I. Mensagem do nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima (*), com data de 6 do corrente, em resposta ao meu pedido para nos enviar, de novo, cópia do seu texto de resposta o Poste P4634, que entretanto se havido extraviado:
Caro Luis, Junto envio, novamente, em anexo, a minha resposta ao Constantino Costa (CC) - 1ª. e 2ª. Partes. A 1ª edição do meu livro [A Retirada de Guileje, 22 de Maio 1973: A Verdade dos Factos, edição de autor, 2008] foi de 500 Exemplares; a 2ª. de 200; a 3ª. também de 200 Exemplares está em distribuição. Podes publicar estes dados.
Espero que agora a resposta ao CC seja publicada rapidamente. Um abraço. Alexandre
II. Comentário de L.G.:
Uma das provas de maturidade do nosso blogue é o respeito pela liberdade de pensamento e de expressão de cada um dos seus membros, dentro dos limites do nosso estatuto editorial. O texto (I Parte) que se agora se publica, já deveria ter sido publicado, no nosso blogue, há muito mais tempo, nomeadamente depois das férias de verão. Ao Coutinho e Lima apresentamos as nossas desculpas. O texto andou perdido pelas nossas várias caixas de correio. De qualquer modo, não perde qualquer actualidade. O nosso dossiê Guileje / Gadamael vê-se assim enriquecido com estes novos esclarecimentos.
A escasso dias de se inaugurar, na Guiné-Bissau, o Núcleo Museológico "Memória de Guiledje", faço meus os votos de um antigo combatente do PAIGC que para possamos, finalmente, depois de "estabelecidas as pontes emocionais entre aqueles que, em lados opostos da barricada, viveram, com o seu ser, momentos de sangue, de sofrimento e de destruição, e que hoje se dão as mãos na construção de um mundo feito de compreensão, amizade e respeito mútuo, a história comum pode ser escrita com objectividade, como legado às gerações vindouras". (citado em
documento inserido na página oficial da Ad - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau).
III. Resposta ao P 4634: Dossier Guileje/Gadamael 1973 (13): A desonra da CCAV 8350 ou o direito à minha versão... (Constantino Costa) (**)
Texto de Coutinho e Lima
1ª. PARTE
O documento referido merece-me a seguinte resposta.
Começo por discordar do termo "versão", empregue pelo articulista; não há várias versões dos acontecimentos de Guileje; o que se passou, na realidade, foi o que consta no meu livro A RETIRADA DE GUILEJE". O que o Constantino Costa [, aqui na foto, à direita, em Guileje, em 1973, ] entendeu divulgar é a sua opinião e interpretação daqueles acontecimentos.
O texto, no seu início, refere:
"foram omitidos factos importantes que, em meu entender, provocaram a fuga de Guileje".
Desde já devo salientar a palavra "fuga"; quer o Constantino quer queira quer não queira, o que aconteceu foi uma
retirada, sob pressão do Inimigo; a retirada é uma manobra militar, não faltando exemplos de retiradas em diversos conflitos. Se em Guileje houve uma "fuga", como classifica o Constantino o que se passou em Gadamael, na sequência das flagelações do Inimigo (In) dos dias 31 MAI 73 e 1 JUN 73?
Afirma também que
"a actividade operacional se limitou, portanto, no interior do aquartelamento ,registando-se apenas algumas saídas esporádica."
Omitiu que havia um patrulhamento diário para reabastecimento de água e que se realizaram, desde meados de Abril, as seguintes colunas de reabastecimento:
ABR – dias 14, 21 e 25.
MAI – dias 1,4,7,11 14 e 16.
Estas colunas constam de documento elaborada pelo Chefe da 4ª Repartição do CTIG (Comando territorial Independente da Guiné, isto é, o Comando do Exército), que foi junto ao processo que me foi instaurado, a meu pedido (pág. 408 do meu livro).
Não admira que o Constantino tenha omitido a realização das colunas referidas, pois que, a própria Repartição de Operações do Comando-Chefe (REPOPER), na sua apreciação semanal da actividade operacional das Unidades, também não as considerou. Devo referir que as colunas de reabastecimento eram verdadeiras operações, hipotecando todos os meios operacionais e logísticos das duas guarnições (Gadamael e Guileje) e estavam sujeitas à acção do In, que sabia da nossa necessidade de as executar, utilizando a única "estrada" existente.
Ainda relativamente à actividade operacional, enviei em 28 ABR 73, uma mensagem para a REPOPER, solicitando autorização para reduzir ao mínimo a actividade da CCAV 8350 (Guileje), a partir de 30 ABR 73, devido à proximidade da época das chuvas e ao grande atraso das obras em Guileje, por motivos alheios ao Comando do COP 5 (Comando Operacional nº 5, em Guileje). Esta mensagem foi respondida, em 30 ABR, autorizando o solicitado devendo, na medida do possível,
"continuar a abertura da estrada de Mejo". Esta actividade continuou, tanto que, nos primeiros dias de MAI, o Alferes Lourenço (especialista de Minas e Armadilhas), foi vítima mortal, quando procedia ao levantamento de um engenho explosivo, implantado pelo In, na referida estrada; em 12 MAI, sucedeu o mesmo a 2 Chefes de Secção de Milícia, ao tentarem levantar uma mina anti-carro, na mesma estrada.
A afirmação do Constantino de que procedia à elaboração de relatórios de patrulhamentos não efectuados, sugere-me a formulação das seguintes perguntas:
- Quem teve a iniciativa (não foi com certeza sua) e quando começou a "prática" de viciar os relatórios dos patrulhamentos?
