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sábado, 21 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26944: Os nossos seres, saberes e lazeres (686): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (209): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 9 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Março 2025:

Queridos amigos,
É o derradeiro dia desta viagem que teve imperativos lutuosos, mas cujos familiares de uma grande amiga entenderam que se devia converter no conhecimento de lugares esplendentes, como procurei revelar em Idstein, Limburgo ou agora no Mosteiro de Eberbach, isto para já não falar nas escapadelas a lugares de algum modo bem conhecidos em Frankfurt. Despeço-me mostrando algumas imagens do mosteiro fundado no século XII, veremos a transição do românico para o gótico, da severidade iremos ver que se evoluiu da arte gótica até se chegar ao barroco. Na Idade Média, estes monges cisterciense meteram-se na cultura do vinho e reza a história que se tornaram nos mercadores mais influentes da Europa Central dos século XVI para o século XVIII. E na visita às suas instalações vê-se que a viniviticultura é a primordial riqueza do mosteiro. Acabou-se a festa, sou levado ao Aeroporto Internacional de Frankfurt, não escondo o meu pesar. Felizmente que os anfitriões deixaram a porta aberta. Qualquer dia dou-vos notícia do meu regresso.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (209):
Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 9


Mário Beja Santos

Encaminho-me para o Mosteiro de Eberbach, também no Estado de Hesse, com dissimulada tristeza, já trago a trouxa feita, aqui se passará a manhã, almoça-se, serei depois transportado para o Aeroporto Internacional de Frankfurt, tem uma dimensão desmesurada, à frente só Heathrow. À porta lê-se uma divisa: Porta Patet, Cor Magis, isto é a nossa porta está aberta e ainda mais o nosso coração! O visitante é assim calorosamente recebido nesta muito abadia cisterciense. Foi fundada em 1136, Bernardo de Claraval enviou um punhado de monges que aqui viviam em ascese e muito trabalho. Graças a uma eficaz gestão económica, o mosteiro transformou-se rapidamente na Idade Média numa empresa próspera, graças à cultura da vinha, importada da Borgonha; no fim da era medieval o mosteiro ganhara a reputação de ser o mais importante negociante de vinho da Europa Central. O mosteiro albergava duas comunidades especialmente separadas: os monges de que alguns eram sacerdotes e o grupo dos irmãos laicos ditos irmão conversos. Rezar e trabalhar era o seu mandamento maior. Monges e irmãos eram maioritariamente originários das camadas pobres.
Que edifícios iremos ver? Temos aqui os tempos primitivos, é patente a reforma cisterciense, nada de embelezamento artístico e ornamental, a imagem da igreja dá-nos exatamente essa perceção. Iremos ver o traçado românico e depois o gótico em salas tal como dormitório dos monges, a sala do capítulo, a construção nova do claustro e até nas capelas funerárias. Até muito tarde, estes monges resistiram aos caprichos do embelezamento, mas deixaram-se depois inspirar pelos esplendores barrocos, como veremos nas últimas imagens.

Arrumada a viatura, avista-se num plano superior a dimensão imponente deste mosteiro com as suas cúpulas bolbosas, impressiona desde logo o bom estado de manutenção.
No caminho para a entrada, uma imagem do transepto
No passeio pelos jardins, não resisti a subir a um patamar que permite ter a dimensão da igreja
Pormenor do claustro
Arte românica, sem equívocos
A chegada do gótico à sala do capítulo
Chamo-lhe igreja mas é verdadeiramente uma basílica abacial. São igrejas que impressionam precisamente pela sua simplicidade, foram concebidas para convidar ao recolhimento, à meditação e à oração. Esta tem 80 metros de comprimento, construída em duas fases, de 1145 a 1160 e de 1170 a 1186. É uma basílica românica de fortes pilares e três naves. As capelas laterais têm elementos góticos. As grandes janelas ao alto conferem à igreja uma luminosidade intensa.
À direita, Adolfo II de Nassau, à esquerda o arcebispo Gerlach de Nassau.
Estamos agora na parede esquerda e temos os túmulos de um religioso proeminentes e de Adolfo II de Nassau. O primitivo túmulo deste arcebispo foi considerado um dos mais monumentos funerários da Idade Média na Alemanha.

