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terça-feira, 14 de março de 2017

Guiné 61/74 - P17138: Boatos e mentiras que correm o risco de entrar para a história (1): De 1 a 10 - Parte I: 1. O território guineense do tamanho do Alentejo; 2. O Strela, a arma que revolucionou a guerra; 3. A FAP perdeu a supremacia aérea (António Matins de Matos, ten gen pilav ref)


Guiné > Mapa da província  1961 > Escala 1/ 500 mil >  A distância entre a BA 12 (Bissalanca) e a fronteira, em Buruntuma, no nordeste, podia ser medida pelos pilotos da FAP nestes termos: 90 minutos  para a avioneta DO-27; 25 minutos para o Fiat G-91...

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2017)

1. Mensagem do António Martins de Matos (ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de 3 do corrente

Assunto - Historiadores precisam-se|

Caros amigos:

Devagar, devagarinho, estamos a perder o fulgor de outros tempos.

Nada mais sobre a Guiné para relembrar ou discutir? Ficámos cansados? A partir de agora só almoçaradas e correlativos? Só conversas sobre Futebol? O Trump e o Brexit? O Marcelo, o Costa e o Centeno?

O Spínola, Nino, Amílcar, Bettencourt, Sekou Touré, Costa Gomes, tudo gente fina, já passaram à história?

E nós, os da ralé, do chão e do ar, que andámos a suar por aquelas terrinhas, já esgotámos o saco?

Acho que sim…

A verdade é que já falámos de tudo ou quase tudo, ainda que, por vezes, de coração na boca e palavreado arrebatado, o que deu um péssimo material para os vindouros, os que vão ter de acabar por escrever a “estória”.

Acho que precisamos de algo novo.

O Público começou a publicar às quartas-feiras,  e durante 14 semanas,  os 42 episódios da série do Joaquim Furtado, "A Guerra", cada DVD com 3 episódios, acompanhados de um texto do Aniceto Simões e Matos Gomes e prefaciados por diversos historiadores.

Pela minha parte os postes,  aqui no blogue,  de inquéritos, da 1.ª Guerra, comemorações de aniversários, efemérides e correlativos…, não me interessam.

Relembrando o que nos uniu, talvez pudéssemos passar a uma nova fase, organizar umas “mesas redondas”, “quadradas”, “tertúlias” ou algo parecido, com algum pessoal a participar, moderador, um secretário e um “historiador de serviço”, discussão construtiva sobre um determinado tema, com conclusões fundamentadas e aceites pela maioria. Depois era só enviar o papel a quem de direito.

Há um grande número de assuntos com interesse a que correspondem um número infindável de postes e que poderiam dar lugar a um texto devidamente “certificado”…

Que acham?

Entretanto e para (re)animar a malta juntei alguns assuntos que já foram discutidos e discutidos mas que nunca obtiveram um consenso alargado.

Deixo-vos com 10 temas, ideias que tenho defendido e que, se o entenderem, poderemos abordar durante o nosso almoço anual, talvez ao lanche [, dia 29 de abril de 2017, em Monte Real], entre um croquete e uma imperial.

Abraços
AMM

2. Comentário dos editores:

António:

Razão tinha/tem o "marafado" do António Aleixo:

P'ra a mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem de trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.


A tua reflexão merece um debate profundo... E estamos-te gratos por vires tentar agitar as águas paradas da lagoa da Tabanca Grande... Os "blogueiros" andam meio anestesiados, adormecidos, desmemoriados... Será a síndrome do Alzheimer coletivo ou geracional?... Outros há que são agora mais "facebook...eiros"... Se calhar, a culpa também é nossa, mas nestas coisas,,, "o povo é quem mais orden(h)a"!... Mas, temos de reconhecer, 13 anos a blogar é "manga de tempo", é o tempo que durou a guerra da Guiné, a contar de 1961 a 1974...

Mas, para já, vamos publicar o teu texto em dois ou três  postes, numa nova série que tu vais abrir, e que tem algo de provocatório, no sentido etimológico do termo (provocatório, provocante, de
provocar: do latim provoco, -are, chamar para fora, mandar sair, mandar vir, estimular, exortar, desafiar, apelar, incitar):

Eis o título da série, que tu vais inaugurar:

Boatos e mentiras que correm o risco de entrar para a história (1): De 1 a 10 - Parte I: 1. O território guineense do tamanho do Alentejo; 2.  O Strela, a arma que revolucionou a guerra: 3. A FAP perdeu a supremacia aérea (António Martins de Matos, ten gen pilav ref)

Cada poste pode ser precedido pela genial quadra do António Aleixo... Já aqui "desmontámos" alguns mitos: por exemplo, o local da proclamação da independência da Guiné-Bissau, que nunca foi em MADINA DO BOÉ, contrariamente à propaganda do PAIGC!... E corrigimos erros toponímicos da nossa historiografia militar (v.g., Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes, que puseram o I congresso do PAIGC, em  Cassamá, em 1964, a realizar-se em plena ilha do Como e em plena Op Tridente!)...


por António Martins de Matos



sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17038: Militares mortos na 1.ª Guerra Mundial e Guerra do Ultramar do concelho de Torre de Moncorvo (Armando Gonçalves) - Parte IV: TO de Angola, Guiné e Moçambique, a Primavera Marcelista e o fim do Estado Novo


Torre de Moncorvo: logo da câmara municipal (cortesia da página do município). 
O município erigiu, em 2013, um monumento aos combatentes da guerra do ultramar.



Eduardo Mondlane (1920-1969)

"Fundador e primeiro Presidente da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), arquitecto de Unidade Nacional, nasceu em Manjacaze, Província de Gaza, a 20 de Junho de 1920 e faleceu a 3 de Fevereiro de 1969, vitima de um livro armadilhado com bomba que ao explodir pôs termo a sua vida.

"Filho de um chefe tradicional, Mondlane estudou na missão presbiteriana suíça, próxima de Manjacaze, terminou os seus estudos secundários numa escola da mesma igreja na África do Sul, depois de uma curta passagem pela Universidade de Lisboa, foi ainda financiado pelos suíços para fazer os estudos superiores nos Estados Unidos da América, onde se doutorou em sociologia".

(Foto e e legenda > Fonte: Frelimo, com a devida vénia)



1. Continuação do trabalho de pesquisa do nosso amigo Armando Gonçalves, professor de História, do Agrupamento de Escolas Dr. Ramiro Salgado, em Torre de Moncorvo, e que aceitou integrar a nossa Tabanca Grande, passando a ser o nº 733 (*)

Parte IV (pp. 16-19)

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P17008: Efemérides (243): Acontecimentos no mês de Janeiro, entre 1963 e 1974, na Guiné (António Tavares, ex-Fur Mil SAM)



1. Mensagem do nosso camarada António Tavares (ex-Fur Mil SAM da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), datada de 30 de Janeiro de 2017:

Camarigos,
Neste Janeiro de 2017, recordemos

OS PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE OUTROS JANEIROS, no Comando Territorial Independente da Guiné:

Em Janeiro de 1960 Amílcar Cabral abandona definitivamente Lisboa para encabeçar a luta de libertação nacional da Guiné.

1963.01.09 - Inauguração, no Centro Nacional de Transmissões, em Lisboa, da ligação pela rádio e teleimpressor com os Serviços Militares da Guiné.

1963.01.23 - Início da luta armada na Guiné, com um ataque ao quartel de Tite, no Sul da Guiné, pelo PAIGC.

1964.01.05 - Ataque do PAIGC a Mansabá, no Morés, com implantação de minas na estrada Mansabá-Mansoa, uma das quais foi accionada por uma autometralhadora Fox.

1964.01.14 - Início da Operação Tridente na ilha de Como, no Sul da Guiné, que se prolonga por mais de dois meses. Nesta operação, que durou 71 dias, Portugal mobilizou cerca de 1200 homens, do Exército, Marinha e Força Aérea.

1964.01.28 - O PAIGC implanta minas na estrada Mansabá-Bissorã e na estrada Bissorã-Olossato.

1965.01.01 - Primeira emissão de uma Emissora de Rádio do PAIGC. O PAIGC dispunha da Rádio Libertação, que era a emissora do partido e, a nível internacional, dispunha do apoio da Rádio Conacri, Rádio Pequim, Rádio Praga, Rádio Gana e Rádio Cairo, que emitiam várias horas em português.