- Este "procedimento" teve lugar apenas em Guileje ou continuou em Gadamael e nas outras localidades em que esteve a CCAV 8350?
- Na actividade do seu Grupo de Combate (GC), em que tomou parte, verificou que os locais patrulhados não foram os que tinham sido determinados e como é que conhecia estes?
- Na actividade dos outros GC, quem o informou o que afirma, isto é, os relatórios não correspondiam aos patrulhamentos efectuados?
Não digo que a afirmação, sobre este assunto, não corresponde á verdade. No entanto, terá que haver provas concludentes do que é afirmado: indicação de testemunhas que confirmem tal "prática", apresentação de algum desses relatórios, etc. E isto porque as observações dos ex-Alferes Reis e Seabra contrariam o afirmado e não tenho outros elementos favoráveis à afirmação do Constantino. Embora não estivéssemos em guerra (o Governo Português nunca declarou este estado), a viciação dos relatórios de actividade operacional era um procedimento muito grave que, a confirmar-se, esse sim, "desonraria" a CCAV 8350.
Se a situação fosse de guerra declarada, a alteração dos relatórios estaria no âmbito de crime militar; pode o Constantino ter a certeza de que, se em Guileje, eu tivesse tido conhecimento destes factos, iniciaria, de imediato, as averiguações indispensáveis, no sentido de apurar a verdade, ao mesmo tempo que faria a respectiva comunicação ao Comando-Chefe; o Constantino seria, seguramente, incluído nos infractores, no mínimo, como conivente.
Tendo estado presente nos convívios efectuados em Condeixa, Santa Maria da Feira e Pombal, porque não apresentou as críticas que agora incluiu no blogue, especialmente o facto da viciação dos relatórios? Não obstante não comparecerem, nesses convívios, mais de 50% da CCCAV 8350 (afirmações suas), tinha sido uma boa oportunidade para debater este assunto, bem como outras questões.
A certa altura afirma que, quando algumas mulheres africanas se deslocaram à bolanha para se abastecerem de água,
…"tendo o major de se colocar à frente dos nossos camaradas para que lhe fosse prestado o devido auxílio". Isto é absolutamente falso, porque este episódio passou-se na tarde de 21 MAI (segundo os depoimentos de testemunhas no processo) e, nessa altura, deslocava-me eu, de Gadamael para Guileje, em coluna apeada, não me encontrando em Guileje.
Afirma também que
…"os abrigos estavam praticamente intactos", o que corresponde à verdade e ninguém afirmou o contrário; mais á frente, referirei as instalações atingidas pelas flagelações.
Parece haver outro equívoco na pergunta:
"Quem se recusou a efectuar a protecção do major, quando este pretendia deslocar-se de Guileje para Gadamael?"
Naquele período, a minha deslocação de Guileje para Gadamael, foi na manhã de 19 MAI, comandando a coluna de evacuação de feridos, resultantes da emboscada da véspera (e também com a finalidade de contactar os Delegados de Bissau, que solicitei que fossem a Guileje e não apareceram); a evacuação fez-se em coluna auto até ao Rio Afiá (onde também seria feito o reabastecimento de água) e depois, via fluvial até Cacine; tanto quanto seja do meu conhecimento, ninguém se recusou a fazer a respectiva protecção.
Pergunta ainda porque é que não falaram do que se passou
"durante a reunião de oficiais na véspera da fuga"; porque é que o Constantino também não falou?
Após a minha chegada a Guileje, no final da tarde do dia 21 MAI, fiz uma visita rápida ao quartel e, de seguida, ouvi o relato do Capitão Quintas, Comandante da Companhia, do que se passara na minha ausência; depois de ter reflectido algum tempo, comuniquei aos presentes (além dos Oficiais, estavam alguns Furrieis e outros elementos), a decisão de retirar no dia seguinte – 22 MAI, logo que a claridade o permitisse.
Nesta altura, importa salientar outras omissões do Constantino, bem como as providências que tomei, desde a emboscada In do dia 18 MAI, até à tomada de decisão de efectuar a retirada.
A primeira omissão diz respeito à última visita do General Comandante-Chefe a Guileje, em 11 MAI 73;perante formatura geral, o General Spínola afirmou que se esperava um agravamento A da situação, que a Força Aérea não podia executar as missões como até há pouco fazia, mas que, apoiaria as Nossas Tropas (NT)., voando mais alto e utilizando bombas mais potentes; afirmou ainda que, no caso de haver feridos graves, seria feita a sua evacuação, não a partir do mato, mas sim de Guileje.
Na emboscada In de 18 MAI, resultaram para as NT, 1 Morto (Comandante do Pelotão de Milícia), 7 Feridos graves e u Feridos ligeiros; pedida a evacuação dos feridos, a mesma não foi efectuada e passadas umas 3-4 horas, um dos feridos graves (Cabo metropolitano), acabou por morrer; enviei então para a REPOPER, a seguinte mensagem:
-"NÃO SATISFAÇÃO…EVACUAÇÕES, CAUSOU GRANDE MAL ESTARENTRE TODO PESSOAL POIS ÚLTIMA VISITA SEXA GENERAL ESTE DISSE MESMAS SERIAM EFECTUADAS QUANDO NT SITUAÇÃO DIFÍCIL".