Cruz do altar-mor da igreja no Mosteiro de Eberbach
O visitante é convidado a deter-se junto das pedras tumulares. Os membros da nobreza e da burguesia piedosa foram autorizados a enterrar-se na abadia de Eberbach a partir do século XIII, depois de levantada a interdição de sepulturas nas igrejas cistercienses. São às dezenas esta pedras tumulares, algumas magnificamente decoradas, muitas foram destruídas quando se extinguiu o mosteiro em 1803.
Pormenor da arte gótica a caminho do dormitório
Todo o visitante é avisado logo na receção de que não deve perder os lagares e as adegas, bem como o dormitório dos monges no andar superior, aqui pontifica a arte gótica.
Um pormenor da abadia junto de uma bela porta românica de ligação ao claustro.
Um outro ângulo do mosteiro, vê-se a igreja e duas torres
Estas últimas três imagens marcam o contraste entre a simplicidade medieval e a atração pela decoração barroca. Se o refeitório primitivo tem decoração medieval, este novo foi construído no princípio do século XVIII, é a única divisão do mosteiro que deixa perceber a alegria festiva barroca, contraste mais gritante com a severidade do passado não podia ter acontecido.

O passeio prosseguiu até aos locais de vendas, daqui se partiu para uma refeição ligeira, guardei no meu caderninho de viagem que no século XII era uma vida severíssima, 150 monges e 300 irmãos, do século XIII ao século XVI reduziram-se as restrições e começou a cultura da vinha, que se tornou prodigiosa; o século XVIII é marcado pela prosperidade; no século XIX assiste-se à secularização, dissolve-se o mosteiro por ordem do príncipe Frederico Augusto von Nassau-Usingen, na década de 1860 este ducado de Nassau é anexado ao reino da Prússia, em 1946 torna-se propriedade do Estado de Hesse, a partir de 1998 surgiu uma fundação. E acabou-se a viagem, bem triste foi a razão que me trouxe a este rincão da Alemanha, mas não posso esconder que os meus anfitriões me asseguraram uma esplêndida estadia, como procurei registar nestas notas de itinerância.
Até à próxima!

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Nota do editor

Último post da série de 14 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26920: Os nossos seres, saberes e lazeres (685): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (208): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 8 (Mário Beja Santos)

sábado, 14 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26920: Os nossos seres, saberes e lazeres (685): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (208): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 8 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Março 2025:

Queridos amigos,
Um dos aspetos mais impressionantes na arquitetura da Catedral de Limburgo é o diálogo perfeito entre os elementos essencialmente românicos e o vislumbre do gótico, dentro daquela conceção medieval da nova Jerusalém e da descida de Deus à terra. Se é facto que a catedral perdeu o mosteiro que ali existiu quase como um anexo, o interior deslumbra por ser visível o gótico nas semicolunas na frente dos pilares, no transepto, olhando para a cúpula percebe-se essa conceção, não só pela monumentalidade desta igreja com as suas sete torres que descem das alturas como o diálogo que se processa com o exterior colorido e com doze pilares, é um dos fundamentos da fé cristã, são os doze apóstolos. A Catedral de S. Jorge assenta num penhasco, o seu castelo, ali ao lado, está em processo de restauro e como se poderá ver introduz uma dimensão castelar feudal, é como uma imponência da construção civil a suportar a grandiosidade religiosa. E depois desceu-se ao centro histórico, restauro irrepreensível, após amesendar com amigos queridos, com a chegada da noite, regresso a Idstein. Amanhã é o último dia de folgar, visita ao mosteiro do século XII, Eberbach, por ali houve filmagens de Em Nome da Rosa, baseado no romance de Umberto Eco, Sean Connery era um frade detetive que desvendou mortes misteriosas, belo filme por sinal, não desmerecendo do fulgor do romance.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (208):
Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 8


