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sábado, 20 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27234: Os nossos seres, saberes e lazeres (701): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (222): Primeiro a Lousã, segue-se São Pedro do Sul - 1 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Agosto de 2025:

Queridos amigos,
Uma semana de férias em julho, ainda com temperaturas amenas, o grupo chegou a acordo de que se voltava a Lousã, região muito amada, ali se passaram férias quase no fim do século, casa alugada a um casal que já partiu para as estrelinhas, gente afetuosa, Dona Deolinda com largo pendor para a arte dos bordados, não resisti a comprar lençóis; as estradas ao tempo eram excelentes para danificar os carros, a patinar na lama e na gravilha, tanto na subida para os ermos como na descida para o vale. O centro histórico da Lousã conhece melhorias, é impressionante a quantidade de pedras de armas, teve aristocracia e fábrica de papel há mais de 300 anos. O grupo visitou religiosamente A Túlipa Negra, quando chegávamos das aldeias era aqui que se fazia o fornecimento de pão e confeitaria, com todo o respeito aqui se bebeu e comeu. Passei pelo cinema, está todo aprumado por restauro recente, veio-me à memória que em grupo viemos ver o filme O Alfaiate do Panamá, baseado num romance de John Le Carré, com interpretações sugestivas de Pierce Brosnan e Geoffrey Rush. Há mudanças apreciáveis em Talasnal. Quando se arrumou o carro à entrada da aldeia, vi alguém com um saco às costas a entrar numa casa, e lembrei-me de um episódio de ver, no final do ano de 1995, entrar naquela casa um rapaz gadelhudo com quem depois fui conversar, tinha comprado a pequena casa com as suas economias, ia agora fazer obras. Fiquei a observar a casa, o senhor saiu e veio até um bar, com uma bela esplanada. Entrei e pedi uma imperial, quem me serviu foi o dito senhor a quem contei a história do tal miúdo gadelhudo, este senhor sorriu e disse-me que o miúdo gadelhudo era ele, sem tirar nem pôr, afeiçoara-se a Talasnal, comprara inclusivamente outras casas, inevitavelmente falámos de pessoas do tempo, caso do Jorge que também tinha um bar, e do Fabrice e da Maria do Céu, um bizarro e inesquecível casal alternativo. Assim se mataram saudades. Preferi não tirar imagens a Catarredor, continua muito degradada, estava impaciente por chegar ao miradouro e ver desde o Castelo até às aldeias, tive sorte com a hora dourada. Amanhã vou mostrar-vos o Casal da Lagartixa e falar-vos da relação de Carlos Reis com a Lousã. Ala morena, que se faz tarde, vamos depois a caminho de São Pedro do Sul.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (222):
Primeiro a Lousã, segue-se São Pedro do Sul - 1


Mário Beja Santos

Aí pelo início dos anos 1990, adquiri um livro intitulado Terra que já foi Terra, uma dissertação de mestrado, o autor, Paulo Monteiro, estudava o habitat populacional das aldeias serranas da Lousã, uma vida duríssima lá naqueles pontos ermos, viver em casas de xisto, com poucos meios de subsistência, vendia-se carvão na vila, população bisonha, arredada da civilização, vivendo em lugares como Casal Novo, Talasnal, Catarredor, Chiqueiro, Vaqueirinho, isto lá nos ermos, cá em baixo outras, como Cerdeira e Candal. Paulo Monteiro analisara a correspondência de um casal, ela numa aldeia serrana, ele emigrante nos Estados Unidos, relato impressionante. A míngua levou toda aquela gente a fugir, o último habitante das aldeias serranas suicidou-se no dia 25 de abril de 1974, nesse dia chegava a eletricidade à serra, se é uma curiosidade, é uma curiosidade mórbida.
Pelos finais do ano 1995, fui passear até à Lousã, vi a referência às aldeias serranas, passei por um lugar chamado Cacilhas, começou uma subida a resvalar na gravilha, a fugir dos buracos, num extenso serpenteio que permitia admirar o esplendor do arvoredo. Ainda hoje me pergunto como se chegou a Casal Novo, então fiquei boquiaberto, havia muitas casas de xisto reconstruídas, saberei mais tarde que pelos anos 1980 gente de Coimbra e arredores se rendeu às belezas paisagísticas e montou aqui casa secundária. Volto trinta anos depois, as diferenças são muitas, a estrada está alcatroada, Casal Novo parece intocável, o Talasnal floresce, é sem dúvida a aldeia que mais deslumbra, descemos para Catarredor, parece haver projetos imobiliários tentadores, mas por enquanto reina a mais pura das decadências. É este o primeiro quadro de referência de uma viagem em que fomos de Lisboa à Lousã, daqui a São Pedro do Sul, depois o sul da Galiza (região de Ourense), descida por Chaves e permanência em Pedrógão Grande.