A afirmação do Comandante-Chefe sobre a satisfação das evacuações, consta não só das minhas declarações, no processo, como no depoimento de várias testemunhas; para confirmar, se isso fosse necessário, basta ler o 5º. Parágrafo da Promoção de Justiça (pág. 438 do livro):
"…tanto mais que dias antes, perante uma formatura geral…Sua Excelência o General Comandante-Chefe…assim como, no caso de haver feridos graves, faria a sua evacuação para Bissau."
Se isso não correspondesse á verdade, não seria incluído, seguramente, no documento citado.
Após a emboscada de 18 MAI, que inviabilizou a realização da coluna de reabastecimento (foi a primeira vez que tal acontecera, por acção do In), apercebi-me da gravidade da situação; enviei uma mensagem para a REPOPER, solicitando a vinda a Guileje de um seu delegado e outro do COAT (Centro de Operações Aero-Tácticas, da Força Aérea), para expor a situação; nessa altura, estava certo que isso seria possível e só constatei o contrário quando as evacuações não foram feitas.
Entretanto decidi evacuar os feridos, por via fluvial, na manhã do dia seguinte, porque nesse dia a maré não o permitia; informei a REPOPER que me deslocava para Cacine, onde esperava encontrar os delegados. A REPOPER comunicou-me que devia expor a situação, por mensagem, o que apenas fiz no dia 20 MAI, às 03H20, hora a que tive conhecimento do pedido da REPOPER, porque esta enviou a mensagem somente para Guileje (onde eu já não estava) e daqui foi retransmitida para Cacine.
"…CMDT COP 5… INFORMA NECESSITA UMA COMPANHIA TROPA ESPECIAL REFORÇO TEMPORÁRIO FIM EFECTUAR REABASTECIMENTO GUILEJE: NECESSÁRIO TAMBÉM REFORÇO VIATS E ESTIVADORES".
A REPOPER, do meu ponto de vista, não reagiu, de forma atempada, à situação; se houvesse intenção de enviar os delegados (e, manifestamente, não foi o caso), estes poderiam ter aproveitado os helicópteros que fizeram as evacuações de Cacine, na manhã do dia 19 MAI; se isso tivesse acontecido, eu poderia regressar, nesse mesmo dia, a Guileje.
Outra omissão do Constantino, diz respeito ao facto de, na tarde do dia 18 MAI, o GC encarregado de proceder ao reabastecimento de água, se ter recusado a fazê-lo, enquanto não fosse esclarecido o problema das evacuações; mandei formar o GC e após lhes ter falado, eu próprio comandei essa operação de reabastecimento de água; devo esclarecer que, contrariamente ao que o Constantino afirmou que, nesses reabastecimentos, apenas alguns homens iam armados (mais uma afirmação que carece ser devidamente confirmada), neste verifiquei que todos os militares, como não podia deixar de ser, apresentaram-se devidamente armados e equipados.
Estive em Cacine até ao fim do dia 20 MAI, enviando mensagens a insistir com a comparência dos delegados ou a minha ida a Bissau, regressando, de imediato. Na tarde de 20 MAI, fui transportado de helicóptero a Bissau, onde expus a situação ao General Comandante-Chefe, no final do "briefing" diário; o General Spínola, disse que não me concedia qualquer reforço, sem nenhuma explicação, que devia regressar a Guileje no dia seguinte e que ia nomear o Coronel Pára-quedista Rafael Durão para comandar o COP 5, passando eu a 2º. Comandante. Importa referir que o Coronel Durão se encontrava em Mansoa e que, se o General Comandante-Chefe entendesse, teria sido possível um encontro comigo, nessa noite e, inclusivamente, poderíamos seguir juntos para Guileje; assim não foi entendido, o que, em minha opinião teria toda a lógica e ganhar-se-ia um tempo precioso.
Na manhã do dia 21 MAI, fui transportado, de helicóptero, para Cacine, donde segui de "sintex" para Gadamael. No dia seguinte, 22, o Coronel Durão foi transportado, de helicóptero, directamente para Gadamael, certamente porque a sua ida era uma emergência, mas não a minha (de acordo com informação da REPOPER, a Força Aérea só ia a Gadamael em emergência); se tivesse sucedido o mesmo comigo, teria tido oportunidade de chegar a Guileje muito mais cedo (só lá cheguei ao fim do dia 21 MAI); com as comunicações ainda funcionais, teria exposto a situação, por mensagem, à REPOPER.
Entretanto, durante todo o período, Guileje continuou a ser atacada pelo fogo In; as flagelações começaram às 20 horas do dia 18 MAI e até às 4 horas do dia 22 MAI, a guarnição de Guileje foi sujeita a 37 flagelações.
Cheguei a Guileje no final de 21 MAI, escoltado por 2 GC da CCAÇ 3520 (Gadamael); o percurso Gadamael/Guileje foi efectuado, em coluna apeada, por um trilho que até então era apenas utilizado pela população. Durante o percurso, ouvimos a flagelação do In a Guileje (das 14H30 até às 16H30).
A situação que encontrei, em Guileje, foi a seguinte:
- Destruição total do Centro de Comunicações, incluindo todas asa antenas, o que impedia a ligação rádio, com quem quer que fosse.
- Na flagelação dessa tarde, um Furriel tinha sido morto, por ter sido atingido pelo rebentamento de uma granada, num abrigo de fraca protecção.
- Estavam destruídas, em consequência das flagelações inimigas:
. dois depósitos de géneros;
. depósito de artigos de cantina;
. cozinha;
. forno;
. celeiros de arroz da população (ainda a arder);
. grande parte das moranças da população.