Mário Beja Santos


O que se mostra na primeira imagem é a Catedral de Limburgo a sofrer obras de restauro. Antes de passarmos ao seu exterior, permita-me o leitor uma pequena recapitulação deste belíssimo e singular templo religioso católico. É essencialmente românico, com influências de gótico e até mesmo do estilo mourisco; o seu interior dá-nos a entender o que pretende a conceção arquitetónica, ver a casa de oração como uma nova Jerusalém. O que aliás se sente no exterior, com as suas sete torres descendo das alturas, e aquele colorido do exterior tem um poder ornamental invulgar, é como se estivéssemos numa cidade celeste; o interior foi restaurado e pintado várias vezes, procurámos mostrar no apontamento anterior obras originais e as respetivas cores; o mosteiro que lhe estava apenso desapareceu, houve adaptação de instalações como é o caso da capela do Santíssimo Sacramento. O leitor irá verificar a magnificência dos sinos desta catedral de S. Jorge. O carrilhão consiste de nove sinos de bronze. Na torre do noroeste há dois sinos históricos datando da Idade Média. Um dos aspetos mais impressionantes que sensibiliza o visitante é verificar o pleno diálogo entre os cromatismos do interior e os do exterior. Vemos na fachada o tipo de janelas, a quantidade de luz que vem incidir sob o seu interior, e atenda-se agora à natureza das torres, ao arredondado das faces que dão a tal lógica de cidade celeste.
Fachada da Catedral do Limburgo a sofrer pequenos arranjos
O outro lado da torre, veja-se a robustez do contraforte, a janela rasgada ao nível do solo e as entradas da luz pelas janelas e óculos
Veja-se o arredondamento típico da arte românica
Descendo em direção à cidade, deslumbrou-me esta imagem do rio Lahn, estava num ponto intermédio do rochedo mas a vegetação parece que pairava sob o arvoredo, há como que uma sensação de neblina, quando aqui se chegou o céu estava um tanto plúmbeo, felizmente que desanuviou
De novo a cidade celeste e a visão de S. João no Apocalipse, vendo a nova Jerusalém e Deus descendo à terra
Foi-me então explicado que o velho castelo do Limburgo, que vem do século X, ganha de novo forma com as construções que estão em restauro no alto deste penhasco em que assenta também a catedral, só vou mostrar obra acabada
Vê-se claramente que é uma construção idealizada noutra de um passado profundo, mas bom gosto não falta e seguramente que o arquiteto teve acesso a esboços do que teria sido o original
Já estou a caminho do Limburgo junto da margem do Lahn, aceito que não era exatamente assim na Idade Média mas que o castelo é uma construção impressionante, não há dúvida
Nunca mais! Estava-se na Alemanha em campanha eleitoral e a igreja católica do Limburgo resolveu lançar o seu pretexto: todos unidos pela democracia e contra a extrema-direita!
É só uma pequena amostra dos encantos arquitetónicos do Limburgo, para ser sincero já passava das 15h00 e não se escondia a vontade de comer, bem procurei um prato de joelho de porco assado, em vão, irei desforrar-me com um arroz de rim que não comia há anos
Outro pormenor do belo casario no centro histórico
Última imagem antes de ir mordiscar, talvez tenha tido sorte com este plano de baixo até ao topo da catedral. Depois dos comes e bebes, já com a chegada da noite, regresso a Idestein. Amanhã é a última jornada, o Mosteiro de, uma extraordinária construção cisterciense, do século XII, aqui os monges levavam uma vida caracterizada pela ascese, nada de salas aquecidas, pouca conversa e comida frugal, mosteiro fundado em 1136, a sua arquitetura e a sua história é um espelho da história cultural do Ocidente, como iremos ver em seguida, antes de dizer adeus à região de Frankfurt.
Duas imagens à entrada do mosteiro de Eberbach, aqui houve filmagens de Em Nome da Rosa, baseado no romance de Umberto Eco, não sei se se recordam.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 7 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26896: Os nossos seres, saberes e lazeres (684): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (207): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 7 (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 11 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26907: As nossas geografias emocionais (51): Jerusalém, Israel (António Graça de Abreu, Cascais)




Israel > Jerusalém  e Nazaré, "lugares santos"> 2013 > Vista panorámica da cidade de Jerusalém; "Muro das Lamentações"; "Jesus, Maria e José"(presume-se que em Nazaré) 


Fotos (e legenda): © António Graça de Abreu (2025). Todos os direitos reservados [Edição e lendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




O escritor, sinólogo, 
tradutor e "globe-trotter"  
António Graça de Abreu
com a esposa, médica,
Hai Yuan. O casal vive em
São Pedro do Estoril, Cascais
1. Texto enviado pelo nsso amigo e camarada António Graça de Abreu ( ex-alf mil, CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74),  e já publicado, no passado dia 9, 22:29, na sua página do Facebook


“Vi a Cidade Santa, a nova Jerusalém, que descia dos céus, da parte de Deus, preparada como uma noiva adornada para o seu marido. Eles serão os seus povos. Ele enxugará dos seus olhos todas as lágrimas.”