1966.01.03 - Amílcar Cabral teve diversos encontros com Fidel Castro em Havana. Foi a partir desta data que se iniciou a ajuda cubana ao PAIGC, fornecendo assessoria militar e ajuda médica.

1966.01.04 - Criação do Serviço Postal Militar, através do Decreto-Lei n.º 46 826, constituído por um número com quatro algarismos. O oito (- - - 8) era o último número atribuído ao CTI da Guiné.

1966.01.22 - Ataque de guerrilheiros do PAIGC a Fulacunda, Sul de Bissau, apoiado com morteiros 82 mm e foguetes de 122 mm, causando 13 feridos.

1968.01.03 - A PIDE referia nos seus relatórios desinteligências graves entre Amílcar Cabral e Malam Sanhá, Mamadu Djassi e Oto, que se tinham recolhido a Conacri. A acusação que faziam a Cabral era a do favorecimento aos cabo-verdianos.

1968.01.10 - Ataque simultâneo do PAIGC à Lancha de Fiscalização Grande (LDG) Hydra e ao quartel de Cacine no rio Cacheu.

1968.01.11 - Emboscada a uma coluna portuguesa na estrada Guileje-Gadamael-Porto causando um morto e oito feridos à força portuguesa.

1968.01.24 - Ataque do PAIGC a aviões T-6 e Fiat G-91 com metralhadora antiaérea na região de Cafal Balanta – Cantanhez-Sul.

1968.01.31 - Ataque do PAIGC ao quartel de Buba, no Sul, provocando sete feridos e grandes destruições. O ataque foi acompanhado pelo capitão cubano Peralta. Este seria capturado em 16.11.1969  no corredor de Guileje por forças Paraquedistas, durante a operação Jove.

1969.01.21 - Operação Grande Colheita na zona de Bigene, nos “corredores” Talicó e Sambuiá.

1970.01.05 - Reunião entre o PAIGC e o Governo do Senegal para resolver a crise existente em Casamança.

1971.01.01 - O PAIGC entrega um cabo e três soldados desertores do Exército Português ao Crescente Vermelho da Argélia. O PAIGC encaminhava habitualmente os prisioneiros portugueses para Argel através do Crescente Vermelho.

1972.01.13 - Forças portuguesas capturaram duas rampas de foguetões do PAIGC, na região de Aldeia Formosa.

1972.01.24 - Golpe de mão de guerrilheiros do PAIGC, comandados por Queba Sambu, a Catió, fazendo prisioneiros dois militares portugueses.

1972.01.27 - Convite formal do PAIGC ao Conselho de Segurança da ONU para enviar uma delegação às “áreas libertadas da Guiné”.

1973.01.08 - Amílcar Cabral anunciou que o Estado da Guiné-Bissau seria proclamado em 1973. Esta promessa foi feita no final da mensagem de Ano Novo lida por Amílcar Cabral na rádio de Libertação, a emissora do PAIGC.

1973.01.20 - Assassínio de Amílcar Cabral, em Conacri.

1973.01.27 - Mensagem de exortação dos dirigentes do PAIGC aos combatentes, na sequência da morte de Amílcar Cabral, assinada por Aristides Pereira, Luís Cabral, Chico Mendes, Victor Saúde Maria, Silvino da Luz e Paulo Correia.

1973.01.28 – Continuação da reocupação do Cantanhez.

1974.01.01 - Fim da Operação Galáxia Vermelha no Cantanhez, a primeira grande operação do comando de Bettencourt Rodrigues.

1974.01.03 - Flagelação do PAIGC a Canquelifá com mais de 100 foguetões de 122mm e 50 granadas de morteiro durante mais de 10 horas.

1974.01.06 - Ataque do PAIGC a Canquelifá com 50 foguetões de 122mm durante três horas e a Buruntuma durante 50 minutos com 30 foguetões de 122 mm.

1974.01.07 - Emboscada do PAIGC na estrada Bajocunda-Copá.

1974.01.07 - Operação Minotauro, na zona de Canquelifá, tendo uma força do recrutamento local interceptado um grupo do PAIGC com 50 elementos, causando-lhe 22 mortos confirmados.

1974.01.07 - Disparos de mísseis Strela contra dois aviões Fiat G-91 em Bedanda.

1974.01.08 – O PAIGC destruiu com cargas explosivas o pontão na estrada Pirada-Bajocunda sobre o rio Mael Jaube.

1974.01.09 – O PAIGC atacou com RPG e armas automáticas quatro helicópteros e um heli-canhão em operações na região de Canquelifá.

1974.01.20 - Ataques do PAIGC a várias guarnições militares no Sul da Guiné para celebrar o 1.º aniversário da morte de Amílcar Cabral.

1974.01.21 - Primeira acção do PAIGC na cidade de Bissau, com lançamento de engenhos explosivos contra autocarros da Força Aérea.

1974.01.26 – Assinatura de um contrato para fornecimento a Portugal de mísseis Antiaéreos Crotale, destinados à defesa antiaérea dos pontos sensíveis na Guiné.

1974.01.28 – O PAIGC lança dois engenhos explosivos num café de Bissau frequentado por militares portugueses.

1974.01.31 - Novo ataque do PAIGC a Canquelifá, próximo da fronteira do Senegal com 50 foguetões de 122mm durante duas horas. Um avião militar português Fiat G-91 foi abatido com um míssil Strela a sul de Canquelifá. O piloto ejectou-se e foi recuperado na povoação de Dunane no dia seguinte.

Fonte:  Os Anos da Guerra Colonial, 1961-1975, de Aniceto Afonso e Carlos de Matos Gomes (Quidnovi II, Matosinhos, 2010, 832 pp.).

Abraço
António Tavares
Foz do Douro, Domingo 29 de Janeiro de 2017
____________

Nota do editor

Último poste da série de 9 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16938: Efemérides (242): Homenagem a Vitor Manuel Parreira Caetano (Mário Pinto, ex-fur mil at art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá", Buba, Aldeia Formosa e Mampatá, 1969/71)

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16647: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (15): Desertor era o militar que (i) foi incorporado, (ii) estava nas fileiras e (iii) as abandonava ao fim de algum tempo... Desconfio um bocado do número de desertores que foi avançado pelos historiadores Miguel Cardina e Susana Martins, se for aplicada a definição exacta dos regulamentos da época (António J. Pereira da Costa, cor art ref)


1961 > Chegada a um porto ultramarino (talvez Luanda), de um contingente militar oriundo da metrópole. [ Foto, alegadamente do porto de Bissau,  adquirida na Papelaria Benfica, junto ao estádio Sarmento Rodrigues... Em 1961, o porto de Bissau não tinha grandes condições para a atracagem de naivos de maior calado do que, por exemplo, os da classe Manuel Alfredo,  Alfredo da Silva ou Ana Mafada. Também parece que não havia carris nem grandes guindastes.].

A foto é do nosso camarada açoriano, ex-fur mil  Durval Faria,  um dos primeiros de nós,  a partir para a Guiné, logo em 1962... Pertenceu à CCAÇ 274 / BCAÇ 356 (1962/64)... O Durval Faria chama-lhe Companhia de Caçadores Especiais nº 274, constituída por militares das lhas de São Miguel e Santa Maria]

Foto do Mural do Facebook, do nosso camarada Durval Faria (Lagoa, S. Miguel, Açores) (Aqui reproduzidas com a devida vénia...). O Durval Faria é membro da nossa Tabanca Grande



1. Comentário de António J. Pereira da Costa ao poste P16628 (**)

[António José Pereira da Costa, cor art ref (ex-alf art , CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-cap art e cmdt , CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74; tem mais de 110 referências no nosso blogue]

Olá,  Camaradas

Desertor é o militar "que deserta". Isto é, o que foi incorporado, está nas fileiras e as abandona, ao fim de algum tempo.

Ponho à consideração do blog que "puxe pelas memórias" e tente lembrar-se de quantos militares desertaram nas unidades a que cada um pertenceu. Creio que o número de desertores "na frente de batalha", foi absolutamente residual, creio que por falta de confiança no "tratamento" que o inimigo lhes daria. 

