Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 29 de março de 2008
Guiné 63/74 - P2700: Construtores de Gandembel / Balana (4): Estive lá 120 dias, com o meu Pel Caç Nat 55, até ao fim (Hugo Guerra)
Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.
1. Texto do nosso camarada Hugo Guerra, que comandou os Pel Caç Nat 55 e Pel Caç Nat 60 (Gandembel, Ponte Balana, Chamarra e S. Domingos, 1968/70):
Caro Luís:
O nosso Povo tem uns ditados muito acertados. Por exemplo, dizer-se que "Quem não se sente não é filho de boa gente", é um daqueles que tem muita aplicação prática.
Já estava à espera que mais dia menos dia "rebentasse a bronca" com outros camaradas nossos que, tal como o Alberto Branquinho e o Mexia Alves, não concordam com o protagonismo exagerado que alimentas no Blogue acerca de Gandembel e Ponte Balana, sempre imputadas ao Idálio Reis da [CCAÇ] 2317 e dos seus homens ....
Tiveste agora que tirar a limpo com o Idálio aquilo que eram as opiniões do Branquinho, como se só o 1º fosse o detentor de todo oconhecimento e acho a resposta do Reis muito brusca, para quem sabe perfeitamente que, só enquanto não se construiram os abrigos de betão, é que o pessoal "imitava as toupeiras".
Eu optei sempre por dormir dentro do Paiol em Ponte Balana, em cima dos cunhetes de munições, junto ao rádio-transmissor, sabendo perfeitamente que se tivessemos um ataque a sério, com a tomada do destacamento, só nos restava abrigar naquele bunker, pedir a Gandembel que nos enchessem de morteiradas e obuses e havia de ser o que fosse.
Claro que não obrigava ninguém a praticar esta loucura comigo, mas tinha sempre companhia,pois enquanto Gandembel estava "a embrulhar" havia sempre quem jogasse as cartas...e alguém contava as flagelações do in.
Assim como o Idálio pode dizer que foi o homem que mais tempo esteve em Gandembel com mais cerca de 150 a 200 homens, incluindo as tropas especiais e os especialistas , foi o meu Pelotão de Nativos 55 que mais meses esteve na Ponte Balana: Talvez uns 4 meses.
Como sabes os Pel Caç Nat tinham graduados brancos e sempre de rendição individual, o que originava duas coisas: (i) Eram apêndices das Companhias,para o pior.... até porque eram Nativos (sem comentários); (ii) Estavam completamente desgarrados das Companhias, o que era péssimo a nível humano e psicológico.
Quando o meu Pel Caç Nat saíu de Ponte Balana, já a cabeça da coluna ía a uns quilómetros de distância e, enquanto a 2317 seguiu para Buba, o Pel Nat 55 ficou logo na Chamarra.... nem sequer os quiseram em Aldeia Formosa.
O Zé Teixeira, que correu todos aqueles destacamentos , possivelmente até me conhece. Além de Aldeia Formosa, onde estive uns oito dias antes de seguir para Gandembel, ainda fui dormir duas ou três noites a Mampatá...
Dos 120 dias que o meu Pel esteve em Ponte Balana lembro-me de três Furréis brancos, do operador de transmissões - esse sim toupeira do 1º ao último dia- e talvez em Dez 68 foi lá colocada mais um ex-Alferes, Barge de seu nome, e que foi uma salutar companhia para mim. Salvo erro comandava um Pelotão da CCAÇ 2317.
Não me lembro de haver qualquer contacto comigo a questionar sobre o que eu teria a dizer de Gandembel-Ponte Balana, aquando da vossa romagem por aqueles lugares. Haverá algum engulho com a minha ida ao Corredor da Morte?
Como é que eu posso pronunciar-me sobre a Guerra da Guiné em locais onde nunca estive, a dormir numa cama, a comer um bife na tasca do não sei quantos ou a ter direito a uma lavadeira - pagando, claro - quando Gandembel e Ponte Balana não tinham contacto com o exterior excepto nos helis que levavam enfermeiras paras- querida Ivone e outras-que só lá iam buscar os mortos e feridos do ataque anterior...
Pista de aviação nada
População nada
Gado nada
Comida pouca e péssima...Nas chuvas o Balana fornecia peixe, à granada, claro.
Colchões para dormir cheios de buracos - remendos nem vê-los. Os poucos que havia eram para as viaturas. Bebida muita. Medo ainda mais. Médico uma vez em Dezembro.
Padre e Missa uma vez no Natal.
Gandembel e Ponte Balana são dois locais com misticismo, feitos de heroísmo e medo e os fantasmas ainda por lá andam e por cá também.
Gostaria, portanto, de te pedir , se assim o entenderes, que não esqueças os demais protagonistas que também forçados fizeram aquele pedaço da História.
Como diz o Branquinho,também lá estive e não vou deixar que outros contem as coisas por mim.
Um abraço do
Hugo Guerra
PS - Tenho muita pena de não ter podido ir ao Simpósium que acho correu muito bem. O meu Ortopedista, que esteve lá, ex-Alferes Francisco Silva, tirou-me as veleidades de aguentar as viagens de picada. Sou agora muito colunável....
2. Comentário de L.G.:
Hugo, errar é humano...Neste caso, pequei por omissão, ao fazer tábua rasa dos teus 120 dias (quatro meses, entre Agosto de 1968 e Janeiro de 1969), no destacamento de Ponte Balana. Tens que me dar o desconto: a minha base de dados, neuronal, não é assim tão grande e tão fiável que não me deixe mal, em certas circunstâncias... Lamento profundamente ter-me esquecido de ti e dos teus homens do Pel Caç Nat 55. Não o fiz intencionalmente, nem tinha nenhuma razão, objectiva, para o fazer... Como não tenho nenhum razão, manifesta ou latente, para pôr o Idálio Reis no Olimpo dos deuses e dos heróis. Sou anti-herói. São os homens, meus camaradas, que fizeram a guerra, que me interessam. Tu, o Idálio, e tantos outros, nos mais diversos pontos da Guiné...
Chegaste à nossa Tabanca Grande em Novembro de 2007 e temos, eu e os meus/nossos co-editores, publicado sempre as tuas mensagens... Foi pena não teres, em tempo útil - isto é, antes do Simpósio Internacional de Guileje - falado,com mais detalhe, da tua estadia em Ponte Balana... A ter havido injustiça, fica aqui reparada. Como eu costumo dizer, a nossa Tabanca Grande não tem portas nem janelas, não há convidados, nem VIP, nem membros de 1ª e 2ª classe... Há apenas amigos e camaradas da Guiné, que têm a liberdade de entrar e sair, quando lhes apetece...Caro que temos algumas regras de convívio e de comportamento...
Procurei em tempo útil incluir nas estórias de Guileje o relato da tua ida (voluntária à força...) ao Corredor da Morte (1)... Como seguramente publicaria o teu relato da estadia no hotel de muitas estrelas de Balana, se me tens avivado a memória... Já publiquei 2700 postes neste blogue e recebi, em três anos, muitos milhares de emails, .. Não me peças, por favor, que memorize todos os detalhes curriculares de toda a gente... Por outro aldo, não vale a pena a gente entrar pelo lado das insinuações e provocações, do género A Minha Guerra Foi Pior que a Tua... É uma picada que não nos leva a lado nenhum e é totalmente contrária ao espírito, aberto, franco, assertivo, frontal, leal, deste blogue...
Dito isto, Hugo, digo-te que apreciei a tua franqueza e aqui vai um abraço. Sem ressentimentos. Luís Graça (que, como tu, foi tropa-macaca, de 2ª classe).
PS - Não tenho fotos tuas do Tombali... Em contrapartida, mando-te uma foto com o teu médico de quem só posso dizer que foi um camaradão no fim de semana que passámos juntos, no sul...E a quem já convidei para ingressar na nossa Tabanca Grande.
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(1) Vd. postes de:
29 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2489: Estórias de Guileje (4): Com os páras, na minha primeira ida ao Corredor da Morte (Hugo Guerra)
7 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2415: Uma guerra entregue aos milicianos: onde estavam (estão) os nossos comandantes ? (Hugo Guerra, Coronel, DFA, na reforma)
22 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2374: O meu Natal no mato (10): Bissau, 1968: Nosso Cabo, não, meu alferes, sou o Marco Paulo (Hugo Guerra)
29 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2312: Tabanca Grande (43): Hugo Guerra, ex-Alf Mil, Pel Caç Nat 55 e 50 (Gandembel, Ponte Balana, Chamarra e S. Domingos, 1968/70):
(...) Chamo-me Hugo Guerra, nasci em Estremoz em Abril de 1945 e estudei na Escola de Regentes Agrícolas de Évora onde acabei o meu curso em 1964. Em Agosto de 1968, sem perceber bem como (depois hei-de contar), estava no Ana Mafalda a caminho da Guiné em rendição individual e, como a sorte nunca me bafejou, quando desembarquei já tinha guia de marcha para Gandembel onde fui comandar o Pel Caç Nat 55 que estava adstrito à CCaç 2317 [, Gandembel/Balana, 1968/69]. Passei por Aldeia Formosa, num heli, e aterrei, ainda em Agosto [de 1968], em Gandembel.
"Passei a maior parte do tempo em Ponte Balana e estava lá quando fechámos a porta em Janeiro de 1969. Nessa altura, e porque a sorte continuava alheia à minha
odisseia, fiquei num destacamento logo a seguir, de nome Chamarra.