Apocalipse 21, 2-4

No mar tanta tormenta e tanto dano,Tantas vezes a morte apercebida.
Na terra, tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade aborrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme e se indigne o céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?



Luís de Camões, Os Lusíadas, 
canto I, 116


Ia à Palestina, minha senhora! Ia ver Jerusalém, o Jordão! (…) E havia de trazer apontamentos, minha senhora, havia de publicar impressões históricas.


Eça de Queirós, A Relíquia


As nossas geografias emocionais >
 Jerusalém, Israel

por António Graça de Abreu



Há muitos séculos é esta terra a sombra iluminada de cristãos, o lugar do acariciante respirar de Deus Pai, o altar supremo do sacrifício de Deus Filho. 

Para quem crê, aqui desceu o Espírito Santo em línguas de fogo ao encontro de Maria e dos apóstolos de Jesus, trazendo-lhes iluminação e sabedoria. 

Para os judeus é também a sua cidade sagrada, onde tomou forma o mundo, com reverências no Muro das Lamentações do tempo do rei Salomão (sec. X a.C.). 

Para os muçulmanos, aqui, na mesquita dourada de Al Aksa, construída logo por cima do Muro judeu de Salomão, subiu Maomé ao céu, três dias após a sua morte acontecida em Medina, a dois mil quilómetros de distância. 

Três religiões, duas mãos cheias de ódio e de lutas de morte entre pais e filhos transviados, gerados numa mesma terra. Onde encontrar a “Glória a Deus nas alturas e a paz na terra aos homens de boa vontade" ?

Venho desde Haifa, de autocarro até Nazaré. Almoço num kiboutz na estrada, estas unidades agrícolas criadas pelos judeus para cultivar e dominar um pequeno território que há mais de trinta séculos consideram como seu. 

Chego a Nazaré onde Jesus terá crescido e com seu pai, São José, terá aprendido a arte de carpinteirar. Venho de visita à casa da família, quase uma espécie de gruta. Antiquíssimas paredes de pedra, vetustos instrumentos para se trabalhar a madeira, Jesus passou por aqui.

Depois, a cidade de Jerusalém, a capital de David e Salomão, do Templo Sagrado, recordar maravilhas gravadas no Cântico dos Cânticos. E relembrar encantamentos e sobretudo sofrimentos de Jesus, da nossa velha fé cristã, da exaltação, da morte e ressurreição de Deus feito homem.

No Muro das Lamentações, caminho rodeado de judeus em permanente peregrinação. Votos e pedidos ao Yehowah, Deus dos hebreus, em papéis colocados nos interstícios da pedra antiquíssima. Preces pela paz. 

Logo acima, a cúpula dourada da Domo muçulmana e a mesquita de Al-Aqsa, depois de Meca e Medina, o lugar mais sagrado do Islão.

 Como é possível haver harmonia entre judeus e muçulmanos? Ao longo dos séculos, a fé e as crenças tão díspares, a terra que ambas as crenças religiosas reivindicam como apenas suas, tanto sangue judeu e muçulmano, algum também cristão a correr pelas lajes delapidadas de Jerusalém... Terra Santa e de paz, infindáveis ódios, ignomínias e guerras. As lágrimas descendo pela face dos deuses.

Avanço na esteira da divindade de Jesus. Nas ruelas de antiga Jerusalém, como outrora, os vendilhões de quinquilharia e pasmosa fancaria, parecem enraizados na pedra da cidade. 