Um pormenor de Casal Novo em 1997, aluguei duas casinhas, aqui juntei mais de uma dúzia de amigos
Cheio de emoção, aqui estou em Casal Novo, há modificações, mas mantém-se o respeito pelas construções que vêm do tempo da vida áspera das gentes do agropastoril, escusado é dizer que as comodidades impressionam, o forno, a casa dos cereais, o chiqueiro e galinheiro desapareceram
Talasnal vista da estrada que vem de Casal Novo
Outros pormenores de Talasnal
Esta paragem era inevitável. Não me recordo se em 1996, se em 1997, a Casa das Alminhas, era por esta designação conhecida, estava à venda por uma ucharia, houve debate se se comprava ou não, a lucidez veio à tona de água, na época aqui se chegara vindo de Lisboa eram mais de três horas, havia que contar com as estradas em estado deplorável, fim-de-semana curto, assim se desistiu do projeto. Verifiquei com agrado que quem adquiriu esta bela casa com uma vista espetacular sobre o vale da Lousã, a adornou com cuidado extremo, que seja muito feliz, o lugar tem o seu quê de misticismo, então quando a bruma toma conta de todo aquele coberto vegetal. Sim, José Saramago, tens toda a razão, a viagem nunca acaba, só os viajantes é que acabam.
Regressa-se à Lousã, vindo de Catarredol e Candal, não há miradouro como este para avistar o Castelo da Lousã, mesmo que só a sua torre de menagem e a vegetação, na chamada hora dourada, que precede o lusco-fusco. Trouxera comigo a Miscelânea de Miguel Leitão de Andrade, nascido em Pedrógão em 1555 e falecido em Lisboa em 1630, comandante da Ordem de Cristo, ainda hoje obra de referência para conhecer estas regiões ao tempo. Escreve ele:
“Está situada a vila da Lousã no distrito e a vinte quilómetros SE de Coimbra, em formosíssimo vale de cinco quilómetros de largura sobre oito ou dez de extensão, e rodeada pela serra que tem o mesmo nome, e é um dos mais admiráveis ramos da gigantesca cordilheira da Estrela.
A vila de Lousã, sob o nome da Arouce, data de tempos imemoriais, porque se esta povoação existiu em volta do Castelo, mas vizinha das abas da serra, como parecem indicar os vestígios de antigas edificações da montanha onde assenta o dito Castelo, não há documento algum pelo qual se possa determinar a data precisa do seu estabelecimento. Todavia, a situação da fortaleza em uma espécie de promontório cercado de fragas e penedias, na raiz, das quais serpenteia caprichosamente o rio Arouce, que vem do alto da serra, e que devia por força estar apartada de qualquer lugar importante.”

Voltaremos à história lendária quando se for visitar o belo quadro de Carlos Reis na Câmara Municipal da Lousã, sugiro ao leitor que quando visitar a Lousã venha até aqui, conhecer esta obra de D. Sesnando Davides, alguém que foi da confiança do rei da Taifa de Sevilha, no século XI, e que, por razões não esclarecidas, se pôs ao serviço do rei Fernando Magno, que lhe entregou o governo de Coimbra. Ponto curioso desta construção é verificar-se que o dito Castelo deve ter tido a função de ponto de atalaia, é notória a influência muçulmana na sua construção, e dispõe de alambor, tal como o Castelo de Tomar. É hoje monumento nacional, há quem critique as discutíveis soluções para o seu restauro, que ocorreu entre os anos 1920 e 1960.