"A CCAÇ 2317 foi para Buba e mais tarde foram acabar a sua martirizada comissão em território menos hostil.
"Eu tive, mais tarde, uma passagem rápida por S. Domingos no comando do Pel Caç Nat 50 mas o suficiente para ficar ferido com o rebentamento duma anti-pessoal, salvo erro a 13 de Março de 1970.
"Sou hoje DFA e Coronel" (...).
(2) Vd. postes de:
26 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2688: Construtores de Gandembel/Balana (1): Op Bola de Bogo, em que participou a CART 1689, a engenharia e outros (Alberto Branquinho)
26 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2689: Construtores de Gandembel / Balana (2): O papel da CART 1689 (8 de Abril a 15 de Maio de 1968) (Idálio Reis)
28 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2692: Construtores de Gandembel / Balana (3): Nunca falei em protagonismo pessoal, mas sim da CART 1689 (Alberto Branquinho)
Guiné 63/74 - P2699: Memórias dos lugares (7): A fatídica jangada do Cheche sobre o rio Corubal (Beja Santos)
Foto e legenda: © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Todos nós sabemos que um dos episódios mais trágicos da guerra da Guiné ocorreu no início de Fevereiro de 1969, durante a evacuação de Madina do Boé. No termo da operação da retirada, virou-se a jangada e do acidente morreram 47 militares [ na travessia do Rio Corubal, em Cheche] (1).
Em «Na terra dos Soncó», fiz referência ao doloroso acontecimento por duas vezes: estávamos a jogar à bola com o Pel Caç Nat 53 em Bambadinca quando os céus escureceram com os aviões que apoiaram a evacuação; e quando chegámos andrajosos ao batalhão, depois da flagelação de 19 de Março de 1969, e recebemos o fardamento dos 17 falecidos da Companhia do Paulo Raposo[, a CCAÇ 2405, Galomaro eDulombi, 1968/70].
O que há de macabro nesta imagem que recolhi de um Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, é que ela foi publicada em 1971, portanto deixara de haver presença portuguesa no Boé... e é uma imagem muito bela.
Beja Santos
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Notas dos editores:
(1) Protagonistas desses trágicos acontecimentos foram dois dos alferes milicianos da CCAÇ 2405 que fazem parte da nossa tertúlia, o Paulo Raposo e o Rui Felício. Em depoimentos já aqui publicados, eles negam terminantemente que tenha havido, como causa imediata e directa do afundamento da jangada, qualquer acção do PAIGC.
Sobre o desastre do Cheche, no Rio Corubal, no âmbito da Operação Mabecos Bravios, e sobre Madina do Boé, vd. os postes publicados no nosso blogue (1ª e 2ª série):
17 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - CIX: Antologia (7): Os bravos de Madina do Boé (CCAÇ 1790)
2 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CXXXIII: O desastre de Cheche, na retirada de Madina do Boé (5 de Fevereiro de 1969)
8 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXX: A retirada de Madina do Boé (José Martins)
3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCV: Madina do Boé: 37º aniversário do desastre de Cheche (José Martins)
12 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXVI: O desastre do Cheche: a verdade a que os mortos e os vivos têm direito (Rui Felício, CCAÇ 2405)
7 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P853: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (10): A retirada de Madina do Boé
18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1292: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (Parte I)
15 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1370: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (Parte II)
21 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1388: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (III parte)
Guiné 63/74 - P2698: Simpósio de Guileje: Notas Soltas (José Teixeira) (3): O Abdulai Djaló
Foto 2> Mampatá 2008> A Djubai, sempre alegre e bem disposta
Foto 3> Mampatá 1968> A Djuvai de olho zarolho, mais bonita agora do que em jovem. Como ela se lembrava de mim!
Foto 4> Mampatá 2008> A Adama, mãe do bebé que livrei do paludismo
Foto 5> Mampatá 2008> A família Baldé
Foto 6> Mampatá 2008> Os miudos de Mampatá
Foto 7> Mampatá 2008> A Farmara (ou Fatma) minha lavandera
Foto 8> Mampatá 2008> A Fatma com as cunhadas (mulheres do filho do Aliu Baldé)
Fotos: © José Teixeira (2008). Direitos reservados.
Algumas notas soltas, mas sentidas (1)
(i) O Abdulai Djaló
Ainda não eram sete da matina quando o telefone tocou. Hora serôdia de uma segunda-feira de Páscoa para acordar, quem após muitos anos de labuta, se entregou ao descanso da merecida reforma.
Alô - sou o Abdulai da Guiné ! Quer falar cum sinhor Tissera.
Qual Abdulai seria? O que conheci em Buba? O de Chamarra ? O Abdulai Djaló qui firma na Catió e todas as semanas aparecia, em tempos idos, que muitos dos leitores recordarão, no programa de discos pedidos da emissora oficial da Guiné a pedir a canção Deixa o meu cabelo em paz, para dedicar à sua bajuda, não era com certeza.
Era o Abdulai Djaló meu amigo de Mampatá Forreá, pequena tabanca perto de Quebo, rodeada de guerra por todos os lados, que durante os seis meses que por lá passei, viveu uma paz relativa, pois que apenas sofreu seis ataques, quando Balana, Gandembel, Guileje, Gadamael, Cacine e outros, tinham festival quase diário.
O Abdulai que há dias procurei na sua morança, mas não encontrei.
O Abdulai que após a Independência se ausentou para o Senegal e por lá viveu longos anos, por amor à pele e voltou há alguns anos. Em 2005 ninguém sabia dele.
O Abdulai das longas conversas nocturnas.
Tudo começou quando já noite me recolhia ao abrigo para me entregar nos braços de Morfeu. Uma voz chamou: - Tissera, vem cá!
Era o Abdulai. Estava deitado na enxerga ao lado da esposa. Recém-casados e sem filhos, queriam kunversa cum Tissera. Queriam saber coisas da Metrópole. Difícil foi explicar-lhe que vivia num terceiro andar. Que havia casas com dez e vinte andares.
Como se seguravam? Como se subia lá para cima? Elevadores ? Eram coisas de branco maluco.
E um comboio? Muitas GMC atreladas umas às outras, mas só uma tinha motor e com rodas de ferro!
Na segunda noite estavam novamente à minha espera. Seguiram-se muitas noites di kunversa.
Um dia convidou-me a deitar na cama. Eu, a mulher e ele, ali ficávamos até vir o sono, conversando.
Há dias passei por Mampatá. Abraços, beijos e algumas lágrimas de comoção. A mulher estava lá, mas o Abdulai, esse tinha ido a Bissau. Deu para matar saudades e deixar um abraço.
Agora telefonou para pidir discurpa, dar um abraço e agradecer a minha visita.
Obrigado Abdulai. Até sempre.
(ii) - Mampatá Forreá, terra de gente querida
É a tabanca da Guiné-Bissau eleita pelo meu coração. Nos meses de convivência com as sua população aprendi muita coisa que me foi útil pela vida fora, sobretudo a forma de acolher um forasteiro, a solidariedade de quem vivia como se fossem ermons.
Os usos e costumes do povo Fula. Sentia-me útil e realizado no meio escaldante de uma guerra traiçoeira em que sobrevivia quem conseguisse atirar primeiro e acertar no inimigo, como em todas as guerras.
Voltei lá em tempos de paz. Recebi abraços e beijos, recordei vivências, momentos hilariantes, momentos tristes, momentos de angústia e sofrimento. Palmilhei os mesmos trilhos (continua a não ter ruas alcatroadas, água canalizada e saneamento). Entrei nas mesmas moranças. Encontrei a mesma simpatia nas pessoas. Brinquei com outras crianças.
Pude reencontrar amigos. A Farmara, minha lavandera, continua linda e com a alegria de sempre. O Braima, o Issa, a Answar, mãe da minha bebé, que não consegui ver, agora que já mulher, casou e foi viver para Kumbijá.
A Ádama, mãe da bebé que salvei da morte e passou a ser por opção da mãe, a minha mudjer. De manhã cedo lá vinha ela no colo da mãe trazer água fresquinha ou bananas.
- Mudjer de bó vem parte mantenhas e traz banana pra ti.
À noite lá estava ela na morança à espera que o fermero passasse para partir mantenhas antes de adormecer.
(iii) - Relendo o meu “Diário” > Novembro 1968 / Mampatá /1
... Fui procurado pela irmã mais velha da Fámara Baldé. Trazia-me a sua filha com oito meses que estava doente. Tinha paludismo e estava a entrar na fase crónica, de que quase todos os adultos de raça africana sofrem, os que conseguem escapar na sua fase mais aguda.
A criança apresentava-se muito magra, com 42 graus de temperatura, diarreia e vomitava tudo o que mamava, nem forças tinha para chorar. Acabava de chegar do Hospital de Bissau, segundo me disse a mãe a chorar, sem esperança.
Todos os dias de manhã tinha sua visita. - Fermero parti-me mézinho para minina, na tem febre e bariga ramassa
Que fazer? Eu que apenas tinha aprendido a tratar feridos da guerra!
Estes poucos meses de Guiné ensinaram-me a lutar contra o paludismo nos meus colegas e nos adultos africanos com bons resultados, mas nunca tinha deparado com uma situação tão delicada.
Pedi-lhe para voltar mais tarde que ia pensar o que fazer para salvar a bébé.
