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quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26199: Recortes de imprensa (140): "Navio doado por Portugal, batizado "Centenário de Amílcar Cabral", veio facilitar a ligação entre Bissau e o arquipélago dos Bijagós



Fotograma de vídeo da RTP África > Notícias >14 out, 2024, 15:57 > "Navio 'Centenário de Amílcar Cabral' doado por Portugal facilita a ligação entre Bissau e Bijagós" (com a devida vénia...)


1.  Com a devida vénia, transcreve-se parcialmente uma peça da Lusa, constante do portal RTP Madeira > Política 12 out, 2024, 21:03


Pronto a zarpar navio oferecido por Portugal às populações da Guiné-Bissau


O navio oferecido por Portugal à Guiné-Bissau foi hoje batizado (...).

O secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal, Nuno Sampaio, entregou ao Presidente da República da Guiné-Bissau a chave da nova embarcação batizada com o nome “Centenário de Amilcar Cabral”, em homenagem ao líder histórico guineense.

O chefe de Estado agradeceu ao Governo português mais esta “demonstração clara da excelência das relações” entre os dois países e a concretização de um projeto que nasceu há dois anos e que ainda aguardará mais alguns dias para chegar a alto mar.

A perspetiva do Governo guineense, exposta na cerimónia de batismo pelo ministro dos Transportes, Marciano Silva Barbeiro, é de que as viagens entre Bissau e as ilhas comecem ainda durante o mês de outubro.(**)

O Governo português investiu mais de 2,5 milhões de euros na reparação e adaptação da embarcação com capacidade para transportar 340 passageiros e uma grua de carga de cinco toneladas, como explicou o secretário de Estado português.

O investimento foi suportado pelo Fundo Ambiental de Portugal e contou com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a colaboração de outros parceiros internacionais, segundo o governante.

O novo navio irá evitar o recurso a pirogas e canoas, o meio de transporte marítimo mais usado pelas populações das ilhas Bijagós, e “permitir mais segurança”, assim como servirá o turismo, a deslocação de doentes ou o transporte de máquinas para a agricultura, disse ainda.

Nas águas do rio Geba, este navio “irá cimentar as condições de desenvolvimento da Guiné-Bissau”, considerou o governante português, salientando que permite a recolha de passageiros mesmo na ausência de cais, com uma lancha para embarque e desembarque de passageiros.

O ministro dos Transportes da Guiné-Bissau, Marciano Silva Barbeiro, realçou a necessidade da construção de pontões flutuantes em Bissau, Bolama e Bubaque e que o Governo guineense já solicitou apoio à União Europeia para este fim.

Para conseguir uma tarifa mais baixa para as populações, o governante guineense defende que uma parceria público-privada para assegurar o serviço. (...)

 O Presidente da República da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, anunciou que, além do novo navio, o país irá receber “nos próximos meses, 21 autocarros de Portugal”.

O chefe de Estado entende que a Guiné-Bissau irá precisar “de uma empresa gestora competente” e de indústria naval face aos novos avanços no sistema de mobilidade.(...)
 
Sissoco Embaló não tem dúvidas de que o dia de hoje “é um passo para vencer o isolamento entre a parte insular e continental” do país com 88 ilhas, 20 das quais habitadas, e cerca de dois milhões de habitantes.

O secretário de Estado português, Nuno Sampaio, assegurou “sempre apoio de Portugal à Guiné-Bissau” e anunciou que, em breve, vai ser assinado uma acordo para o desenvolvimento do das ilhas Bijagós

Portugal e a Guiné-Bissau têm um Programa Estratégico de Cooperação (PEC) em execução entre 2021 e 2025, que prevê um investimento de cerca de 60 milhões de euros no país da África Ocidental.


Lusa

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos: LG)

___________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 26 de setembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24702: Recortes de Imprensa (139): Jornal "Voz da Guiné" (9): Reprodução das 3.ª e 4.ª páginas do número especial de 10 de Setembro de 1974 (Abílio Magro)

(**) Vd. poste 26 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26197: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (43): Passeio à ilha de Orango Grande, com passagem por Bubaque - Parte I

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26078: Consultório Militar do José Martins (84): Protocolo de Cooperação entre o Hospital das Forças Armadas e a Liga dos Combatentes para assistência médica e internamento dos seus sócios


Em mensagem de 22 de Outubro de 2024, o nosso camarada José Martins (ex-Fur Mil TRMS, CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), fez chegar até nós uma cópia do Protocolo de Cooperação entre o Hospital das Forças Armadas e a Liga dos Combatentes para assistência médica e internamento aos membros da Liga dos Combatentes.
Reproduzimos com a devida vénia.



PROTOCOLO DE COOPERAÇÃO ENTRE O HOSPITAL DAS FORÇAS ARMADAS E
A LIGA DOS COMBATENTES PARA ASSISTÊNCIA MÉDICA E INTERNAMENTO

Considerando que o Hospital das Forças Armadas (HFAR) é um estabelecimento hospitalar militar, que se constitui como elemento de retaguarda do sistema de saúde militar, criado pelo Decreto-Lei n.° 84/2014, de 27 de maio, encontrando-se na direta dependência do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas;

Considerando que o Decreto-Lei n.° 19/2022, de 24 de janeiro, que estabelece a Lei Orgânica do Estado-Maior-General das Forças Armadas e altera as Leis Orgânicas dos três ramos das Forças Armadas, prevê, no seu artigo 51.°, que o Hospital das Forças Armadas pode prestar cuidados de saúde a outros utentes, para além dos que presta a beneficiários militares das Forças Armadas, militarizados, família militar ou deficientes das Forças Armadas, na sua capacidade sobrante, mediante celebração de acordos com outras entidades ou, quando tal não for possível, por despacho do CEMGFA;

Atendendo a que o legislador, com esta disposição, pretendeu conferir margem ao HFAR para alargamento do seu universo de utentes, na medida da sua capacidade sobrante;

Considerando, ainda, que é interesse do HFAR colaborar com a Liga dos Combatentes na medida das suas possibilidades e que existe disponibilidade para assistência médica e internamento;

Considerando que a Liga dos Combatentes tem como um dos seus principais objetivos estatutários promover a proteção, auxílio mútuo e solidariedade social em benefícios geral do país e direto dos seus associados;

Considerando que a Liga dos Combatentes pretende ter no HFAR o seu hospital de retaguarda para onde poderá referenciar os seus associados que necessitem de cuidados diferenciados;

Considerando que a Liga dos Combatentes, num estudo preliminar, estima que o número de utentes, seus associados, a referenciar anualmente, se situará entre os 1500 a 2000, entre os polos do Porto e de Lisboa do HFAR;

Considerando, por fim, que ambas as entidades estão altamente empenhadas em promover o bem-estar social e a qualidade de vida das pessoas mais vulneráveis, nomeadamente dos antigos combatentes;

É celebrado o presente Protocolo de Cooperação, doravante designado por Protocolo,

Entre:

O HOSPITAL DAS FORÇAS ARMADAS, adiante designado HFAR, com o número de identificação de pessoa coletiva 600010180, sito na Azinhaga dos Ulmeiros — Paço do Lumiar, 1649-020 Lisboa, aqui representado pelo aqui representado pelo Diretor do Hospital das Forças Armadas, Comodoro Francisco Gamito Ferreira Quaresma Guerreiro, por designação para assinatura pelo Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, General José Nunes da Fonseca,
e
A LIGA DOS COMBATENTES, adiante designada de LC, com sede na Rua João Pereira da Rosa, 18, 1239-042 Lisboa, pessoa coletiva 500816905, de utilidade pública administrativa, sem fins lucrativos, equiparada a IPSS, aqui representada pelo Tenente- General Joaquim Chito Rodrigues, na qualidade de Presidente da Direção Central.

