG
(...) Camaradas e Amigos (aqui incluo a minha filha Paula Salgado – a camariga que vive em Oxford e que adora ouvir as histórias e as estórias do velhote - camariga que só o será com a licença de vossas mercês, pois ela fez aqui o 11.º ano e papia kriolo diritu i tene amigus manga deli).
Ele é a sina de conduzir os periquitos (designação que se dava às companhias que chegavam da metróple à Guiné – e os velhinhos até cantavam: Periquito vai pró mato, a velhice vai pra Bissau; bem se compreende o desaforo: os novos que gramassem!). E vai-se a Quinhamel, a Uaque, ao Saltinho, conhece-se o rio no cais do Pidjiguiti, são os colegas que chegam do Porto para colaborar no Projecto.
Ele é o corre-corre no campus hospitalar à procura não sei de que solução para tantos problemas, tantos que as gentes já passam indiferentes ao sofrimento, tenha ele a feição e a forma e a dimensão que tiverem: a cólera, a malária, a elevada taxa de mortalidade infantil e maternal… E coisas mais simples como o gerador que avariou e … não há luz nem água para enfermarias, nem PC que registe, nem a fresquidão de ventoínhas e de ares condicionados onde os há, e lá se vão, estragados, os parcos reagentes do laboratório de análises clínicas (35 horas sem luz é muita hora!), e as intervenções marcadas que ficaram no papel (até foi necessário transportar de longe água para desinfecção e dar ao doentes da cólera). Isto só visto, camarigos!
No Olossato, os frigoríficos a petróleo ou a electricidade do geradorzinho aguentavam lindamente… Alguns camaradas até tinham ventoínhas que colocavam no cimo da cabeceira, seguras na parede, para refresco de suores quentes - adivinham-se quais - ou frios, estes devidos a saída iminente para o mato, ali para Manacá, ou Amina Dala, ou Iracunda, esta tabanca bem perto do Morès, ver foto de saída bem cedinho e dizei lá se não era à maneira correcta!!!...
Ah!, aquelas ventoinhas pequeninas que nos batiam no corpo sedento de amor, e que, rodopiando, serviam para afastar os insistentes mosquitos que teimosamente zumbiam aos nossos ouvidos – porra, a mim não me deixavam nem sequer fechar os olhos. Aquele geradorzinho até dava para alumiar os campos até 100 metros, e encandeavam as tropas quando regressavam de sortidas nocturnas.
Acho que estas coisas todos vivemos…! Até se conta a estória de um capitão, de que não digo o nome, que se lembrou de apagar os holofotes em momento de ataque e, pasme-se, quando o IN estava a tentar entrar no aquartelamento, foi uma razia nos guerrilheiros ao acenderem-se as luzes. Se tal foi verdade, como ouvi, foi uma emboscada nocturna a preceito...
Mas a sério: quem não se lembra de uma patrulhamento, bem feito? – segue foto (...)
Nota bem: Eu devo confessar-vos uma coisa – tenho a história da companhia [CCAV 2712, comandada pelo capitão Mário Tomé, entre 1970 e 1972]. Parece-me pouco correcto que a traga a terreiro. Mas tentarei traduzi-la, sem romancear, mas recontando-a à minha maneira.
Que me desculpem os historiadores, que me perdoem os puros… mas há coisas que eu não acho oportuno contar, por escrito.
A todos os Camaradas e Amigos muitas mantenhas e com a promessa de que podeis contar comigo porque eu tenho, também, a segurança à retaguarda – ou não é, Humberto?
Bissau, 13 de Outubro de 2005
Vd. os restantes postes da série:
5 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXXX: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (1)
(...) "Vou tentar relatar (narrar, contar, ficcionar quanto baste) as minhas vivências nesta terceira (ou quarta?) comissão / presença demorada... (Agora estamos numa Missão que é um termo muito divulgado por quem passa aqui curtas ou mais longas estadias em nome de alguém a fazer qualquer coisa – confesso-vos que tenho visto muita coisa mal feitinha)"(...).