Chegámos à vila da Lousã em hora de amesendar, perguntou-se a um passante onde se podia comer uma boa chanfana, o passante sugeriu a Churrasqueira Borges, foi chegar, ver e vencer, um indiscutível ambiente familiar, conversa para lá, conversa para cá, nisto o olhar ficou preso a uma estranha fotografia pendurada no alto de uma parede, e foi explicado que se tratava da árvore genealógica deste empreendimento churrasqueiro. Autorizada a foto, ela aqui fica. Ainda se dá um passeio pelo centro histórico, todos alegam ter o corpo moído, vamos à deita, a manhã será dedicada à Lousã, com viagem até São Pedro do Sul.
Carlos Reis passou temporadas largas na casa que mandou fazer em Lousã, e que iremos visitar, ter-se-á rendido à lenda do rei Arunce e da princesa Peralta, tempos remotos, rei riquíssimo com uma formosíssima princesa sua filha, veio um poderoso conde, cobiçoso, que produziu estragos colossais na metrópole daquele reino, o rei e a sua filha única, bem como a corte, esconderam-se num Castelo edificado no coração de umas serras, havia uma ribeira muito fresca a quem o rei pôs o nome de ribeira de Arunce, no Castelo ficou a filha e os tesouros, o rei fez encantar o dito Castelo, claro que tinha que aparecer alguém tentado pela mão da princesa, seria Sertório, consta na fábula que não deu pelo Castelo encantado, o que interessa é que ele fi conquistado por D. Afonso Henriques e Miguel Leitão de Andrade refere-o na sua Miscelânea, bem como as ermidas envolventes, destaca-se a Nossa Senhora da Piedade, por quem os lousanenses têm a maior devoção e veneração.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 13 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27215: Os nossos seres, saberes e lazeres (700): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (221): Um jardim Zen no Planalto das Cezaredas - 2 (Mário Beja Santos)

domingo, 13 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27013: Os nossos seres, saberes e lazeres (689): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (212): Um dia na rota da cereja, Fundão e Castelo Novo (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Maio 2025:

Queridos amigos,
Em hora feliz verifiquei que a CP tem uma gama de excursões de dia inteiro, não hesitei em ver os cerejais do Fundão em flor. Sorte no dia, ensolarado, depois de praticamente duas semanas de céu pardacento e mesmo pluvioso; o Tejo a correr em galope, bem caudaloso, e é sempre um prazer, mesmo vendo de raspão, as portas do Ródão. Foi bem gentil o apoio dado pelos guias autárquicos, à chegada a visita a um núcleo interpretativo, um regalo de muito boa qualidade museográfica e museológica. E depois viagem para ver deslumbrantes cerejais, o espetáculo da paisagem passando pela Cova da Beira até às faldas da Serra da Estrela; e depois a aldeia histórica de Castelo Novo, nunca aqui estivera, abençoado programa de aldeias históricas de Portugal que permite requalificações de Almeida até Trancoso. Fiquei confiante em novas deambulações com a marca CP, sou amante de viajar em comboios, lá para os lados do Reguengo Grande estou sempre à espreita que abra a linha do Oeste e anseio que o mesmo aconteça com a linha da Beira Alta para ir visitar um querido amigo a Trancoso.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (212):
Um dia na rota da cereja, Fundão e Castelo Novo