- Vários abrigos tinham sido atingidos, sem consequências para as NT ou população.
- Muitos impactos de granadas nas valas.
- Falta de água potável; o último reabastecimento tinha sido feito no dia 19 MAI, de manhã.
- Escassez de munições de Artilharia.
- Escassez de alguns medicamentos e material de primeiros socorros.
- Tinha sido verificada, nessa tarde, a presença do In nas proximidades do quartel (do lado de Mejo), tendo flagelado elementos da população, que tinham ido tentar abastecer-se de água.
- Todo o pessoal estava arrasadíssimo, quer física, quer psicologicamente, ao fim de 3 dias e 3 noites consecutivas de flagelações.
- A vida no interior dos abrigos (onde, desde início, se recolhera toda a população) era pouco menos que insuportável; com a superlotação dos mesmos abrigos, o calor e cheiro nauseabundo, a situação era muitíssimo difícil, além de que a presença dos civis limitava grandemente os movimentos dos militares.
- Garantia de não evacuação de feridos; este facto era de extraordinária importância, contrariamente à opinião do Constantino; se houvesse feridos graves, estes ficariam entregues à sua sorte, cujo desfecho poderia ser a morte, como já tinha acontecido com um deles, na manhã de 18 MAI.
Todo o pessoal tinha muita esperança que a minha ida a Bissau fosse bem sucedida, com a atribuição de reforços.
Depois de me inteirar do que havia sucedido na minha ausência (embora, através das mensagens, soubesse o que se ia passando), fiz uma reunião informal com o Comandante da CCAV 8350 e outros Oficiais, estando também presentes outros elementos.
Os factores que considerei, para tomar uma decisão, foram os seguintes:
1. Forte pressão do In, que não abrandava; pelo contrário, a flagelação dessa tarde tinha sido a maior; a Repartição de Informações enviara, às 19 horas do dia 20 MAI, informando que o 3º. Corpo de Exército estava nas matas de Mejo, admitindo a pos- sibilidade de vir a actuar sobre Guileje; isto era a confirmação de que o In continuava a reforçar o seu dispositivo, à volta de Guileje.
2. Não atribuição de reforços.
3. Não evacuação de feridos; a evacuação, via fluvial, como fora feita em 19 MAI, não mais era possível, porque os barcos ficaram em Cacine, em virtude da falta de segurança, do seu regresso, pela mesma via, a Guileje.
4. Escassez de munições, especialmente de Artilharia; o seu reabastecimento só podia ser feito por estrada e não mais era possível, com os meios do COP 5, pela acção do In, que já tinha impedido a realização da coluna do dia 18 MAI.
5. Falta de água potável no aquartelamento e impossibilidade \de fazer o seu reabastecimento, pois o In, instalado nas matas do Mejo, não o permitiria.
6. Defesa da população
Na Missão do COP 5, constava:
…(5) Assegura a defesa eficiente dos aglomerados populacionais ocupados pelas NT.
Nas condições existentes, não podia garantir essa defesa.
7. Destruição do Centro de Comunicações
Como poderia eu ou o novo Comandante, Coronel Durão, exercer a acção de Comando sem comunicações?
8. Novo Comandante do COP 5
Além de não saber quando o Coronel Durão chegaria a Guileje, considerei que não iria resolver a situação, porque:
- Não viria acompanhado dos reforços necessários; estes, ser-lhe-iam atribuídos, mas demorariam a chegar a Gadamael, no mínimo, uns dois dias, após a decisão de os enviar, que só seria depois de o novo Comandante do COP 5, os solicitar; seguir-se-ia a deslocação para a região de Guileje; esta guarnição não estava em condições de lhes prestar qualquer espécie de apoio, nem tão pouco proporcionar nenhum descanso, no intervalo da actividade operacional; além disso, iriam actuar em condições particularmente difíceis, no que respeita à evacuação dos possíveis/muito prováveis feridos, que teriam que ser transportados para Gadamael, pela própria força e só a partir dali poderiam ser evacuados.
- Sem comunicações, como poderia exercer a sua acção de Comando?
- Não solucionaria o problema do reabastecimento de água.
- Não estava em condições de fazer chegar a Guileje, enquanto não chegassem os reforços, munições de Artilharia e outros artigos críticos.
- Não garantiria a evacuação de feridos, a partir de Guileje.
9. Previsão do futuro, a curto prazo
A pressão do In não abrandava, pelo contrário recrudescia e as NT não estavam em condições de aguentar, pelos motivos apontados, até à chegada de reforços, que certamente seriam atribuídos ao novo Comandante e que a mim tinham sido negados.
10. Existência de um Morto
Naquele momento existia, infelizmente, um Morto, provocado pela flagelação dessa tarde de 21 MAI. Considerei que era exequível o transporte do cadáver; se houvesse meia dúzia de baixas, isso seria impeditivo de poder retirar, por impossibilidade do seu transporte, em coluna apeada.
11. Efeito de surpresa
Tendo eu chegado a Guileje ao fim desse dia 21 MAI, sem ter sido detectado pelo IN, este não teria possibilidades, durante a noite, de verificar a utilização, pelas NT, do trilho da população, utilizado no regresso a Guileje.
Ponderados os factores apontados, considerei que não havia condições de aguentar a posição, decidindo pela retirada que, do meu ponto de vista, deveria ser efectuada o mais cedo possível, isto é, no dia seguinte, logo que as condições de visibilidade o permitissem, aproveitando principalmente o efeito de surpresa.