Podemos lançar um inquérito "à Luís Graça" com a pergunta quantos camaradas desertaram na minha unidade no TO daquela PU? 

As cinco hipóteses: 

nenhum
um
dois
três
mais de três 

Não se aceitam respostas do tipo "não sei/não me lembro", uma vez que um caso de deserção numa companhia era um caso muito falado. 

Será de excluir a deserção dos naturais da PU? Ou deverão ter um tratamento estatístico à parte?

No fundo, estavam nas mesmas condições dos que desertavam nas unidades metropolitanas. Há também o caso dos que desertavam "para trabalhar". Tive vários casos de homens que desertavam - ausentavam-se por mais de 8 dias se eram prontos ou mais de 15 dias na recruta - para irem trabalhar nas colheitas e outros trabalhos agrícolas e depois, finda a tarefa, voltavam.

Este tipo de deserção levanta a questão do "patriotismo" do nosso povo. É um conceito escorregadio que se poderia medir pelo número de "voluntários". No fundo, "aquilo da tropa era uma chatice". Pagavam uma miséria, davam comida que até podia ser em quantidade mas, às vezes, não era assim tão boa e era muito diferente da de "lá de casa". (A questão da comida é/era importante.).

O ambiente do quartel (caserna e refeitório) tinha muito que se lhe dissesse...

Ensinavam(?) coisas que não interessavam para nada e até mandavam fazer ginástica que só servia para cansar e chatear. Ukék eutouakiafazer? Uké isso da pátria?

Este tipo de desertores era frequente e, quando punidos pelo crime, não entendiam o que tinha passado e alegavam que não tinham cometido crime nenhum e até diziam:
- Eu não fugi. Precisava de ir para sustentar a família.

A legislação sobre "amparos" era e tinha de ser muito restritiva. E tudo acabava no embarque para o TO de alguma PU.

Desertores "ideológicos", nas unidades territoriais,  era poucos. Poderemos lançar mais um inquérito, pois assistimos a casos de deserção sem regresso e, na minha opinião, são estes os verdadeiros desertores, os que se recusaram a fazer a guerra e preferiram deixar o país definitivamente e reiniciar a vida noutro país. Claro que a consulta às ordens de serviço das unidades não permite destrinças entre as diferentes situações.

Para ser sincero, desconfio um bocado do número de desertores, se for aplicada a definição exacta dos regulamentos.

Parece-me que estamos a referir como "desertor" qualquer homem que fugiu ao serviço militar, quer tenha fugido adolescente - antes de "dar o nome" [, faltoso] - quer o tenha dado e tenha fugido quando a incorporação se aproximava [refratário]. 

Estes números são muito consideráveis, mas creio que não sejam determináveis com grande exactidão. Julgo que os serviços não os controlavam, nem para efeito de estatística, o que poderia medir a impopularidade da guerra ou patriotismo do povo. Este resultado poderia ser decepcionante para os "guerristas".

Para se ser desertor - naquele tempo e hoje - é necessário ter-se sido incorporado. Era, nos termos da lei do tempo, um crime "essencialmente militar", ou seja, um crime que só os militares podiam cometer. Hoje a legislação mudou e não existe este tipo de crimes. 

Se se não era incorporado,  era-se civil e, quanto muito, deixava de se cumprir "um dever de cidadania", como se diz hoje.

Neste âmbito, considerando que os membros do blog são ex-militares, teremos de tomar como verdadeiros os elementos fornecidos pelos investigadores, relativos àquelas duas situações. Seria bom que eles indicassem o seu método de trabalho, técnica de interpretação de elementos disponíveis e fontes consultadas.

Aqui, era interessante consultarmos as histórias das unidades, onde as deserções em face do inimigo deverão vir assinaladas e, talvez, personificadas.

O tal inquérito sobre esta matéria seria interessante...

Para a maioria dos membros do blog, dada a curta permanência na "metrópole", será difícil fornecer números de desertores nas unidades do continente e ilhas. (***)

2. Comentário do editor:

Seguimos a sugestão do nosso amigo e camarada Tó Zé, abrindo um inquérito 'on line' no sítio do costume, o  canto superior da coluna da esquerda... 

Vamos considerar também as eventuais situações de deserção na metrópole, aquando da formação da companhia (ou equivalente). Pode haver um caso ou outro onde seja difícil obter elementos fiáveis: por exemplo, na minha CCAÇ 2590, futura CCAÇ 12, éramos cerca de 60 e tal graduados e especialistas que se juntaram no Campo Militar de Santa Margarida para "formar a companhia".  Não posso garantir que alguém não tenha comparecido (, sendo dado nesse caso como desertor). Mas penso que não. Era uma unidade "atípica" que se foi juntar aos seus praças, do recrutamento local, já recrutas (cerca de 1 centena).  Demos-lhes a instrução de especialidade e fizemos com eles a IAO. Não houve deserções  no tempo em que lá estive (maio de 1969/março de 1971). Fomos substituídos por outros graduados e especialistas, em rendição individual.

Já no caso da CCAÇ 2402 / BCAÇ 2851, (, Mansabá e Olossato, 1968/70), por exemplos, sabemos que houve, na véspera do embarque, a deserção de um oficial miliciano (ou aspirante a oficial miliciano).

O nosso inquérito desta semana contempla as duas situações: a hipótese de deserção ter ocorrido na metrópole e ou já no TO da Guiné. Podem e devem ser dadas duas respostas: por exemplo, 1. Nenhum [caso], na metrópole; e 2. Nenhum [caso], no TO da Guiné. Ou então: 3. Um [caso], na metrópole; e 2. Nenhum [caso], no TO da Guiné. 

INQUÉRITO 'ON LINE': "NA MINHA UNIDADE (COMPANHIA OU EQUIVALENTE) NÃO HÁ CASOS DE DESERÇÃO" 

1. Nenhum, na metrópole

2. Nenhum, no TO da Guiné

3. Um, na metrópole

4. Dois, na metrópole

5. Três ou mais, na metrópole

6. Um, no TO da Guiné

7. Dois, no TO da Guiné

8. Três ou mais, no TO da Guiné


A responder até 3/11/2016, 5ª feira, 15h34.
______________

(**) Vd. poste de 22 de outubro de  2016 > Guiné 63/74 - P16628: Recortes de imprensa (83): Guerra colonial: mais de 200 mil refratários, mais de 8 mil desertores... e faltosos, não se sabe..., segundo estudo em curso conduzido pelos historiadores Miguel Cardina e Susana Martins (Lusa / DN - Diário de Notícias / Expresso, de ontem

(...) Os historiadores do Centro de Estudos Sociais (CES), da Universidade de Coimbra, vão apresentar os dados finais do estudo no colóquio "O (as)salto da memória: histórias, narrativas e silenciamentos da deserção e do exílio", que se realiza na quinta-feira, no qual será também apresentada documentação inédita sobre desertores da Guerra Colonial.

De acordo com os investigadores, o número definitivo do novo estudo sobre militares que desertaram da Guerra Colonial "pode pecar por defeito" porque ainda não é possível contabilizar os dados referentes a todos os territórios e o estudo tem como base apenas fontes do Exército.

O Código de Justiça Militar definia como desertor aquele que não comparecia na instalação militar a que pertencia num prazo limite de oito dias.

Segundo Miguel Cardina, para compreender o fenómeno da recusa de ir à guerra, além dos militares que desertaram, é preciso também considerar os refratários - jovens que faziam a inspeção mas que fugiam antes da incorporação - e os faltosos, que nem sequer faziam a inspeção militar.

"Temos dados que indicam que entre 1967 e 1969 cerca de dois por cento dos jovens que são chamados à inspeção foram refratários. Este número é certamente superior ao número dos desertores. Os faltosos são aqueles que nem sequer se apresentam à inspeção. Dados de 1985 do Estado-Maior do Exército indicam que cerca de 200 mil terão abandonado o país. Na década de 1970, cerca de vinte por cento dos jovens que deveriam fazer a inspeção já não se encontravam no país", indicou o historiador do CES.

