Timor Leste > Um país montanhoso, de paisagens luxuriantes... A muitos sítios no interior, só se consegue chegar de "motor" (motorizada), mesmo que o "pendura", em muitos troços, tenha que ir a "penantes" (como é o caso, aqui, do Rui Chamusco, na primeira foto de cima)
Fotos: © Rui Chamusco (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Escola Portuguesa Ruy Cinatti > Festa final de ano 2024/25 (vídeo, 5' 40'') (com a devida vénia...).
(A Escola Portuguesa de Díli - Centro de Ensino e Língua Portuguesa Ruy Cinatti, fundada em 2002, é um estabelecimento de de ensino pré-escolar, primário e secundário localizado em Díli, Timor-Leste., frequentada por alunos timorenses, portugueses e de outras nacionalidades)
1. Rui Chamusco, membro da nossa Tabanca Grande desde 10 de maio último, é cofundador e líder da ASTIL (Associação dos Amigos Solidários com Timor-Leste), criada em 2015 e com sede em Coimbra.
A ASTIL fundou e administra a Escola de São Francisco de Assis (ESFA), nas montanhas de Liquiçá, Manati / Boebau (pré-escolar e 1º ciclo) e tem também em curso um programa de apadrinhamento de crianças em idade escolar. (Havia, então, em Boebau, 150 crianças sem acesso à educação.)
Lourinhã > 2017 > Rui Chamusco e Gaspar Sobral, casado com a Glória Lourenço, professora do ensino secundário, conterrânea e amiga do Rui. A família Sobral tem um antepassado comum que foi lurai, régulo, no tempo dos portugueses. As insígnias do poder (incluindo a espada) estão na posse do Gaspar, que vive em Coimbra. A família Sobral andou vários anos pelas montanhas de Luiquiçá e de Ermera, tentando escapar à tirania dos ocupantes indonésios. O Gaspar esteve 38 anos fora da sua terra, só lá voltando em 2016, com o Rui.
1. Esta segunda viagem e estadia do Rui Chamusco (de 27 de janeiro a 14 de junho de 2018) (*), em Timor Leste, em missão solidária, culminaria com a inauguração da Escola de São Francisco de Assis (ESFA), em 19 de março de 2018, em Boebau, Manati, nas montanhas de Liquiçá, evento já aqui relatado.
Através da família Sobral, um exemplo de "resistência e resiliência", e das crónicas do Rui, vamos conhecendo melhor Timor-Leste, de ontem e de hoje:
Estas crónicas têm um enorme interesse para se perceber melhor o que é hoje a República Democrática de Timor Leste, país membro da CPLP, com o qual mantemos laços históricos, e sobretudo afetivos, tal como mantemos com a Guiné-Bissau e outras antigos territórios que estiveram sob a administração portuguesa em África e na Ásia.
Enfim, estas crónicas, que o Rui Chamusco partilha connosco, acabam por ser um privilégio, para os nossos leitores, amigos de Timor Leste e/ou promotores da lusofonia.
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Nota do editor:
Último poste da série > 29 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25699: II Viagem a Timor: janeiro / junho de 2018 (Rui Chamusco, ASTIL) - Parte V: O país da diversidade, onde umas vezes apetece partir, e outras vezes apetece ficar
Professor de música, do ensino secundário, reformado, natural do Sabugal, e a viver na Lourinhã, o Rui tem-se dedicado de alma e coração a estes projetos solidários no longínquo território de Timor-Leste.
Desde a sua primeira viagem a Timor-Leste, no 1º trimestre de 2016, que ele vai escrevendo umas "crónicas" para os membros da ASTIL e demais amigos de Timor Leste. Temos estado a recuperar essas crónicas, agora as da segunda estadia, em 2018 (*).
Desde a sua primeira viagem a Timor-Leste, no 1º trimestre de 2016, que ele vai escrevendo umas "crónicas" para os membros da ASTIL e demais amigos de Timor Leste. Temos estado a recuperar essas crónicas, agora as da segunda estadia, em 2018 (*).