Sigo pela Via Sacra, imagino o Senhor carregando a cruz até ao lugar do Calvário, hoje a igreja do Santo Sepulcro, quase uma fortaleza de pedra. Aqui veio morrer Jesus Cristo, crucificado entre dois ladrões, aqui os cristãos ajoelham diante das cruzes do sec. XII. Adiante, abre-se a estrutura circular no meio da qual se situa a construção que abriga o túmulo onde Cristo terá sido sepultado. Está sempre vazio porque, três dias após a morte, terá subido gloriosamente aos céus.

Todos nós, poderemos, talvez um dia, também na hora da morte, ressuscitar e ascender a paragens celestiais. Jesus Cristo disse: “Eu sou a ressurreição e a vida; quem acredita em mim, ainda que morra, viverá.” João, 11, 25-26.

Ah, homens de pouca fé – eu também, tanta incerteza e tanta dúvida, até em Jerusalém 
, porque duvido da palavra do Senhor?

sábado, 7 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26896: Os nossos seres, saberes e lazeres (684): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (207): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 7 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Março 2025:

Queridos amigos,
Foi um dia muito feliz, este em que passei em Limburgo no Estado de Hesse. A vida permitiu-me visitar extraordinários templos religiosos, mas nada de parecido com este que vamos agora visitar, a catedral de S. Jorge, consagrada em 1235 como igreja de colegiada e paroquial, e tendo além de S. Jorge o patrono de S. Nicolau. Na essência é um romano-gótico alemão, típico do baixo e médio Reno, tempo de Frederico II do Sacro Império Romano-Germânico, mas também se encontram elementos da Lorena e de outras regiões. Igreja com transepto, pilares maciços e compartimentos típicos do estilo-românico. A conceção arquitetónica é motivada pela ideia difundida na época de que as igrejas góticas deviam representar o céu, revelar aos crentes que devia ser a cidade celeste É esta a espantosa leitura que se pode contemplar na impressionante abóbada, na multiplicação das arcadas, nas suas sete torres, o crente devia-se sentir que o céu descia das alturas. Peço ao leitor para ver as imagens do túmulo do conde Conrado Kurtzbold, suportado por figuras do século XI e a laje de pedra datada do século XIII. O conde parece um jovem, a intenção do artista foi representar a juventude eterna, que continuará a viver na eternidade. E depois iremos ver o Limburgo.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (207):
Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 7