Para Miguel Cardina, o "processo de afastamento e fuga" da estrutura militar deve ser estudado com profundidade e, por isso, o estudo começa pelos desertores - porque não existiam números conhecidos até ao momento - mas frisou que é preciso considerar as outras categorias: os refratários e os faltosos.

"Temos de colocar estas três categorias na mesma equação, sabendo que elas são diferentes e têm uma ligação com o fenómeno da guerra, também ela diferente. É natural que, no quadro dos faltosos, a guerra possa estar presente mas não tem o mesmo peso que tem nos refratários e também nos desertores", explicou.

Segundo o historiador, o "fenómeno dos faltosos" cruza-se com o fenómeno da emigração, sendo que uma boa parte destes jovens não estavam a "fugir da guerra" mas também da falta de perspetivas de futuro, ou seja, "a guerra podia ser" uma das motivações para o ato de emigrar. (...)


(***) Último poste da série > 24 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16631: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (14): A maldição de Cancolim e a CCAÇ 3489 que teve dois casos (o capitão e um alferes) de "abandono" (no período de férias) e um de "deserção" para as fileiras do IN, o sold at inf José António Almeida Rodrigues (1950-2016)

sábado, 22 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16628: Recortes de imprensa (83): Guerra colonial: mais de 200 mil refratários, mais de 8 mil desertores... e faltosos, não se sabe..., segundo estudo em curso conduzido pelos historiadores Miguel Cardina e Susana Martins (Lusa / DN - Diário de Notícias / Expresso, de ontem


Amadora > RI 1 > 1968 > CCAÇ 2402, em formação > De pé e da esquerda para a direita, o Raul Albino, o Francisco Silva e o Medeiros Ferreira, aspirantes milicianos.  [Os dois primeiros são membros da nossa Tabanca Grande.]

O João Bonifácio, ex-furriel mil SAM, CCAÇ 2402 (, Mansabá e Olossato, 1968/70) e que vive no Canadá, evocou aqui no poste P1592, o exemplo do Medeiros Ferreira que, como é publicamente sabido, não compareceu ao embarque, para a Guiné . Ele é, das nossas figuras públicas, talvez o mais conhecido dos desertores da guerra colonial.

Na foto acima, o antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros de Mário Soares (I Governo Constitucional, 1976/78), historiador e professor universitário (FSCH/NOVA), já falecido, José Medeiros Ferreira (Ponta Delgada, 1942 - Lisboa, 2014), aparece assinalado com um círculo a vermelho. Foi também um dos principais dirigentes estudantis durante a crise académica de 1962.

Foto: © Raul Albino (2006). Todos os direitos reservados.



Cartaz do Colóquio O (as)salto da memória", 27 de outubro de 2016,  FSCH / NOVA, Lisboa



1. Reprodução de excerto, com a devida vénia,  de notícia da Lusa, publicada no DN - Diário de Notícias, de ontem,  "Mais de oito mil soldados desertaram da Guerra Colonial"


(...) O número de militares do Exército Português que desertaram entre 1961 e 1973 ultrapassou os oito mil, segundo uma investigação dos historiadores Miguel Cardina e Susana Martins que vai ser apresentada num colóquio sobre deserção e exílio.

"Este número, baseado em fontes militares, é um número que peca por defeito e refere-se ao período entre 1961 e 1973. É bastante acima de oito mil e é um número importante porque, até agora, não tínhamos dados sobre o pessoal já incorporado", disse à Lusa Miguel Cardina, um dos autores da análise histórica sobre o fenómeno da deserção da Guerra Colonial.

Miguel Cardina antecipou à Lusa algumas das conclusões do estudo que será apresentado na próxima quinta-feira na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas [da Universidade NOVA de Lisboa], em Lisboa.

"Tínhamos algumas referências a números mas eram parcelares e faziam eco de um certo tipo de deserções. O que nós vamos mostrar é que a deserção é um fenómeno mais complexo do que aquilo que se considerava", explicou.

Os historiadores do Centro de Estudos Sociais (CES), da Universidade de Coimbra,  vão apresentar os dados finais do estudo no colóquio "O (as)salto da memória: histórias, narrativas e silenciamentos da deserção e do exílio", que se realiza na quinta-feira, no qual será também apresentada documentação inédita sobre desertores da Guerra Colonial.

De acordo com os investigadores, o número definitivo do novo estudo sobre militares que desertaram da Guerra Colonial "pode pecar por defeito" porque ainda não é possível contabilizar os dados referentes a todos os territórios e o estudo tem como base apenas fontes do Exército.

O Código de Justiça Militar definia como desertor aquele que não comparecia na instalação militar a que pertencia num prazo limite de oito dias.

Segundo Miguel Cardina, para compreender o fenómeno da recusa de ir à guerra, além dos militares que desertaram, é preciso também considerar os refratários - jovens que faziam a inspeção mas que fugiam antes da incorporação - e os faltosos, que nem sequer faziam a inspeção militar.

"Temos dados que indicam que entre 1967 e 1969 cerca de dois por cento dos jovens que são chamados à inspeção foram refratários. Este número é certamente superior ao número dos desertores. Os faltosos são aqueles que nem sequer se apresentam à inspeção. Dados de 1985 do Estado-Maior do Exército indicam que cerca de 200 mil terão abandonado o país. Na década de 1970, cerca de vinte por cento dos jovens que deveriam fazer a inspeção já não se encontravam no país", indicou o historiador do CES.

Para Miguel Cardina, o "processo de afastamento e fuga" da estrutura militar deve ser estudado com profundidade e, por isso, o estudo começa pelos desertores - porque não existiam números conhecidos até ao momento - mas frisou que é preciso considerar as outras categorias: os refratários e os faltosos.

"Temos de colocar estas três categorias na mesma equação, sabendo que elas são diferentes e têm uma ligação com o fenómeno da guerra, também ela diferente. É natural que, no quadro dos faltosos, a guerra possa estar presente mas não tem o mesmo peso que tem nos refratários e também nos desertores", explicou.

Segundo o historiador, o "fenómeno dos faltosos" cruza-se com o fenómeno da emigração, sendo que uma boa parte destes jovens não estavam a "fugir da guerra" mas também da falta de perspetivas de futuro, ou seja, "a guerra podia ser" uma das motivações para o ato de emigrar.

A primeira conclusão do estudo indica, sobretudo, que a Guerra Colonial tem ainda aspetos de natureza historiográfica que é preciso aprofundar e torna evidente que a temática do exílio, da deserção e da recusa da guerra precisa de ser estudada. (...)

Sobre os militares que desertaram, Miguel Cardina indicou que "todas as histórias de fuga são individuais" e que, por isso, devem ser tidos em conta os portugueses que vão para a África e que desertam das colónias, refugiando-se em Argel ou na Europa, assim como os africanos incorporados nas forças portuguesas.

Cardina frisou que, nos anos finais do conflito colonial, há um fenómeno de africanização das tropas, "porque havia pouca gente e, por isso, havia necessidade de soldados para a guerra", verificando-se que muitos africanos incorporados na tropa portuguesa constituem, em muitos casos, um fluxo específico de deserção.

O colóquio é organizado pela Associação dos Exilados Portugueses (AEP61-74) [, tem página no Facebook, aqui], Centro de Documentação 25 de Abril, Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Centro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA) e Instituto de História Contemporânea.

Vão estar presentes, além de Miguel Cardina e Susana Martins, os historiadores Rui Bebiano, do Centro de Documentação 25 de Abril, Victor Pereira, da Universidade de Pau, em França, e os historiadores Irene Pimentel, Sónia Ferreira, Sónia Vespeira de Almeida e Cristina Santinho.

O presidente da Associação de Exilados Políticos Portugueses, Fernando Cardoso, disse à Lusa que a questão dos desertores da Guerra Colonial (1961-1974) deve ser "analisada com profundidade" porque ainda divide a sociedade portuguesa. (...)


2. Recorte do Expresso, com data de ontem > Centro de Documentação 25 Abril divulga material sobre desertores da Guerra Colonial



(...) O Centro de Documentação 25 de Abril está a preparar documentação inédita sobre desertores da Guerra Colonial para divulgar durante o colóquio sobre a deserção, na próxima quinta-feira, em Lisboa.