Para combater o paludismo nos adultos servia-me de um anti-palúdico injectável misturado com outro injectável para prever a reação negativa do coração. Então pensei que injectando na bébé umas milésimas destes dois produtos talvez salvasse a criança.
Ontem assim fiz, com todo o cuidado, no posto de socorros ao ar livre, no coberto da casa da Answar.
A reacção só se fez sentir cerca de um quarto de hora depois com um pulsar acelarado do coração e um avermelhamento da face.
Depois a acelaração aumentou, os olhos dilataram-se e a menina ficou estática por duas ou três horas.
Que momentos de ansiedade para mim e para aquela mãe que me confiou a sua filha. Esta chorava e dizia: - Tu mataste minina.
Eu pedia-lhe para ter calma e apelava para todos os Santos. Por fim a acelaração do coração começou a baixar e temperatura registou 39 graus. Estava ganha a vida da criança. Abraçamo-nos a chorar um ao outro e a mãe ofereceu-me a menina para minha mulher quando fosse grande.
Ao fim do dia deixei-a levar a menina para a tabanca e chorei sozinho de alegria.
Hoje voltou para me dizer que a minina ká na tem xoro já não vomitou a mamada.
A recuperação foi de cerca de oito dias.
Daí em diante, todos os dias a mãe trazia-me a menina. - Tua mudjer vem parte mantanhas (cumprimentar).
Trazia-me água fresca, numa cabaça, que ia buscar à bolanha a uma nascente de que se servia também o IN. (Que riscos por minha causa).
Trazia-me cachos de bananas e eu tinha de todas as noites ao passar para o meu abrigo ir parte mantanhas à minha mulher. Se não o fizesse, a mãe chamava: - Fermero tu não vens ver tua mudjer e parte mantanhas a ela !"
Dizia-me muitas vezes que quando eu viesse para a Metrópole tinha de trazer a minha mudjer.
Assim foi até sair de Mampatá. Tornei-me um visitante da família Baldé: Fámara, Binta, Auá, e Ádama e, da Answar a mãe da Maimuna...
A Djubai de olho zarolho, mais bonita agora do que em jovem: - Tissera! Mama garandi. Mama piquena, - dizia ela a rir-se enquanto apalpava com a sua mão os seios, hoje escondidos e talvez mais disformes do que eram na altura, recordando o que eu, atrevido, por brincadeira lhe fazia. Se o leitor apreciar as fotografias anexas entenderá melhor esta linguagem, que ela recordou com inaudito prazer e me fez reviver tempos tão belos, quanto perigosos da minha juventude.
A mudjer, ainda viva, do falecido régulo Aliu Baldé, alferes da milícia morto em combate em 1971.
O seu filho, talvez um dos miúdos que no meu tempo de estadia se pinha à porta da cozinha na esperança de “agarrar” uns restitos de comida, a quem agradeço a forma carinhosa e dedicada, como soube ser meu cicerone, nesta aventura.
A famíla da Djovo Ansato, ausente em Bissau, que se juntou toda para me receber.
(iv) - Do meu “diário” > Dezembro,1968 / Mampatá /29
... A bajuda Jobo Ansato ( Joaninha, como eu lhe chamo), começou há tempos a ter um comportamento diferente para comigo. Várias vezes me ofertou fruta, chama-me muitas vezes à noite para a porta do abrigo subterrâneo onde dorme, gosta de conversar comigo e fica ciumenta quando me vê a conversar com outras bajudas, com a Fámara, por exemplo, que é a jovem mais linda que eu vi em toda a minha vida.
Eu, embora notasse essa mudança não conseguia compreender a sua razão de ser. Ontem, como tantas outras vezes fui até à sua tabanca e a conversa virou para os feridos de guerra, as doenças da população e a acção dos enfermeiros e fiquei espantado ao ouvi-la dizer dizer: - No último taque di bandido eu ver Tixera ir por Tabanca, baixo di fogo perguntá tudo dgente si ká na tem firido. A mim nesse dia ficá manga di contente com Tixera. Tixera i amigo di Africano.
Para meu espanto verifico que foi a partir da data do último ataque que sofremos que se deu esta mudança no seu comportamento. Como uma simples acção no cumprimento do meu dever pode influir tanto na maneira de pensar e agir de uma pessoa!...
As crianças que se acotovelavam para me tocar. Os dedos das minhas mãos, não chegavam para tantas mãos.
Calou bem fundo aquele convite da Djuvai: - Tissera volta para cá. Esta casa é para ti!...
Um dia voltarei... de visita.
José Teixeira
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Nota dos editores
(1) Vd. último poste da série, de 23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2676: Simpósio de Guileje: Notas Soltas (José Teixeira) (2): Um abraço de ermons e (más) recordações do Comandante Manecas
Guiné 63/74 - P2697: As últimas, boas, notícias do caso do nosso camarada António Batista (Álvaro Basto, Paulo Santiago e Pereira da Costa)
Vejamos.
No dia 25 de Março pelas 14,57 horas Paulo Santiago dirigia-se a Diana Andringa nestes termos:
Cara Diana:
Já existe alguma resposta ao mail enviado ao Ministro da Defesa? Li, hoje, no blogue a mensagem do Cor Pereira da Costa, pessoa que não conheço. Ainda não falei com o Álvaro Basto, iremos aguardar mais uns dias.
Também estou um pouco indeciso sobre a porta a que hei-de bater. A saga do Batista, que no Verão passado, pensei ser fácil de resolver, está a prolongar-se demais e eu, aqui em Águeda, não tenho muito por onde mexer-me.
Aguardo alguma notícia.
Abraço
Paulo Santiago
2. No mesmo dia pelas 19,31 horas era a vez de Álvaro Basto se dirigir ao Paulo Santiago:
Caro Paulo:
Uma vez mais obrigado pelo teu empenho na resolução deste assunto e claro, obrigado igualmente a todos quantos se esforçaram por ver esta situação resolvida o mais rapidamente possivel.
Acabo de receber um telefonema do António Baptista informando-me que recebeu um ofício comunicando-lhe que o processo dele se encontrava completo e que deveria aguardar o despacho da sua pensão.
Longe de ser um assunto encerrado, a conquista desta pensão é pelo menos um acto da mais elementar justiça da Pátria para com aqueles que tanto deram de si na sua defesa.
Aguardemos pois
Alvaro Basto
3. Às 19,58 horas Paulo Santiago respondia:
Fico feliz com essa tua notícia do ofício recebido pelo Batista. Não lhe telefonei depois do regresso da Guiné, não sabia bem o que dizer-lhe. Aguardemos. Se a conclusão fôr a que esperamos, temos de comemorar juntos com o Batista.
Obrigado a todos e recebam um abraço
Paulo Santiago
4. No mesmo dia, ainda, às 22,29 horas, era a vez do Coronel António Pereira da Costa manifestar o seu agrado face às últimas notícias.
Caros Amigos:
Agrada-me saber que as coisas estão bem encaminhadas para o Baptista, que não conheço, mas que acho, como profissional e ex-combatente, que devo ajudar. Para mim, não tenho dúvidas de que há um erro de identificação, depois de ter lido alguns documentos no Arquivo Histórico Militar e na Comissão para o Estudo das Campanhas de África, cujas fotocópias fiz seguir para o oficial averiguante.
Creio que é fundamental inquirir o Cor Reformado Eurico de Deus Corvacho, que o recebeu no QG/RMNorte, quando ele regressou.
Agora parece-me que seria bom alguém acompanhá-lo ao Porto e conversarem com o oficial averiguante para saberem para onde seguem os autos e qual a tramitação seguinte.
Um Abraço
António Costa
5. No dia 26 de Março, Paulo Santiago dirigia-se ao Coronel António Pereira da Costa e a Diana Andringa assim:
António, Diana:
O Álvaro está no Porto, ele tem sido incansável no acompanhamento ao Batista, tem o
contacto do oficial averiguante. Isto agora vai resolver-se. Estou optimista.
Abraço para todos
Paulo Santiago
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Nota dos editores
(1) Vd. poste de 25 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2680: O caso do nosso camarada António Batista (Carlos Vinhal / Álvaro Basto / Paulo Santiago e Pereira da Costa)
Guiné 63/74 - P2696: O Nosso Livro de Visitas (8): José Maria Almeida, ex-Fur Mil Ranger da CCS/BCAÇ 1877 (Guiné 1966/67)
Camaradas e amigos:
Este primeiro contacto é de apresentação
José Maria Araújo de Almeida, Furriel Miliciano (Ranger), Pelotão de Reconhecimento e Informação, CCS/BCAÇ 1877, Guiné (Fevereiro de 1966/Outubro de 1967).
Funcionário Público aposentado, residente na Av. Bento de Freitas, 603-2º, 4480-656 Vila do Conde.
Desde já, uma saudação de admiração e apreço ao ex-combatente, sem excepção, mas, em particular, àquele que percorreu as picadas e bolanhas da Guiné.
Um forte abraço para Tabanca Grande
José Almeida
2. Em 29 de Março foi enviada uma mensagem a este nosso camarada
Caro José Maria
Estou a dar conta da recepção do teu mail na nossa Tabanca Grande.
Aproveito também para te convidar a aderir ao nosso Blogue, onde serás bem recebido.
Para seres membro de pleno direito da nossa grande família, basta que mandes uma foto do teu tempo de tropa e outra actual (ambas de preferência tipo passe).