Mário Beja Santos

Deu-me para abrir no site da CP, queria fazer uma pesquisa sobre passeios organizados, logo me chamou à atenção a rota da cereja, viagem da Gare do Oriente até ao Fundão, boas-vindas por um guia da autarquia, visita ao Núcleo de Interpretação da Moagem do Centeio (reconstituição do circuito de maquinaria de processamento do cereal da antiga empresa A Moagem do Fundão), passei pelo Fundão, comes e bebes à escolha do visitante, rota da cereja, com passeio em Alcongosta, ver os cerejais em flor e seguir de autocarro para a aldeia histórica de Castelo Novo, regresso ao Fundão, mais comes e bebes à escolha do visitante e regresso até à Gare do Oriente. Gostei do preço, 49€, tive sorte com o dia, segue viagem, o Tejo está caudaloso, as Portas do Tejo, depois de Vila Velha do Ródão, deixam correr a água em cachão, tempos depois arribamos ao Fundão. Cumprimentos efusivos, o grupo segue para a moagem do centeio, era este o cereal que se dava na região, dele se guarda boa memória. Como vamos ver, todo este património está cuidadosíssimo tratado, tenho todo o gosto em exaltar o que me parece tão boa museografia e museologia.
O que estamos a ver chama-se tarara, era equipamento que servia para limpar o centeio com o apoio de um ventilador, que separava as impurezas. Tem um tambor de rede metálica com orifícios de menor diâmetro que o centeio.
Este aqui chama-se ensacadora, é maquinismo onde termina o processo da moagem. O controlo da operação era feito manualmente. O produto era conduzido pelo bico de enchimento para o saco, que era preso por uma mola ou cinta. As farinhas e as sêmolas eram embaladas em sacos de serapilheira.
Para que o visitante fique a saber o que era o sistema de moagem Austro-Húngaro
A imagem fala por mil palavras
Duas imagens de tão impressionante maquinaria
Já percorremos a avenida principal do Fundão, estamos diante da câmara, edifício que já teve outras utilidades, temos à frente vistoso pelourinho, espaço bem ajardinado, bancos ocupados por gente que veio aproveitar o dia ensolarado.
Já foi casino, agora é casa de cultura. Impressionou-me na avenida principal a remodelação do cineteatro da Gardunha, no turismo tive acesso à programação cultural no segundo trimestre de 2025, há cinema, exposições, feira ibérica de teatro do Fundão, festival internacional do Fundão, e muito mais, já que vim à procura de cerejais em flor, descobri que existe o motoclube Os Trinca Cereja.
Começou a rota da cereja, Alcongosta é um espaço de eleição. Não me resisto a transcrever de um folheto que me entregaram no turismo: “A rota da cereja é um calendário dos sentidos. Na primavera, as cerejeiras vestem-se de branco, pintando a Gardunha num espetáculo único. No verão, o verde das árvores é pontuado pelos frutos vermelhos que deliciam o paladar. No outono, os tons ocre amarelo-alaranjado das folhas inundam a serra de matizes e cores magníficas. A rota da cereja tem duas portas de entrada localizadas junto à entrada de Alcongosta e na casa da floresta de Alcongosta.” Repito que tive sorte com o dia, a semana precedente fora de dias enevoados, é um espetáculo ver-se com a ilusão de que estamos próximos da Serra da Estrela a partir da Gardunha.”
Tirei fotografias a fio, como é de prever o cerejal domina as paisagens, seguimos num daqueles comboios rodoviários, para-se nuns miradouros, contempla-se a deslumbrante paisagem sobre a Cova da Beira, que se estende até aos limites do sul da Serra da Estrela, fiquei com vontade de voltar, e percorrer Alcongosta com mais cuidado, os seus miradouros e a levada. Há para aqui nomes muito bonitos, como Ribeira da Bárbara ou Vale de Alcambar.
Prossegue a viagem até Castelo Novo, os cenários paisagísticos são deslumbrantes. Leio noutro folheto que esta aldeia histórica se abriga no regaço da Gardunha, teve origem em tempos medievos, a ribeira chama-se Alpreada, foi aliás o primeiro nome deste bastião templário que teve floral em 1202. Por aqui me passeio cheio de contentamento, e o que mais gostei nesta igreja da terra foi este agrupamento de anjinhos, devemos ter aqui nesta estatuária o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
Nunca vi uma fonte como esta, poderá ser ilusão minha ou o escultor quis fixar a concha de Santiago, é de uma impressionante singeleza.
O leitor, se assim o entender, tem aqui o essencial da história de Castelo Novo
A torre sineira domina a povoação, fica-me a dúvida se não era também Atalaia, dá para ver até dezenas de quilómetros, os templários esmeravam-se na prevenção do seu sistema defensivo, Castelo Novo deve ter conhecido um grande abandono, mas agora o visitante tem acessos seguros para andar de cima a baixo.
Já conheceu melhores dias, mas ainda é um pano de muralha que mete respeito.
Andava-se em digressão lá por cima e chegava-nos a estridência dos Dire Straits, algures havia festa rija. E havia mesmo. Um candidato a deputado apresentara-se pela sua comitiva e oferecera uns comes e bebes, quem vinha na excursão da CP beneficiou da festa, resta dizer que o pelourinho está muito bem mantido bem como a praça envolvente.
Estamos regressados ao Fundão, ainda sobra tempo para umas mastigações e beberragens. Mas não quis despedir-me do Fundão sem fotografar este lobo com que Bordalo II brindou o Fundão. E até à próxima viagem, da CP ou outra.
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Nota do editor