O qual se rege pelas cláusulas seguintes:

Cláusula 1.a
Objeto e âmbito

O presente Protocolo tem por objeto o estabelecimento das condições de cooperação entre as Partes para assistência médica e internamento dos membros da LC, no HFAR.

Cláusula 2.a
Atribuições do HFAR

No âmbito do presente Protocolo, o HFAR compromete-se a:

1. Assistir e internar, os membros da LC, providenciando o seu acompanhamento médico, incluindo a realização de todos os exames complementares de diagnóstico e terapêutica julgados necessários pelos respetivos médicos, atento os recursos de assistência hospitalar disponíveis nas suas instalações, mediante a sua capacidade sobrante, nas mesmas condições de prestação aos demais beneficiários do sistema de saúde militar;

2. Providenciar, segundo critérios clínicos dos seus profissionais, o seu acompanhamento cirúrgico, caso necessário.

Cláusula 3.a
Beneficiários

Encontram-se abrangidos pelo presente protocolo todos os membros da LC.

Cláusula 4.a
Local de execução

Os serviços de saúde objeto do presente Protocolo serão prestados nas instalações do HFAR, em Lisboa e no Porto.

Cláusula 5.a
Condições de acesso

Os membros da LC devem identificar-se, nas instalações previstas na Cláusula 4.a mediante apresentação do documento de identificação e documento comprovativo da condição de sócios da LC, sendo também portadores da “Declaração de acesso ao Hospital das Forças Armadas”, emitida pelos Núcleos ou Centros de Apoio Médico, Psicológico e Social (CAMPS) da LC, documentos imprescindíveis para a aceitação dos utentes ao abrigo deste protocolo.

Cláusula 6.a
Marcações

O agendamento de consultas e meios complementares de diagnóstico e terapêutica é da responsabilidade das Secções de Gestão de Utentes dos Polos do HFAR.

Cláusula 7.a
Preçário

As tabelas de preços a aplicar aos beneficiários do presente protocolo são as que se encontram em vigor na produção da atividade clínica e consequente faturação do HFAR, sem prejuízo da faculdade de definição de outro regime de faturação a estabelecer nos termos da lei.

Cláusula 8.a
Proteção de dados

Cada uma das Partes é responsável pelos dados recolhidos e compromete-se a cumprir escrupulosamente a legislação aplicável à proteção de dados pessoais, nomeadamente o Regulamento (UE) n.° 679/2016, de 27 de abril, e a Lei n.° 58/2019, de 08 de agosto, que transpõe e executa a matéria de proteção de dados no ordenamento jurídico nacional.

Cláusula 9.a
Alterações, dúvidas e omissões

1. Quaisquer alterações ao presente Protocolo serão acordadas por ambas as Partes, através de adenda.

2. As Partes comprometem-se a resolver entre si, em comum acordo, quaisquer dúvidas, omissões ou dificuldades de interpretação que possam advir da execução do presente Protocolo.

Cláusula 10.a
Resolução de conflitos, lei e foro competente

1. O presente Protocolo rege-se, em todos os seus aspetos, pela lei portuguesa.

2. As Partes comprometem-se a solucionar, de comum acordo, por meio extrajudicìal, quaisquer conflitos decorrentes da execução do presente Protocolo.

3. Caso não seja possível alcançar solução por comum acordo, é competente o foro das Comarcas de Lisboa ou Porto, com expressa renúncia a qualquer outro.

Cláusula 11.a
Resolução

Qualquer das Partes pode resolver o presente protocolo, a todo o tempo, mediante comunicação escrita fundamentada à contraparte, em caso de incumprimento culposo do presente Protocolo, desde que tal incumprimento torne inviável a manutenção da sua vigência.

Cláusula 12.a
Vigência

O presente Protocolo entra em vigor na data da sua assinatura pelos representantes das Partes, e vigora pelo prazo de 02 (dois) anos, renovável por iguais e sucessivos períodos, salvo se for denunciado por qualquer das Partes, mediante comunicação escrita à contraparte com uma antecedência mínima de 60 (sessenta) dias.

O presente protocolo é assinado em duplicado, ficando um exemplar para cada uma das Partes.

Lisboa, 16 de outubro de 2024

PELO HOSPITAL DAS FORÇAS ARMADAS,
Francisco Gamito Guerreiro
Comodoro

PELA LIGA DOS COMBATENTES,
Joaquim Chito Rodrigues
Tenente-General


_____________

Em tempo:

Esclarecimento do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes:

1 - Relativamente à declaração de acesso ao Hospital das Forças Armadas (que consta no Protocolo), esclarece-se o seguinte:
- A declaração é emitida pelo Núcleo ao sócio da LC com as quotas pagas (do ano em curso) e comprovadas no seu cartão de sócio (a apresentar no HFAR com o documento de identificação).
- Esta declaração é passada pelo Núcleo apenas na primeira vez que o sócio pretende ser encaminhado para o HFAR. Passando a ser utente do HFAR, será o médico de referência do HFAR, a encaminhar, se for necessário, para outros cuidados de saúde.

2 - Relativamente ao preçário (cláusula 7ª): os preços a aplicar aos sócios da LC, que passam a ser utentes do HFAR, têm como referência a Tabela da ADSE.

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Nota do editor

Último post da série de 10 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25505: Consultório Militar do José Martins (83): Revolta de 16 de Março de 1974 passou pelo Concelho de Loures

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25398: De volta às montanhas de Liquiçá, Timor Leste, por mor da Escola de São Francisco de Assis, em Boebau (5.ª estadia, 2024): crónicas de Rui Chamusco (ASTIL) (excertos) - Parte I




Timor Leste > Liquiçá > Manati > Boebau > Fevereiro de 2024 > Escola de 
São Francisco de Assis (ESFA) (iria celebrar o seu 6º aniversário em 16 de março)
 

Fotos (e legenda): © Rui Chamusco (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Crónicas de Timor Leste - 5ª. Estadia (2024)


1. Mensagem enviada pelo nosdo amigo Rui Chamusco  em 3 de março de 2024, 00:11


Estimados sócios e amigos da ASTIL;

Junto envio-vos, em anexos, o meu primeiro bloco de Crônicas da 5º estadia em Timor Leste e algumas fotos dos dias passados na Escola São Francisco de Assis (ESFA).

No próximo dia 16 de Março vamos celebrar o 6º aniversário da inauguração da ESFA, a nossa menina dos olhos neste projeto de solidariedade. Peço-vos que estejam connosco, ainda que ausentes, e que a vossa força mental nos ajude a superar alguns dos problemas que enfrentamos.

Com um forte abraço para cada um de vós, Rui.


Lourinhã > Praia da Areia Branca >
Rui Chamuscao e Gaspar Sobral) 
 (2017)


2. Publicamos a primeira crónica que o nosso amigo Rui Chamusco (77 anos, professor de educação musical reformado, do Agrupamento de Escolas de Ribamar, Lourinhã, natural de Malcata, concelho de Sabugal, cofundador e líder da ASTIL - Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste, membro da antiga Tabanca de Porto Dinheiro / Lourinhã ) nos mandou, na sequência da sua 5.ª viagem àquele país lusófono em missão solidária (2024) (*).

Esteve já lá 5 vezes, em 2016, 2018, 2019, 2023 e agora 2004, no âmbito da construção, 
organização e funcionamemento 
da Escola de  São Francisco de Assis (ESFA), 
em Boebau, Manati, município de Liquiçá.

O Rui Chamusco, o "abô" Rui, é juntamente com a família luso-timorense Sobral um dos grandes pilares deste projeto de solidariedade com o povo timorense. É um exemplo inspirador, de amor à lusofonia e de solidariedade para com o povo de Timor Leste, que merece ser conhecido (e acarinhado) pelos nossos leitores.  Mais: é um exemplo de rigor,   paixão e tenacidade nas causas em que se mete.