Podes e deves contar as tuas estórias e experiências vividas naquela terra que ficou para sempre no nosso coração, enviando, quando for o caso, fotografias para as ilustrar.
Na nossa página, lado esquerdo, poderás consultar as nossas normas de conduta tão naturais como por exemplo respeitar as ideias e a propriedade intelectual de terceiros.
Já agora, um apontamento pessoal, pois eu, embora vivendo desde sempre em Leça da Palmeira, sou natural de Vila do Conde, mais propriamente da freguesia vizinha de Azurara.
Aguardamos as tuas próximas notícias.
Recebe, em nome de toda a Tabanca Grande, aquele abraço.
O teu camarada
Carlos Vinhal
Guiné 63/74 - P2695: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (11): Iemberém, uma luz ao fundo do túnel
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez , algures entre Iemberém e Cananime, na margem direita do Rio Cacine > Simpósio Internacional de Guiledje > 2 de Março de 2008 > Visita, da parte da manhã, ao Acampamanto (Baraca) Osvaldo Vieira, de que se fará um detalhado relato em próximas notas desta viagem memorável à pátria de Cabral...
Mas agora que estou a chegar a Imberém, vindo de Guileje, ao fim de hora e meia de jipe, pela picada poeirenta e imprópria para gente com coluna vertebral (1), deixem-me pôr no ar um pequeno microfilme com o Hino da Guiné-Bissau, que um grupo de jovens, de ambos os sexos, pioneiros de qualquer coisa, irão cantar, amanhã, em pleno Cantanhez... Acho que todos os hinos nacionais são um pouco pimbas, românticos, panfletários (desculpem-me os nacionalistas, puros e duros!...), já que só há hinos nacionais porque há/houve Revoluções e Contra-Revoluções ... Mas não posso deixar de acreditar que esta é, para os guineenses, a sua Pátria Amada... Não posso duvidar da sua sinceridade.... Todos precisamos de um cantinho na terra a que chamemos nossa, a nossa casa, a nossa morança, a nossa aldeia, a nossa tabanca, a nossa nossa terra, a nossa pátria... Mesmo que seja pobrezinha. Cantada ao ar livre, sob as árvores seculares e sagradas da floresta do Cantanhez, a letra de Cabral (com música, por encomenda, de um chinoca, maoísta, que nunca terá posto os pés na Guiné) tem algo que me arrepia, ao olhar para trás, para os últimos trinta e poucos anos do pós-independência da Guiné-Bissau... Ao lançar um olhar, crítico, para a terra (Guiné-Bissau, separada de Cabo Verde, os dois ramos do mesmo tronco...), para o Continente (África), para o mundo que herdámos do Séc. XX...
Como está ainda bem longe, Cabral, o ideal por que lutaste e morreste, tu e tantos outros combatentes da liberdade da pátria (é assim que agora chamam, aqui, aos teus guerrilheiros)... Nada que tu não saibas, ou não soubesses já, que a História é fértil em exemplos de efeitos perversos, de Revoluções que devoram os seus filhos... Tudo isto, para te dizer que os jovens do teu país cantam o teu hino com o mesmo fervor do que qualquer outro jovem noutra parte do mundo, em Portugal, em Cuba, na China... Pelo menos os teus sabem a tua letra, e até a música que foi composta pelo Sr. Xiao He.
E ao mesmo há nele, no poema musicado de Cabral, algo que me emociona, positivamente, ao desejar, para estes jovens, e para os seus pais e/ou avós que aqui combateram, nalus, balantas e outros, a tão frágil paz que leva tempo a consolidar e o tão suspirado progresso que não chega, ou que é tão lento, desesperadamente lento, ou só chega para uma meia dúzia de privilegiados, a nomenclatura do poder e do dinheiro... Esta é a nossa Pátria amada Letra: Amílcar Cabral Música: Xiao He (2) Sol, suor e o verde e mar, Séculos de dor e esperança! Esta é a terra dos nossos avós! Fruto das nossas mãos, Da flôr do nosso sangue: Esta é a nossa pátria amada Refrão Viva a pátria gloriosa! Floriu nos céus a bandeira da luta. Avante, contra o jugo estrangeiro! Nós vamos construir Na pátria imortal A paz e o progresso! (repete as três últimas linhas) Paz e o progresso! Ramos do mesmo tronco, Olhos na mesma luz: Esta é a força da nossa união! Cantem o mar e a terra A madrugada e o sol Que a nossa luta fecundou, Vídeo (1' 45'): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Alojado em: You Tube >Nhabijoes
Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 23 de Março de 2008. "De 1 a 7 de Março de 2008 realizou-se o Simpósio Internacional de Guiledje que contou com a participação de mais de 60 participantes vindos do estrangeiro, para contribuir para o registo da história recente da Guiné-Bissau, para recordar e confraternizar com combatentes, então de lados diferentes da trincheira e para assinalar uma página pioneira de um reencontro de companheiros que nutrem entre si uma grande amizade". Foto e legenda: AD- Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados (com a devida vénia...)
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guileje (1) > 2 de Março de 2008 > Monumento assinalando a passagem, por aqui, da CCAÇ 4942/72, de origem madeirense, mobilizada pelo BII 19 (Funchal).
Há três locais e datas assinaladas no monumento: Mansoa, 3/2/73; Cadique, 27/3/73 (3); Jemberém, 20/4/73. O brazão da companhia era constituído por um Galo, com os dizeres Cantamos de Galo. A unidade designava-se a si prórpia como Pioneiros e Contrutores de Jemberém Também sabemos como se chamavam os seus Grupos de Combate: Os Primitivos (1º Gr Comb); Os Descavilhados (2º Gr Comb); O Zigue-Zague (3º Gr Comb); Os Tais (4º Gr Comb). O nosso camarada A. Marques Lopes já há tempos tinha referido, na lista das unidades que passaram por Barro, na região do Cacheu (onde ele esteve com a sua CCAÇ 3), a existência desta CCAÇ 4942/72, cuja actividade operacional era resumida nestes termos (1): (i) Em princípios de Abril de 1973, seguiu para Cadique, na zona de acção do COP 4, a fim de tomar parte na operação Caminho Aberto, com vista à instalação de uma subunidade em Jemberém [hoje, Iemberém]. (ii) Em 20 de Abril de 1973, após o desembarque [em LDM ou LDG ?] e ocupação daquela área, assumiu a responsabilidade do subsector de Jemberém [ou Iemberém], então criado, iniciando a construção do respectivo aquartelamento e ficando integrada no dispositivo e manobra do COP 4 e depois do BCAÇ 4514/72, e ainda, após reformulação dos limites dos sectores, do COP 5 [ que incluía Guileje]. (iii) Foi substituída no subsector de Jemberém pela CCAÇ 4946/73. (iv) Instalou-se em Barro, a partir de 23 de Fevereiro de 1974, a fim de efectuar a sobreposição e render a CCAÇ 3519. (v) Em 12 de Março de 1974, assumiu a responsabilidade do respectivo subsector de Barro, ficando integrada no dispositivo e manobra do COP 3 e depois do BART 6522/72 e ainda do BART 6521/74. Destacou ainda um pelotão para Bigene, em reforço da guarnição local. Em resumo: esta companhia - de pessoal maioritariamente madeirense (4)- chegou até Jemberém, no coração do mítico Cantanhez, numa região que o PAIGC considerava de há muito libertada, construiu aqui, de raíz, um aquartelamento (de que não há muitos vestígios, visíveis, actualmente), e depois foi substituída por uma companhia mais nova, a CCAÇ 4946/73, em Fevereiro de 1974. Guiné-Bissau > Região de Tomboli > Parque Nacional do Cantanhez > Jemberém (ou Iemberém, de acordo com a toponomia actual) é uma localidade onde a AD - Acção para o Desenvolvimento tem a sua base operacional (instalações de apoio aos projectos desenvolvidos no Cantanhez). Por aqui também passou a 1ª CART do BART 6521/72 (1972/74)... De acordo com a inscrição que se encontra na base do respectivo monumento, colocado na actual Praça IMVF [Instituto Marquês Valle Flôr-IMVF ], há também três locais e três datas-chave na história desta companhia: Pelundo, 27 Out 72; Cadique, 21 Jan 73; Jemberém, 20 Abr 73. Tudo indica que os militares da 1ª CART do BART 6521/72 (Os Nómadas) tenham sido os verdadeiros Pioneiros de Jemberém. Outra hipótese é terem estado em Jemberém em sobreposição com a CCAÇ 4942/72, na sequência da Op Caminho Aberto (Abril de 1973). Mas voltemos às notas do viajante (1): Vindos de Guileje, por volta das 17h, chegámos ao fim da tarde do dia 1 de Março de 2008 a Iemberém, para jantar e pernoitar... Ou melhor, para passar o resto do fim de semana, com regresso a Bissau, marcado para segunda-feira de manhã, dia 3. Às cinco da tarde é oficialmente aberto o Simpósio Internacional de Guileje, com conta cerca de 6 dezenas de participantes estrangeiros... De Guileje a Iemberém levámos cerca de hora e meia, por estradas más que exigem boas máquinas e melhores condutores, como o nosso Antero, balanta, que a guerra civil de 1998 trouxe à AD (até então trabalhava como motorista numa ONG sueca, que se fartou dos guiné...). Iemberém foi, para mim, para todos nós, uma caixinha de surpresas, a começar pela luz eléctrica!.. Em Bissau não há luz, à noite, a não ser nos estabelecimentos e nas casas particulares que dispõem de gerador.... Quero destacar, antes de mais, a afabilidade e a hospitalidade da população local, que nos recebeu em festa. E depois tenho que falar, mais uma vez e antes que seja tarde, na eficácia e na eficiência da equipa