O Rui Chamusco partiu para Timor, em 25 de janeiro de 2018, com o seu amigo, luso-timorense, Gaspar Sobral, cofundador também da ASTIL. Em Dili ele costuma ficar na casa do Eustáquio, irmão (mais novo) do Gaspar Sobral, e que andou, com a irmã mais nova, a mãe e mais duas pessoas amigas da família, durante três anos e meio, refugiado nas montanhas de Liquiçá, logo a seguir à invasão e ocupação do território pelas tropas indonésias (em 7 de dezembro de 1975) (tinha "apenas" 14 anos...).
Lourinhã > 2017 > Rui Chamusco e Gaspar Sobral, casado com a Glória Lourenço, professora do ensino secundário, conterrânea e amiga do Rui. A família Sobral tem um antepassado comum que foi lurai, régulo, no tempo dos portugueses. As insígnias do poder (incluindo a espada) estão na posse do Gaspar, que vive em Coimbra. A família Sobral andou vários anos pelas montanhas de Luiquiçá e de Ermera, tentando escapar à tirania dos ocupantes indonésios. O Gaspar esteve 38 anos fora da sua terra, só lá voltando em 2016, com o Rui.
Foto: Arquivo do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2017)
1. Esta segunda viagem e estadia do Rui Chamusco (de 27 de janeiro a 14 de junho de 2018) (*), em Timor Leste, em missão solidária, culminaria com a inauguração da Escola de São Francisco de Assis (ESFA), em 19 de março de 2018, em Boebau, Manati, nas montanhas de Liquiçá, evento já aqui relatado.
Através da família Sobral, um exemplo de "resistência e resiliência", e das crónicas do Rui, vamos conhecendo melhor Timor-Leste, de ontem e de hoje:
Estas crónicas têm um enorme interesse para se perceber melhor o que é hoje a República Democrática de Timor Leste, país membro da CPLP, com o qual mantemos laços históricos, e sobretudo afetivos, tal como mantemos com a Guiné-Bissau e outras antigos territórios que estiveram sob a administração portuguesa em África e na Ásia.
Enfim, estas crónicas, que o Rui Chamusco partilha connosco, acabam por ser um privilégio, para os nossos leitores, amigos de Timor Leste e/ou promotores da lusofonia.
II Viagem a Timor: janeiro / junho de 2018 (Rui Chamusco, ASTIL)
Parte VI - Uns com tanto,
e outros com tão pouco
06.04.2018, sexta feira - Investimento ou desperdício
Hoje estive de novo na escola Rui Cinatti, uma escola verdadeiramente portuguesa num contexto timorense. Os créditos que este estabelecimento de ensino foi granjeando ao longo dos anos são sobejamente conhecidos. Frequentar esta escola é motivo de orgulho para qualquer aluno e família.
Hoje estive de novo na escola Rui Cinatti, uma escola verdadeiramente portuguesa num contexto timorense. Os créditos que este estabelecimento de ensino foi granjeando ao longo dos anos são sobejamente conhecidos. Frequentar esta escola é motivo de orgulho para qualquer aluno e família.
Com programas e funcionamento do calendário escolar português, aqui são administrados conhecimentos, saberes e atitudes que muito dignificam mais de mil alunos, respetivos professores e auxiliares de ação educativa (mais ou menos sete dezenas). As condições físicas deste estabelecimento fazem inveja a muitas escolas de Portugal. Tudo é tratado com muito respeito; tudo parece bem. Mas por detrás de todo este cuidado está o zelo, a competência e a dedicação da sua direção, concretizada na pessoa do Dr. Acácio.
Perante os números astronómicos indicados em investimentos à vista, fala-se quase sempre em milhões, quase instintivamente perguntei: “quem paga isto tudo?” A resposta foi pronta e clara: “ O ministério da Educação e a embaixada de Portugal”. Se acrescentarmos a tudo isto os gastos mensais com o pagamento a professores e auxiliares de educação poder-se.á ter uma ideia do bolo mensal que aqui é investido.