Ele faz como.como ninguém a ponte com um país que tem parte da sua história em comum com Portugal e por quem os portugueses têm um especial carinho,  mas do qual sabem pouco.  De facto, há aspetos da história, da geografia e da cultura timorenses que nos são totalmente desconhecidos, daí também o interesse destas crónicas para os nossos leitores.

Para os leitores que se queiram associar a este projeto, aqui fica a conta solidária da Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste (ASTIL) (Página do Facebook)

IBAN: PT50 0035 0702 000297617308 4

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De volta às montanhas de Liquiçá, Timor Leste, por mor da Escola de São Francisco de Assis, em Boebau (5ª estadia, 2024): crónicas de Rui Chamusco (ASTIL) (excertos) - Parte I


15/16/17 fev 2024  – Voando rumo à “Terra do Sol Nascente”

Estas viagens tão longas, com tantas horas de vôo, deixam-os sempre
bastante apreensivos. Aguentaremos tantas horas sentados? Como vão ser os transbordos? A bagagem chegará a tempo e em bom estado? E assim vamos matutando com estas e outras inquietações.

Nesta viagem e durante um mês de estadia temos a companhia da professora Angelina Ribeiro, que decidiu conhecer o nosso projeto de solidariedade “in loco” e para o qual quer contribuir com a sua larga e valorosa experiência sobre a dislexia, a quem agradecemos desde já a sua disponibilidade. 

Ficará, com certeza, ainda mais rica depois de conhecer este povo timorense, que dispensa gatuitamente sorrisos e veneração a todos os que a eles se dedicam. Que o digam as crianças.

Com algumas peripécias pelo caminho próprias para quem vem para o “fim mundo”, chegamos sãos e salvos à terra do sol nascente, que em tetum de diz “Terra de Loro s’ae”. 

Sem atrasos (que os aviões não esperam por ninguém), o avião da AeroDili (companhia timorense) aterrou sob um calor sufocante e húmido como é próprio de todos os países tropicais junto à linha do equador. 

À nossa espera estavam os irmãos Mári (mário) e Eustáquio (João Sobral), dando-nos os abraços de “boas vindas” e a "pickup"  da ASTILMB que nos levou aos nossos destinos. 

Como sempre, muito fatigados fisicamente, KO como se costuma dizer, ao final do dia entramos no “nirvana” através de um sono reparador que nos deu força e vigor para continuar no dia seguinte com vontade de rever pessoas, locais, paisagens que nos enchem o peito de ar e batem no coração.


18  fev 2024   - Dando a conhecer a cidade de Dili

É sempre agradável dar a conhecer e revisitar os lugares mais icónicos da cidade de Dili. 

Depois do almoço no Timor Plaza, visitamos o monumento a João Paulo II, em Tassitolo, o Largo e igreja de Motael, as Praias de Areia Branca e Cristo Rei, o mercado do Tais em Caicoli, a Catedral, o mercado de Perunas, a casa da família do Eustáquio, o mercado da fruta em Lecidere. 

Embora seja dia de domingo, pouco mais tempo tivemos para fazermos outras andanças. A tarde e a noite foram tomando conta do dia, e o cansaço (ainda não refeitos da viagem) levou-nos facilmente à letargia do sono dando lugar a sonhos e fantasias que edificam as nossas noites. Até amanhã e bom descanso.


19 fev 2024   - Quando o sonho comanda a vida

Já referi em noticiário anterior que a razão mais forte desta minha vinda a Timor é a tarefa de resolvermos o problema falta de professores para a Escola São Francisco de Assis, em Boebau/Manati. Por isso a programação das atividades para este dia está sujeita a este objetivo.

Na falta de resposta adequada dos ministérios da educação de Portugal e de Timor, que prometem e não cumprem, temos forçasamente de nos virar para outras possíveis respostas. Iremos aonde for preciso, para que alguém, pessoas ou instituições com espírito de missão e de serviço nos possam valer.

Assim, logo de manhã, fomos á faculdade de Filosofia e Teologia do Seminário Maior para nos encontrarmos com as Irmãs Franciscanas Vitorianas a fim de sermos informados das suas presenças em Timor Leste, particularmente da comunidade de Kaité’hu. (...)

E, como não há tempo a perder, rumamos de seguida para a Universidade Católica, com o objetivo de falarmos com o Reitor, frei Joel como ele gosta que lhe chamem os amigos. Como já nos conhecíamos da visita do ano passado, foi mais fácil entendermo-nos. Para além de outros assuntos fiz-lhe o convite de participar na celebração do 6º aniversário da ESFA, que aceitou, se nada de imprevisto acontecer.


20 fev 2024  - Rumo a Kaité’hu, Liquiçá

Logo de manhã, depois de uma passagem pelo BNU/CGD de Dili a fim de resolvermos situações imprevistas, aí vamos nós visitar as Irmãs Franciscanas de Kaité´hu, tendo em vista encontrarmos um apoio para a resolução do problema que nos aflige, a dificuldade de arranjar professores para a ESFA. A visita foi breve, mas deu para ter novas ideias, sobretudo novos contatos de alguém que teve já de percorrer o mesmo caminho. Por aí iremos.

De chegada a Liquiçá, fomos diretos que nem um fuso para a Escola CAFE à procura da professora Teresa Costa, coordenadora, que exultou de alegria quando nos viu chegar. Eu e o Eustáquio já éramos conhecidos dos anos anteriores (o ano passado a professora Teresa esteve na celebração do 5º aniversário da ESFA). Mas a surpreza foi grande quando se olharam face a face, a professora Tereza e a professora Angelina. 

Então não é que ambas habitam na Guarda e na mesma rua? A pouco e pouco foram juntando pormenores que depressa as irmanou. Momentos muito bem passados, em conversa amena com alguns professores. Novas amizades, novos contactos.

Depois do almoço, quando o que apetece é fazer a “toba” (dormir a sesta), 
fomos até ao município a fim de entregar o material que a câmara municipal de Sabugal por mim enviou. Só que, sem marcação antecipada, o novo presidente não estava. Fomos recebidos pelo seu assessor, que depressa se entusiasmou com o que íamos dizendo e revelando logo uma vontade enorme de visitar Portugal. (...)

A última visita foi reservada para o novo diretor da educação de Liquiçá. Não sei porquê, entrei sem qualquer esperança para a resolução do problema e saí de lá com um sentimento contrário. Penso que, pela atitude e interesse do novo diretor, a nossa proposta de colaboração entre a escola de São Francisco e a escola de Quilo, pelo menos, vai ser entregue a ministra de educação de Timor. (...)


21 fev 2024  - Na Galeria “Memória Viva”

Custou, mas desta foi de vez. O que fazem os amigos!... Coube-me nesta viagem de regresso a este país trazer na minha bagagem algumas prendas para entregar aos amigos de amigos. Foi sempre assim, e por isso nada de novo, tudo dentro das regras da amizade. 

A maior parte das prendas destinam-se aos afilhados dos padrinhos da Astil, uma vertente do nosso projeto de solidariedade. E, como por delicadeza, não verifico o conteúdo de cada uma, às vezes temos “chatices” na passagem de fronteiras. 

E pronto, lá ficaram tesouras, tubos que excediam as dosagens, peças que incluiam metais. Malas abertas, sacos passados a pente fino, peças metálicas no corpo... farta-se a gente de ser apalpada. Na mala de porão, nem sei o que se passou. Mas que é chato e stressante, lá isso é.

A fim de entregar uma destas encomendas, deslocà-mo-nos por três vezes ao Farol, nas imediações de Santo Antóniuo de Motael, a fim de encontramos a Galeria Memória Viva para entregar a encomenda de um amigo comum. E desta vez conseguimos encontrar o local e a pessoa certa. Depressa criamos amizade, não fosse a Lourinhã vizinha de Peniche.