“Basicamente, são documentos, muitos deles pessoais e de organizações que se destinavam a apoiar politicamente e pessoalmente os desertores, e que não são conhecidos. Muitas destas organizações resultaram de circunstâncias que já passaram e que só existiram enquanto foram necessárias”, disse à Lusa Rui Bebiano, historiador e diretor do Centro de Documentação 25 de Abril.

O historiador é um dos participantes no colóquio “O (as)salto da memória: história, narrativas e silenciamentos da deserção e do exílio”, que vai decorrer na próxima quinta-feira na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, em Lisboa.

A divulgação inicial de material respeitante à deserção da Guerra Colonial (1961-1975) - através do site do Centro de Documentação 25 de Abril - está integrada nos trabalhos do colóquio e organiza documentos pessoais e de material de países estrangeiros que apoiavam os movimentos de libertação nas antigas colónias portuguesas, assim como os militares que decidiram desertar.

“Nós temos o espólio de organizações de apoio aos desertores na Suécia, na Holanda e em França e temos materiais que nos foram cedidos por exilados e desertores, e é isso que vamos apresentar nesta exposição virtual”, acrescentou Rui Bebiano.

Além da apresentação do material de arquivo, o diretor do Centro de Documentação 25 de Abril vai também fazer uma comunicação que levanta a interrogação sobre se os desertores da Guerra Colonial foram heróis ou traidores.

“Pretendo refletir sobre esta divisão entre aquelas pessoas que consideram os desertores como heróis e aqueles que vêm os desertores como traidores. Há aqui duas vertentes: há pessoas que pensam que o desertor abandonou o teatro de guerra por medo, porque não queria morrer ou ficar ferido. Essas pessoas continuam a pensar da mesma maneira, ainda hoje”, referiu Rui Bebiano, sublinhando que a sociedade portuguesa ignora os motivos da deserção assim como a realidade vivida pelos exilados e desertores antes de 1974.

“É preciso desfazer a ideia de que o desertor ia para uma bela vida no estrangeiro porque, na verdade, foi uma vida de dificuldades e de privações”, afirmou o historiador.

“A animosidade em relação aos desertores – que perdura nos dias de hoje - deve-se à ausência de memória. Não se conhecem as razões que levaram as pessoas a desertar e desconhece-se como foi a vida que essas pessoas levaram a partir do momento em que escolheram não combater, e isso é muito importante. É por isso que este colóquio faz todo o sentido”, disse Rui Bebiano, considerando que se trata de um assunto “esquecido” pela sociedade portuguesa. (**)

“O importante é a compreensão, quer em relação àqueles que decidiram desertar como também em relação a todos os que quiseram combater”, concluiu. (...) (***)


(Excerto reproduzido com a devida vénia...)
________________


(...) [João Bonifácio:] Pessoalmente, acho que cada um de nós tem o direito a demonstrar o seu ponto de vista, mesmo que negativo. Depois do 25 de Abril, penso que todos os que foram obrigados pelo antigo regime de Salazar e Marcelo Caetano, a refugiar-se em certos países da Europa, puderam todos, ou quase todos, regressar a Portugal e restabelecer as suas vidas junto aos seus familiares.

Por isso, penso que este tema, por muito complicado que seja, deverá ser discutido abertamente por todos os que sintam ter as suas ideias quanto aos chamados desertores. Hoje, e depois de ler neste blogue que o Amigo Luís em tão boa hora iniciou, ter lido das dificuldades de tantos militares, que por pouco não foram apanhados à mão e até fugiram para o mato, para não falar do abandono total por parte dos chefes da guerra em abandonar estes nossos irmãos, até já fiz a pergunta se eu não deveria ter feito o mesmo. (...)


(...) [Paul Raposo:] Quem fugiu, foi por medo, conveniência, comodismo, etc. Uma coisa é certa, por política é que não foi. Esta de, à ultima da hora, vir dizer que se era antifacista, não cola. Se havia assim tantos, então no tempo da outra senhora onde andavam? Andavam a mamar à custa do regime e, para se branquearem, viraram resistentes para aranjarem novos tachos. Cambada de oportunistas.
Atenção, não me compete criticar ninguém, mas galos e perús não são todos uns. Bem me custou o embarque, fugir era mais fácil. (...)


(...) J. L. Vacas de Carvalho:] Uma parte da minha consciência diz que não devemos fazer juízos de valor sobre as causas que levaram um português a desertar. pode ter sido por razões familiares, razões de consciência ou por outras razões que não me compete a mim julgar ou criticar. Outra parte de mim diz-me que eles simplesmente fugiram, tiveram medo, acobardaram-se. Ponto final. Admiti-los no nosso blogue é uma traição a quem lá esteve e que por quem lá morreu. No entanto o nosso Presidente no seu mais alto critério assim o decidirá.(...)

(**)  "Desertores" é um dos temas fraturantes do nosso blogue, que é um blogue de combatentes, dos que cumpriram o dever como portugueses, independentemente das reservas ou objeções (políticas, ideológicas, religiosas, morais, etc.) que podia, ter ou não em relação àquela guerra.

Temos, mesmo assim, cerca de meia centenas de referências com o marcador "desertores"... Em prosa,. em verso: vd. por exemplo poste de 2 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13680: Manuscrito(s) (Luís Graça) (40): Selfies /autorretratos: o meu amigo F..., pintor, e eu... Queria que fôssemos, a salto, até Paris, em 1965...

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15731: Documentos (29): Ata da reunião do CEMGFA, Costa Gomes, com os comandos do CTIG, Bissau, 8/6/1973 (José Matos, historiador independente)





Cópia de documento de 4 páginas, do Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), de 15/6/1973, com o relato de uma reunião com os comandos militares do CTIG em 8 de junho de 1973.   Francisco da Costa Gomes (1914-2001) foi CEMGFA de 5/9/1972 a 13/3/1974.   Visitou o CTIG,  de 6 a 9 de junho de 1973.



1. Mensagem, com data de ontem, do José Matos, 

[ O nosso grã-tabanqueiro José [Augusto] Matos, formado em astronomia em 2006 na Inglaterra ( University of Central Lancashire, Preston, UK ), é especialista em aviação e exploração espacial desde 1992, e faz parte da Fisua - Associação de Física da Universidade de Aveiro.

Tem-se dedicado, como investigador independente, à história militar, e em particular à história da guerra na Guiné (1961/74).]

Olá, Luís

Mando-te um documento [, de 4 pp.]  interessante sobre a reunião que Costa Gomes teve na Guiné, quando foi lá em Junho de 1973, de 6 a 9.

Ab, Zé

2. Comentário do editor:

Obrigado,  Zé. Os antigos combatentes da Guiné, e não apenas os investigadores, têm direito a conhecer estes "documentos para a história"...

 O documento que reproduzimos, com data de 15/6/1973, ontem "muito secreto, hoje "desclassificado", à guarda do Arquivo de Defea Nacional, para consulta dos estudiosos e historiadores,  fala por si, mas tu tens aqui no blogue vários postes teus  que ajudam o nosso leitor  a compreendê-lo melhor, a partir da sua  contextualização histórica, geoestratégica, política e militar.

Julgo que pode este documento pode (e deve) ser visto como complemento à série Análise da situação do inimigo - Acta da reunião de Comandos, realizada em 15 de Maio de 1973 no Quartel-general do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné, aqui publicada há menos de 4 anos (*), da autoria do Luís Gonçalves Vaz [, membro da Tabanca Grande e filho do Cor Cav CEM Henrique Gonçalves Vaz, último Chefe do Estado-Maior do CTIG, 1973/74, e que tinha 13 anos e vivia em Bissau quando se deu o 25 de abril de 1974, que derrubou o regime do Estado Novo]. (*)

Na realidade, em 8/6/1973, o que o CEMGFA fez, foi um "briefing" com os todos os comandos militares do CTIG. Recorde-se,  citando o poste P9639, do Luís Gonçalves Vaz (*), que três semanas antes,  “em 15 de Maio de 1973, pelas 10h30, no Quartel General do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné, teve lugar, sob a presidência e mediante convocação do General Comandante-Chefe, General António de Spínola, uma reunião de Comandos na qual participaram os comandantes-adjuntos",  respectivamente:

(i) Comodoro António Horta Galvão de Almeida Brandão, Comandante da Defesa Marítima da Guiné;

(ii) Brigadeiro Alberto da Silva Banazol, Comandante Territorial Independente da Guiné;

(iii) Brigadeiro Manuel Leitão Pereira Marques, Comandante-Adjunto Operacional;

(iv) e Coronel Gualdino Moura Pinto, Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné.