13 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXL: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (2)
19 de utubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLVII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (3)
(...) "Hoje, sábado, fomos até ao Saltinho, com os cooperantes da Saúde que chegaram ontem no avião (já agora: a Dra. Adelaide, ginecologista; o Dr. Justiça, hematologista e que também fez a guerra em Angola) e ainda o João Faria, engenheiro hospitalar (que já cá está há oito dias… Manga di tempu! , que esteve em Angola, e que se está a aguentar com brio e companheirismo nas lides do Hospital Civil... Todos eles emprestaram à viagem de 350 km um sabor especial)" (...).
5 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXI: Crónicas de Bissau ou o 'bombolom' do Paulo Salgado (4)
29 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (5): para onde ?
3 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXXIII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (6): HN Simão Mendes
5 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXXVIII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' de Paulo Salgado) (7): Suleiman Seidi
30 de Dezembro 2005 > Guiné 63/74 - CDIII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (8): novos tertulianos
18 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLVII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (9): História e estórias
30 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXXV: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (10): ontem e hoje em Uaque
1 de Fevereiro 2006 > Guiné 63/74 -CDXC: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado)(11): Beethoven e batuque no Olossato
2 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCI: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (12): reviver o passado em Olossato
13 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1069: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (13): Para quando África ?
(...) "Quem está aqui em trabalho intenso, meses a fio, deixa coisas para contar num amanhã, escrevinha outras para uma memória que há-de ser escrita, agora e sempre falando da Guiné sob outros ângulos e com outras visões e tu perguntarás e os camaradas perguntarão:- Por que razão não bombolaste?
(...) Lá no Hospital há traumatizados há meses à espera de intervenção. Era isto que eu ia contar? Mas hoje apeteceu-me. 10 de Setembro de 2006. (Ouvi passar uma ambulância uivando - o que irá fazer ao Hospital com o doente?)" (...).
Foto: © Paulo Salgado (2005). Direitos reservados
2. Mensagem da Paula Salgada, membro da nossa Tabanca Grande, juntamente com os seus pais, Paulo e Conceição Salgado:
Amigos do Blogue (*),
O meu pai (Paulo Salgado) esteve na guerra. O meu pai sempre nos falava, a seu jeito – a mim e ao meu irmão – das suas experiências. Recordo-me dos almoços-convívio em que nós, miúdos, brincávamos ao sol, enquanto os nossos pais (re) viviam as emoções e as recordações. Conforme crescíamos, fomos ouvindo as outras histórias – as do medo, da incerteza, do perigo.
O meu pai regressou à Guiné-Bissau como cooperante, em 1990 (**). "Arrastou" a minha mãe e a mim também. Tinha dezasseis anos. Lembro-me da primeira vez que saímos de Bissau, num inadequado Fiat Punto, e regressávamos já de noite, pelas picadas. Lembro-me de pensar como teria sido para o meu pai, para todos vós, com poucos mais anos do que eu tinha, "cair de pára-quedas" no meio daquele mato. Pela primeira vez, comecei a entender o que ficava por dizer nas histórias que ouvi em criança.
Para uma adolescente, viver num país como a Guiné-Bissau dos anos 90 foi uma experiência emocionante, rica. Convivi com os meus colegas guineenses no Colégio, tive aulas com professores de Matemática, Física e Biologia que tinham vindo do Leste, e com o Padre Macedo – um herói com mais de 50 anos de Guiné que me ensinou muito sobre o que é a língua Portuguesa e como a influência dos povos além-Europa que a falam só a enriquece e enaltece.
Guiné-Bissau > Rio Farim > 2006 > Cambança do rio... Observação do barqueiro: "A bos portuguisis? Pai di nôs".[ Vocês, portugueses ? Então, pais de nós!]
Foto: © Paulo & Conceição Salgado (2006).
E fui ao Olossato, e fui a Farim e fui ao Saltinho, a Bambadinca, Bafatá, corremos a Guiné toda… e fui…ao Morés, o célebre Morés! Ali, a conversa entre um professor do internato, um ex-combatente do PAIGC e o meu pai, partilhando as suas histórias, de lados opostos das barricadas, foi tão mágica que eu e a minha mãe ficámos em silêncio, apreciando o simples facto de presenciarmos um momento tão único, tão fraterno.