Tudo bem. Dão-se os meios e atingem-se os fins. Dito de outra maneira, “as árvores conhecem-se pelos seus frutos”. Mas sem qualquer preconceito ou acusação, dou comigo a pensar: “se nós dispuséssemos de uma ínfima parte do que aqui se gasta para apetrechar e fazer funcionar a nossa escola de São Francisco de Assis em Boebau.”
Perante os números astronómicos indicados em investimentos à vista, fala-se quase sempre em milhões, quase instintivamente perguntei: “quem paga isto tudo?” A resposta foi pronta e clara: “ O ministério da Educação e a embaixada de Portugal”. Se acrescentarmos a tudo isto os gastos mensais com o pagamento a professores e auxiliares de educação poder-se.á ter uma ideia do bolo mensal que aqui é investido.
Tudo bem. Dão-se os meios e atingem-se os fins. Dito de outra maneira, “as árvores conhecem-se pelos seus frutos”. Mas sem qualquer preconceito ou acusação, dou comigo a pensar: “se nós dispuséssemos de uma ínfima parte do que aqui se gasta para apetrechar e fazer funcionar a nossa escola de São Francisco de Assis em Boebau.”
Os restinhos que aqui sobejam matavam a fome à pobreza e ainda sobrava pão. Uns com tanto e outros com tão pouco, como cachorrinhos que ansiosamente esperam alguma migalha que caia da mesa dos seus senhores.
07.04.2018, sábado - Pedido de ajuda
A Delfina, uma moça de que já falei a propósito de ter acabado o secundário como sendo a segunda melhor aluna da turma, mas que estava em casa por a família de acolhimento não ter hipóteses de economicamente lhe poder garantir a continuidade nos estudos, veio até nós para nos informar dos seus primeiros dias na Universidade da Paz, onde frequenta o curso de Relações Internacionais.
07.04.2018, sábado - Pedido de ajuda
A Delfina, uma moça de que já falei a propósito de ter acabado o secundário como sendo a segunda melhor aluna da turma, mas que estava em casa por a família de acolhimento não ter hipóteses de economicamente lhe poder garantir a continuidade nos estudos, veio até nós para nos informar dos seus primeiros dias na Universidade da Paz, onde frequenta o curso de Relações Internacionais.
A rapariga conta, com um ar de felicidade bem visível no seu rosto, episódios relacionados com o estudo das disciplinas (comunicação social, economia, filosofia, português, e outras). Fala-nos dos professores, dos colegas, do seu envolvimento em ações culturais. Até parece que ganhou uma nova vida.
No seu ar de simplicidade, próprio das terras donde provém, Boebau, promete-nos que se irá esforçar muito para aproveitar ao máximo o apoio que lhe estamos prestando. Com uma prestação de contas ao pormenor, a Delfina explicou-nos como, para poupar algum dinheiro, se desloca para a universidade. Em percurso normal teria de apanhar duas microletes que, a quinze cêntimos cada viagem, daria 60 cêntimos por dia. No fim do mês teria gasto dezoito dólares, o que para ela e muitos timorenses é incomportável. Então resolveu fazer uma parte do trajeto a pé e reduzir assim a despesa a metade.
É difícil hoje em dia encontrar jovens com este querer e esta força de vontade. Claro que se a Delfina fosse filha de gente rica ou gente notável, não haveria qualquer dificuldade em prosseguir os estudos. Mas a Delfina perdeu o pai e a mãe está muito doente. Por isso recorreu a uma família de acolhimento, onde vivem neste momento 14 pessoas. Os seus estudos na Universidade da Paz só são possíveis graças à benevolência do seu reitor, Dr. Lucas, que compreensivelmente atendeu o nosso apelo, libertando-a do pagamento de propinas e graças ao apoio de outros amigos sensíveis a casos como este.