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Nota do editor: 

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Guiné 63/74 - P11735: Recortes de imprensa (66): Osvaldo Lopes da Silva, então comandante do PAIGC, e um dos principais responsáveis pela Op Amílcar Cabral, sustenta, na mesa-redonda, em Coimbra, no passado dia 23/5/2013, a versão do cerco total ao quartel de Guileje e afirma que as forças sitiantes dispunham de um dispositivo (do qual teria sido utilizado menos de 10%), com condições para actuar durante um mês (AngopPress)


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (1972/74) > 22 de maio de 1973: por decisão do comandante do COP 5, maj art Coutinho e Lima, as NT e a população civil abandonam o aquartelamento e a tabanca de Guileje, num total de cerca de 600 almas, dirigindo-se, de madrugada, a Gadamael, através de um carreiro que só a população local conhecia, e iludindo a pretenso cerco das forças do PAIGC. Entre os sitiantes, estava o Nino 'Vieira' e outros comandantes do PAIGC como o aqui citado Osvaldo Lopes da Silva...

Esta foto é, em princípio,  de autor desconhecido. Creio que a vi originalmente reproduzida na revista Pública, do jornal Público,  numa reportagem sobre a retirada de Guileje (provavelmente o artigo do Eduardo Dâmaso, "Coronel Coutinho e Lima: Salvou 600 vidas mas foi castigado por Spínola", Público, Domingo, 16 de Maio de 2004). Mas a cópia, dessa imagem, que temos,  faz parte do espólio "Guiledje Visual" e foi-nos gentilmente cedida pelos nossos amigos (e parceiros) da ONGD AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau, em 2005.

Espero que um dia o autor apareça e dê a cara... Era muito provavelmente alguém da CCAV 8350 ou subunidades adidas... Foi editada por nós, para ilustrar este poste... Entretanto, apareceu o J. Casimiro Carvalho, fur mil op esp, da CCAV 8350, a dizer que muito provavelmente a foto, tal como outras do pessoal (militar e civil) na retirada, é do seu camarada Carlos Santos. A foto de qualquer modo é notável, estando longe de sugerir debandada, pânico, desorganização... Pelo contrário, parece haver alguma dignidade e disciplina na retirada do pessoal (dois terços, civis...).  (LG).


1. Conforme poste P11552, de 10 de maio último, realizou-se em Coimbra, no dia 23 do mesmo mês, a    Mesa Redonda "Guidage, Guiledje, Gadamael 40 anos dos 3 G's da Guerra na Guiné".

O historiador guinense, doutor Julião Soares Sousa, investigador  do  Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20) da Universidade de Coimbra,  conseguiu juntar à volta da mesma mesa alguns dos protagonistas dos acontecimentos de há 40 anos (Op Amílcar Cabral, na designação do PAIGC),  homens esses que então se confrontaram de um lado (Coutinho e Lima, Ferreira da Silva, Raul Folques, José Calheiros, Pedro Lauret) e do outro (Osvaldo Lopes da Silva, Fandji Fati) da barricada.

A moderação da mesa redonda coube ao historiador, prof doutor Luís Reis Torgal. Não assistimos ao evento. Nem vimos que a nossa imprensa, escrita e falada, tenha feito grande cobertura da iniciativa.  Um dos "recortes de imprensa" que nos chegou, foi este, da Angop - Agência AngolaPress.  Vamos aqui reproduzi-la, com a devida cortesia, e com uma chamada de atenção: não podemos garantir o rigor dos excertos das declarações dos participantes. Algumas merecem-nos reservas, como a do caboverdiano Osvaldo  Lopes da Silva, "então comandante do PAIGC"  e um dos principais responsáveis militares pela 'Operação Amílcar Cabral'  que - passo a citar - "salientou que o quartel português em Giledge estava 'completamente cercado' e que as suas forças dispunham de 'um dispositivo (do qual não foi utilizado 10%) para actuar durante um mês'."

A teoria do cerco (total) a Guileje, por parte do PAIGC, só pode ser uma "figura de estilo", na medida em que é incongruente com a retirada, sem baixas, das NT, na madrugada de 22 de maio de 1973, tendo as forças sitiantes ocupado o aquartelamento, vazio, 3 dias depois, a 25 de maio.

Osvaldo Lopes da Silva (n. 1936) publicou recentemente o livro autobiográfico "Nos tempos da minha infância" (Cabo Verde, 2011).

Feita esta ressalva, aqui fica mais esta peça para os nossos dossiês sobre os 3 Guês (Guidaje, Guileje, Gadamael). Negritos (bold) e realce a amarelo, do editor L.G.

2. Recortes de imprensa > Angop > 24-05-2013 12:23 Guiné-Bissau:  Portugueses e guineenses debatem operação militar em 1973


Coimbra - Oficiais das tropas portuguesas e dirigentes das forças guineenses em 1973, evocaram e debateram, hoje (sexta-feira), em Coimbra, a "Operação Amílcar Cabral", uma das mais "marcantes ofensivas militares" da guerra colonial na Guiné.

Visando os aquartelamentos militares de Guidage, no norte da Guiné, e de Guiledje e de Gadamael, no sul do país, em Maio de 1973, a "Operação Amílcar Cabral" tinha como objetivo final, "a liquidação do colonialismo, através do aproveitamento dos seus resultados do ponto de vista da política doméstica e internacional", recordou o historiador guineense Julião Sousa.

Promovida pelo Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20) da Universidade de Coimbra, a mesa-redonda visou evocar os 40 anos de "acontecimentos incontornáveis no desenrolar do conflito".

Além de evocar os 40 anos daquela guerra, o [evento...]  também "servirá de introdução e mote" para o primeiro colóquio internacional "Colonialismo, Anti-colonialismo e Identidades Nacionais", a realizar em Coimbra, no final de 2013, adiantou, à agência Lusa, à margem do encontro, Julião Sousa.

Nas operações militares dos "3 G da Guerra da Guiné" (Guidage, Guiledje e Gadamael) "foram empregues elevadas quantidades de meios humanos e materiais", salientou Julião Sousa, que também é investigador do CEIS20, sublinhando que é, igualmente, preocupação dos promotores da iniciativa, perpetuar a memória de uma das mais" marcantes ofensivas militares" da guerra na Guiné.

A retirada, na madrugada de 22 de Maio de 1973, das tropas portuguesas do aquartelamento de Guiledge, então comandadas por Alexandre Coutinho e Lima, actualmente coronel na reserva, foi um dos momentos recordados pelo próprio e um dos temas que ocupou boa parte do encontro, em que participaram pelo menos uma centena de pessoas e se prolongou por cerca de seis horas, durante a tarde de hoje.

Na sequência da sua decisão de retirar as tropas, Coutinho e Lima foi preso pela hierarquia militar portuguesa, situação que se manteve até 14 de Maio de 1974.

"Tive a oportunidade, mas também a grande responsabilidade de ter nas mãos o destino de centenas de pessoas civis e militares", recordou o coronel Coutinho e Lima, considerando que pagou "bem caro" a sua "ousadia, que, seguramente, teria consequências mais graves, não fora o 25 de Abril de 1974".

Sublinhando o "acto de coragem política, mas também física" de Coutinho e Lima, Osvaldo Lopes da Silva, então comandante do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde) e um dos principais responsáveis militares pela "Operação Amílcar Cabral" (***), salientou que o quartel português em Giledge estava "completamente cercado" e que as suas forças dispunham de "um dispositivo (do qual não foi utilizado 10%) para actuar durante um mês".

A retirada de Giledge foi "a decisão mais acertada", conclui a generalidade dos intervenientes na sessão, que também consideram, "sem margem para dúvidas", que "a Guiné era uma causa perdida" para Portugal, no plano militar.