A finalidade da retirada foi, prioritariamente, evitar que as NT e a população ficassem à mercê do In, retirando-lhe a possibilidade de completar o cerco e causar mais baixas que, naquelas circunstâncias, seriam baixas não justificáveis; a vida humana não tem preço e a sua perda deve ser minimizada.
O objectivo primeiro de uma guerra é impor a nossa vontade ao Inimigo, infligindo-lhe a derrota. Neste caso concreto, a desproporção de meios humanos e, nomeadamente de meios materiais, com relevância para o armamento pesado, era de tal maneira favorável ao PAIGC que a nossa vitória, na minha avaliação, não era possível.
Nas condições concretas, naquele momento em Guileje, não podia assegurar a segurança eficiente da população, como estava na minha Missão.
A decisão de retirar foi tomada de forma consciente e comunicada aos presentes, na reunião informal que efectuei, não havendo nenhuma discordância.
Lamento que o Constantino, não tenha apresentado a sua não concordância com a decisão, logo que dela teve conhecimento; perdeu uma boa oportunidade de marcar a sua posição; agora, passados 36 anos sobre os acontecimentos, é bem mais fácil argumentar contra a decisão.
Logo que tomei a decisão, tive a convicção que a mesma não iria ser aceite pelo Comando Superior, tendo declarado aos presentes, que a minha vida militar poderia ter chegado ao fim.
O cenário descrito foi resultante das informações que eram recebidas do Comando-Chefe, nomeadamente da Repartição de Informações, no que dizia respeito à actividade do In.
No processo que me foi instaurado, em consequência da decisão de retirar de Guileje, tomei conhecimento de outros documentos. A primeira referência à preparação de um ataque em força sobre Guileje, consta do extracto de relatório, com data de 27 DEZ 72 (isto é, antes da criação do COP 5) – pág. 410 do meu livro.
Desse relatório transcrevo:
" Intenções do IN
…a. NA FRONTEIRA -Refere que o In pretende fazer um ataque com bastante força a GUILEJE, porque pretende obter uma maior liberdade de movimentos logísticos e de pessoal no Corredor de Guileje. Para isso, ficaram em KANDIAFATRA alguns elementos que vieram recentemente dum estágio de Artª. na Rússia, para fazerem reconhecimentos na área de GUILEJE e preparar essa acção…
………MODO DE ACTUAÇÃO
Os chefes sabem que as flagelações aos aquartelamentos não têm obtido resultados compensadores e por isso resolveram mandar vários elementos ao estrangeiro receber uma instrução mais adiantada de Artilharia
…Estes elementos ficarão normalmente em observadores avançados durante as flagelações, ligados por telefone às bases de fogos, dirigindo a acção e regulação de tiro…"
No Jornal PÚBLICO de 20 JUL 04, foi publicado um artigo, com o título
Amílcar Cabral "Se o quartel de Guileje cair, cai tudo à volta".
O artigo é da autoria de Osvaldo Lopes da Silva (OLS), antigo Comandante do PAIGC, está transcrito, integralmente, no meu livro (pág. 358 a 365) e reporta-se a um outro artigo, inserido no PÚBLLICO de 16 MAI 04.
Desse artigo, transcreve-se:
"…É na qualidade de protagonista importante que fui na preparação e condução da Operação Amílcar Cabral, que determinou a queda de Guiledje, que trago informações e comentários que podem completar o quadro apresentado no artigo em referência.
Foi em Agosto ou Setembro de 1972, num momento de muita tensão no seio do PAIGC em CONAKRY, que Cabral me confiou a tarefa de preparar as condições para um ataque força a Guiledje…
Cabral terminou a sua exposição com este desabafo: "Se este quartel cai, tudo à volta também cai". Calou-se, olhou para mim à espera da minha resposta. E eu, com convicção, disse; "Posso destruir o quartel, só preciso de tempo para preparar os dados de fogo e os meios"….
Cabral deu logo instruções no sentido de serem colocados à minha disposição os meios necessários. Para começar, uns 30 homens, guineenses e cabo-verdianos, para o meu grupo especial de reconhecimento, com o que fosse necessário para a missão…
O que finalmente resultou foi o levantamento topográfico, ligando posições distantes do quartel entre 4 e 12 kms, de acordo com os alcances das peças de artilharia que iríamos utilizar…
Feito o levantamento topográfico, procedemos a vários flagelamentos com morteiros 82, tendo em vista provocar a resposta do inimigo e podermos assim determinar…o azimute do quartel…
Destinámos uma posição a 12 kms para canhões que teriam a missão de desgastar psicologicamente o inimigo com um disparo com intervalos de meia ou uma hora; uma a 4 kms ara morteiros 120 com missão de destruir os abrigos com fogo de saturação sobre eles concentrado e, finalmente, uma posição para GRAD ("catiucha") …entre 6 e 7 kms…A posição de GRAD só foi utilizada em finais de Março de 1973, com o lançamento de 2 ou 3 foguetes, numa operação que se destinava a testar o comportamento das nossas tropas a ataques prolongados, de dia, e a reacção da aviação. Esta veio, tendo sido abatidos 3 aviões com foguetes terra-ar Strela.