Eis senão quando, a convite do amigo que nos recebeu, deparo com um piano vertical entre a variedade dos artigos expostos nesta galeria. Quis saber de imediato se funcionava e, depois de verificar o bloqueio do teclado, foi me dito a quem pertencia este piano (nada mais nada menos que ao Sr. Presidente da República Dr. Ramos Horta) e que estava assim porque não se arranja um afinador de pianos para o pòr a funcionar. E que seria uma grande alegria para
o sr. Presidente que alguém o pudesse restaurar.

Na minha insignificância de saber alguma coisa de música pois foi esta a minha arte em toda a vida, informei que eu já afinei alguns pianos, mas tenho a chave de afinação em Portugal, e que estarei disposto a fazer esse trabalho caso estejam interessados. A resposta foi imediata, e começamos a fazer diligências em mandar vir a chave de afinação. (...)
 

23 fev2024  - Relíquia musical

Foi-me dito que este foi o primeiro piano de Timor Leste. Custa-me a crer. Mas intrigado com a importância deste instrumento, passei de novo na Galeria Memória Viva para me certificar de como esteva o piano por dentro.

 Abri, desmontei e fiquei perplexo. Todo danificado: martelos, abafadores, algumas cordas, teclas. Disseram-me que tinha passado pelo incêndio, durante a invasão indonésia.

Seja como for, este piano precisa de uma grande recuperação antes de ser afinado. Valerá a pena? Mas para isso outras mãos são necessárias. Assim, a música é outra! (...) 


25 fev 2024  - Subindo a montanha, a caminho de Boebau, calços e precalços

Esta seria sem dúvida a nossa intenção. E para isso logo de manhã, fomos a Bidau buscar a professora Angelina, e partimos para Liquiçá, a fim de nos abastecermos dos bens alimentares que garantam a nossa estadia em Boebau.

 E, já depois de fazermos uma parte do percurso através do leito acidentado de uma ribeira, eis a surpresa: um carreta(camião) com areia, não conseguiu desfazer bem a curva na subida e tombou, ocupando literalmente todo o caminho. Nenhum carro ou carreta podia passar, para cima ou para baixo. Os populares foram se juntando (ao menos há novidades), mas nada podiam fazer pois o peso e a estrutura do camião estavam inamovíveis.

Chegou o patrão da viatura e, depois de examinar o acontecido, partiu de novo, com certeza à procura de uma solução. Como ninguém sabia o tempo que isso iria demorar, não tivemos outro remédio que não fosse voltar para casa, voltar para Dili.  (...)


26 fev 2024  - Finalmente em Boebau

Desta vez tudo correu bem. Mesmo com os ossos a ranger, chagamos sãos e salvos, sem percalços. Um pouco de chuva, algum nevoeiro e paisagens deslumbrantes de cortar a respiração. 

Ao longo do percurso e de pequenas paragens fomos recebendo e dando os sorrisos e o “bom dia!” de bandos de crianças que regressavam das suas escolas. E ao chegar a Boebau, à Escola de São Francisco de Assis, aquela emoção de sempre que nos embarga a voz e faz bater o coração. A felicidade reina por aqui, nos rostos de quem chega e de quem acolhe. 

A nossa presença é um presente, e depressa se espalha a notícia da chegada do avô Rui e do Painino (Eustáquio), desta vez acompanhados da “malai” professora Angelina

Estou certo de que quem tem a coragem de fazer esta experiência de vida, nunca mais irá esquecer estas crianças, este povo. Que o diga a Maria e o João Picão; que o diga A Angelina.

Faz-me lembrar a letra da canção “Chuva” de Jorge Fernando:

As coisas vulgares que há na vida não deixam saudades / Só as lembranças que doem ou fazem sorrir / Há gente que fica na história, na história da gente / E outras de quem nem o nome ousamos dizer. / São emoções que dão vida…”


27,28,29 fev 2024  - De manhãzinha se começa o dia

Eram 6 horas da manhã e já o sol espreitava para de novo nascer. O cantar dos galos, o barulho das angunas que passavam na recolha de passageiros, algumas vozes da vizinhança junto à casa dos professores, tudo indicava o começo de um novo dia. Em atitude contemplativa, projetava o meu olhar sobre a beleza da paisagem, sobre os vales de Atabai e sobre os montes de Ermera.

Lá ao fundo, a ribeira de Laoeli. Umas horas depois são as crianças que se vão agrupando a caminho da escola e que, quais cabritos brincalhões, vão animando o caminho a fazer. À chegada ao local, as crianças atropelam-se para o beija-mão aos professores malai’s, seguido da saudação do “Bom dia!”.

Durante a nossa estadia o tempo das aulas é assim repartido: o 1º tempo (90 minutos) está à responsabilidade do avô Rui, que vai ocupar-se da sala São Francisco de Assis, onde estão todas as crianças. Através da música, com sons, vocábulos, sílabas, palavras e frases em português, canções didáticas, vamos transmitindo e envolvendo todos os presentes, numa participação ativa.

Segue-se o intervalo, estes dias adocicado com rebuçados distribuídos pelos malai’s. 

O segundo tempo (também de 90 minutos) é passado nas respetivas salas, com os alunos assim distribuídos: pré-escolar grupo A e grupo B na sala 2, com as professoras Adelina e Fátima; 1º e 2º anos sala 1, com o professor
Alarico; 3º e 4º anos na sala 3, com a professora Angelina e professor
Eustáquio.

Para surpresa nossa, uma vizinha da escola veio-nos trazer o almoço, a saber: Arroz, acompanhado de galinha caseira em caldo (sim, por que aqui não há aviários). E que bem nos soube.

A tarde do dia é passada em contatos com as famílias das crianças
apadrinhadas
, e com outros transeuntes que calorosamente nos saúdam com o “Boa tardi!...” 

Mesmo ao fim do dia, algumas vezes até já de noite, são jovens e adultos que nos procuram para aprenderem mais portugûes, sejam estudando os verbos (muito difíceis para esta gente, pois o Tetum só tem uma forma verbal), seja cantando canções em língua portuguesa.


29 fev 2024  - De volta a Dili

Há mar e mar. Há ir e voltar. Desta vez tivemos que nos apressar, pois termina hoje às 18.00 horas a possibilidade de votar antecipadamente. De manhã desenvolvemos a atividade letiva, e pelas duas horas da tarde começamos a nossa viagem de regresso, acompanhados do professor Alarico e do Jerónimo, nosso vizinho da casa dos professores.

 E embora tenhamos chegado a Dili com o corpo feito num oito devido aos solibancos do caminho, lá vamos nós diretos à embaixada de Portugal exercer o nosso direito de voto. Foi rápido e simples.

À noite, em Ailok Laran, caíu uma tromba de água que nunca tal houvera visto.

Conclusão: falha de luz duranta toda a noite e luz muito fraca no dia seguinte. São as contingências deste país no meio do mar plantado.


1
 
 
Lourinhã (2017) > O João Crisóstomo,
 outro grande amigo de  Timor



mar 2024 - João Crisóstomo e Vilma

Já sabia que a Vilma faz hoje anos. O João Crisóstomo, grande amigo (mano) de coração, com grande excitação escreveu, publicou e telefonou para alertar todo o mundo: a minha querida “Vilma faz anos e celebra a obtenção de passaporte e de cidadania americana (USA). Quero e peço a todos os amigos que a saúdem por estes eventos”. 

E assim fizemos em Ailok Laran. A família do Eustáquio, da qual eu também já faço parte, reuniu-se para, em direto através do facebook, felicitarmos a Vilma e lhe cantarmos os parabéns, acompanhados por mim ao acordeão. Temos a certeza e sentimos que foi um momento muito especial para este casal extraordinário, que espalha felicidade e boa disposição por todo o lado. E eu que o diga!...