Último post da série de 5 de julho de 2025 > Guiné 61/74 - P26986: Os nossos seres, saberes e lazeres (688): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (211): Visita ao novo acervo permanente no Museu Nacional de Arte Contemporânea – 2 (Mário Beja Santos)

sábado, 21 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26944: Os nossos seres, saberes e lazeres (686): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (209): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 9 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Março 2025:

Queridos amigos,
É o derradeiro dia desta viagem que teve imperativos lutuosos, mas cujos familiares de uma grande amiga entenderam que se devia converter no conhecimento de lugares esplendentes, como procurei revelar em Idstein, Limburgo ou agora no Mosteiro de Eberbach, isto para já não falar nas escapadelas a lugares de algum modo bem conhecidos em Frankfurt. Despeço-me mostrando algumas imagens do mosteiro fundado no século XII, veremos a transição do românico para o gótico, da severidade iremos ver que se evoluiu da arte gótica até se chegar ao barroco. Na Idade Média, estes monges cisterciense meteram-se na cultura do vinho e reza a história que se tornaram nos mercadores mais influentes da Europa Central dos século XVI para o século XVIII. E na visita às suas instalações vê-se que a viniviticultura é a primordial riqueza do mosteiro. Acabou-se a festa, sou levado ao Aeroporto Internacional de Frankfurt, não escondo o meu pesar. Felizmente que os anfitriões deixaram a porta aberta. Qualquer dia dou-vos notícia do meu regresso.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (209):
Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 9


Mário Beja Santos

Encaminho-me para o Mosteiro de Eberbach, também no Estado de Hesse, com dissimulada tristeza, já trago a trouxa feita, aqui se passará a manhã, almoça-se, serei depois transportado para o Aeroporto Internacional de Frankfurt, tem uma dimensão desmesurada, à frente só Heathrow. À porta lê-se uma divisa: Porta Patet, Cor Magis, isto é a nossa porta está aberta e ainda mais o nosso coração! O visitante é assim calorosamente recebido nesta muito abadia cisterciense. Foi fundada em 1136, Bernardo de Claraval enviou um punhado de monges que aqui viviam em ascese e muito trabalho. Graças a uma eficaz gestão económica, o mosteiro transformou-se rapidamente na Idade Média numa empresa próspera, graças à cultura da vinha, importada da Borgonha; no fim da era medieval o mosteiro ganhara a reputação de ser o mais importante negociante de vinho da Europa Central. O mosteiro albergava duas comunidades especialmente separadas: os monges de que alguns eram sacerdotes e o grupo dos irmãos laicos ditos irmão conversos. Rezar e trabalhar era o seu mandamento maior. Monges e irmãos eram maioritariamente originários das camadas pobres.
Que edifícios iremos ver? Temos aqui os tempos primitivos, é patente a reforma cisterciense, nada de embelezamento artístico e ornamental, a imagem da igreja dá-nos exatamente essa perceção. Iremos ver o traçado românico e depois o gótico em salas tal como dormitório dos monges, a sala do capítulo, a construção nova do claustro e até nas capelas funerárias. Até muito tarde, estes monges resistiram aos caprichos do embelezamento, mas deixaram-se depois inspirar pelos esplendores barrocos, como veremos nas últimas imagens.