A Delfina pediu-nos timidamente um telemóvel a fim de poder desenvolver com mais competência os seus trabalhos de investigação. Entretanto conta com a ajuda de colegas, com trabalhos de grupo, e claro está com a ajuda dos professores. Talvez apareça algum anjo portador deste meio de comunicação, com acesso à Internet...
09.04.2018, segunda feira - Mundo Mágico
Estamos a falar, claro está, do mundo das crianças, onde a fantasia é rainha e os seus habitantes são príncipes e princesas. “Mundo Mágico” é o nome de uma escola creche e jardim infantil que hoje visitei em Motael / Dili, no intuito de aprender alguma coisa que nos possa servir de exemplo para a nossa escola de Boebau.
É difícil hoje em dia encontrar jovens com este querer e esta força de vontade. Claro que se a Delfina fosse filha de gente rica ou gente notável, não haveria qualquer dificuldade em prosseguir os estudos. Mas a Delfina perdeu o pai e a mãe está muito doente. Por isso recorreu a uma família de acolhimento, onde vivem neste momento 14 pessoas. Os seus estudos na Universidade da Paz só são possíveis graças à benevolência do seu reitor, Dr. Lucas, que compreensivelmente atendeu o nosso apelo, libertando-a do pagamento de propinas e graças ao apoio de outros amigos sensíveis a casos como este.
A Delfina pediu-nos timidamente um telemóvel a fim de poder desenvolver com mais competência os seus trabalhos de investigação. Entretanto conta com a ajuda de colegas, com trabalhos de grupo, e claro está com a ajuda dos professores. Talvez apareça algum anjo portador deste meio de comunicação, com acesso à Internet...
09.04.2018, segunda feira - Mundo Mágico
Estamos a falar, claro está, do mundo das crianças, onde a fantasia é rainha e os seus habitantes são príncipes e princesas. “Mundo Mágico” é o nome de uma escola creche e jardim infantil que hoje visitei em Motael / Dili, no intuito de aprender alguma coisa que nos possa servir de exemplo para a nossa escola de Boebau.
Mais ou menos 40 crianças povoam o espaço agradável que as responsáveis procuram com muito carinho proporcionar aos seus utentes. Em funcionamento há cinco anos, de melhoria em melhoria, um local onde a língua portuguesa é o veículo principal de comunicação. A decoração, os jogos, o ambiente transportam-nos para este mundo de sonho e de fantasia em que o presente e o futuro se constrói com fadas, castelos, músicas e canções infantis que nos empolgam para horizontes ilimitados, para campos cobertos de arco iris sem alcance mas que encantam e fazem sonhar.
E, ao me lembrar daquela frase perdida “cada criança que nasce é um sinal de que Deus ainda não está zangado com a humanidade...”, fico a pensar e a concluir que, aqui em Timor, Deus está bem presente graças ao número tão elevado de crianças que nascem e crescem nestes mundos mágicos mas reais. Os seus sorrisos contagiantes são a prova provada de que este Deus existe e se manifesta com abundância nestas crianças. Remato com a letra de uma velha canção: “ Se Deus é alegre e jovem / Se é bom e gosta de sorrir / Porquê andar tão triste / Porquê andar sem cantar e sem rir.”
14.04.2018, sábado - Rumo a Boebau
Até que enfim! Depois de tanta espera, lá vamos nós, o Eustáquio e eu, bem assentados no “motor” a caminho de Boebau. Não foi preciso muito tempo para nos aprontarmos. Mochila às costas e uma mala com os materiais da exposição “Lameta”, e toca a andar que se faz tarde.
14.04.2018, sábado - Rumo a Boebau
Até que enfim! Depois de tanta espera, lá vamos nós, o Eustáquio e eu, bem assentados no “motor” a caminho de Boebau. Não foi preciso muito tempo para nos aprontarmos. Mochila às costas e uma mala com os materiais da exposição “Lameta”, e toca a andar que se faz tarde.