1 mar 2024 - Cultura tradicional timorense: médico, curandeiro, fisoterapeuta, ortopedista, osteopata

Tdo isto vem a propósito de um telefonema que fiz para a professora Cristina Castilho, que há dias deu um tombo de mota e partiu a cabeça do úmero em três fragmentos e que, segundo o ortopedista, vai ficar engessada três ou quatro semanas.

O Eustáquio que ouviu a conversa interveio no assunto e disse: “três ou quatro semanas é muito. Aqui em Timor há outra forma de curar essas coisas”. E informou que vive em Bidau um senhor que cura as fraturas em três dias, através de fricção com saliva, imobilização da área afetada com talas de cana de bambú e, muito importante, o estado de alma do doente.

 Se a pessoa tiver algum problema com alguém, por exemplo um mau relacionamento, tem de primeiro pacificar-se para que o resultado da cura se verifique no prazo previsto. 

E deu o exemplo da filha de uma vizinha que também caíu de mota e fraturou a tíbia da perna. A cura não se realizou no prazo previsto porque andava zangada com uma vizinha. Teve de primeiro reconciliar-se com ela.

Não sei se a professora Cristina alinharia neste processo, mas penso que não.

Claro que todos nós conhecemos em Portugal gente dotada para estas coisas. Quem é que nunca foi a um endireita? Normalmente os resultados são mais rápidos, embora talvez não tão seguros. Cá por mim, que não sou esquisito, acredito nestas terapias, e até já fui tratado pelo Eustáquio, que é um grande conhecedor da cultura e da tradição timorense, com resultados muito positivos.

E surprendentes. Quem puder entender que entenda...

(Continua)

(Seleção, revisão / fixação de texto, edição de fotos, negritos e italicos: LG)
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Nota do editor:


Vd. também o primeiro poste, do Rui Chamusco,  que aqui publicámos há 7 anos:

2 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17814: Ser solidário (204): "Uma escola em Timor" - Parte I: o projeto de construção de uma escola em Manati-Boibau, Liquiçá, Timor Leste... (Rui Chamusco, tabanca de Porto Dinheiro)

segunda-feira, 8 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25357: Notas de leitura (1681): "Margens - Vivências de Guerra", por Paulo Cordeiro Salgado; Lema d’origem Editora, Março de 2024 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Abril de 2024:

Queridos amigos,
Porque ficou este amor excessivo pela Guiné, por aqui andamos a testemunhar o que a memória ainda retém, no caso vertente Paulo Salgado, nosso confrade, volta em ondas sucessivas ao Olossato, aproveita acontecimentos vividos nos anos da cooperação e estas vivências da guerra, que agora nos oferece em livro, andam talentosamente entre o antes e o depois. Compete-me fazer uma declaração de interesse, dizendo que conheci o Paulo Salgado nos meses de cooperação de 1991, que viajámos ao Cumeré e ao Olossato, que numa das suas páginas me trata por Mariano e põe-me em Galomaro (diga-se de passagem que no meu tempo era uma quase colónia de férias, mas ele retratou-me entre flagelações e minas anticarro...). Devo-lhe um memorável encontro no Cumeré com o coronel Mamadu Jaquité que me deixava bilhetinhos na picada, sempre tratando-me carinhosamente por "alferes de merda"; e, não menos importante, guardo comovido a recordação da viagem ao Olossato, espero que o Paulo Salgado se recorde que quando ali chegámos se disse que nada de tão edénico tinha visto, sentia-me em Sintra. Enfim, as vivências que partilhei com o Paulo Salgado.

Um abraço do
Mário



Nunca o preço do amor pela Guiné é excessivo, só a morte o pode aniquilar

Mário Beja Santos

Paulo Salgado, depois da sua comissão no Olossato e em Nhacra, voltou à Guiné muito mais tarde como cooperante na área da saúde, durante sete anos, e sobre esta temática e outras incursões já deixara algumas achegas na escrita. Acaba de publicar uma nova incursão, de cariz memorial, pontuada por solilóquios, circunlóquios, viagens ficcionadas mas com personagens de carne e osso, deixa fluir a consciência de como pensava e agia no turbilhão da guerra, e com subtileza articula todos os seus regressos ao anseio da paz e do desenvolvimento, aquela terra, aquela vivência ganham forma de um processo irrefragável, é corpo dentro do seu corpo, e não resisto a comentar o que me ocorreu quando finalizei a leitura das "Margens Vivências de Guerra", Lema d’origem Editora, março de 2024, aquele parágrafo de Álvaro Guerra na sua obra O Capitão Nemo e Eu, 1973, nada de mais belo conheço em termos literários, e tudo por causa daquela guerra que nos irmanou: “Por lá chafurdei na lama das lalas, debati-me no turbilhão dos tornados, derreti-me na fornalha de um Sol quase invisível, dissolvi-me na chuva vertical, e amei como um danado aquela terra que me injetou a febre, me secou, me expulsou a tiro. Mas nunca o preço do amor é excessivo, nem a presença da morte o pode aniquilar.”

Paulo Salgado é Alberto, tudo começa no aeroporto de Bissalanca, vem esperar Mateus, irão viajar até ao Olossato, inevitavelmente passarão por Ponte do Maqué, “lá está o que resta do fortim, quadrado fortificado, por onde passaram pelotões de companhias para guarda e salvaguarda da ponte, coberto de capim e arbustos, tudo o tempo levou, mas não levou as memórias que me vêm ao presente”; no Olossato Mateus procura Sali, a sua antiga lavadeira, ela anuncia-lhe que lhe deixou um filho, tem nome de Infali, trabalha nos correios de Bissau, põe-lhe diante dos olhos uma criança de cinco anos, é o neto de Mateus e dá pelo menos nome, Mateus pensa logo em levar esta criança consigo e educá-la; mas há uma outra viagem, Alberto, a mulher e a filha levam um outro antigo alferes, de nome Mariano até ao Cumeré, conta-lhe que em Nhacra, no dia 9 de junho de 1971, houve bastante sobressalto com flagelações do PAIGC, no Cumeré Mariano procura o comandante Demba, o antigo guerrilheiro do PAIGC fora seriamente flagelado no seu aquartelamento por ele e por o seu grupo, depois de uns segundos de embaraço tudo acabou em abraços, e gritou-se viva à Guiné!, e viva à Portugal!

Temos agora uma rotação de lugar e tempo, o antigo médico combatente conversa com uma sua colega, um rasto de memória leva-os até ao Sul, a jovem médica tem muito por contar, e nem lhe passa pela cabeça como fez bem ao veterano da guerra ouvi-la. Voltamos á orla do Morés, há um soldado que chora numa emboscada e será reconfortado pelo seu comandante; há um radiotelegrafista que não queria naquele dia ir em operação, o alferes lá o persuadiu, houve emboscada, a vítima foi o radiotelegrafista.

Temos agora Mateus e Alberto junto do enorme poilão do Alto do Maqué: “As nervuras salientes do poilão são enormes, cabendo ambos numa das fendas, parecendo que, abraçando-a, a magnífica árvore parece recordar-se deles, uma espécie de reencontro entre a majestade e imponência da árvore e a revisitação por estes homens que a ela ocorrem respeitosamente. Sentado, de pé, ao lado, de vários ângulos, deixam-se fotografar por Carolina, embevecida perante aquele cenário, aquele consolo quase pueril dos ex-militares, agora cinquentões.”