A Operação Amílcar Cabral pôs em evidência a grande supremacia das forças do PAIGC (infantaria, artilharia, logística); supremacia de tal ordem que me permito dizer que as acções eram em sentido único e que prosseguir na resistência seria uma loucura que só poderia ter como epílogo o esmagamento do contingente cercado em Guiledje pelas nossas forças, pela mata e pelas minas que pretendiam protegê-lo. A nossa supremacia em meios (quantitativa e sobretudo qualitativa) e em homens era reforçada pelo minucioso conhecimento que tínhamos do dispositivo contrário, conseguido ao fim de vários meses de reconhecimento. Desencadeada a operação, não houve necessidade de correcção do fogo de artilharia…
Nem a artilharia apontada para Kandiafara, nem a aviação, nos causava mossa. A aviação, particularmente os Fiat, passavam por cima das nossas cabeças sem nos desviar do que estivéssemos a fazer. O mesmo não direi dos helicópteros e das minas que tínhamos que ter sempre em conta".
Das transcrições do artigo referido, verifica-se que a Operação em força sobre Guileje, foi preparada minuciosamente, com reconhecimentos ao longo de vários meses, devidamente acompanhada da preparação de especialistas, especialmente de Artilharia.
A referência ao abate de 3 aviões não é correcta; o incidente verificou-se em 25 MAR 73 e foi abatido 1 Avião FIAT, pilotado pelo Tenente Piloto Aviador Miguel Pessoa, que conseguiu ejectar-se e foi recuperado no dia seguinte.
Posso confirmar a afirmação do Lopes da Silva, quando afirma que
"não houve necessidade de correcção de fogo de artilharia", de facto, desde o início das flagelações, verificaram-se muitos rebentamentos dentro do quartel.
O Comando-Chefe e, em especial a sua Repartição de Informações, teve conhecimento da preparação que o PAIGC estava a fazer, tendo em vista uma acção em força sobre Guileje, pelo menos desde DEZ 72, conforme extracto de relatório referido atrás.
Para fazer face à intenção do PAIGC, relativamente a Guileje, o Comando-Chefe criou o COP 5 (22 JAN 73), para o qual me nomeou Comandante, sem atribuição de qualquer reforço; até essa altura, todos os Comandos Operacionais criados tinham recebido reforços; é caso para perguntar porque é que o COP 5, logo na sua criação, não foi reforçado, sabendo-se que o In tinha intenção de actuar em força sobre aquele aquartelamento.
Reportando-me ainda ao artigo de OLS, saliento a afirmação da
"grande supremacia das forças do PAIGC".
Relativamente aos efectivos empregues pelo PAIGC na acção em força sobre Guileje, o Chefe da Repartição de Informações, no seu depoimento, quando ouvido no âmbito do processo que me foi instaurou, afirmou que eram da ordem de 300 a 350 homens, incluindo o 3º. Corpo de Exército. Esta estimativa parece-me avaliada por defeito. Com efeito, no livro GUERRA COLONIAL, da autoria de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (pág. 513 a 515), pode ler-se:
"No total, o PAIGC concentrou na zona de Guileje, um corpo de exército (3º. CE), no Mejo, dez bigrupos em reforço do sector de fronteira e uma bateria de artilharia, com um grupo de reconhecimento, Ao todo, considerando a base numérica de cada unidade do PAIGC utilizada pelos serviços militares portugueses, seria de 650 homens, efectivo idêntico ao que foi concentrado em Guidage."
No que se refere a outros meios utilizados, pode também ler-se, no mesmo livro:
" Para o início da operação, o PAIGC concentrou em redor de Guileje, a bateria de artilharia de KANDIAFARA, com morteiros de 82 e 120 mm, canhões sem recuo de 85 e de 130 mm, um grupo de reconhecimento e observação e cinco bigrupos do sector de fronteira. Deslocou o 3º. Corpo de Exército do Unal para a mata de Mejo e transferiu três bigrupos da região do Boé e dois bigrupos do 2º. Corpo de Exército, no Tombali, para reforço do sector de fronteira".
Os meios das NT em Guileje eram:
- CCAV 8350, Pelotão de milícia e Secção de auto-metralhadora Fox – cerca de 200 homens.
- Armamento pesado:
. 2 Obuses de 14 cm;
. 1 Morteiro de 10,7 cm;
. 2 Morteiros de 81 mm,
O número de 650 homens, estimado por Aniceto Afonso e Matos Gomes, no seu livro, parece-me mais realista, porque foi calculado a partir da base numérica das unidades do PAIGC, do que o de 300/350, referido pelo Chefe da Rep Info, não esclarecendo este como chegou à sua estimativa.
O efectivo de 650 homens do PAIGC, diz respeito a pessoal combatente; acrescentando todo o pessoal de apoio logístico, carregadores e outro, o número total não terá andado longe de 1 000 homens, número indicado por Nino Vieira, quando lhe fiz a pergunta sobre este assunto.
Através do processo que me foi instaurado, tomei conhecimento do que se passou em Guidage, onde o PAIGC desencadeou uma acção em força semelhante à de Guileje, num documento elaborado pelo Chefe da REPOPER (pág. 87 e 88 do meu livro).
Nesse documento verifica-se que a acção do In se iniciou, no dia 8 MAI 73, de maneira idêntica à de Guileje, com uma emboscada a uma coluna que tinha partido de Farim; a coluna foi retida pelo accionamento de mina anti-carro, obrigando o pessoal a pernoitar no local, tendo sofrido um forte ataque, durante a noite. A coluna regressou a Binta, deixando no local 4 viaturas que, foram destruídas pela força Aérea; as NT sofreram 4 Mortos e 30 Feridos; o In teve 13 Mortos e outras baixas prováveis.
No dia 10 MAI 73, foi realizada uma nova coluna de reabastecimento Binta-Guidage.