A Guiné tinha-me conquistado. O regresso, em 2001, um prémio que pedi aos meus Pais pelo doutoramento, foi doloroso, como são dolorosas as notícias do sofrimento pelo qual aquele povo, que é da nossa família também, passou e passa.
Pode ser que eu traga aqui, a esta tertúlia tão interessante e onde vós, de alguma forma, fazeis a catarse, outras historias desta vivência.
Para todos vós, valentes (ainda que com medos que ainda guardais no vosso subconsciente) eu envio daqui, de Londres, um abraço de admiração e parabéns pelo aniversário do vosso blogue.
Paula Salgado
Doutora em Bioquímica / Investigadora
Londres, 23/04/2010
[ Revisão / fixação de texto / bold / título: L.G.]
________________
Notas de L.G.:
(*) Vd. último poste da série > 23 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6223: O 6º aniversário do nosso blogue (18): Ensinamento de vida (Joaquim Mexia Alves)
(**) Vd. poste, da I Série > 13 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXL: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (2)
(...) Texto do Paulo Salgado que vive em Bissau (...) e que submete à aprovação da tertúlia a admissão da Paula Salgado, sua filha, mais guineia que muito guinéu...
Eu cá, por mim, terei muita honra em apadrinhar a nova tertuliana, a nossa doutoranda Paula, mas aqui quem mais ordena é o colectivo dos tertulianos: no nosso tempo as mulheres não entravam nas casernas, mas isso foi no século passado... Bom, não quero influenciar o resultado da consulta tertuliana. Limito-me a dar a minha opinião. E já agora, cá para mim não entrava só uma camariga, entravam duas, a filha e a mãe, neste caso a Maria da Conceição, a mulher do Paulo... Mais: respeito o silêncio (ou o pudor) do Paulo que tem uma cópia da história da companhia dele mas que não quer escarrapachá-la aqui no blogue, assim, sem mais nem menos, as folhas todas abertas... Respeito e concordo, desde que o bombolom do Paulo vá trazendo notícias e estórias da Guiné-Bissau de ontem e de hoje. Hoje publica-se, a seguir, "mais uma parte do Capítulo I". Até à próxima Paulo e Maria, gente de cepa rija, que não desanima facilmente com o macaréu da desgraça... LG
(...) Camaradas e Amigos (aqui incluo a minha filha Paula Salgado – a camariga que vive em Oxford e que adora ouvir as histórias e as estórias do velhote - camariga que só o será com a licença de vossas mercês, pois ela fez aqui o 11.º ano e papia kriolo diritu i tene amigus manga deli).
Ele é a sina de conduzir os periquitos (designação que se dava às companhias que chegavam da metróple à Guiné – e os velhinhos até cantavam: Periquito vai pró mato, a velhice vai pra Bissau; bem se compreende o desaforo: os novos que gramassem!). E vai-se a Quinhamel, a Uaque, ao Saltinho, conhece-se o rio no cais do Pidjiguiti, são os colegas que chegam do Porto para colaborar no Projecto.
Ele é o corre-corre no campus hospitalar à procura não sei de que solução para tantos problemas, tantos que as gentes já passam indiferentes ao sofrimento, tenha ele a feição e a forma e a dimensão que tiverem: a cólera, a malária, a elevada taxa de mortalidade infantil e maternal… E coisas mais simples como o gerador que avariou e … não há luz nem água para enfermarias, nem PC que registe, nem a fresquidão de ventoínhas e de ares condicionados onde os há, e lá se vão, estragados, os parcos reagentes do laboratório de análises clínicas (35 horas sem luz é muita hora!), e as intervenções marcadas que ficaram no papel (até foi necessário transportar de longe água para desinfecção e dar ao doentes da cólera). Isto só visto, camarigos!
No Olossato, os frigoríficos a petróleo ou a electricidade do geradorzinho aguentavam lindamente… Alguns camaradas até tinham ventoínhas que colocavam no cimo da cabeceira, seguras na parede, para refresco de suores quentes - adivinham-se quais - ou frios, estes devidos a saída iminente para o mato, ali para Manacá, ou Amina Dala, ou Iracunda, esta tabanca bem perto do Morès, ver foto de saída bem cedinho e dizei lá se não era à maneira correcta!!!...