E há a memória do rio, quase sempre um fio de água que vaza as suas águas pelos braços do rio Cacheu; naquele local, estratégico, entre Bissorã e Farim, com o Morés à espreita, há recomendações para fazer ação psicológica, organizar manifestações de apoio à política do Governo, Alberto, que comanda a companhia, conversou com onze chefes de tabanca, e houve recados incómodos, do género: “Nosso alferes, a guerra não tem jeito nenhum; o senhor fala com o homem grande de Bissau para falar com o chefe do PAIGC para acabar com a guerra.”

E há as cartas de amor, Fernando Pessoa falava nelas como ridículas, Alberto dirige-se à sua amada, um tanto circunspecto, mas sempre com muitas saudades; traz-se gente da população afeta ao PAIGC numa operação, Alberto conversa com uma enfermeira da guerrilha, ela diz-lhe sem volteios que só quer lutar pela liberdade, o capitão decide que ela e as outras mulheres voltem para onde estavam, como aconteceu; não falta a mágoa de receber mensagens criticando a falta de cumprimento exato do que se devia ter feito numa operação e Alberto/Paulo Salgado dão nos conta, como se todos estivéssemos numa sala de espelhos, em Assembleia Geral, da ansiedade na espera do correio, a morte de um ente querido que nos é comunicada por uma mensagem, os meses passam, há brancos e pretos, mortos e feridos, lá na companhia chegou a funcionar um jornal, de novo “O Tabanca”, morre a mãe de Alberto e ele dedica-lhe um lindo poema, estamos em novembro de 1970, no fim desse ano há um ataque com mísseis terra-terra ao Olossato, o capitão enviar para Bissau o relatório: “Aquartelamento e povoação atacados com mísseis terra-terra; não houve vítimas nem prejuízos; apenas há que refazer o heliporto.” Num relatório não cabe dizer que houve gente escoriada e que se comeu um jantar frio; caso excecional, desapareceu um cabo-condutor do aquartelamento, mandou-me mensagem informando que o militar se teria perdido na mata do Morés.

O cooperante Alberto está agora numa receção na embaixada do Brasil em Bissau, disserta-se e brinda-se à lusofonia. Novo salto até ao passado, Alberto viaja pelas tabancas do Olossato e, mais adiante, fala-se do pontão que liga as duas margens do rio Maqué, que faz a ligação entre Bissorã e Farim, e alguém conta que o PAIG a rebentou com petardos, houve que reconstruir a ponte; muito anos mais tarde, quem contou a esta história, de nome Suleiman, ex-chefe de milícia, foi visitado pelo cooperante Alberto no hospital Simão Mendes, e o que fica escrito a todos nós pertence:
“Que vida de dor, primeiro, português de segunda, depois guineense de segunda, castigado por ter combatido ao lado da trapo portuguesa; agora amortalhado, vencido pelo sacrifício e pela doença, tenho de chorar, para dentro, não se consigo reter as lágrimas, um pedaço da minha vida escoou-se naquela figura íntegra e amiga, que tantas vezes guiou os nossos passos, nossos e de outras companhias, trilhos, carreiros, picadas… e me salvou a vida, evitando o pisar de uma mina… que Alá te abençoe, Suleiman.”

Ainda há muito que esperar desta literatura memorial, na casa dos setentas e dos oitentas são estas acendalhas que tornam esplendente o que Álvaro Guerra nos advertiu em 1973, chafurdou-se na lama das lalas, viveu-se a espiral da solidão, conheceu-se o medo, viram-se crianças esquálidas e de ventre inchado, seres humanos minados pela doença, tudo parecia acabado quando a guerra para nós acabou, mas não, como diz Álvaro Guerra, nunca o preço do amor é excessivo, porque muitos receberam a graça de amar aquela terra como este amor que agora se confessa, não se quer só reter para uso da memória individual.
Olossato: torre abrigo com vista para a pista de aviação
Olossato: abrigo das peças de artilharia – obus 8,8
Olossato: efeitos de uma mina na estrutura da ponte

Estas três imagens foram extraídas do blogue Rumo a Fulacunda, com a devida vénia
Regresso ao Olossato, neste caso Ponte do Maqué, 2006. Paulo Salgado, ex-alferes da CCAV 2721, na companhia do ex-cabo Moura Marques. Imagem retirado do nosso blogue
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Nota do editor

Último poste da série de 5 DE ABRIL DE 2024 > Guiné 61/74 - P25342: Notas de leitura (1680): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (19) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23149: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XXV: O "meu" regresso à Guiné (1): Enfim, pontes em vez de...muros!

 

Foto  1>  Guiné-Bissau>  Região do Cacheu > Rio Cacheu > S. Vicente >  2010 > Ponte de S. Vicente (Ponte Europa) sobre o Rio Cacheu, ligando S. Vicente ao Ingoré.  Construída pela Soares da Costa.


Foto 2> Guiné-Bissau> Região do Cacheu > Rio Cacheu > S. Vicente > 2008 > Ponte de S. Vicente em construção. Vd. blogue criado na altura por Pedro Moço (e que ainda está "on line"). obre o período de outubro de 2007 a junho de 2011. Tiago Costa também lá escreveu.



Foto 3 > Guiné Bissau> Região do Cacheu > S. Vicente > A travessia do Rio Cacheu, antes da ponte, era feita por um "ferry" que transportava veículos e pessoas (e, claro, porcos galinhas a cabras!), de seu nome “Saco Vaz”. nome de um herói de guerra guineense




Foto 4 > Guiné-Bissau> Região do Cacheu > Rio Cacheu > S. Vicente> 2009 > Mais uma travessia da “Saco Vaz”, depois de longos dias parada devido a mais uma avaria. Em frente a ponte promete desenvolvimento, contudo a "Saco Vaz"  vai deixar saudade…



Foto 5 > Guiné-Bissau> Região de Cacheu> S. Vicente> 2008 >  Festa de Natal > A cumplicidade com as gentes de S. Vicente mitigava as saudades de Portugal. Ninguém fica indiferente à afabilidade destas gentes. Como família se reuniram nos estaleiros da empresa para festejarem, conjuntamente, o Natal, onde as prendes às crianças, como em qualquer outra família, é o ponto alto da festa> 

 

Foto 6> Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Rio Cacheu >  S. Vicente > 2009 >  Jaime Gama,  chefiando os representantes dos financiadores da obra (a União Europeia), numa visita à construção da ponte, cujo nome oficial é “Ponte Europa”. O Tiago Costa é o quarto a contar da direita. É engenheiro civil pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP).

A ponte Euro-africana tem 730 metros de comprimento, 11 metros de largura total,  dividido em duas faixas de rodagem de três metros e meio e dois passeios. O finaciamento da UE foi de 31 milhões de euros.



Foto 7 > Guiné Bissau> Cacheu> S. Vicente > A equipa de trabalhadores da Soares da Costa que construiu a Ponte de S. Vicente. O  Tiago Costa é o terceiro da esquerda da primeira fila.



Foto 8 > Guiné-Bissau > Região de Cacheu > S. Vicente> A equipa de trabalhadores guineenses contratados pela Soares da Costa (Era conhecida pela equipa maravilha!) 


Fotos (e legeendas) © Tiago Costa / Joaquim Costa (2022). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Joaquim Costa, hoje e ontem. Natural de V. N. Famalicão,
vive em Fânzeres, Gondamar, perto da Tabanca dos Melros.
É engenheiro técnico reformado. Foi também professor.

Já saiu o seu livro de memórias (a sua história de vida),
de que temos estado a editar largos excertos, por cortesia sua.
Tem um pósfácio da autoria do nosso editor Luís Graça (*)


Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) (*)


Parte XXV - O "meu" regresso à Guiné (1): Enfim!, pontes em vez de muros


Aproveitando o facto de ter o meu filho Tiago (Engenheiro  Civil da Soares da Costa) a trabalhar na Guiné (de 2007 a 2009), na construção de uma ponte sobre o rio Cacheu, junto a S. Vicente, considerei fortemente a possibilidade do meu regresso à Guiné, aproveitando toda a logística da empresa em termos de mobilidade e segurança. 