Até Liquiçá tudo bem. Depois começa o calvário até Boebau. Quem já fez este caminho de carro ou de motorizada sabe bem do que estou falando. As dificuldades do caminho são tantas que, só por sorte, a gente não tem de parar para se safar dos buracos ou de algum ser vivo (vacas, cabras, porcos, galinhas que instantaneamente se cruzam na estrada).
Mesmo assim, a vontade de chegar é tão forte que tudo aguenta. À chegada, com o corpo todo partido, as pernas mal se aguentavam em pé, e só depois de alguns momentos de recuperação foi possível dar alguns passos. Refeitos do desgaste, começam as visitas e os contactos.
Como o dia seguinte era domingo, tivemos algum tempo para falar do porquê desta pequena estadia. E logo à noite em casa do AbôZé travamos algumas conversas importantes que deram o mote para colóquios do dias seguintes. E “vamos para la cama, que hay que descansar. Para que mañana possamos trabajar”.
15.04.2018, domingo - A contemplar as montanhas
Talvez por ser domingo, passei uns bons momentos a contemplar as montanhas e o mundo que nos rodeia. Aqui a natureza é pródiga na oferta que nos faz. Um sem número de paisagens deslumbrantes, com o sol a fecundar todos os sinais de vida. Coqueiros, mangueiras, madre cacau, bananeiras, e tantas outras árvores de fruta e de flores. Aqui é fácil e agradável contemplar e agradecer ao criador que dá a vida e a sustenta. Cabe-nos a nós cuidar dela.
Neste contexto, deparo com a Escola de São Francisco de Assis, com o padroeiro e amante da natureza que, na sua simplicidade, chama mãe à terra e irmãs a todas as outras criaturas: irmão sol, irmã lua, irmã água, irmão vento, irmão fogo, etc,etc... Sei que a sua proteção nunca nos vai falhar, saibamos nós ser reconhecidos.
À tarde, tive uma das experiências que irá acompanhar-me para sempre: plantação de coqueiros nas traseiras da escola. O Abô Zé surgiu com a ceira (espécie de cesta feita em palapa) cheia de cocos já com rebentos, e foi então que me ofereci para o ajudar na plantação. As dificuldades de equilíbrio eram tantas, que me lembrei da técnica para dançar o tango, a saber: dois passos lentos para a frente e três passos rápidos para trás. Ou seja, demorei um tempo enorme a subir o que já tinha descido.
15.04.2018, domingo - A contemplar as montanhas
Talvez por ser domingo, passei uns bons momentos a contemplar as montanhas e o mundo que nos rodeia. Aqui a natureza é pródiga na oferta que nos faz. Um sem número de paisagens deslumbrantes, com o sol a fecundar todos os sinais de vida. Coqueiros, mangueiras, madre cacau, bananeiras, e tantas outras árvores de fruta e de flores. Aqui é fácil e agradável contemplar e agradecer ao criador que dá a vida e a sustenta. Cabe-nos a nós cuidar dela.
Neste contexto, deparo com a Escola de São Francisco de Assis, com o padroeiro e amante da natureza que, na sua simplicidade, chama mãe à terra e irmãs a todas as outras criaturas: irmão sol, irmã lua, irmã água, irmão vento, irmão fogo, etc,etc... Sei que a sua proteção nunca nos vai falhar, saibamos nós ser reconhecidos.
À tarde, tive uma das experiências que irá acompanhar-me para sempre: plantação de coqueiros nas traseiras da escola. O Abô Zé surgiu com a ceira (espécie de cesta feita em palapa) cheia de cocos já com rebentos, e foi então que me ofereci para o ajudar na plantação. As dificuldades de equilíbrio eram tantas, que me lembrei da técnica para dançar o tango, a saber: dois passos lentos para a frente e três passos rápidos para trás. Ou seja, demorei um tempo enorme a subir o que já tinha descido.