de apoio logístico da AD - Acção para o Desenvolvimento que tomou conta de nós, que cuidou de nós. Eles merecem um destaque especial, nestas minhas notas de viagem à pátria de Cabral (1). Foram superiormente dirigidos pelo Domingos Fonseca, que jogava em casa, uma vez que é técnico do Programa Integrado de Cubucaré (PIC), de que é director o Abubacar Serra, ocupando-se preferencialmente das acções ambientais em Cantanhez, nos domínios de eco-turismo, formação de professores das EVA (Escolas de Verificação Ambiental), recolha de plantas medicinais e identificação de percursos naturais. Sob o olhar (discreto mas atento) do Tomané Camará e do Pepito, tudo funcionou às mil maravilhas. A tarefa não era fácil: no último dia, antes do nosso regresso a Bissau, o Domingos estava visivelmente cansado... Mais quinze dias, confidenciou-me ele, e baixava... à psiquiatria (que deve ser um supremo luxo na Guiné-Bissau!). Mulher de armas, incansável, deslocada do norte para o sul, eis a Domingas Badinca. Como outros quadros da AD, foi mobilizada para o apoio ao Simpósio, e nomeadamente para a visita dos participantes ao sul. Não sei se deixou em casa marido e filhos. Disponilidade a 100%. "Há mais de um mês que AD está toda, literalmente, envolvida na realização do Simpósio. Todos os demais projectos estão parados" - confidencia-me, baixinho, quase a medo, o Patrão (leia-se, o Pepito, que espantosamente irá ter sempre um low profile durante o decorrer do Simpósio, em Bissau, no Hotel Palace... É aqui, no campo, no interior, no Cantanhez, que ele se sente como peixe dentro de água... É aqui que a gente o apanha com um brilhozinho nos olhos)... Esteve sempre omnipresente, a Domingas, desde Guileje, onde foi servido o almoço para as largas dezenas de convidados da AD, participantes do Simpósio, nacionais e estrangeiros. Com uma camioneta, com a tralha, os talheres, as geladeiras, as bebidas sempre frescas, da cerveja portuguesa à coca-cola mundial, sem esquecer as bebidas artesanais, que fizeram sucesso noalmoço de Guileje, como o Pó de Pila...) Irei novamente encontrá-la nas sessões do Simpósio, no Hotel Palace. Sempre discreta, sempre omnipresente, sempre afável, sempre hospitaleira, sempre preocupada com o bem-estar dos outros, um traço comum à mulher africana. Na equipa da AD ela é responsável dos serviços administrativos e financeiros do programa de desenvolvimento da AD-Norte, zela pelo património, organiza os relatórios de despesas e entradas de fundos e assegura os contactos organizativos com as autoridades locais. Posso - e vou seguramente - cometer a injustiça de omitir nomes da comissão organizadora, de colaboradores da AD que trabalharam anonimamente, discretamente, nas tarefas de apoio à visita ao sul, sem esperar sequer o reconhecimento público ou particular dos hóspedes da AD e do Simpósio. Digo isso por que nem sequer conheci todos ou a maior parte deles. Mas deixem-me que mencione aqui o nome da Cadidjatu Candé, que chamou a si sobretudo as tarefas hoteleiras (vulgo, os comes e bebes). Com ela, e com a Domingas, ninguém passou sede ou fome, em Guileje, em Iemberém ou em Cananime... De qualquer modo, a Candé, pela sua beleza e simpatia, também era difícil não dar nas vistas... Amanhã, domingo, dia 2 de Março, está programado visitar um centro de saúde materno-infantil (ou maternidade ?), uma rádio comunitária e - imaginem - uma TV comunitária. Para quem vem de Bissau, Iemberém não é a porta do paraíso, mas representa uma luz ao fundo do túnel, é um marco de referência, é um farol de esperança... Aqui há gente feliz, sem lágrimas, e miúdos com ar saudável. E diferentes grupos étnico-linguísticos (balantas, fulas, nalús, tandas, sossos...) coexistindo pacificammente, integrados na mesma comunidade... Amanhã de manhã, até os macacos do Cantanhez nos vêm cumprimentar... De repente, olho e vejo Iemberém transformado num acampamento... Algum pessoal (nomeadamente, motoristas dos jipes e escolta policial da ministra...) vai ter que dormir em tendas... Só o pobre do Xico Allen teve que dormir no carro!... E aqui a solidariedade devia ter funcionado e não funcionou, por falha no processo de comunicação: na casa onde eu fiquei, havia três quartos, nove camas e uma casa de banho... Eu fiquei num quarto com o Nuno Rubim e o Pedro Lauret... (Claro, mulheres de um lado, homens do outro). Ao lado, havia uma entrada, espaçosa, com sofás... O Xico, que estava hospedado no Saltinho e veio à pendura, poderia lá ter dormido, connosco... Pobre Xico, jipe não é mesmo o melhor sítio para se dormir em África, queixava-se ele, na manhã seguinte... Escrevi no meu bloco: Oxalá Iemberém se multiplique, já não digo por mil, por dez, por cem, de norte a sul, e de leste a oeste, por toda a Guiné-Bissau. Noutra crónica explicitarei melhor as razões deste elogio... (Continua)
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Notas de L.G.:
(1) Vd. postes de: 8 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2618: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (1): Regresso a Bissau, quatro décadas depois...
9 de Março de 2008> Guiné 63/74 - P2620: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (2): O Hino de Gandembel, recriado pelos Furkuntunda ~
9 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2621: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (3): Pequeno-almoço no Saltinho, a caminho do Cantanhez
11 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2625: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (4): Na Ponte Balana, com Malan Biai, da RTP África
14 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2640: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (5): Um momento de grande emoção em Gandembel
16 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2650: Uma semana involvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (6): No coração do mítico corredor de Guiledje
17 de Março de 2008 > Guine 63/74 - P2655: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (7): No corredor de Guiledje, com o Dauda Cassamá (I)
17 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2656: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (8): No corredor de Guiledje, com Dauda Cassamá (II)
19 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2667: Uma semana memorável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (9): O grande ronco de Guiledje 23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2673: Uma semana memorável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (10): Guiledje: Homenagem ao Coronel Coutinho e Lima
(2) Vd. 7 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2332: O Hino da Guiné-Bissau: letra de Amílcar Cabral e música de Xiao He (Virgínio Briote)
(3) Por Cadique, na margem esquerda do Rio Cumbijã, passou e montou tenda a CCAÇ 4540 ("Somos um Caso Sério"), de 12 de Dezembro de 1972 a 17 de Agosto de 1973: vd. poste de 25 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1876: Restos de aquartelamentos (1): Cadique, na margem esquerda do Rio Cumbijã (CCAÇ 4540, 1972/73) (Pepito)
(4) Vd. poste de 8 de Janeiro de 2008 >Guiné 63/74 - P2421: Em busca de... (15): Pessoal da companhia madeirense que esteve em Jemberem (1973/74) (Luís Candeias, amigo do Arsénio Puim)
sexta-feira, 28 de março de 2008
Guiné 63/74 - P2694: Poemário do José Manuel (5): Não é o Douro, nem o Tejo, é o Corubal... Nem tudo é mau afinal.... Há o Carvalho, há o Rosa...
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cananime > Rio Cacine > 2 de Março de 2008 > Um grupo de participantes do Simpósio Internacional de Guileje (1 a 7 de Março de 2008) atravessam, de canoa motorizada, o Rio Cacine, entre Cananime e Cacine... De cima para baixo: o barqueiro, ao entardecer; o José Carlos Marques, jornalista do Correio da Manhã, em primeiro plano, do lado esquerdo; a discretíssima Catarina Santos, da Fundação Mário Soares, com a sua inseparável máquina fotográfica...
Fotos: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.
1. Mais poemas do dia, do José Manuel Lopes, da Quinta da Graça, no Douro, o José Manuel, muito simplesmente (como era conhecido em Mampatá)... Poemas de um imenso poemário, recebidos, dia a dia, ao longo de uma quinzena, de 16 a 28 de Março de 2008. Foram escritos na Guiné, um por dia.
Por detrás da máscara do José Manuel (que eu não conheço pessoalmente, nem por fotografia, só por voz e por mail), que foi Fur Mil, Op Esp, CART 6250 (Mampatá, 1972/74), há uma voz muito original, pessoal, uma surpreendente revelação da escrita poética sobre a guerra colonial na Guiné... Até agora guardada o baú do sótão...
Muitos dos poemas (assinados por josema) que temos recebido, por e-mail, todos os dias, não têm título. E alguns não estão datados. Vão-se publicando (1), ao sabor da espuma dos dias, e das remessas do poeta, e dos humores do(s) editor(es)... Que já conquistou leitores fiéis aqui, na nossa Tabanca Grande... Eu, o Torcato Mendonça e, seguramente, muitos outros camaradas... Pode morder, que esta poesia é para morder, para comer, para trincar.... (LG).