Fui planeando com entusiasmo o meu regresso não só aos locais mais marcantes no tempo de guerra, mas também, uma visita às várias ilhas do arquipélago dos Bijagós, e, se possível, ao Senegal e à Gâmbia. Por razões várias, a visita foi sempre adiada e, infelizmente, nunca chegou a acontecer.

Concretizei o “regresso”, por interposta pessoa, neste caso o meu filho, que não obstante as dificuldades colocadas na construção de uma ponte de grande complexidade no meio do nada e onde tudo falta, deu ainda para conhecer toda a Guiné continental, as mais importantes ilhas dos Bijagós e fazer umas incursões aos "resorts" do Senegal e da Gâmbia.

 

Imagens arcantes durante a construção da ponte. 


Foto 9 > Guiné Bissau> Região de Cacheu> S. Vicente> A segurança do estaleiro da Soares da Costa era levada muito a sério. Para além do musculado guarda, havia sinalética  (ISTOP) e equipamentos de intrusão sofisticadíssimos 


Foto 10


Foto 11

 
A grande família da Obra de S. Vicente, na Guiné-Bissau, conta com um novo e surpreendente membro. O seu nome é Vicentina, tem uns poucos meses de idade, e uns belos e sedutores olhos castanhos. (Fotos  1o e 11).

A Vicentina rapidamente seduziu todos os trabalhadores, com o seu ar frágil e inseguro, e a sua graciosidade própria das gazelas.

Dada a sua tenra idade, foi no início da sua estadia alimentada a biberão, com toda a paciência e desvelo. Passada a infância, mais arisca, mais confiante, já se desloca pelo estaleiro, comendo tudo o que é verde no jardim, e confraternizando com a restante equipa técnica. Foi a mascote da obra e já faz parte das vidas de todos, com o seu ar que desperta ternura.

Seria uma ótima companhia para a Cabra Joana que a minha Ccav 8351 trouxe de Nhacobá para o Cumbijã, em 1973, na operação Balanço Final.

(Fonte: Fotos 9, 10 e 11: Cortesia do blogue Construção da Ponte S. Vicente - Guiné Bissau

(Continua)

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 8 de março de 2022 > Guiné 61/74 - P23057: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XXIV: O regresso a casa, com a cidade do Porto a abrir os seus braços só para mim

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21493: Notas de leitura (1318): "Guia turístico: À descoberta da Guiné-Bissau", 2ª ed., 2018, 176 pp. Uma notável iniciativa da ONGD Afectos com Letras, com apoio da União Europeia.



Capa






Contracapa


À descoberta da Guiné-Bissau : guia turístico / Joana Benzinho, Marta Rosa ; il. Jorge Mateus, Nuno Tavares. 2a ed. rev. e atualiz. [S.l.] : Afectos com Letras, 2018, 176 pp- ISBN 978-989-20-6252-5.


Disponível em pdf, em 4 versões (em português, inglês, francês e espanhola). Descarregar aqui a versão portuguesa:

Versão portuguesa - Guia Turístico: À Descoberta da Guiné-Bissau

 
A 2ª edição, revista e aumentada, deste belo livro, escrito a quatro mãos, foi lançada em março de 2018, e apresentada em Bissau em 10/5/2018. É um edição da ONGD Afectos com Letras ( que tem sede em Pombal), com apoio da União Europeia. Esta ONGD tem já mais de dez referências no nosso blogue.

Sobre o "making of" do livro, vale a a pena reler ou reler uma crónica da sua primeira autora, Joana Benzinho, publicada na "Bird Magazine", na devida altura. É também um convite para os nossos leitores descarregarem o livro, em formato digital, lerem-no, divulgarem-no e fazerem chegar, ao nosso blogue, algumas notas de leitura ou simples comentários. (**)

Para alguns dos nossos leitores vai permitir o regresso a lugares (vd. índice alfabético do livro) que ficaram, com marcas indeléveis, na sua memória da guerra, desde Bambadinca a Buba, passando pelo Boé, ou desde Mansoa a Gabu, passando pelo Saltinho e Guileje ... Para outros, pode ser um sugestão para uma viagem... "on line" à Guiné-Bissau, que tem hoje o triplo da população do nosso tempo, mais de 1,5 milhões de habitantes, metade dos quais têm menos de 18 anos, Existem entre 27 e 40 grupos étnicos.

E há lugares de que ouvimos falar pela primeira vez... É o caso de Nhampassaré (p. 101):

(,..) "Nas imediações de Gabú, é possível visitar as Grutas de Nhampassaré, onde se encontra reunido um património de valor arqueológico e natural notável. Aqui, podemos ver as referidas grutas ocupadas pelo homem pré-histórico com alguns vestígios de gravuras e formações em quartzito com várias formas de erosão produzidas pela natureza, nomeadamente com formas colunares. A gruta e as pedras gigantescas de Nhampassaré são, de facto, uma fascinante obra natural e terão sido habitadas pela primeira vez na época do neolítico. Neste local, também existe um santuário muçulmano, onde é comum as pessoas fazerem pedidos." (...)

Ficamos a saber também que, de acordo com o censo de 2009, os grupos étnicos com maior expressão na Guiné-Bissau, são os Fulas (28,5%) que vivem essencialment no leste do país (Bafaté e Gabu), seguidos dos Balantas (22,5%)) que se encontram principalmente na região Sul (Catió) e Norte (Oio), e dos Mandingas (14,7%), que vivem no Norte do país. Em 4º e 5º lugares, vêm os os Papéis (9,1%) e os Manjacos (8,3%). Balantas, Papéis e Manjacos são essemcialmente povos ribeirinhos.

Os indicadores de desenvolvimento mostram que praticamente metade da população (48,9%) da população vive em condições de extrema pobreza, com menos de $1,25 dólares por dia. Só 13% falam português, a língua oficial, a par do crioulo (que só 60% entende)...Há cerca de 20 línguas locais, fazendo a Guiné-Bissau uma autêntica Babel... Além da sua diversidade cultural, é um país, com uma espantosa biodiversidade, tendo em conta o seu diminuto tamanho (o equivalente ao nosso Alentejo). Basta referir, por exemplo, que estão identificadas mais de 370 espécies de aves, Tem 5 (cino!) parques nacionais... Infelizmente, na agricultura, continua a predominar a monocultura do caju (, que sucedeu à mancarra colonial), e de cuja exportação a Guiné Bissau está dependente: representa mais de 90% das exportações, mais de 60% do PIB e cerca de 17% das receitas fiscais...

Em suma, um país que nso diz muito e que vale a pena conhecer, visitar ou revisitar... E o turismo, se sustentável, pode ser uma alavanca para o tão necessário e desejável desenvolvimento integrado, que continua a ser uma miragem desde a independência, em 1974.

No entanto, com os problemas de saúde que já têm ou começam a ter os antigos combatentes portugueses que lá estiveram entre 1961 e 1974, torna-se cada vez menos exequível (e recomendável) um regresso (feliz e seguro) à terra onde passaram dois anos das suas jovens vidas, agora em "turismo de saudade".

Há regiões da Guiné, como por exemplo, o Boé ou quase todas as ilhas do arquipélago dos Bijagós onde é extremamente difícil (e caro) chegar. E os preços que as agências de turismo praticam ainda são incomportáveis para as nossas bolsas. Vamos ver, daqui a uns meses, as ofertas turísticas pós-pandemia Covid-19.

Mas àparte as acessibilidades, o país não pode oferece ainda, ao turista estrangeiro, grandes garantias de apoio sanitário, em caso de acidente ou doença súbita... O hospital mais próximo é... Dacar, no Senegal. E as infraestruturas hoteleiras são extremamente rudimentares...