Foram executadas, no total, 7 colunas, das quais 5 chegaram a Guidage; as NT sofreram 22 Mortos e 70 Feridos.
Em 29 MAI 73, foi feita uma operação de abertura de um novo itinerário Binta-Guidage, envolvendo efectivos, entre outros, a 38ª. Companhia de Comandos, a Companhia de Pára-quedistas 121 e os Destacamentos de Fuzileiros 1 e 4.
De 17 a 21 MAI 73, o Batalhão de Comandos Africanos realizou a Operação Ametista Real, com forte apoio da Força Aérea, que nela emprenhou praticamente todos os seus meios; a missão dessa operação era aniquilar ou, no mínimo, desarticular o In na zona, atacando a sua base de CUMBAMORY (Rep. do Senegal). Os resultados da operação foram: o In teve 67 Mortos e bastantes baixas prováveis; destruída uma quantidade enorme de material e capturado diverso armamento; As NT sofreram 10 Mortos, 22 feridos graves e 3 Desaparecidos.
Pelo depoimento do Chefe da REPOPER; no processo, fiquei a saber que:
- as flagelações a Guidage se iniciaram em 8 MAI 73;
- as flagelações terminaram em 1 JUN, não tendo havido flagelações nos dias 20, 24, 26, 30 e 31 MAI;
- chegaram colunas de reabastecimento, a Guidage, em 10, 12, 15 e 29 MAI;
- a guarnição de Guidage foi reforçada, por iniciativa do Comandante do COP 3 (a que pertencia), em 8 MAI, com 2 Grupos de Combate (GC) da CCAÇ 3 e, em 12 MAI, com mais um GC da CCAÇ 3 e os Destacamentos de Fuzileiros Especiais 1 e 4;
- os reforços atribuídos a Guidage foram:
. 12 MAI (coluna de reabastecimento): 5 GC do Batalhão de Caçadores 4512 (Farim), 1 bigrupo da 38ª. Companhia de Comandos e 1 Secção do Pelotão de Morteiros 4274, até às 06H40 do dia 13 MAI;
. 15 MAI (coluna de reabastecimento): 2 GC do Comando de Bissau, 1 GC da Companhia Eventual Africana e 1 Grupo de Milícias de Jemberem, até às 10h30 de 16 MAI;
. 23 a 30 MAI: Companhia de Caçadores Pára-quedistas 121;
. Pelotões de Caçadores (tropa nativa) 56 e 65, em data não indicada, para suprir as baixas da CCAÇ 19 (Guidage);
. após 29 MAI, outras forças, não discriminadas;
. as flagelações a Guidage causaram às NT, 7 Mortos, 17 Feridos graves e 13 Feridos ligeiros.
Em 8 MAI 73, a guarnição de Guidage era constituída pela CCAÇ 19 (Tropa nativa) e pelo 24º. Pelotão de Artilharia.
Refere-se ainda que em 8 MAI, por solicitação do Comandante do COP 3 (sede em Bigene, tendo-se deslocado para Guidage em 11 MAI), foi feito um reabastecimento de emergência de munições de Morteiro 81, Obus \10,5 e Espingarda G3, por 5 helicópteros para Bigene e um avião Nord Atlas para Farim.
Nos dois documentos referidos (relatório do Chefe da REPOPER e seu depoimento), verifica-se que Guidage foi fortemente reforçado, desde o 1º. dia do ataque In.
Tais documentos permitem comparar a actuação do Comando-Chefe nas duas situações: Guidage foi objecto do reforço adequado e imediato, sendo de destacar a Operação Ametista Real do Batalhão de Comandos Africanos, sobre a base do PAIGC em Cumbamory (Rep. do Senegal).
Guidage pôde ser socorrido por tropas de Farim, tendo o próprio Comandante de Batalhão comandado a coluna de reabastecimento de 12 MAI; recebeu também reforços de Binta e Bigene.
Guileje estava ainda numa situação mais difícil, relativamente a possíveis reforços locais, pois a única ligação terrestre era com Gadamael e esta foi cortada pelo In, pela emboscada de 18 MAI.
Durante o Simpósio Internacional de Guileje, realizado em Bissau, em MAR 08, tomei conhecimento, através de elementos do PAIGC, que estava planeado que as acções contra Guidage e Guileje se realizassem simultaneamente; devido ao facto de as forças do PAIGC terem sido detectadas, durante a montagem do dispositivo, em Guidage, a acção sobre esta guarnição foi desencadeada em 8 MAI, mantendo-se a data prevista em Guileje – 18 MAI.
Tenho a firme convicção que, se os dois ataques tivessem sido simultâneos, o Comando-Chefe teria repartido os reforços pelas duas guarnições – Guidage e Guileje.
Ao hipotecar praticamente todos os seus reforços em Guidage, o Comando-Chefe e o seu Estado Maior falhou a previsão dos acontecimentos em Guileje, onde sabia que o In iria actuar em força, como aconteceu.
Se Guileje tivesse sido reforçado, como o foi Guidage, não teria eu ficado com toda a responsabilidade da situação e, seguramente, não teria decidido retirar.
E não se argumente que o Comando-Chefe não tinha reservas disponíveis; se assim fosse, isso em nada abonaria a favor de um Comando responsável, empregando os seus reforços numa área do teatro de operações, estando outras sob forte ameaça.
Na verdade estava, em Cacine, um Destacamento de Fuzileiros Especiais, que poderia, de imediato, reforçar o COP 5; em Cufar (Sector do COP 4) encontravam-se as Companhias de Pára-quedistas 122 e 123; em Bissau, estava a Companhia de Paraquedistas 123, em descanso, desde 20 ABR 73; esta foi também reforçar Guidage.