Calor, cansaço, suor
saudades de tudo
e de um rio...
mas podia ser pior
pois há ali o Corubal
com sombras e água boa
nem tudo é mau afinal
não é o Douro, eu sei
nem o Tejo de Lisboa
são outros os horizontes
falta o xisto e o granito
as encostas e os montes
mas diga-se na verdade
há o Carvalho, há o Rosa
há um hino à amizade
há o Gomes e o Vieira
a sonhar com a Madeira
há o Farinha e o Polónia
gestos e solidariedade
há o Esteves e o Pinheiro
amigos e sinceridade
há o Nina e até amor
também sofrimento e dor
há o desejo de voltar
e um apelo à liberdade.
Josema
Mampatá 1974
Ouve-se um violão
numa noite de luar
tocado pelo Gastão
p'ra algo comemorar
cantigas de Zeca Afonso
de raíz popular
põem magia no ar
mas eis
outro som a chegar
mais grave e persistente
é Guiledje a embrulhar
é a guerra noutra frente
até que o ataque acabe
a festa é interrompida
e recomeça num brinde
à vida da nossa gente.
s/d
As brincadeiras loucas
acabam por ter sentido
se as alegrias são poucas
neste cantinho perdido
já vi tourear uma cabra
entre os arames farpados
e outros ao beber água
ir pelos ares aos bocados
desde o carreiro de Uane
à estrada para Nhacubá
todo o cuidado é pouco
ninguém quer ficar por cá
chegam do patrulhamento
cobertos de pó a suar
anseiam pelo momento
de se refrescar no bar.
Mampatá 1973
josema
Guernica!
pintura
visão, mensagem, recado?
para quem e porquê?
Pearl Harbour, Hiroshima
Londres, Leninegrado
e tantas mais
Vietnam, napalm
e o mundo não reage
se espera que acalme?
se esquece Nabuangongo
Guidage, Guiledje
e as minas de Mueda
dão graças à sua sorte
os regressados
dos corredores da morte
e agora
eis a bomba inteligente
mais importante
que gente
e o mundo estúpido
consente!
s/d
Quantas batalhas e guerras
geradas pela ambição?
quantos pior que feras
mataram o seu irmão?
sem nunca se aperceberem
das causas e da razão
mortes em troca de quê?
a que preço e porquê?
a resposta está no ganho
no lucro que é tamanho.
s/d
Ao menino do papá
"É mais fácil entrar um camelo no cu duma agulha, que
um rico no reino dos céus"
Metam-lhe a agulha no cu
para ver
se ele acorda
não vá morrer de repente
e venha culpar a gente
do encontro
com belzebu.
s/d
O calor húmido nos envolve
abraça-nos a escuridão
e a noite se faz dia
c’o ribombar do trovão
cai a água em catadupa
numa suave carícia
fecho os olhos
que delícia
até sinto um arrepio
sinto-me bem afinal
até chego a sentir frio
e penso que é Natal...
Guiné 1972
Josema
Neste imenso sofrer
pensar Nele ajuda
mas Ele parece não ouvir
então solta-se a raiva
incham as veias do pescoço
outro homem nasce
e cai-se dentro do fosso.
josema
Guiné 1972
Um ruido vem do céu
e há cabeças no ar
hoje é dia de correio
há novas para chegar
faz-se a distribuição
com chamada frente ao bar
para o Santos nada veio
será que vai desmaiar?
p'ró Zé Manel veio a Bola
com as novas do Benfica
p’ró Pinheiro uma encomenda
e alguém lhe manda uma dica
fazendo-se para a merenda
sim de correio foi o dia
não pode haver melhor prenda
é altura de alegria
retiram-se os felizardos
relêem a mesma carta
até afogar a saudade.
Mampatá 1972
josema
Quero irmas não sei onde
tudo
me parece um delírio
sem sentido nem razão
neste mundo desumano
quero fugir
mas não posso
prende-me
o sentir-me solidário
à união dos Unidos (*)
prende-me
o cheiro a mosto
prende-me
o calor de Agosto
prende-me
um regresso ao Douro
prende-me
uma família que espera
por tudo isso
não posso partir.
Bolama 1972
Josema
(*) Cart 6250, Os Unidos
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Nota de L.G.
(1) Vd. postes anteriores:
27 de Fevereiro de 2008 >Guiné 63/74 - P2585: Blogpoesia (8): Viagem sem regresso (José Manuel, Fur Mil Op Esp, CART 6250, Mampatá, 1972/74)
3 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2608: Poemário do José Manuel (1): Salancaur, 1973: Pior que o inimigo é a rotina...
9 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2619: Poemário do José Manuel (2): Que anjo me protegeu ? E o teu, adormeceu ?
13 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2630: Poemário do José Manuel (3): Pica na mão à procura delas..., tac, tac, tac, tac, tac, TOC!!!
19 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2665: Poemário do José Manuel (4): No carreiro de Uane... todos os sentidos / são poucos / escaparão com vida ? / não ficarão loucos ?
Guiné 63/74 - P2693: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos (25): A festa do meu casamento, 7 de Fevereiro de 1970
Foto 2 > "O major [de operações, Herberto ] Sampaio pontifica, calmo porque bem jantado, o Abel [da CCAÇ 12], de costas, parece escutá-lo, estava com um ataque de paludismo, o capitão Figueiras diz uma pilhéria ao tenente Pinheiro, o já falecido Rodrigues [ da CCAÇ 12] a tudo assiste bem disposto, de costas o Augusto, o Valentim da Justiça e o Reis sapador [os três da CCS], atrás do Rodrigues, que ainda tentou uns conflitos pela noite fora" (BS)...
Foto 3: "o Tenente Pinheiro estava jocoso, coisa rara, não falou em autos nem nada que se relacionasse com secretaria, o Vidal Saraiva [ o médico,] deve ter correspondido à observação ambígua do capitão Figueiras, íamos na 1ª rodada de cervejas, eu ainda não sabia o que a noite me reservava" (BS)...
Fotos (e legendas): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Texto do Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), enviado, com correcções, em 15 de Janeiro de 2008:
Operação Macaréu à vista > Episódio n.º XXV > HOJE É A FESTA DO MEU CASAMENTO! (1)
por Beja Santos
(i) Conversas desgarradas entre o edifício do comando e a escola
O Moreira e eu saímos em bicos de pés do nosso quarto, o Abel tirita debaixo de dois cobertores de papa, destila os suores do paludismo, gemeu toda a noite. Tomo o pequeno almoço à pressa, tenho que levar um oficial superior de Bafatá em visita aos Nhabijões, segue-se o serviço de justiça, prometi ao tenente Pinheiro que o auto dos dois militares que se feriram recentemente na rampa de Bambadinca ficará adiantado antes de eu partir, ao anoitecer, para a ponte de Udunduma, onde ficaremos quatro dias.
À porta, espera-me o Cherno com a lista de pedidos para as compras a fazer na Europa (falei no meu casamento, entreolharam-se quando falei numa cerimónia por procuração, em África um homem quando casa vai buscar a mulher à tabanca dos pais dela). Bala, o ordenança do comando, acena-me, indicando que sou chamado ao 1º comandante. Com o oficial superior de Bafatá já a impacientar-se junto ao Unimog onde aguarda uma secção do Pel Caç Nat 52, apresento-me a Jovelino Corte Real. Segue-se na minha imaginação o diálogo travado:
- Beja, hoje não vai à noite para a ponte de Udunduma, mandei fazer uma cerimónia, jantamos, haverá bolo e espumante. Não casamos todos os dias. Amanhã de manhã junta-se aos seus soldados. Falei com o coronel Neves Cardoso, do agrupamento de Bafatá, acerca da sua licença, com carácter excepcional, ele só vê dificuldades, recomenda mesmo que não se deposite mais esperanças na iniciativa, o RDM é taxativo. Ontem lembrei-me de falar com o Vidal Saraiva, pedi-lhe a opinião sobre uma sua baixa, você aparecia em Bissau para um hipotético tratamento, ele escreveria um relatório para o Payne, simulava-se um internamento.
- Meu comandante, agradeço-lhe essa prova de consideração. Mas parece-me bastante macabro eu ir casar e ter que ir parar ao hospital. Deixe-me pensar uns dias, por favor.
- Não comece com a sua retórica. Você é punido no início de 1969, em Missirá, recorre, e muitos meses depois, mesmo com a alteração de redacção da punição, fica tudo na mesma. O RDM é mudado, ninguém que seja punido pode gozar férias a não ser dois anos depois, nessa altura você já está na Metrópole, não sei o que é que quer que lhe faça. Resolve casar-se, requer uma licença para ter casamento religioso, era o que faltava que o deixasse casar aqui na capela do aquartelamento de Bambadinca, em pleno teatro de operações. Para ir a Bissau é preciso um pretexto, em Janeiro esteve lá a tratar-se uns dias, qual é o problema de se simular uma recaída? Tem proposta melhor?
- Não tenho, meu comandante. Só que não me passou pela cabeça ir para lua de mel e ser hospitalizado. Vou só reconsiderar e agradeço-lhe o que está a fazer por mim. Permita-me agora que parta para os Nhabijões, quero estar aqui ao meio dia para falar com a minha mulher, felicitá-la em primeira mão.