A primeira edição deste guia é de 2016. Alguns reparos nossos foram corrigidos (*). E esta 2ª edição é altamente meritória e profissional, com excelente ilustração e boa execução gráfica. Merece seguramente uma leitura, mais crítica e atenta, da nossa parte, numa próxima oportunidade. Joana Benzinha, uma "mulher de armas", mas também dotada de uma grande sensibilidade sociocultural e ecológica, explica aqui o impacto que teve, na sua vida, a primeira descoberta da Guiné-Bissau em 2008. (LG)


GUINÉ-BISSAU: A VIAGEM DA MINHA VIDA

por Joana Benzinho


[Com a devida vénia à autora e ao editor...)

Aterrei pela primeira vez na Guiné-Bissau em Agosto de 2008, com muita chuva , para duas semanas de férias que iriam moldar o meu futuro e levar à criação da ONG Afectos com Letras que tem levado a cabo um trabalho intensivo na área da educação, no apoio às mulheres e na criação de bibliotecas por todo o país.

E foi nessa condição inicial de turista que conheci a enorme dificuldade em encontrar informação sobre as características económicas, sociais, culturais ou geográficas do país. 

Depois de uma busca demorada por livrarias em Portugal e na Bélgica acabei por encontrar no Amazon um guia dos anos 90, completamente desfasado da realidade do país que passou por momentos difíceis com uma guerra em 1998 que o desvirtuaram de algumas das suas características arquitectónicas mas não ao abalaram a sua fabulosa biodiversidade.

Surgiu assim em 2015 a possibilidade de passar para o papel o muito que palmilhei e conheci na Guiné-Bissau, numa parceria com a União Europeia e em co-autoria com a Marta Rosa em nome da Afectos com Letras. Este Guia Turístico, a quem demos o nome “À descoberta da Guiné-Bissau” veio colmatar uma falha sentida por quem queria visitar a Guiné e permitiu também aos próprios guineenses conhecerem o seu país de uma forma mais aprofundada.

A procura da primeira edição, de Fevereiro de 2016, superou todas as nossas expectativas e cruzou fronteiras e oceanos. Fomos contactadas desde o Brasil, a Cuba, Alemanha ou Suécia por pessoas interessadas no guia. Chegou a vários países como presente oficial em visitas de Estado, o que muito nos honrou. E isso é sintomático da falta que fazia e do interesse que suscitou. 

É um trabalho que nos fez correr centenas de quilómetros e outras tantas milhas em busca do mais interessante para dar a conhecer deste maravilhoso país que é a Guiné-Bissau. Posso dizer que foi esta “A Viagem” da minha vida.

Agora, dois anos passados, o guia caba de regressar numa segunda edição revista e atualizada, apresentada esta semana em Bissau.

A Guiné-Bissau tem variados recursos que podem ditar uma mudança positiva no seu futuro e um turismo sustentável é claramente um deles. Foi precisamente isso que tentámos trazer até ao leitor, o melhor deste país berço de uma biodiversidade fabulosa e detentor de um arquipélago de quase 100 ilhas onde a palavra paraíso encontra a sua definição e o seu conteúdo.

Este Guia serve vários propósitos e públicos que vão desde o turista clássico, ao investidor que procura informação sobre o país, passando pela simples curiosidade de quem quer aumentar a cultura geral sobre as suas características ou para dar a conhecer aos guineenses, residentes no país ou na diaspora, as belezas que a Guiné abriga.

O Guia Turístico “À descoberta da Guiné-Bissau”, está disponível em papel nas versões portuguesa, inglesa e francesa e pode também ser descarregado gratuitamente nestas três versões e ainda na versão espanhola.

A quem não conhece este paraíso, fica a sugestão de um passeio pelas páginas do livro. Quem sabe se uma viagem até Bissau não mudará a vossa vida, como mudou um dia a minha, já lá vão nove anos.

Joana Benzinho

[ Licenciada em Direito pela Universidade de Coimbra, Diplomada em Direito Europeu pelo Institut d'Études Européens - Université Libre de Bruxelles e Diploma da Academia Diplomática Europa e pelo Institut Européen des Relations Internationales. Assessora Parlamentar no Parlamento Europeu desde 1999. Fundadora da Associação Afectos com Letras, criada em 2009 e professora de informática de emigrantes portugueses na Bélgica em regime de voluntariado desde 2004. "A minha casa é a minha de viagem", vd. a sua página no Facebook ]


2. Amostra (por ordem alfabética)  de projetos financiados pela União Europeia (entre 201o e 2020), e citados no "guia turístico":

O guia turístico não podia deixar de referir, com algum detalhe, os diversos projetos de desenvolvimento apoiados com o dinheiro dos contribuintes europeus, entre 2010 e 2020. É uma amostra:

Áreas Protegidas e Resiliência às Mudanças Climáticas, regiões de Quinara, Tombali,Gabú, Bafatá, Cacheu, Bolama-Bijagós: c. 3,9 milhões de euros (p.  27);

Bafatá Misti Igua, Bafatá, c. 880 mil euros (p. 89);

Bambadinca Sta Claro  – Programa Comunitário para Acesso a Energias Renováveis, Bambadinca: c. 1,6 milhões de euros (p. 93)

Bubaque Cidade Aberta, ilha de Bubaque, arquipélago dos Bijagós; c. 480 mil euros (p. 131);

Conservação pelas Comunidades dos Valores Culturais e Naturais do Setor de Boé: c. 500 mil euros (p. 100)

Conservação e Desenvolvimento das Ihas Urok   – projetos “Urok Osheni! “, “Bemba di Vida!” e “ Etikapun N'ha - Urok”, ilhas Urok: c. 1,8 milhões de euros;

Cultura i Nô Balur – Uma estratégia de Educação para a Cultura na Guiné-Bissau. c. 700 mil euros (p. 44);

EcoCantanhez – Ecoturismo no Parque Nacional de Cantanhez, região de Tombali; c. 490 mil euros (p. 117)

Festivais de Cultura  – Sustentar o Homem e a Biosfera. Bubaque: c. 330 mil euros (p. 132)

Gestão Sustentável dos Recursos Floresais no ParqueNatural dos Tarrafes de Cacheu, região de Cacheu, c. 2 milhões de euros (p. 68):

Gestão Transparente  – Recursos Sustentáveis: Projeto de Reforço de Capacidades da Sociedade Civil para a monitorização da gestão dos Recursos Naturais na Guiné-Bissau, c. 200 mil euros (p. 27);

Memorial da Escravatura e do Tráfico Negreiro de Cacheu   – projetos “Cacheu, Caminho de Escravos” e “Cacheu di si Cultura i istoria “, região de Cacheu, c. 1,05 milhões de euros (p. 65);

No Cultura i No Riqueza – Promoção da Economia Criativa, c. 690 mil euros, região de Bissau (p. 43);

Observatório dos Direitos  - Casa dos Direitos, c. 300 mil euros (p. 37);

Parque Europa – Lagoa N’Batonha – projeto “Kau di catchu ku kau di pecadur”, c. 390 mil (p.

Projeto de Apoio Integrado ao Desenvolvimento Rural nas  regiões de Bafatá, Quinara e Tombali (PAIDR), regiões de Baftá, Quinara e Tombali, c. 3,5 milhõs de euros (p.108):

Reforço do Turismo Natural, Histórico e Cultural como Crescente Atividade Económica para o  Desenvolvimento da Guiné-Bissau, ilha de Orango, arquipélagos dos Bijagós: c. 500 mil euros (p. 138)

Tchossan Soninké  – Panos de Ponte Nova, Bafatá: c. 1,150 milhões de euros  (p. 91)

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