Mário Beja Santos

Na itinerância de hoje mudo para outro estado alemão, o Hesse, venho encontrar-me com amigos com quem passarei o dia no Limburgo, confesso que foi um dia feliz na minha vida, rever bons amigos e numa cidade deslumbrante. Como é timbre dos alemães, dados os abraços alguém anuncia que há um programa, é inevitável começarmos pela catedral de Limburgo, uma singularidade do romano-gótico alemão. Foi aqui, no início do século X, que o conde Conrado Kurtzbold mandou construir uma basílica de três naves em homenagem a S. Jorge, isto num ponto alto; no século XII os habitantes do castelo pretenderam fazer uma igreja maior, alargando a planta antiga e aumentando o número de andares para quatro. A igreja que eu vou visitar foi consagrada em 1235, é uma obra do fim do período românico e nitidamente com influências do estilo gótico. Vamos entrar.
Fachada da Catedral de Limburgo, retirada da Wikipedia, a imagem que posteriormente mostrarei deixa claro que a fachada está em obras
Logo no vestíbulo, em permanência, um dos quadros representativos da vida de Jesus, este retirado de um episódio narrado do Evangelho de São Marcos que se trata da apresentação do Menino no Templo de Jerusalém, José e Maria levam o Menino para uma cerimónia de sacrifício de dois pombos, ali estava um homem bom, de nome Simeão que pegou no Menino, louvou-o e disse que a partir deste momento já podia partir em paz por ter pegado no Salvador do Mundo.
Um primeiro detalhe do interior da catedral, são a planta e os pilares maciços que suportam a abóbada, bem como a divisão horizontal dos andares. A influência do estilo gótico é visível nas semi-colunas colocadas nas frentes dos pilares, na relação entre altura e planta, assim como nos arcos ogivais. Pormenor bem curioso são as influências do estilo mourisco que se encontram nos arcos centrais do coro.
Outro detalhe elucidativo da influência mourisca
A época gótica quis representar o céu através da construção destas igrejas. De algum modo, procurava-se materializar a visão de S. João no Apocalipse: “Vi a nova Jerusalém, a cidade celeste, descendo de Deus à terra, ornada como uma noiva e fundada sobre as doze pedras dos apóstolos.” Tenho para mim que é indispensável andar por aqui para ver tudo com minúcia e depois o exterior, para entender a conceção arquitetónica. Fica-se com a impressão de que o templo, com as suas sete torres, vem descendo das alturas. O colorido do exterior representa os ornamentos da noiva e nos doze pilares, como fundamento da nossa fé, encontramos os doze apóstolos. Especado diante deste altar, procurei exatamente a leitura de que o arquiteto quis que nós contemplássemos a cidade celeste.
Toda esta ornamentação do teto é uma surpresa de rendilhados, o que eu mais aprecio é sentir o contraste entre a austeridade do românico e a luminosidade das alturas do gótico.
À primeira vista, fica-se com a ideia da existência de um sobrepeso de tantos arcos suspensos nos pilares. Depois vem a lembrança do que subjaz à conceção arquitetónica: as numerosas arcadas assemelham-se aos portões da cidade celeste. É a impressão que nos é transmitida pelas galerias, encontrando-se à altura das janelas uma outra galeria.
A Virgem com o Menino, obviamente uma imagem barroca
O túmulo do conde Conrado Kurtzbold é uma preciosidade, tal como as pinturas perto, o caso desta árvore da vida. Um dos aspetos decorativos/ornamentais que mais nos impressionam é, por exemplo, na superfície dos arcos do coro vermos figuras de ancestrais da nossa fé: apóstolos, profetas e santos. Na posição central, acima do arco da quadratura, aparece Cristo, na sua qualidade de juiz sobre o mundo. As pinturas a fresco na abóboda da nave central representam o cosmo mediante duas figuras: Água e Terra, assim como a flora. Uma segunda pintura a fresco mostra o Paraíso com dois arcanjos, Miguel, representante do Paraíso fechado e Gabriel, representante do Paraíso aberto.
Um belíssimo pormenor escultórico
Detalhe da pia batismal, se toda a pintura e escultura deviam funcionar como a representação do que vem na Bíblia, temos aqui marcas dos pecados mortais, o que vemos aqui nesta troca de beijos é a tremenda advertência de que a luxúria é pecaminosa.
Imagem da pia batismal, nunca vi escultura tão impressionante
O interior da catedral foi restaurado e pintado várias vezes. Por ocasião do último restauro, apareceram as cores originais e os restauradores conservaram-nas no estado em que foram descobertas. Como é óbvio, este seu colorido não tem o mesmo brilho que tinha há mais de 800 anos. Um dado curioso é de que na época do romantismo não se podia mais imaginar que na Idade Média o exterior da catedral fosse colorido. A visão preferida nessa época era de que uma igreja tivesse muros feitos de pedras cinzentas, e neste caso de Limburgo, se devia erguer para o céu a partir do rochedo situado mesmo ao lado do rio Lanh. E dentro deste espírito do romantismo retirou-se o reboco das paredes. Somente por ocasião do último restauro em 1977, a catedral voltou a ser rebocada e adquiriu um colorido semelhante ao original.
Na área norte das antigas dependências, que restaram até hoje, continua abrigada a capela sacramental. É impressionante esta Pietà, inequivocamente medieval, dentro de um formalismo, que presa uma quase indiferença emocional da Virgem e em que o corpo de Jesus parece articulado numa rigidez para todo o sempre.
Nesta capela sacramental temos este espantoso tabernáculo cinzelado em pedra de tufo, obra do período gótico.
Aqui faço uma suspensão dos trabalhos, antes de ir contemplar algumas janelas e pinturas, como sempre S. Jorge em cima de um cavalo a matar o dragão e não quero sair da igreja sem visitar o órgão. Mas não resisto a mostrar-vos esta belíssima porta medieval, claro está que foi restaurada, que belas ferragens e que bela fechadura!

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 31 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26869: Os nossos seres, saberes e lazeres (683): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (206): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 6 (Mário Beja Santos)