Como se tratava de um dia extraordinário, ao preparar-me para subir ao Unimog, D. Violete chama-me com determinação, sem possibilidade de lhe fugir ao que tinha para me dizer. Sim, tem novidades para mim, andou a remexer nas estantes, lá em casa, encontrou uns livros do comandante Teixeira Mota e um texto sobre o islamismo na Guiné Portuguesa onde se fala da conversão dos mandingas e da islamização dos soninqués, dos beafadas, dos fulas-pretos e dos fulas-forros. E disse-me algo como isto:
- Sr. alferes, já sei de onde é que vêm os Mané, a tal família do Cuor. Li que os balantas islamizados procuram distinguir-se dos animistas adoptando o apelido Mané, que é de origem mandinga. Temos pois os Soncó, que eram beafadas, e temos os Mané que eram balantas.
Sem lhe esconder a minha satisfação pela informação, pedi-lhe licença para continuarmos a conversa depois, sugeri-lhe um encontro em breve, o oficial de Bafatá acompanhou esta conversa visivelmente intrigado.
Desempenhei-me na missão dos Nhabijões, eram dez para o meio dia quando entrei nos correio de Bambadinca. Depois de uma vozearia ao bocal, indicam-me a cabina, e começo igualmente aos gritos para Lisboa. Os senhores das Conservatória estão a chegar, a casa está cheia de familiares e camaradas da Guiné. Não preparei nenhum discurso, saiu-me tudo aos tropeções: que andava a ler Naná, de Émile Zola; que se podiam ouvir os prelúdios de Chopin, o disco estava encarquilhado pelo sol, mas uma das faces era audível; que o amytal sódico estava a dar bons resultados, mesmo na ponte de Udunduma, com os cibes em decomposição com os bichinhos tipo serradura a caírem na cama, não dava por nada, dentro do mosquiteiro; que estava a terminar a minha gerência de messe e que ia passar as contas ao Augusto, uma complexa contabilidade de queijo, conservas e bebidas alcoólicas e outras.
A Cristina ouvia toda esta cantilena como se fosse a coisa mais natural do mundo eu estar preocupado em dia de casamento com o inventário do fardamento, as qualidades do cabo Queirós, proposto para o prémio Governador da Guiné, depois perguntei quem lá estava, se ela se sentia feliz, ela respondeu-me a tudo, mas queria saber quando é que eu previa chegar a Lisboa.
Não sei como é que arranjei coragem para lhe dizer a verdade, informando-a mesmo que o comandante propusera qualquer coisa como uma baixa psiquiátrica para eu ir até Bissau, prometi escrever-lhe, queria saber a sua opinião. Assegurei que lhe ia telefonar novamente dentro de dias, depois as nossas vozes embargaram-se, falei de saudades, dei comigo a repetir tudo o que escrevia nos aerogramas. A cabina dos correios tinha a porta aberta, vi expressões arrelampadas, certamente não estavam à espera de assistir a um casamento por telefone.
(ii) A festa na messe de Bambadinca
O capitão Figueiras, comandante da CCS [do BCAÇ 2852], pediu-me à hora do almoço para ir levar doentes à Bantajã Mandinga e à Ponta Brandão (era uma serração de madeira, havia lá um alambique para a aguardente de cana, um dos irmãos Brandão tinha ali também um estanco) e depois a Bricama, entregando umas mercadorias no agrupamento de Bafatá e trazendo correio.
Aproveitei o resto da tarde para comunicar ao mundo o meu estado de alma, acabara de me casar. Registei no aerograma à Cristina:
“Tudo mudou, sopra um novo vento, mas estranho esta nossa vida em comum... Há momentos em que a solidão é irrecusável, ficamos entregues a um disco, a uma leitura, a uma recordação que se irá dispersar quando eu partir para Sinchã Dembel, Queroane ou Bambadincazinho. Amanhã escrevo-te mais da ponte de Udunduma. O Pires vai de férias, contar-te-á os últimos acontecimentos. Decidi recomeçar com as lições escolares, há um plano de obras na ponte, não quero parar”.
Não esqueci a ementa do jantar, pois o Gomes da messe tudo fez para que fosse uma refeição especial, até o vinho era bebível, havia pataniscas e depois bifes tenros, bem apimentados. Findo o jantar, aclimatámos à volta de uísques e cervejas, veio depois um bolo, entregaram-me uma catana para o cortar, seguiram-se discursos do Jovelino Corte Real e do major Sampaio, o Vacas de Carvalho e o Calado entoaram cantares alentejanos, cada ronda de felicitações era acompanhada de uma rodada de álcool, nas fotografias que restam vejo os sorrisos de todos, o tenente Pinheiro conseguiu nunca falar de serviço, o Abel saiu da cama, o Reis sapador tentou implicar, o calvário veio depois, tive que fazer e refazer a cama um sem-número de vezes, os ferros presos por arames, os lençóis cheios de açúcar, de manhã antes de partir para a ponte de Udunduma enxuguei-me a uma toalha cheia de sal. Assim mudara a minha vida.
(iii) Um novo serão com D. Violete
No regresso da ponte, não resisti a procurar D. Violete, ela, sempre prestável, dava as explicações que podia. Sim, Abdul Injai fora régulo do Oio (talvez tenha sido também régulo do Cuor, mas não tinha a certeza), tivera relações péssimas com a população, era um jalofo do Senegal, caíra rapidamente em desgraça, fora deportado para a Madeira mas morrera em Cabo Verde; não tinha nenhuma teoria sobre o fundamento das tensões entre os caboverdianos e os guineenses, ela própria era filha de caboverdiano, era bom não esquecer que o caboverdiano chefiava sempre, era chefe de posto, notário, conservador, professor, médico e farmacêutico, consideravam-se pessoas civilizadas (não eram indígenas como os outros), eram cristãos, sentiam um ascendente natural sobre gente que por vezes nem o crioulo arranhava, mas considerava que não havia razão especial, um dado estrutural, para se falar em racismo; quanto ao islamismo, conversa que tínhamos iniciado, de facto fora a religião de Mafoma que levara à reorganização das etnias, os mandingas e os soninqués tinham no passado empurrado os beafadas e os balantas para o litoral, vieram depois os fulas, muitos séculos depois dos mandingas, instalaram-se no Gabu, tinham feito uma guerra religiosa perto do fim do século XIX e depois aliaram-se aos portugueses nas chamadas guerras da pacificação, já no século XX. O islamismo apareceu apoiado pelos postos militares portugueses, os caramôs ou os agentes religiosos do Islão, vinham da Gâmbia e do Casamansa, instalaram-se em Jabicumba, no regulado de Gussará, e em Bijine, no regulado de Badora.
Agradeci tudo à professora Violete, pedi-lhe para que a nossa próxima conversa andasse à volta das doenças mais correntes e dos animais da Guiné. Ela sorriu:
- Sr. alferes, só me faltava andar a estudar para satisfazer a sua curiosidade. Ando surpreendida com a descoberta destes séculos de história que os portugueses tanto ignoram, eles que mandaram sobretudo analfabetos e criminosos colonizar esta terras.
Capa de Djamília, de Tchinghiz Aitmatov Foi uma surpresa, esta novela oriunda das estepes da Ásia Central.Pode não ser a mais bela história de amor do mundo, mas é quase.Capa de João da Câmara Leme, Livro de Bolso da Portugália Editora,v s/data, tradução, a partir da versão francesa , de Alfredo Brás.
Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
(iv) Uma semana de livros policiais e uma revelação vinda da Quirguízia
Eu ainda não sei que este mês de Fevereiro está a levedar a minha experiência operacional mais violenta, e que tudo vai ocorrer já mês de Março. O prisioneiro que eu levara a Bissau vai fugir num patrulhamento na região do Buruntoni; em Ponta Varela o inimigo atacou com gravidade embarcações que avançavam para Bambadinca; a tabanca do Enxalé irá ficar incendiada numa flagelação; o capitão Maltez, do Xime, ficará ferido num patrulhamento na margem esquerda do rio Geba. Neste entretanto, continuarei a exercer as minhas funções de recoveiro e julguei enlouquecer quando soube da morte do meu mais querido amigo. Como irei contar.
Numa Noite Solitária, de Mickey Spilklane. Capa de Luis Filipe de Abreu,tradução de H.Silva Horta,Editora Ulisseia,s/data.A Ulisseia tentou, nos anos 60, uma alternativa à Colecção Vampiro,escolhendo autores como Craig Rice e Horace McCoy, sem fugir aos consagrados Dashiell Hammett e Agatha Christie.este livro de Spillane está solidamente escrito,mas não tem originalidade face a outras aventuras de um lendário detective justiceiro, Mike Hammer.
Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Li de Mickey Spillane “Numa Noite Solitária”, Mike Hammer, o mais solitário dos detectives justiceiros descobre uma rede comunista que se prepara para conquistar o Capitólio. Só o macartismo podia permitir esta literatura de ódio, o tratamento dos comunistas norte-americanos como bandidos, agentes do Kremlin, apátridas, desgraçados morais, gente totalmente inescrupulosa. Hammer liquidara na ponte de Brooklin um assassino que se preparava para matar uma mulher em fuga. Ambos tinham cartões verdes que eram códigos de identificação de membros do partido comunista. Entretanto, surge o nome Lee Deamer, candidato às próximas eleições para senador, que tem um estranho irmão gémeo. Começa uma caçada que termina com a justiça feita por Hammer executando o cabecilha dos comunistas, exactamente na mesma ponte onde tudo começara. Tirando esta demência do macartismo, Spillane escreve como poucos, é um controle exímio das frases da expressão dos sentimentos, um registo que por vezes roça o sublime das cores, dos movimentos, das paixões.