Missão cumprida, ficou a satisfação de ter plantado algo que quero ver crescer, à semelhança de outras coisas menos visíveis.
Histórias que são verdade
À noite depois da ceia, começam as conversas de sobremesa. Sentados nas cadeiras de encosto ou em qualquer lado, vão se contando cenas do dia a dia que foram acontecendo. Passo a relatar as duas que mais me impressionaram.
Na semana passada foram encontradas duas raparigas mortas, uma de treze anos e outra de dezoito, trazidas nas enxurradas da ribeira Laoeli. Segundo contam, uma delas já meia comida por alguns cães ou bichos carnívoros que por ali passaram. As vítimas que não são conhecidas, são provavelmente do concelho de Ermera, do outro lado que divide a ribeira.
Já tinha ouvido dizer as dificuldades e riscos que estes habitantes das montanhas correm quando têm que atravessar, a pé porque não são navegáveis. Alguns contam, já do tempo da guerrilha e da ocupação indonésia, que a melhor maneira de passar de uma margem para a outra é em corda, de mãos dadas, mas que de vez em quando a corrente é tão forte que algumas pessoas se desprendem e são arrastadas pela força das águas, sem possibilidade se serem apanhadas.
O Abô Zé descreve também com um realismo impressionante, em que os gestos tudo dizem, como durante a guerrilha armavam emboscadas aos soldados indonésios. Faziam grandes buracos nas veredas e caminhos, levavam a terra para longe a fim de que não desconfiassem, lá dentro colocavam canas de bambu bem afiadas, disfarçavam com ervas e mato na esperança de que por ali passassem e fossem desta forma eliminados ou apanhados.
Histórias que são verdade
À noite depois da ceia, começam as conversas de sobremesa. Sentados nas cadeiras de encosto ou em qualquer lado, vão se contando cenas do dia a dia que foram acontecendo. Passo a relatar as duas que mais me impressionaram.
Na semana passada foram encontradas duas raparigas mortas, uma de treze anos e outra de dezoito, trazidas nas enxurradas da ribeira Laoeli. Segundo contam, uma delas já meia comida por alguns cães ou bichos carnívoros que por ali passaram. As vítimas que não são conhecidas, são provavelmente do concelho de Ermera, do outro lado que divide a ribeira.
Já tinha ouvido dizer as dificuldades e riscos que estes habitantes das montanhas correm quando têm que atravessar, a pé porque não são navegáveis. Alguns contam, já do tempo da guerrilha e da ocupação indonésia, que a melhor maneira de passar de uma margem para a outra é em corda, de mãos dadas, mas que de vez em quando a corrente é tão forte que algumas pessoas se desprendem e são arrastadas pela força das águas, sem possibilidade se serem apanhadas.
O Abô Zé descreve também com um realismo impressionante, em que os gestos tudo dizem, como durante a guerrilha armavam emboscadas aos soldados indonésios. Faziam grandes buracos nas veredas e caminhos, levavam a terra para longe a fim de que não desconfiassem, lá dentro colocavam canas de bambu bem afiadas, disfarçavam com ervas e mato na esperança de que por ali passassem e fossem desta forma eliminados ou apanhados.
Imaginem a crueldade e o sofrimento das pobres vítimas. Mas, como diz o ditado “em tempo de guerra não se limpam armas”.
O que mais me impressiona é o realismo que os protogonistas destes relatos revelam ao contar estas histórias.
O que mais me impressiona é o realismo que os protogonistas destes relatos revelam ao contar estas histórias.
(Continua)
(Título, seleção de excertos, revisão / fixação de texto, inegritos: LG)
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Nota do editor:
Último poste da série > 29 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25699: II Viagem a Timor: janeiro / junho de 2018 (Rui Chamusco, ASTIL) - Parte V: O país da diversidade, onde umas vezes apetece partir, e outras vezes apetece ficar