Ah!, aquelas ventoinhas pequeninas que nos batiam no corpo sedento de amor, e que, rodopiando, serviam para afastar os insistentes mosquitos que teimosamente zumbiam aos nossos ouvidos – porra, a mim não me deixavam nem sequer fechar os olhos. Aquele geradorzinho até dava para alumiar os campos até 100 metros, e encandeavam as tropas quando regressavam de sortidas nocturnas.
Acho que estas coisas todos vivemos…! Até se conta a estória de um capitão, de que não digo o nome, que se lembrou de apagar os holofotes em momento de ataque e, pasme-se, quando o IN estava a tentar entrar no aquartelamento, foi uma razia nos guerrilheiros ao acenderem-se as luzes. Se tal foi verdade, como ouvi, foi uma emboscada nocturna a preceito...
Mas a sério: quem não se lembra de uma patrulhamento, bem feito? – segue foto (...)
Nota bem: Eu devo confessar-vos uma coisa – tenho a história da companhia [CCAV 2712, comandada pelo capitão Mário Tomé, entre 1970 e 1972]. Parece-me pouco correcto que a traga a terreiro. Mas tentarei traduzi-la, sem romancear, mas recontando-a à minha maneira.
Que me desculpem os historiadores, que me perdoem os puros… mas há coisas que eu não acho oportuno contar, por escrito.
A todos os Camaradas e Amigos muitas mantenhas e com a promessa de que podeis contar comigo porque eu tenho, também, a segurança à retaguarda – ou não é, Humberto?
Bissau, 13 de Outubro de 2005
5 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXXX: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (1)
(...) "Vou tentar relatar (narrar, contar, ficcionar quanto baste) as minhas vivências nesta terceira (ou quarta?) comissão / presença demorada... (Agora estamos numa Missão que é um termo muito divulgado por quem passa aqui curtas ou mais longas estadias em nome de alguém a fazer qualquer coisa – confesso-vos que tenho visto muita coisa mal feitinha)"(...).
13 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXL: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (2)
19 de utubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLVII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (3)
(...) "Hoje, sábado, fomos até ao Saltinho, com os cooperantes da Saúde que chegaram ontem no avião (já agora: a Dra. Adelaide, ginecologista; o Dr. Justiça, hematologista e que também fez a guerra em Angola) e ainda o João Faria, engenheiro hospitalar (que já cá está há oito dias… Manga di tempu! , que esteve em Angola, e que se está a aguentar com brio e companheirismo nas lides do Hospital Civil... Todos eles emprestaram à viagem de 350 km um sabor especial)" (...).
5 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXI: Crónicas de Bissau ou o 'bombolom' do Paulo Salgado (4)
29 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (5): para onde ?
3 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXXIII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (6): HN Simão Mendes
5 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXXVIII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' de Paulo Salgado) (7): Suleiman Seidi
30 de Dezembro 2005 > Guiné 63/74 - CDIII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (8): novos tertulianos
18 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLVII: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (9): História e estórias
30 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXXV: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (10): ontem e hoje em Uaque
1 de Fevereiro 2006 > Guiné 63/74 -CDXC: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado)(11): Beethoven e batuque no Olossato
2 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCI: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (12): reviver o passado em Olossato
13 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1069: Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Salgado) (13): Para quando África ?
(...) "Quem está aqui em trabalho intenso, meses a fio, deixa coisas para contar num amanhã, escrevinha outras para uma memória que há-de ser escrita, agora e sempre falando da Guiné sob outros ângulos e com outras visões e tu perguntarás e os camaradas perguntarão:- Por que razão não bombolaste?
(...) Lá no Hospital há traumatizados há meses à espera de intervenção. Era isto que eu ia contar? Mas hoje apeteceu-me. 10 de Setembro de 2006. (Ouvi passar uma ambulância uivando - o que irá fazer ao Hospital com o doente?)" (...).