Capa de O primeiro inquérito de Maigret, de Georges Simenon. Capa de Cândido da Costa Pinto,tradução de Maria Ivone d. Alves,nº83 da Colecção Vampiro.Simenon desenhou neste livro personagens espantosas e uma admirável atmosfera da Belle Époque,sem hesitar na crítica a esse tempo de permuta de favores sociais e políticos, onde a polícia não era excepção.
Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Noutra dimensão, voltei contente à leitura de Georges Simenon, neste caso O primeiro inquérito de Maigret. Um flautista apresenta-se numa esquadra onde Maigret é secretário do comissário, tudo se passa em 1913. Vira uma mulher gritar por socorro numa varanda de um prédio, batera á porta, fora espancado por um mordomo, vinha apresentar queixa. Maigret acompanha-o ao local, descobre que é a casa dos Gendreau-Balthazar, dos famosos cafés Balthazar. Percorre toda a casa, vê mesmo o aposento onde ocorrera o pedido de socorro, não há indícios. Maigret não se conforma e vai começar o seu primeiro inquérito, afinal houvera falsas declarações do mordomo e do dono da casa, descobrir-se-á o móbil do crime, Maigret terá conversas com um escroque cheio de sentimentos, Dédé, uma das mais notáveis criações de Simenon, um pouco como o flautista Justin Minard que além de trabalhar nos Concertos Lamoureux, uma das mais prestigiadas orquestras clássicas em França, também toca em cervejarias e cafés. É um grande Simenon que não disfarça a critica social e política em torno dos favores que a polícia faz aos ricos, encobrindo-os. É a seguir ao desenlace deste caso que Maigret é transferido para o lendário Quai des Orfévres.
Outra grande revelação é Djamília, de Tchinghiz Aitmatov, natural da Quirguízia. O poeta Louis Aragon teceu o seguinte comentário a esta obra: “A mais bela história de amor do mundo. Uma história a um tempo breve e intensa. Uma história de amor onde não há uma palavra inútil, uma frase que não tenha eco no coração”.
Tudo começa com uma recordação à volta de um pequeno quadro com uma estepe de absintos onde se vêem as pegadas de dois viajantes que se vão desvanecendo na distância. É uma recordação de juventude, uma história de amor durante a guerra, os adultos combatiam nas frentes de batalha, em plena Rússia, os velhos, as mulheres e as crianças trabalhavam nos kolkhozes. O irmão do narrador partira para a guerra, ficara a sua mulher Djamília, a cargo da dona da casa, a sogra desta heroína. São lindas descrições realçadas pela simplicidade:
“Havia em Djamília um não sei quê que desconcertava aos sogros. Ela manifestava uma alegria sem disfarce, como a de uma garoto. Algumas vezes ponha-se a rir sem motivo e, apesar disso, o seu riso era tão forte, tão alegre! Quando regressava do trabalho, não reentrava simplesmente em casa, mas corria para a porta, atravessando o aryk de um salto e punha-se a beijar e a abraçar, sem haver porquê uma ou outra das suas sogras. E Djamília gostava também de cantar; estava sempre a cantarolar qualquer coisa, sem se acanhar com a presença dos mais velhos. Tudo isto, sem dúvida, em nada correspondia à representação que se fazia da aldeia da conduta de uma nora em família”.
Portanto, Djamília tinha o seu marido Sadyk a combater contra os alemães. À aldeia vai chegar Daniiar, ferido em combate, sempre a coxear da sua perna ferida. O narrador mostra um ex-combatente introvertido que gradualmente se afeiçoa por Djamília, sendo a inversa também verdadeira. Acabarão por fugir, durante a fúria dos familiares e de toda a comunidade É este desaparecimento que o narrador fixará numa tela, registando a impressão que lhe provocara tão lindo amor:
“Eles caminham na estepe outonal. Diante deles, os longes vastos, luminosos... o meu quadro é-me infinitamente querido, é a minha primeira emoção consciente de criar. Ainda hoje tenho desânimos, minutos pesados em que perco a fé em mim. E em tão volto-me para este quadro que me é caro, para Daniiar e Djamília. Onde estais agora, marchais sobre que estradas? Tu partiste, minha Djamília, pela larga estepe, sem olhar para trás. Terás perdido a fé em ti? Apoia-te a Daniiar. Que ele te cante a sua canção sobre o amor, a terra, a vida! Que a estepe se agite e exiba todas as suas cores! Vá, Djamília, não te arrependas, tu encontraste a tua difícil felicidade!”.
É em Daniiar e Djamília que penso quando vamos para a ponte de Udunduma. Também eu estou a viver a mais bela história de amor do mundo.
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Nota dos editores:
(1) Vd. último poste, desta série: 21 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2668: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (24): Cartas de Bambadinca, Janeiro / Fevereiro de 1970
Guiné 63/74 - P2692: Construtores de Gandembel / Balana (3): Nunca falei em protagonismo pessoal, mas sim da CART 1689 (Alberto Branquinho)
Camarada Luis Graça
Estou profundamente infeliz por ter sido mal entendido pelo Idálio Reis (2), tendo presente o que ele e a sua Companhia terão sofrido durante os muitos meses que terão permanecido naquele inferno depois de 15 deMaio de 1968.
Quanto ao protagonismo - nunca falei de mim. Falei da minha Companhia - CART 1689.
Quanto ao narcisismo e diletantismo narcisista que encontro ao longo do blogue, nada tem a ver contigo e muito menos com o Idálio Reis, repito MUITO MENOS com o Idálio Reis, que NUNCA fala de si, mas só da sua Companhia e das fotografias que lhe vi já publicadas, ele nunca consta. Se entenderes necessário que eu identifique os casos do «...gosto de falar de mim», eu identificarei.
Não faço questão que este texto seja publicado no blogue (fica ao teu critério ), mas PEÇO o reencaminhes para o Idálio Reis, para que repense o juizo que fez de mim, que me deixou muito infeliz.
Um abraço (e continua a trabalhar NISTO, que é positivo).
Alberto Branquinho
2. Nova mensagem do Alberto Branquinho:
Caro Luis Graça
Obrigado. É verdade. Para completar as informações - conheci o Eng. Carlos Schwarz ( a quem chamam Pepito) em 1999, em Bissau, ao tempo em que era Ministro dos Transportes do governo Francisco Fadul. Fomos com ele por Farim, Susana e Varela, onde dormimos, em casa sua. Essa zona noroeste da Guiné era, afinal, aquela que eu não conhecia do tempo da guerra. Dali fomos (já sem ele) de jeep até Dakar, onde apanhámos um avião para Lisboa.
Para que a nota do Idálio Reis não fique sem clarificação, gostava que publicasses o seguinte texto:
ASS: Construção de Gandembel/Balana
Fiquei mui triste com a parte introdutória do escrito do Idálio Reis. Em primeiro lugar, porque ninguém lhe quer negar o sofrimento e a sobrevivência de nove ou dez meses no inferno de Gandembel; segundo, porque fez de defensor de quem não foi acusado e, em terceiro lugar, porque presumiu que eu conhecia todos os seus textos, quando eu só tinha tropeçado em um ou outro. ( Agora, com os links do comentário final do L.G. fiquei a saber mais ).
Para terminar, pela minha parte, esta troca de notas, venho dizer o seguinte:
- Todos os que fizeram afirmações, ao longo do blogue, quanto à construção de Gandembel/Balana devem considerá-las como corrigidas, referindo que a construção foi efectuada «... pelo capitão F....?.... e pelos seus homens-toupeira da CCAÇ 2317, with a little help from their friends.» ( Que viveram, também, como toupeiras durante quase um mês e meio em Gandembel ).
Este é o serôdio protagonismo que quero para a minha CART 1689, não para mim. Sem voltas e sem amêndoas está explicado.
Nada mais direi sobre este assunto.
Um abraço
Alberto Branquinho
3. Mensagem que mandei ao Idálio Reis (c/c ao Alberto Branquinho e os co-editores do blogue, CV e VB), para fecho desta troca de impressões/recordações entre dois valorosos construtores e defensores de Gandembel/Balana (ou melhor, representantes de duas das nossas unidades que estiveram lá):
A última coisa que eu quero é gente infeliz no blogue e na Tabanca Grande... O Branquinho - que eu sei, pelo Jorge Cabral, que é irmão do outro Branquinho, o ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 63, do meu tempo de Bambadinca - já percebeu que entre nós não há ressentimentos: tratamo-nos por tu, como velhos camaradas, e nunca puxamos pela G3 contra um camarada...
Com três anos de comissão bloguística, aprendemos todos a viver e conviver com o que nos identifica e com o que nos separa ou pode ser fracturante... O que temos em comum é um património valiosíssimo que eu quero que o Alberto também partilhe... A partir de hoje ele faz parte integrante da nossa Tabanca Grande, com direito a figurar na lista nominal de A a Z, da coluna do lado esquerdo da página de rosto do blogue... A menos que ele me dê ordens em contrário... Idálio, e os meus caros co-editores, CV e VB, podem dar-lhe as boas vindas... Quem bebeu da água do Balana só pode ser uma camarada fixe... Luís
(1) Vd. poste de 26 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXV: Estórias do Xitole ao Saltinho: duas pontes, um fornilho e uma trovoada tropical (David Guimarães)