Em termos de armamento "havia um desequilíbrio" muito acentuado, em favor das forças guineenses, destacou o coronel José de Moura Calheiros (que se deteve sobre a situação de Guidage em maio de 1973), sublinhando que "os guerrilheiros do PAIGC estavam muito bem preparados, bem organizados e muito bem comandados".


2. A par desta notícia, da Angop, que reproduzimos acima, emos também, no Diário Digital, de 24/5/2013, a seguinte: 

"Colóquio em Coimbra vai debater colonialismo e anticolonialismo"

O Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20) da Universidade de Coimbra vai promover, em novembro, naquela cidade, um colóquio internacional para debater, «sem tabus», colonialismo, anticolonialismo e identidades nacionais.

«É necessário discutir estes temas sem tabus» e «já há condições» para que isso possa acontecer, acredita o historiador guineense e investigador do CEIS20 Julião Sousa, sublinhando que «nota-se, claramente, que há uma tendência para as pessoas fazerem a catarse - que também faz parte da história»

Ainda há «alguns tabus», reconhece o historiador, considerando que para os ultrapassar é necessário estudar e discutir as questões e isso já é possível com algum distanciamento, pois já passaram 40 anos (sobre o fim da guerra colonial portuguesa) e já há muita documentação sobre aquele tempo, designadamente memórias e biografias de muitos dos seus protagonistas.

Diário Digital / Lusa


__________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 10 de maio de2013 > Guiné 63/74 - P11552: Agenda cultural (269): Convite para a Mesa Redonda "Guidage, Guiledje, Gadamael 40 anos dos 3 G's da Guerra na Guiné", dia 23 de Maio de 2013, pelas 14H00, na Casa Municipal da Cultura de Coimbra (Julião Soares Sousa)


(**) Último poste da série 26 de abril de 2013 > Guiné 63/74 - P11474: Recortes de imprensa (65): O filme lusoguineense "A batalha de Tabatô", de João Viana, veio pôr Tabató e a cultura da Guiné-Bissau no mapa das rotas do cinema internacional (Luís Graça)

(***) Publicou, no jornal Público, em 26 de julho de 2004, um depoimento, como protagonista dos acontecimentos, sob o título, "Amílcar Cabral: 'Se o quartel de Guiledje cair, cai tudo à volta' ". Reproduzido, na íntegram, pelo cor art ref Alexandre Coutinho e Lima, no seu livro "A retirada de Guileje_ 22 maio 1973: a verdade dos factos, 1ª ed." (Linda a Velha, Oeiras: DG Edições, 2008, p. 358--361). O arttigo de Osvaldo Lopes da Silva vem na sequência da reportagem do jornalista Eduardo Dâmaso, acima referida, publicada no Público, 16 de maio de 2004. O artigo do Osvaldo Lopes da Silva nunca chegou a ser reproduzido no nosso blogue.


segunda-feira, 4 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11190: Notas de leitura (461): Texto policopiado e publicado pelo Comissariado Nacional da Mocidade Portuguesa - Ultramar (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Novembro de 2012:

Queridos amigos,
Dando continuação à transcrição de folhas policopiadas cuja data desconheço, a verdade é que referem o Comissariado Nacional da Mocidade Portuguesa, embora seja de supor tratar-se de um espetáculo de cantares Mandingas para o qual foram compilados vários textos e onde não terá sido alheia a mão de Manuel Belchior, um funcionário ultramarino que trabalhou na Guiné e com uma missão claramente cultural, juntam-se agora elementos que têm a ver com lendas Mandingas ao serviço de música do Korá.

Braima Galissá confirmou que o pai viera a Portugal onde deu espetáculos, é de supor que estes textos tenham tido essa proveniência.

Um abraço do
Mário


Lendas Mandingas ao serviço de músicas e canções

Beja Santos

Dando continuidade às referências feitas aos Mandingas numas folhas policopiadas que foram editadas pelo Comissariado Nacional da Mocidade Portuguesa, com data desconhecida, refere-se hoje um extrato do livro “Grandeza Africana”, de Manuel Belchior, um funcionário ultramarino que é autor de obras de divulgação, sobretudo da cultura Mandinga.


A canção de Quelé Fabá

Quelé Fabá, a tua lança ficou em Baria.
Tu não tinhas medo da morte.
Quelefá Sané, filho de Mariama Nanki,
porque era o teu almoço e o teu jantar.
Os cobardes, esses vivem mais,
mas nunca terão música para dançar.(1)
(Da canção de Quelé Fabá)

Quelé Fabá Sané, natural de Badora, era o maior guerreiro das terras de Bafatá e Gabu. Ninguém o igualava em temeridade e destreza. Tão alto subia a sua fama que, vários régulos, quando empenhados em guerras, pediam o seu concurso.

Um dia, Demba, senhor de Baria e seu amigo, chamou-o para o auxiliar a combater um chefe vizinho poderoso. Pôs-se Quelé Fabá a caminho, acompanhado de sua mulher, Fendabá, mas antes de partir jurou na sua tabanca que, nem na guerra, nem tão pouco na viagem, voltaria a cara para trás.

A certa altura necessitaram de atravessar um rio e, na canoa, o herói esqueceu-se do juramento feito. Para melhor conduzir o barco, ficou de frente para o ponto de partida. Vendo isto, Fendabá gritou: “Que desgraça! Lembra-te do juramento!”.

Entristeceu Quelé Fabá e disse que o seu esquecimento era de certo presságio de que iria morrer na luta. Implorou a mulher que voltassem para casa, mas o guerreiro ponderou-lhe que perder a vida era uma desgraça mas que perder a honra seria muito pior.

Ficou Fendabá aflita e, chegados que foram a Baria, contou em segredo a Demba o que acontecera, pedindo-lhe que poupasse o amigo a uma morte certa, afastando-o da guerra por meio de qualquer pretexto hábil.

Assim fez Demba, amigo verdadeiro, que incumbiu Quelé Fabá de uma missão distante, garantindo-lhe que não iniciaria a luta antes de ele regressar.

Quando o campeão credulamente seguiu ao destino que lhe fora designado, o régulo partiu para a guerra. Causou espanto em Baria o ato de Demba que, sem motivo conhecido, assim desprezava o concurso de homem tão valente, e a explicação que a alguns ocorreu foi a de que pretendia roubar ao seu amigo uma nova glória.

Por isso, uma bruxa velha e má foi no encalço de Quelé Fabá e, quando o encontrou, disse-lhe que Demba partira para a guerra e por inveja o havia afastado.

Lembrou-se o guerreiro do episódio da canoa e da aflição de Fendabá, concluindo que esta e o amigo se haviam combinado para o salvar. Então, repeliu com desprezo a intriguista, regressou precipitadamente a Baria e dali correu ao campo de batalha.

Quando lá chegou, Demba morrera e os seus homens lutavam já sem esperanças de vitória. Lançou-se Quelé Fabá com ímpeto na refrega e mudou o curso da luta, mas, quando o inimigo ia ser vencido, eis que uma lança adversa o fere de maneira grave.

Admirados com o que acontecera ao herói, que todos supunham invulnerável, os trovadores que animavam os combatentes de Baria gritaram, aflitos:
- Como foi isso, Quelé Fabá? O teu guarda de corpo, o teu chifre mágico, permitiu que fosse assim ferido?(2)

A esta pergunta o próprio chifre respondeu:
- Cada pessoa tem o seu dia para morrer e este é o dia de Quelé Fabá. Por isso, eu não o pude proteger.(3)

Pediu que o guerreio que lhe ligassem fortemente a ferida para o sangue não se escapar muito depressa. Voltou à contenda como um leão esfaimado e desbaratou os últimos inimigos. Depois, caiu exausto e disse aos bardos:
- Até ao meu último suspiro cantem as canções de guerra que eu tanto amei.

Isso fizeram.

Quando sentiu que a morte estava próxima, perguntou-lhes:
- Que vão vocês fazer para que o meu nome fique na memória dos homens?