Arrumada a viatura, avista-se num plano superior a dimensão imponente deste mosteiro com as suas cúpulas bolbosas, impressiona desde logo o bom estado de manutenção.
No caminho para a entrada, uma imagem do transepto
No passeio pelos jardins, não resisti a subir a um patamar que permite ter a dimensão da igreja
Pormenor do claustro
Arte românica, sem equívocos
A chegada do gótico à sala do capítulo
Chamo-lhe igreja mas é verdadeiramente uma basílica abacial. São igrejas que impressionam precisamente pela sua simplicidade, foram concebidas para convidar ao recolhimento, à meditação e à oração. Esta tem 80 metros de comprimento, construída em duas fases, de 1145 a 1160 e de 1170 a 1186. É uma basílica românica de fortes pilares e três naves. As capelas laterais têm elementos góticos. As grandes janelas ao alto conferem à igreja uma luminosidade intensa.
À direita, Adolfo II de Nassau, à esquerda o arcebispo Gerlach de Nassau.
Estamos agora na parede esquerda e temos os túmulos de um religioso proeminentes e de Adolfo II de Nassau. O primitivo túmulo deste arcebispo foi considerado um dos mais monumentos funerários da Idade Média na Alemanha.

Cruz do altar-mor da igreja no Mosteiro de Eberbach
O visitante é convidado a deter-se junto das pedras tumulares. Os membros da nobreza e da burguesia piedosa foram autorizados a enterrar-se na abadia de Eberbach a partir do século XIII, depois de levantada a interdição de sepulturas nas igrejas cistercienses. São às dezenas esta pedras tumulares, algumas magnificamente decoradas, muitas foram destruídas quando se extinguiu o mosteiro em 1803.
Pormenor da arte gótica a caminho do dormitório
Todo o visitante é avisado logo na receção de que não deve perder os lagares e as adegas, bem como o dormitório dos monges no andar superior, aqui pontifica a arte gótica.
Um pormenor da abadia junto de uma bela porta românica de ligação ao claustro.
Um outro ângulo do mosteiro, vê-se a igreja e duas torres
Estas últimas três imagens marcam o contraste entre a simplicidade medieval e a atração pela decoração barroca. Se o refeitório primitivo tem decoração medieval, este novo foi construído no princípio do século XVIII, é a única divisão do mosteiro que deixa perceber a alegria festiva barroca, contraste mais gritante com a severidade do passado não podia ter acontecido.

O passeio prosseguiu até aos locais de vendas, daqui se partiu para uma refeição ligeira, guardei no meu caderninho de viagem que no século XII era uma vida severíssima, 150 monges e 300 irmãos, do século XIII ao século XVI reduziram-se as restrições e começou a cultura da vinha, que se tornou prodigiosa; o século XVIII é marcado pela prosperidade; no século XIX assiste-se à secularização, dissolve-se o mosteiro por ordem do príncipe Frederico Augusto von Nassau-Usingen, na década de 1860 este ducado de Nassau é anexado ao reino da Prússia, em 1946 torna-se propriedade do Estado de Hesse, a partir de 1998 surgiu uma fundação. E acabou-se a viagem, bem triste foi a razão que me trouxe a este rincão da Alemanha, mas não posso esconder que os meus anfitriões me asseguraram uma esplêndida estadia, como procurei registar nestas notas de itinerância.
Até à próxima!

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Nota do editor

Último post da série de 14 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26920: Os nossos seres, saberes e lazeres (685): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (208): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 8 (Mário Beja Santos)