Ao abordar o problema da retirada de Guileje, de uma forma séria, não pode deixar de se comparar com o que se passou em Guidage.
O procedimento do Comando-Chefe, em duas situações semelhantes, foi profundamente diferente:
Guidage foi reforçado com a maioria das suas reservas, destacando-se a Operação Ametista Real, sobre a base do PAIGC, em Cumbamory;
a Guileje não foi atribuído nenhum reforço.
Devo esclarecer o Constantino que não pretendi
"sacudir a água do capote", nem
"agi como Pilatos". Assumi inteiramente a responsabilidade da situação, decidi efectuar a retirada, por considerar que era a maneira de evitar um grande número de baixas (militares e população) e a tomada de prisioneiros, pelo In.
A certa altura, o Constantino afirma que eu nunca fui
"ilibado, mas sim amnistiado", o que é verdade. Devo esclarecer que, se tivesse sido sujeito a julgamento (e este só não se realizou, por virtude do 25 de Abril de 1974), certamente que o Chefe da REPOPER teria sido chamado a depor, como testemunha e seria interrogado sobre a maneira como resolveria o problema de Guileje, o que não aconteceu quando foi ouvido, no âmbito do processo, em que não lhe foi feita nenhuma pergunta acerca de Guileje.
Será que o Constantino concorda que, num processo sobre a retirada de Guileje, destinado a averiguar a verdade dos factos, o Chefe da REPOPER, primeiro responsável pela conduta das Operações, não tenha sido instado a pronunciar-se sobre o objecto dos autos?
E, no julgamento, o Comandante-Chefe também seria, eventualmente, posto perante os factos e solicitado a pronunciar-se sobre os mesmos.
O Constantino afirma que eu, como militar, não cumpri. É a sua opinião, que vale o que vale; para mim vale muito pouco, porque considero que não tem conhecimentos militares nem capacidade para me julgar.
Pede-me que,
"sensatamente", me
"remeta ao silêncio". Pois terá que me ler, se quiser, porque não prescindo do meu direito de resposta e defesa.
Pergunta ainda porque é que noutras zonas,
"os militares altamente massacrados pelo In, não abandonaram as suas instalações"; só me posso pronunciar sobre Guidage e Gadamael; no primeiro caso, foram apresentadas atrás os avultados reforços que lhe foram atribuídos; Gadamael, não obstante ter sido pedida a sua evacuação, pelo então Capitão Manuel Monge, não aceite pelo Comando-Chefe e foi reforçado com o Batalhão de Caçadores Pára-quedistas nº.12 (3 Companhias).
Outra afirmação é que os Obuses de 14 cm não faziam fogo para não denunciarem as suas posições; isto não corresponde minimamente à verdade; nas declarações dos Senhores Oficiais presentes em Guileje, no âmbito do processo, todos foram unânimes em afirmar que, a reacção pelo fogo às flagelações inimigas, era feita também pelos Obuses de 14 cm. O Alferes Pinto dos Santos, Comandante do 15º. Pelotão de Artilharia, em Guileje, declarou que
"executei cerca de 70 tiros…, em reacção à emboscada de 18 MAI"; o mesmo Oficial afirma que, no início do período, havia cerca de 400 munições completas; na noite de 21/22 MAI, depois de ter decidido retirar, dei-lhe ordem para, em reacção às flagelações (foram 3), gastar todas as munições completas existentes, o que aconteceu.
Desde o início das flagelações (dia 18 MAI às 20H00), houve a preocupação de "poupar" as munições de Artilharia, porque
sabíamos que não seríamos reabastecidos; o reabastecimento de munições de emergência, como aconteceu no apoio a Guidage, no primeiro dia do ataque (8 MAI), não era viável em Guileje, porque nenhum meio aéreo o faria.
O Constantino diz que "
o Major Coutinho e Lima infringiu gravemente regulamentos militares de então….é facto que desobedeceu a uma ordem legítima do Comandante-Chefe do CTIG".
Não é de admirar que confunda Comando-Chefe e CTIG, que são duas entidades distintas: o Comando-Chefe, comandava os 3 Ramos das Forças Armadas: o CTIG era o Comandante do Exército; Comandante-Chefe do CTIG não só não existia, como não faz nenhum sentido.
Esclareço que na Missão do COP 5, não constava a
"defesa a todo o custo", missão que, no limite, há que aguentar até ao último homem; se tal estivesse expressamente na minha Missão, não poderia ter decidido e efectuado a retirada.
No despacho do Comandante-Chefe, que manda instaurar auto de corpo de delito contra mim (pág.414 do meu livro), é referido que ordenei a retirada,
"sem que para tal estivesse autorizado"; porque o Centro de Comunicações foi totalmente destruído, foi impossível solicitar autorização.
[Itálicos e negritos do autor]
(Continua)
[Revisão / fixação de texto / título: L.G]
__________
Notas de L.G.:
(*) 21 de Setembro de 2009 >
Guiné 63/74 - P4986: Parabéns a você (27): O veterano Coutinho e Lima, Cor Art Ref, Gadamael (1963/65), Bissau (1968/70), COP 5 (1972/73)
(**) Vd. poste de 3 de Julho de 2009 >
Guiné 63/74 - P4634: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (13): A desonra da CCAV 8350 ou o direito a contar a minha versão... (Constantino Costa)