Então o mais velho dos cantores respondeu por todos:
- Morre em paz. Nós vamos lembrar-te como nunca o foi outro guerreiro. Faremos uma canção que louve os teus feitos e terá o privilégio de ser a primeira que todo o trovador aprenderá. Essa será a canção de Quelé Fabá.(4)
__________

(1) - Aos grandes guerreiros, os “judeus” dedicavam uma composição musical. Nas vésperas de uma batalha, ao som de cada música, o respetivo guerreiro dançavam diante dos outros e dizia o que se propunha fazer no combate

(2) - Guardas de corpo são amuletos que podem ser usados em diversas partes do corpo, pendentes do pescoço, na cintura, nos braço e nos tornozelos. Nos africanos islamizados são versículos de Alcorão dentro de uma caixinha de metal ou de coro. Quelé Fabá era, porém, um Mandinga animista (soninqué) e, por isso, usava um chifre. 

(3) - Os amuletos conservam sempre o seu prestígio, mesmo que a morte venha ao encontro do seu possuidor porque neste caso ou se considera que o guerreiro não tinha o coração puro e não merecia por isso a guarda de corpo, ou, então, na hipótese presente de um verdadeiro herói, chegara a sua hora derradeira. 

(4) - Tive a curiosidade de perguntar ao contar que me narrou esta lenda se de facto fora a canção de Quelé Fabá a primeira que aprendera. Respondeu-me afirmativamente.



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Nota do editor:

Vd. poste anterior de 1 de Março de 2013 > Guiné 63/74 - P11174: Notas de leitura (460): Texto policopiado e publicado pelo Comissariado Nacional da Mocidade Portuguesa - Ultramar (1) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10897: Agenda cultural (246): Exposição, em Odivelas, na biblioteca municipal D. Dinis, de 4 a 20 de janeiro de 2013, " Regimento de Engenharia nº 1 - 200 anos a servir Portugal" (José Martins)



Exposição “Regimento de Engenharia nº 1  - 200 Anos a servir Portugal”, patente, de 4 a 20 de janeiro de 2013, em Odivelas, Biblioteca Municipal D. Dinis.

Data: 4 a 20 de janeiro
Hora: 10h30 às 18h30 - Ter. a Sex. | 10h30 às 17h30 - Sáb.
Local: Biblioteca Municipal D. Dinis
Informações:
Tel.: 219 320 770 - Divisão de Cultura, Turismo, Património Cultural e Bibliotecas
Biblioteca Municipal D. Dinis
bmdd@cm-odivelas.pt
cultura@cm-odivelas.pt

Inauguração dia 4 de janeiro – 16h00

A exposição Regimento de Engenharia nº 1 - 200 anos a servir Portugal procura sintetizar o percurso histórico do Regimento de Engenharia nº 1 (RE 1) , desde a sua origem em 24 de Outubro de 1812 até aos dias de hoje, integrando-o no contexto da história de Portugal.

Os marcos históricos mais  relevantes são os seguintes:

(i) Origem do Regimento de Engenharia nº 1
(ii) Guerra Peninsulares
(iii) I Guerra Mundial e a importância do Batalhão de Sapadores de Caminhos-de-ferro
(iv) Mobilização na 2ª Guerra Mundial – Trabalhos no Açores
(v) Guerra do Ultramar
(vi) Revolta Militar de 25 de Abril de 1974

Esta exposição, comemorativa do  bicentenário do RE 1, é composta por painéis, livros e fardas que abordam os principais marcos da história do Regimento desde a criação do Batalhão de Artífices Engenheiros em 24 de outubro 1812.


A exposição, organizada pela Divisão de Cultura, Turismo, Património Cultural e Bibliotecas de Odivelas, em parceria com o RE 1, procura  também documentar  a atual atividade do RE 1  no âmbito do apoio ao bem-estar das populações, apoio à proteção civil, a atividade operacional militar, a participação em Forças Nacionais Destacadas e as atuais capacidades operacionais de emprego.

Elementos informativos pelo nosso camarada e colaborador permanente  José Martins [, foto á esquerda, Odivelas, 2006]

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Nota do editor:

Último poste da série > 3 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10892: Agenda cultural (245): TSF, Grande Reportagem, hoje, às 19h00: "Sem panela, não se coze arroz" (reportagem de João Janes, com sonorização de João Félix Pereira)

terça-feira, 5 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8509: Em busca de ... (167): Guião do Comando de Agrupamento nº 2957 (Bafatá, 1968/70), cujo paradeiro se ignora (António Azevedo Rodrigues)


Comando de Agrupamento 2957 (Bafatá, 1968/70) > Guião. O Comando de Agrupamento 2957 esteve  em Bafatá, Zona lestem  no período de Novembro de 1968 a Setembro de 1970. Os seus elementos metropolitanos sáiram  do ex- RAL 1 e embarcaram  no T/T Uíge, em 9 de Novembro de 1968. O comandante do Cmd Agrup 2957 era o então Cor Hélio Felgas, mais tarde substituído pelo Cor Neves Cardoso.


1. Mensagem de António Azevedo Rodrigues (que está connosco desde Junho de 2008):

Data: 15 de Junho de 2011 20:02

Assunto: À Procura do Guião do Cmd Agrup 2957 (Bafatá-Guiné)


Olá, camarigos, o meu obrigado, pelas felicitações do meu 64º aniversário... Agora entrando no assunto principal que me traz hoje cá, é o seguinte: depois de andar por todo o lado na procura incessante do meus camaradas do Cmd Agrup 2957 de que o Fernando Gouveia também fez parte, bem como mais 50 elementos; depois de, posso dizer,  3-4 anos de intenso trabalho, pois ninguém tinha moradas de ninguém nem nunca em 41anos nuinguém contatou ninguém; depois, enfim, de eu meter anúncio na RTP e jornais; depois de tudo isso, o que primeiro me aparece é o Belmiro, de Penafiel.

Mas é só um primeiro contato e nada sabe, vou então para o Ministério da Defesa, para o Exército,  e nada. Com o que aprendi neste blogue, que muito me ajudou, e depois duma primeira tentativa,  lá consegui chegar aos primeiros [camaradas], e depois aos muitos e agora a todos. Isto é, todos menos um, pois de todo o pessoal do Agrupamento resta-me esperar para encontrar o último a tempo de ainda ir ao convívio total dos ainda resistentes e que se realiza [, ou melhor, já se realizou...], no próximo fim de semana, em Lisboa (Búfalo Grill).

Como disse,  falta encontrar um, sim um, é o que falta de pessoas. Então pelo meio fui procurando saber como encontrar o Guião/Estandarte, que foi a nossa Bandeira de apresentaçao, e pelas fotos anteriormente ja publicadas em que eu julgo ser o único a ter tirado uma foto com o mesmo na Guiné, eis que à procura do mesmo já lá vai mais de um ano, de procura em procura, de mail em mail, de telefone em telefone, sempre na eperança de que um dia há-de aparecer o tal Guiã/estandarte.

Quando estava à espera de saber do último cabo, do último a responder à chamada,  então voltei a pegar no telefone e chatear na procura,  de quartel em quartel, a tentar saber onde pára o guião.

Agora sim, o tal mail tão esperado chega com a pior noticia: mais um amigo que caiu para sempre, mais um desaparecido, como pode ser observado, mesmo sem Certidão de Óbito;  eis que chega a sentença de  que me abstenho de fazer mais considerações. Agradeço que publiquem o oficio enviado por mail com as palavras aí reproduzidas...

Em suma, não existe rasto do guião, simplesmente "desconhece-se o paradeiro do Guião do cmd agup 2957"... Foi abatido.  não se sabe como. É menos um comando deste agrupamento que não se sabe se caiu de morto,  fulminado por qualquer ataque cardíaco... 

Termino lamentando o desaparecimento de mais um elemento deste Cmd Agrup 2957... Paz à sua alama, que repouse na sua eterna morada, desconhecida. Lamentamos o sucedido e eu, pessoalmente,  apresento condulâncias à familia desgostosa do Cmd Agrup 2957...

António Azevedo Rodrigues
Contactos:
Telefones: 252 938 133 - 915 225 337 - 926 641 776 - 934 432 545

E-mail: rodrigues60@gmail.com






Fotos: © António Azevedo Rodrigues (2011). Todos os direitos reservados

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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de Junho de 2011> Guiné 63/74 - P8470: Em Busca de... (166): Precisa-se de depoimentos para fazer a História da Pensão Central da Dona Berta (Hélder Sousa / José Ceitil)